A escrita na História da humanidade - 1

Eduardo de Castro Gomes (1)

Resumo

O leitor encontrará aqui momentos importantes da escrita na História da

humanidade. O texto foi redigido tendo como bases bibliográficas principais Pierre Lévy, José Juvêncio Barbosa e Charles Higounet. Apresenta o relacionamento da escrita com as seguintes áreas do conhecimento humano: ciências e literatura na Mesopotâmia, escritas sagradas do Egito, origens do alfabeto, a escrita e o comércio fenício, a inovação das vogais no alfabeto grego, a formação da língua portuguesa pela dominação romana e a formação da língua portuguesa no Brasil.

Palavras-chave: escrita, história, sociedade.

Introdução

Uma contemplação cuidadosa e criativa sobre o histórico da humanidade e a informação impressa permite deduzir que esta é uma das relações mais estruturadas e antigas entre o homem e um engenho seu. Percebe-se isso ao se considerar que os laços homem-impresso existem desde antes da escrita. E até mesmo antes da comunicação verbal! Uma prova é o fato de que as mais remotas performances protagonizadas pelo homem chegaram até nós principalmente através de alguma inscrição: as pinturas rupestres, por um cuidado da natureza, ainda hoje comunicam ao homem – milênios mais tarde – aspectos da vida daqueles ancestrais. Ou seja, na pré-história o ser humano já internalizava a necessidade de registros impressos.

Esses laços foram atados de tal forma na evolução humana, que até pode-se tecer uma analogia entre a história da humanidade e a aprendizagem da escrita de um indivíduo, pois do Paleolítico ao contemporâneo o homem mantém uma relação com as inscrições de forma semelhante à aprendizagem da escrita na infância. Explicando: assim como a criança mantém seus primeiros contatos com os impressos rabiscando, desenhando e reconhecendo figuras, a raça humana em sua fase “criança” (o homem das cavernas) começou a registrar sua história através de identificáveis facilmente. E um e outro iniciam sua comunicação verbal com sons não identificáveis facilmente.

Assim, na evolução humana, a utilização dos registros impressos, sejam os pictogramas rupestres, sejam os primeiros símbolos literais dos fonemas, tornaram-se indispensáveis às relações sócio-econômico-culturais. Charles Higounet observa uma relação inseparável no triângulo história-escrita-homem:

"A escrita faz de tal modo parte da nossa civilização que poderia servir de definição dela própria. A história da humanidade se divide em duas imensas eras: antes e a partir da escrita. (...) Vivemos os séculos da civilização da escrita. Todas as nossas sociedades baseiam-se sobre o escrito. A lei escrita substitui a lei oral, o contrato escrito substituiu a convenção verbal, a religião escrita se seguiu à tradição lendária. E, sobretudo não existe história que não se funde sobre textos" (HIGOUNET, 2003).

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O legado das cavernas

Dada a inexistência de organização e padronização nas representações gráficas das pinturas rupestres, estas não são consideradas exatamente escrita, mas criptografias aleatórias que pretendem transmitir sua mensagem, gravadas em um material da natureza. Por isso mesmo, é possível fazer uma analogia entre aquelas gravuras e a escrita: ambos os casos buscam registrar algo, de alguma forma, para determinado grupo, para aquele momento ou para a posteridade. A antropóloga Cláudia Pires afirma:

"Sobre a relação entre a «linguagem simbólica» – expressa através de símbolos abstractos pintados – e a sua intenção, digamos que foi através destas imagens que o homem entendeu que podia fazer passar uma mensagem, um pensamento, o seu estado de espírito, etc. Estas pinturas demonstram o valor que os homens da pré-história conferiam às suas criações. O conjunto destes desenhos-escrita, passíveis de serem compreendidos por todos os membros de um mesmo grupo, tomam a designação de pictogramas. Pertencem, pois, ao conjunto das escritas pictográficas, que no grego significam descrição da imagem, para servir de símbolo". (PIRES, www.revista-temas.com).

As semelhanças entre as pinturas paleolíticas e a escrita também estão nos instrumentos e suportes para execução de ambas as técnicas, que trazem a mesma idéia principal, em dois momentos distantes entre si cerca de milhares de anos: um objeto com o qual se vai desenhar ou escrever (utilizando para isso pedra, materiais inorgânicos e orgânicos à base de tintas vegetais e minerais, e pena, caneta ou lápis) e outro no qual será registrado o assunto pretendido (a rocha ou um papel). Com esses instrumentos, os homens das cavernas foram os primeiros a dispor de um tipo de registro usado até hoje, a ideografia, cujo grande número de símbolos que a compõem permite que seja utilizada e interpretada em qualquer lugar onde seu significado seja correspondente, como os desenhos das placas de trânsito, por exemplo.

Portanto, as figuras rupestres talvez representem o mais remoto exemplo de que um registro impresso adquire preeminência sobre a oralidade, no que diz respeito a uma mensagem escrita permanecer o máximo possível em seu estado representativo original, suportando o tempo e condições naturais do ambiente, e permitindo que gerações milênios mais tarde apreciem e teçam conjecturas sobre uma forma social que não deixou outro vestígio, em vida, de como o homem primitivo se comportava e como observava seu meio ambiente. A arte primitiva é um legado de inscrições em rochas que desafiou o tempo, sobrevivendo há milhares de anos e ainda transmitindo informações sobre uma civilização inexistente, mesmo depois do surgimento da escrita como um marco da História.

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(1) Mestre em Educação pela Universidade Federal do Amazonas. Professor de comunicação e linguagem midiática, atuando com pesquisa e ensino de produção de material didático no Centro de Educação a Distância da Universidade Federal do Amazonas - Ufam.

(continua)

Eduardo Escreve
Enviado por Eduardo Escreve em 17/07/2012
Reeditado em 20/07/2012
Código do texto: T3781907
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