Esperança se escreve com giz branco
Eu não acredito em vocação. Quando alguém diz ‘’ah, ele nasceu para ser médico ou engenheiro’’, não sei se é uma previsão ou um desejo da família. Fato é que, infelizmente, ninguém quer que o filho seja professor, ninguém entende por que o filho escolhe uma profissão pouco reconhecida, em que se trabalha em jornadas longas e, às vezes, tripla. Ninguém sonha em sentar à mesa com os amigos e compartilhar sobre o sucesso do filho em uma explicação sobre o ciclo de vida de uma briófita... mas como seria gostoso falar dos hospitais em que ele trabalha, das pessoas que ajuda, do planejamento urbano que ele fez ou, quem sabe, até da qualidade de vida proporcionada aos velhinhos da fisioterapia. Tudo lindo!
Eu não acredito em vocação. Tive professores excepcionais que não eram sequer formados, como também tive aqueles com múltiplos diplomas e currículo invejável. Nenhum deles segue um padrão de investimento intelectual e qualidade na aula que dá. Seja no ensino fundamental, médio ou na universidade, o título de professor não deveria meramente remeter ao indivíduo mais bem informado sobre determinado assunto. A responsabilidade sobre a sala de aula e sobre as informações que dali saem vai além da reprodução de conteúdos ou de uma lousa cheia.
Eu não acredito em vocação, porque essa ideia esconde as noites mal dormidas para preparar aulas, o esforço desgastante em formular hipóteses e propor discussões, as tentativas hercúleas de traduzir informações para uma linguagem acessível aos alunos. A vocação abraça o indivíduo e o deixa confortável em sua posição, afinal ‘’era pra ser assim’’. Mas eu não acho que seja tão simples. E não acho que os alunos e a nossa família tenham uma exata dimensão de tudo isso. Aliás, muitos de nós não têm.
Eu me apaixonei pela profissão assistindo às aulas de pessoas que faziam questão de mostrar o quanto amavam aquilo que faziam e o quão prazeroso era falar sobre coagulação, Lei de Hess, cinemática ou equação biquadrática. Eu olhava atento e pensava se algum dia eu seria capaz de contagiar outras pessoas daquela forma, se conseguiria prender a atenção de tanta gente ao mesmo tempo, se teria habilidade em ser condescendente e rígido ao mesmo tempo...
Eu aprendi a valorizar cada espaço do ambiente escolar, seja ele moldado em uma infraestrutura admirável ou simplesmente uma carteira, uma lousa e meio giz branco. Aprendi que o professor é um personagem e um ator ao mesmo tempo, cujo objetivo é ensinar, transformar e modificar(-se).
Triste será o dia em que não houver o frio na barriga antes de cada aula. O dia em que o pedido para ir ao banheiro não irritar. O momento em que as perguntas óbvias não fizerem o sangue ferver. Lamentarei quando perceber que a minha hora dentro da sala de aula já passou, mas até lá farei o (im)possível para manter acesa essa chama e alta essa bandeira em que acredito. O professor não é um instrumento da educação e jamais deve ser passivo dentro da sala de aula. Respeito e admiração são consequências e não imposições. Os alunos não são meros ouvintes, mas sim parte de todo um processo de construção.
E é por isso que eu parabenizo a todos os meus amigos e companheiros de profissão, pela escolha e pela coragem em enfrentar todos os diários desafios dentro da educação. Agradeço aos que me incentivaram e aos que me ajudaram a criar visão crítica sobre tudo o que me cerca, bem como aos que me mostraram o caminho que eu não gostaria de seguir (é importante saber descartar algumas coisas também...).
Encerro essa mensagem agradecendo também a todos os alunos que de alguma forma passaram pelo meu caminho. Saibam que as brincadeiras, as discussões, os sorrisos e os momentos emocionantes sempre foram sinceros e que é nisso em que acredito: a relação professor x aluno não precisa, necessariamente, ser estigmatizada e burocratizada. Tudo flui de uma forma muito mais incrível quando se sente que algum grau de amizade existe dentro da sala de aula, mesmo que para isso tenham existido muitas e muitas broncas.
Eu encho o peito, com orgulho, pra dizer FELIZ DIA DOS PROFESSORES para todos nós!