Gênero e Educação Física: Algumas reflexões acerca do que diz as pesquisas das décadas 80 e 90

Gênero e Educação Física: Algumas reflexões acerca do que diz as pesquisas das décadas 80 e 90

Agripino Alves Luz Junior∗∗

Orientador: Elenor Kunz∗∗∗

Resumo

O que se convencionou chamar “Estudos de Gênero” na/para (a) Educação Física (EF)? De que forma essa área

se apropriou dessa categoria, e a partir de que ótica tem classificado como sendo “Estudos de Gênero” esse ou

aquele trabalho? Essas são algumas das questões, em torno das quais se fundamente este estudo, cujo olhar está

voltado para as dimensões de gênero presentes na produção acadêmico-científica oriunda dos Programas de Pós-

Graduação em Educação e EF, em nível de Mestrado e Doutorado, elaborados nas décadas de 80 e 90. Alguns

cuidados, quanto aos rumos que podem tomar as pesquisas neste campo teórico, são necessários, pois esse é um

terreno onde as imprecisões conceituais são muito freqüentes. Nesse sentido são utilizadas, muitas vezes,

perspectivas teórico-metodológicas incompatíveis entre si onde certos conceitos são tidos como equivalentes

sem, no entanto, o serem.

Abstract

What was convencionally called “Study of Gender” in/for Physical Education (Ped)? In which way this category,

and starting from this view classified as “Study of Gender” this or that paper? These are of the questions around

which we trying to set the foundations for this study, that is basically turning to dimensions of gender that are

present in the academic-scientific production coming from Graduate Programs in Education and Physical in

Master’s as well as Doctorate’s level produced in the 80’s and 90’s. When we elaborated the research we were

very careful as far as the way it would take in the theoretical field, it is extremmelly necessary since this is a

domain where imprecise concepts are often what occur. This way, we used several times theoretical

methodologic persperctives incompatible among them, where several concepts are considered equivalents

without, reality, being.

... As primeiras palavras

∗ Síntese da Dissertação intitulada “Gênero e Educação Física: O que diz a produção teórica brasileira dos anos

80 e 90?”, defendida no Mestrado em Educação Física/Teoria e Prática Pedagógica – PPGEF/UFSC, em

fevereiro de 2001. Banca Examinadora: Profª. Drª. Silvana Goellner (ESEF/UFRGS), Profª. Drª. Ana Márcia

Silva (PPGEF/UFSC), Profª. Drª. Miriam Pillar Grossi (PPGAS/UFSC).

∗∗ Prof. do Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Maranhão/UFMA. Doutorando em Engª. De

Produção/Mídia e Conhecimento – PPGEP/UFSC.

∗∗∗ Prof. do Programa de Pós-Graduação em Educação Física/Teoria e Prática Pedagógica – PPGEF/UFSC.

Tendo-se como referências as perguntas...

O que se convencionou chamar “Estudos de Gênero” na/para (a) Educação Física? De que forma essa área se

apropriou dessa categoria? A partir de que ótica tem classificado como sendo “Estudos de Gênero” esse ou

aquele trabalho?

... Foi que desenvolvi uma reflexão acerca do que tem dito a produção científico-acadêmica brasileira

relacionada com a temática das relações de gênero, oriunda dos Cursos de Pós-Graduação em Educação e EF, nos

anos 80 e 90.

O estudo tomou forma a partir das inquietações vivenciadas por mim, tanto no cotidiano escolar, no

Colégio de Aplicação da UFMA1, quanto no espaço universitário, no Curso de Educação Física dessa mesma

instituição.

O debate acerca das relações de gênero, no âmbito da Educação Física brasileira, vem sendo realizado

por algumas/alguns pesquisadoras (es) desde a década de 80, mas é a partir de 90 que essas questões têm

despertado maior interesse, e se apresentam como ponto de pauta, isto porque, o processo ensino-aprendizagem

dessa disciplina passou nos últimos anos a ser desenvolvido na perspectiva de turmas heterogêneas (turmas

mistas), muito embora ainda existam práticas com turmas homogêneas (turmas separadas por sexo).

Nesse sentido, então, penso ser importante, pela possibilidade de sistematização de uma temática em

expansão, o estudo que intitulei: Gênero e Educação Física: o que diz a produção teórica brasileira dos anos 80

e 90?

Os Objetivos:

♦ Identificar, na produção acadêmico-científica, as concepções/abordagens teóricas em que são apresentados

os elementos constitutivos do gênero;

♦ Destacar, nesses estudos, as instâncias/temáticas mais freqüentemente abordadas, e as questões

priorizadas;

♦ Identificar o lugar/instituição onde foram produzidos os estudos, como também, o sexo do (a) pesquisador

(a), os (as) orientadores (as)/co-orientadores (as) e a composição das bancas examinadoras;

♦ Mapear os estudos relacionados com a questão de gênero na EF, reconhecendo o estado atual do debate da

produção científica, considerando-se as escolas de pensamento no campo de gênero neles contidos.

... Mas, para desenvolver essas reflexões, foi preciso trilhar certos caminhos...

No sentido de melhor ilustrá-los, segue, abaixo, algumas pistas que serviram de fontes de inspiração

nesse processo, e que de certa forma direcionou o meu olhar:

Concepção de Pesquisa

“... atividade socialmente condicionada ou [...] fenômeno historicamente situado, partindo do entendimento de

que essa forma de produção humana traz em seu processo de desenvolvimento questões de natureza

epistemológica, teórica, metodológica e técnica”. (Silva, 1997)

Postura do Pesquisador

“... O sujeito que conhece ‘fotografa’ com a ajuda de um mecanismo específico, socialmente produzido, que

dirige a ‘objetiva’ do aparelho. Além disso ‘transforma’ as informações obtidas segundo o código complicado das

determinações sociais que penetram no seu psiquismo mediante a língua em que pensa, pela mediação da sua

situação de classe e dos interesses de grupo que a ela se ligam, pela mediação das suas motivações conscientes ou

subconscientes e, sobretudo, pela mediação da sua prática social sem a qual o conhecimento é uma ficção

especulativa”. (Schaff, 1995)

Pesquisa Teórica e Pesquisa Empírica: Oposição ou Complementaridade?

“Toda pesquisa empírica tem algum fundamento teórico, mais ou menos explícito, nem sempre formulado. Por

outro lado, toda pesquisa teórica tem alguma base empírica, em nosso contacto com o mundo que nos cerca, e

resultam de nossa experiência com a realidade circunstancial”. (Votre, Boccardo & Ferreira Neto, 1993)

Método e Práxis

“... Aqui não há distinção entre o momento de conhecer e o momento de intervir. Assim entendemos que no ato

de produzir o conhecimento novo estamos intervindo simultaneamente”. (Votre, Boccardo & Ferreira Neto,

1993)

Empregos da Análise de Conteúdos

“... analisar obras de um romancista para identificar seu estilo e/ou para descrever a sua personalidade; analisar

depoimentos de telespectadores que as assistem a uma determinada emissora ou de leitores de um determinado

jornal para determinar os efeitos dos meios de comunicação de massa; analisar textos de livros didáticos para o

desmascaramento de ideologia subjacente; analisar depoimentos de representantes de um grupo social no sentido

de levantar o universo vocabular desse grupo” (Gomes in Minayo, 1994).

Nesse sentido, foi realizado, então, um levantamento preliminar das dissertações e teses, a partir da

consulta nas fontes: UNIBIBLI – cd-rom, SIBRADIDI, CEVGENER, NUTESES – on line, além de consultas,

também, a referências bibliográficas de livros/dissertações/teses e artigos relacionados com a temática.

Realizado este levantamento, foi feita a localização e busca do material, e à medida que estes iam sendo

analisados, outros trabalhos foram identificados e incorporados como amostras do estudo. Dos 15 trabalhos

identificados, dois não puderam ser adquiridos2, apesar das tentativas de contato. Restando apenas 13 amostras

das quais 10 dissertações e 03 teses.

As amostras, numeradas em ordem cronológica, desde os anos 80 e 90, foram categorizadas conforme:

autor, título, universidade e programa veiculado, orientador/a, banca examinadora, data de defesa, número de

páginas e grau obtido.

As categorias de análise da produção científica, objeto desse estudo, foram expressas nos seguintes

termos: 1) Temáticas abordadas dentro do campo de gênero na Educação Física; 2) Questões norteadoras,

evidências e propostas; 3) Relação sujeito/objeto – sexo do (a) pesquisador/(a); 4) Lugar onde foram produzidos

os estudos; 5) Orientação, co-orientação dos trabalhos e sobre a composição das bancas examinadoras; 6)

Paradigmas/abordagens teóricos utilizados nos estudos de gênero no campo da Educação Física/Esportes.

Nas teias do Gênero:

“Que caminhos são estes que me conduzem a teias de que terei

de escapar, que trama é esta que ronca surda em meu peito, me

assusta, mete medo e me põe gelado a defender-me da vida?”.

(Sócrates Nolasco)

A produção científica oriunda da Pós-graduação e os trabalhos acadêmicos, em geral, desenvolvidos em

diversas áreas do conhecimento e em diferentes espaços têm, nessas últimas décadas – 80 e 90 –, recorridas a um

signo lingüístico (termo, palavra) pouco utilizado socialmente durante muito tempo. Está-se a falar do conceito

de “gênero”.

Em termos gramaticais, em princípio, o termo gênero fundamenta-se nas distinções do sexo a partir de

valores e normas vigentes do contexto social, portanto, são definições carregadas por interesses. Mesmo que se

leve em conta estes aspectos, estes representam, ainda, uma idéia muito vaga do conceito, necessitando um

aprofundamento no que diz respeito à sua construção histórica e cultural.

Nesse sentido, se torna relevante introduzir alguns elementos discutidos por

pesquisadores/pesquisadoras de diferentes linhas de pensamento. Assim, temos que pensar, pelo menos, que

desse conceito emergem diferentes construções e significados, o que demarca o caráter plural e diversificado do

que foi produzido em seu nome. Não é de se estranhar, desse modo, que este é um terreno onde a precisão teórica

traz em si constantes desconstruções, e reelaborações.

Por outro lado, é também desafiador encontrar dentro da produção teórica de uma área de conhecimento,

como é a Educação Física, construída por um olhar das ciências médicas e da saúde, pesquisas e olhares que se

distanciam dos determinismos biológicos. Isto nos faz optar pela abrangência do que foi dito na produção tanto

fora quanto dentro dessa área, relativa às questões de gênero.

Mas afinal, o que se procura instaurar com essa palavra (na academia)? Em que sentido ou sentidos esse

termo é empregado nos discursos dos vários campos do conhecimento? A que nos reportamos quando usamos

essa palavra? Qual/quais o(s) significado(s) advindos de seu emprego? Como se instala e se legitima esse

conceito? Que, outras tantas, interpretações podem ser evocadas pelo gênero? Quais as possíveis instâncias de

intervenção social?

Reconhecendo alguns conceitos e significados:

Algumas estudiosas já começaram, desde o final dos anos 70 e início dos 80, contestar a divisão de

papéis sexuais, das esferas pública/privada. Nesse contexto, alguns elementos teóricos, sobre o uso da palavra

gênero, começam a ser gestados, e é quando se rejeita “... explicitamente explicações biológicas utilizadas para

assegurar diversas formas de subordinação, pelo fato de a mulher gerar os filhos e o homem ter a força muscular”

(Celi Taffarel, 1994, p. 237).

O fundamento que deu suporte ao campo que hoje denominamos “gênero” ou “relações de gênero”,

conforme Miriam Grossi (1998), está relacionado com as

... conseqüências das lutas libertárias dos anos 60, mais particularmente dos movimentos sociais de

1968: as revoltas estudantis de maio em Paris, a primavera de Praga na Tchecoslováquia, os black

panters, o movimento hippie e as lutas contra a guerra do Vietnam nos EUA, a luta contra a

ditadura militar no Brasil. Todos estes movimentos lutavam por uma vida melhor, mais justa e

igualitária e é justamente no bojo destes movimentos ‘libertários’ que vamos identificar um

momento chave para o surgimento da problemática de gênero, quando as mulheres que neles

participavam perceberam que apesar de militarem em pé de igualdade com os homens tinham nestes

movimentos um papel secundário. Raramente elas eram chamadas a assumirem a liderança política:

quando se tratava de falar em público ou ser escolhida como representante do grupo elas sempre

eram esquecidas e cabia-lhes em geral o papel de secretárias e ajudantes de tarefas consideradas

menos nobres como fazer faixas ou panfletear. (p.2)

Nessa mesma década, destacam-se com grande ímpeto o movimento feminista e o movimento de

homossexuais, cujos questionamentos levantados a respeito das relações afetivo-sexuais, têm como

conseqüências, a incorporação ativa dessas reflexões pelo espaço acadêmico, considerado um espaço

privilegiado de produção de teorias, que possibilitava respostas às demandas oriundas desses movimentos. Com

isto, diferentes disciplinas acadêmicas, em torno da problemática da “condição feminina”, buscaram, então, no

final dos anos 60 e no decorrer da década de 70, encontrar o “espaço das mulheres”, até então, desconhecido.

Os estudos sobre a “condição feminina”, num primeiro momento, situavam-se em torno do debate da

opressão da mulher nas sociedades patriarcais. Diriam, pois, as feministas que as relações entre a mulher e os

homens acontecem num contexto de relações exploradoras dominantes entre o dono dos meios de produção e o

trabalho assalariado. Nesse sentido, a divisão sexual do trabalho torna-se central ao explicar a posição

subordinada da mulher no contexto das relações de classe capitalista.

Na década de 70, os trabalhos que se convencionou denominar de estudos sobre a Condição Feminina

valorizavam, em grande medida, o livro de Friedrich Engels, “A origem da Família, da Propriedade Privada e do

Estado”, que diz ser a mulher a primeira propriedade privada do homem. Muitos dos estudos desenvolvidos,

nessa década, trabalhavam na perspectiva teórica desse autor, e giravam em torno de uma temática fundamental:

a mulher na sociedade de classes. Eis, pois, a corrente Marxista influenciando o modo de olhar das mulheres.

Num segundo momento, já década de 80, questiona-se nas pesquisas, no Brasil, a existência de uma

única condição feminina. Diz-se, portanto, que não há uma única mulher, há várias mulheres: negras, brancas,

amarelas, índias, ricas, pobres.

Neste contexto, com a introdução dessa nova idéia no discurso feminista, ou seja, o de que há diferentes

mulheres, que são também de idade, etnia, e modo de ser, convém que se discuta no momento não mais essa

condição feminina, mas as suas diferentes constituições. Inauguram-se, então, os estudos sobre as mulheres.

Mesmo assim, estas continuam portadoras da sua condição biológica, independente da sua condição social.

O próximo passo, eis, a emergência de um campo teórico interdisciplinar definido, cuja pretensão é

problematizar essa determinação biológica da “condição feminina” – se está diante dos “estudos sobre as

relações sociais de sexo” ou “estudos de gênero”.

Gênero e EF: refletindo sobre as pesquisas dos anos 80 e 90:

... o início de pesquisas que têm como objetos de estudo, a mulher e a atividade física em seus

aspectos históricos, psicológicos, políticos e sociais que, em sua maioria, denunciavam a

inferioridade da mulher em relação ao homem e os estereótipos sexuais estabelecidos pela

Educação Física na escola e pelos esportes praticados fora dela. (Eustáquia Sousa, 1994 p. 5)3

Até o final da década de 70 e início da década de 80, alguns estudos, na EF, não só sugeriram a separação

dos sexos, como também a distribuição destes em função dos esportes e das brincadeiras. Somente no final da

década de 80, são observados, a partir dos estudos bio-fisiológicos, alguns trabalhos nos quais se estabelecem

diferenças e semelhanças nas capacidades físicas e nos movimentos do homem e da mulher.

A partir do início dos anos 90, acompanhando os movimentos políticos e sociais, as pesquisas

acadêmicas, ainda muitas marcadas pelo ativismo e militância, denunciam os mecanismos de opressão a que são

submetidas as mulheres, principalmente a inferioridade dessas em relação ao homem. A Educação Física

encontra, na instância dos papéis sexuais e nos estudos da estereotipia, sua temática, objeto de estudo,

privilegiado.

Neste momento é oportuno e relevante fazer referência à tese de doutoramento de Elaine Romero,

defendida no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo - USP, em 1990, com o título: “Estereótipos

masculinos e femininos em professores de Educação Física”, pois penso que mesmo sendo esta tese defendida na

psicologia, portanto, não pertencente à amostra deste estudo conforme a delimitação, ela, de certa forma,

inaugurou o que se convencionou chamar “estudos de gênero” na Educação Física e colaborou, também, para

uma certa confusão conceitual estabelecida na área.

Conforme o anexo 2, da dissertação, dos 72 trabalhos apresentados, 13 são escritos por essa autora,

sendo resumos dos capítulos ou desdobramentos dessa tese. Esse dado, que é quantitativo, tem desdobramentos

na nossa área quando se vê, por exemplo, ser esse um trabalho a se identificar como de gênero, e ser essa autora a

primeira a territorializar essa temática como de seu domínio. Por essa razão, no decorrer desta pesquisa, tenho

feito algumas referências a ela quando falo de estereótipos sexuais.

1. Temáticas abordadas dentro do campo de gênero na Educação Física

A análise sobre esse aspecto identificou, de modo geral, uma grande preocupação das pesquisas, em

estudar aspectos relacionados com os papéis sexuais, com os estereótipos, com a perpetuação do sexismo, e com

a dominação masculina. A adjetivação das brincadeiras e do esporte, como atividades masculinas ou femininas,

fundada por argumentos bio-psicológicos e sexual foi, de modo geral, a crítica estabelecida na maioria dos

trabalhos estudados.

2. Questões, Evidências e propostas

O interesse dos pesquisadores, pelas temáticas apresentadas, tem como ponto de partida, questões de

natureza diversas. Umas situam-se em nível escolar, outras se libertam desse contexto, e ousam refletir para além

do espaço pedagógico. Do mesmo modo refiro-me às evidências e propostas desses estudos.

3. A Relação sujeito/objeto – sexo do(a) pesquisador(a)

Evidentemente, há uma predominância do olhar feminino entre os treze trabalhos produzidos sobre

gênero na/para (a) Educação Física. Alguns desses, tentam firmar-se como discursos denunciadores da realidade

vivida pelas mulheres, considerando as conseqüências do processo de socialização sexista. Conseqüências essas

que marcam a dualidade masculino/feminino e perpetuam todo o conjunto de estereótipos e preconceitos.

Outros trabalhos superam essa fase de denúncia, e a partir de outros olhares ousam em trilhar caminhos

visando à transformação das relações entre homens e mulheres, sem a qual não será possível, qualquer

transformação social.

4. Do Lugar onde foram produzidos os estudos

Ao fazer esse mapeamento foram considerados os aspectos: região do país, universidades e programas

de pós-graduação, conforme se evidencia na tabela 1 da dissertação.

Nesse sentido, foi observada uma maior concentração dos estudos relacionados com a temática gênero,

na região sudeste, totalizando 11 trabalhos, a seguir tem-se a região sul (2), e, por último, a região nordeste (1).

As demais regiões não apresentam trabalhos.

Das universidades e dos Programas de Pós-graduação onde esses trabalhos foram realizados constam:

USP (PPGEF), UFF (PPGE), UGF (PPGEF), UNICAMP (PPGE e PPGEF), UERJ (PPGEF), UFMG (PPGE),

UFSC (PPGE), UFRGS (PPGE), e UFPB (PPGE).

5. Da orientação/co-orientação dos trabalhos e sobre a composição das bancas examinadoras

A qualidade dos dados quantitativos permite apontar que na Educação Física talvez não tenham sido as

feministas aquelas que escreveram sobre gênero. A predominância dos homens com titulação para orientar teses e

dissertações é um dado a ser considerado, pois das 5 dissertações defendidas em cursos ligados à Educação

Física, por exemplo, todas foram orientadas por homens como também foram os homens maioria nas bancas

examinadoras. Muito deles, inclusive orientadores, sem expressão alguma no campo de estudos de gênero. Já no

campo da educação, foram 23 mulheres e 7 homens nas bancas examinadoras.

Esses dados são reveladores, quando se pensa na produção teórica da nossa área, que o acesso à titulação

e ao respeito acadêmico no mundo dito como “científico” ainda é mais masculino que feminino, mesmo em

temas onde os orientadores não têm produção acadêmica. Dessa forma, as mulheres ficam sempre escondidas ou

negadas em sua participação na academia, por uma ciência cujo domínio pertenceu e ainda pertence ao homem.

6. Abordagens teóricas utilizados nos estudos de gênero no campo da Educação Física/Esportes

Entre os paradigmas presentes nas pesquisas sobre gênero da/para (a) Educação Física, foram

identificadas as seguintes abordagens: marxismo e culturalismo. Na primeira concepção – Marxista, as

problemáticas mais abordadas e questões priorizadas dizem respeito às desigualdades sociais, às formas de

opressão e de subordinação a que são submetidas as mulheres e as demais minorias sexuais (gays e lésbicas).

Apresenta como algo relevante na análise das questões de gênero, o aspecto conflituoso das relações sociais.

A segunda concepção – Culturalismo, é bastante recorrente nos trabalhos analisados, alguns utilizam

essa perspectiva como referencial teórico. Outros, apenas, estabelecem um diálogo com os autores, sem, no

entanto, compartilhar dos conceitos por eles apresentados.

Aqui, são discutidas, em grande medida, as políticas culturais e a construção de representações de

identidades de gênero, as quais se materializam nas ações corporais, nos gestos, nas falas e nas diferentes

maneiras de vivenciar o cotidiano.

Como se fossem as últimas palavras...

No decorrer desse estudo pude perceber, através das nuances teóricas, que o gênero, enquanto, categoria

de análise histórica, é uma temática em expansão dentro da Educação Física. É, também, um terreno onde a

precisão teórica traz em si constantes desconstruções, estranhamentos e reelaborações.

Apesar da produção teórica da EF ser construída por um olhar advindo das ciências médicas e da saúde,

mesmo assim, há pesquisas e olhares que se distanciam dos determinismos biológicos.

As dissertações e teses da/para (a) EF escritas, sobre a questão de gênero, refletem, de algum modo, a

trajetória desta área, que vai desde uma concepção de contestação política, revelando uma inquietação face a

supressão dos direitos de cidadania, especialmente, os direitos da mulher frente à prática da atividade física, e os

questionamentos dos preconceitos e estereótipos construídos na ordem social sobre a hierarquia sócio-esportiva

de gênero, até a flexibilização das fronteiras dos campos do conhecimento ocorrido em outras áreas, nas quais a

EF vivência, também, um momento de questionamento face ao paradigma cientifico (positivista) orientador dos

discursos produzidos.

Aqui é colocada em “suspense” a possibilidade de vir-a-ser instituído um novo termo/conceito/categoria

para a reflexão impulsionada pelo diálogo com o feminismo na academia brasileira. O gênero representa esta

escolha, que “... não é ingênua nem arbitrária, pelo contrário, remete às controvérsias sobre a natureza e os limites

dessa área de estudos” (Heilborn & Sorj, 1999, p. 187).

Sendo o gênero um conceito relacional há de se pensar nele, a partir da noção de diálogo, que pressupõe

a relação entre os sujeitos. Há de se considerar as articulações que este pode manter com outras categorias e

conceitos, tais como: idade, etnia, classe, sexo. Diferentemente do feminismo, que teve uma conotação de

exclusão do homem, aqui se encontra o momento adequado da inclusão destes.

Referências

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TAFFAREL, Celi N. Z. & FRANÇA, Tereza L. de. A Mulher no esporte: o espaço social das práticas esportivas

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Vitória: UFES, Secretaria de Produção e Difusão Cultural, 1993.

Notas

1 Universidade Federal do Maranhão

2 “Meninos pra cá, Meninas pra lá”, e “Aulas de Educação Física para turmas mistas ou separadas por sexo? Uma

análise comparativa de aspectos motores e sociais. De Neise Gaudêncio Abreu e Greice Kelly de Oliveira,

respectivamente.

3 Os resultados oriundos dessas pesquisas podem ser conferidos nos estudos de Castellani Filho (1988), Elaine

Romero (1990), entre outros.

Agrippa de Florippa
Enviado por Agrippa de Florippa em 03/12/2011
Código do texto: T3369392