O imoral dano moral.
O imoral dano moral.
Matéria essencialmente jurídica... logo, peço “paciência” ao leitor e à leitora... Já vimos, mesmo que superficialmente, como nasceu e quais os efeitos da responsabilidade - com o texto (“Responsabilidade e a dor-sofrimento”).
Este texto cuida de uma das espécies de responsabilidade jurídica: dano moral.
Intimamente conexionada à ética (termo derivado do grego ethos – caráter; modo de ser de uma pessoa; conjunto de valores morais e princípios que norteiam a conduta humana na sociedade), moral, que significa “costumes” (valores estabelecidos como bons, certos e úteis em dado meio cultural), tem o seu significado originado do latim morale, sendo mais aproximado do que é na língua francesa: moeurs – costumes. Assim, tem-se a moral individual, a moral familiar, a moral social, a moral religiosa, a moral profissional etc.
A atual Constituição da República Federativa do Brasil, cuidando de preceitos éticos e morais que tem por conteúdo orientar o Ordenamento Jurídico, traz inscrita no seu art. 1.º, III, a dignidade da pessoa humana como Princípio Fundamental, topográfica e hegemonicamente superada apenas pela cidadania e a soberania, respectivamente, nos seus incisos II e I, o que significa dizer e impor: - depois de cuidar de questões referentes à Soberania e à Cidadania, o Poder Judiciário, por seus representantes, deve apreciar, cuidar e proteger este bem concebido pelo Povo como essencial: a dignidade da pessoa humana.
E não é sem razão que a dignidade é elevada a tal patamar de importância. Em estando vivo (pressuposto elementar, mas que nem assim a ultrapassa), que outro bem-interesse seria mais importante que ela? “Estar vivo” é suficiente ?
Quando, como, e, onde a dignidade da pessoa humana pode ser desprezada ? Resposta: no Brasil!
Muito embora a “Constituição Cidadã” tenha a dignidade da pessoa humana como alvo de sua proteção, a responsabilidade de quem a fere e a agride é pífia, na prática inexistente. Alguém que pratique um Crime Contra a Honra terá como consequência, pelo Código Penal, arts. 138, 139 e 140, na Calúnia − detenção, de seis meses a dois anos, e multa; na Difamação – detenção, de três meses a um ano, e multa; e, na Injúria − detenção, de um a seis meses, ou multa – todos casos de Juizados Especiais (ou de “pequenas causas”). Como, atacar a dignidade da pessoa humana pode ser visto com tal grau de desvalor (causa de menor potencial ofensivo) − se a própria Constituição não quer isso?
Na esfera civil ocorre o mesmo! Responsabilidade pífia, ou inexistente, quando se trata de dano moral, não obstante a mesma Constituição Federal comandar no inciso X, do art. 5.º, que deverá haver indenização em caso de violação... Sob o pretexto de cuidar da “ética”, o violado na sua dignidade não pode “ficar rico” com a indenização por danos morais, pois o seu enriquecimento seria ilícito ou sem causa. Idem, não pode haver a banalização do dano moral. Idem, a ação por danos morais não pode ensejar a indústria da indenização.
Enfim, constatando que em todos esses casos o Poder Judiciário interfere na relação jurídica material e processual para “manter a ética” e “negociar” o valor em dinheiro para ser decretado como condenação nas ações por danos morais, primeiro, o(a) cidadão(ã) é concebido, aprioristicamente, como pessoa de “terceira classe”, ou seja, é um potencial desonesto, com seu Advogado, que visa ganhar dinheiro com a ação, e só não conseguirá porque haverá a “profícua” intervenção do Juiz(íza) – se não fosse assim, o larápio conseguiria atingir o seu espúrio intento. Segundo, verificada a condição individual, e, principalmente, a financeira do violado na sua moral, a soma a lhe ser “dada” tem de ser compatível com esse seu estado, isto é, a dignidade de uns vale, em dinheiro, mais, ou menos, que a dignidade de outros etc. No descompasso, pode-se até criar uma iníqua equação que traduziria a pequena ou inexistente responsabilidade para os casos de danos morais, tendo o dinheiro como função principal:
Violador => V1; Violado => V2; Dinheiro => D: quanto mais D tem V1, e menos D tem V2= menor (ou nenhuma) a responsabilidade de V1.
Imprimindo o dinheiro como prioridade nas ações por danos morais na forma de “compensação”, o Poder Judiciário (que faz lei entre as partes, e, portanto, é cultural), o plano psicossocial é afetado confundindo o valor ético com o valor pecuniário, e ainda aviltando o violado que, a par de tudo isto, jamais quereria ver a sua dignidade “barganhada” num verdadeiro Negócio Jurídico Judicial.
Enquanto prosseguimos nesta trajetória “ética”, é normal que o brasileiro não saiba e nem sinta ter a sua dignidade verdadeiramente protegida com resposta, consequência jurídica, no caso de violação de sua moral.
Rodolfo Thompson - 23.5.2012.
P s . preferindo responsabilidade no lugar de “punição”, o fato é que, no Brasil, a dignidade da pessoa humana só é reconhecida no papel, enquanto, a cada dia mais, é banalizada a violação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas.
P s do p s . pela importância, e exemplo cultural, respeitante ao tema, deveria haver um “JUÍZO ESPECIAL CÍVEL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA”.