EDUCAÇÃO EM PRISÕES SOB A ÓTICA DE UM EGRESSO

Cornelius Ezeokeke - Teólogo nigeriano, egresso do sistema penal brasileiro e autor do livro “Penas mais rígidas: justiça ou vingança?”

Os problemas que tangem a educação são complexos. Quando se fala em educação em prisões estas questões tornam-se ainda mais problemáticas. Seja por não ter sido implantada uma política específica nesse sentido seja porque não estava previsto em lei o seu uso como forma de remir as penas aplicadas aos reclusos.

No entanto, com a mudança na Lei de Execução Penal fica reconhecido o estudo para efeito de remição (Lei Nº 12.433, alterando os artigos 126, 127, 128 e 129 da Lei de Execução Penal.), deve-se tecer reflexões que ajudem na formulação de projetos educacionais voltados para os presidiários, promovendo espaços participativos numa educação para a vida. Para além dos muros prisionais.

Em linhas gerais, contribuo com essa discussão mostrando a importância da educação na vida dos encarcerados. Reconhecer o significado da educação penitenciária transcende vislumbrar somente a questão da remição da pena. A educação deve ser capaz de servir como mecanismo de reabilitação e reinserção social dessas pessoas.

A intenção deste artigo é descrever como, por meio da educação em prisões, se chega a ressocialização. A educação penitenciária se torna um programa por excelência à medida que coíbe a ociosidade reinante nos presídios. Como garante o pensador Charles Lucas, citado por Foucault em Vigiar e punir: nascimento da prisão: “Só a educação pode servir de instrumento penitenciário. A questão do encarceramento penitenciário é uma questão de educação”. A educação é um processo constante de aprendizado e desenvolvimento humano e, portanto, é tarefa histórica dos grupos sociais, além de dever do Estado, principalmente para os privados de liberdade.

Entendo, igualmente, que a educação em prisões precisa ser praticada numa dimensão mais conscientizadora, libertadora e inclusiva, pois a comunidade carcerária sente a falta de participação das universidades públicas na educação penitenciária. Para tanto, indaga-se o paradeiro das universidades públicas no que diz respeito à educação em prisões? Será que os presos só têm direito a primeiro e segundo grau? A lei que garante o direito aos estudos não proíbe o ingresso dos presos a uma universidade. Portanto a pergunta que cabe aqui: onde está a função social das universidades públicas?

A minha experiência mostra que os presos podem continuar com os seus estudos, incluindo o terceiro grau, uma vez que não é proibido por lei. Fiz vestibular dentro da prisão e parte do curso superior ainda quando cumpria minha pena. A educação foi minha remição com a vida. Isto é, por meio do meu exemplo, pude encontrar nos estudos força e esperança para mudar e ter outra chance. Isso é possível.

Mas muitos encarcerados não conseguem cursar primeiro e segundo graus, muito menos, o terceiro grau, às vezes por falta de incentivo do próprio sistema penitenciário e das políticas públicas da educação em prisões. Refletir sobre a importância da educação nas prisões é também exigir que se cumpra a Constituição Federal (artigos 205 e 206) que prevê a educação como um direito inalienável.

Sou favorável à lei que equipara a educação ao trabalho no que concerne a remição da pena, uma vez que a educação dá acesso aos bens culturais, fortalecendo a autoestima das pessoas em privação de liberdade e oportunizando o seu reingresso à sociedade.