O MEDO DE DEIXAR O CENTRO DO PALCO ( SALA)

È comum ouvir na sala dos professores e nas reuniões de formação continuada a expressão “os alunos devem ser os protagonistas do aprendizado”. Mas na prática, continuamos a ocupar o centro do palco, dos conteúdos e da didática.

O professor, embora tenha formalizado teoricamente a sua condição de coadjuvante na história de seus alunos, ainda não desenvolveu humildade suficiente para entregar o papel principal.

Muitos professores não abrem mão de sua “autoridade” por pura insegurança. O que não é nenhum absurdo, afinal estamos imersos numa realidade onde o ser está submetido a ilusão de poder. Não ter poder é sinal de exclusão... Assim o professor é a vítima que se transforma em algoz para não perder seu espaço. É como uma novela de Gilberto Braga onde o mocinho precisa ter toques de maldade para não perder o seu espaço na trama.

Só que a vida real não pode ser encarada como uma novela. Se estamos dispostos a desenhar um novo paradigma, onde o ser supera a ter, e onde o poder é medido pela capacidade de construir estruturas mais justas, o professor não deveria se revestir de uma autoridade bizarra a quem não se pode questionar.

Esta defesa pela obediência irracional acaba por gerar forças completamente opostas.

Primeiro vem a resistência, o aluno começa testando a autoridade através de um comportamento irreverente, ou seja ele não se dobra a autoridade, pelo contrário faz troça, ri dela. Infelizmente o que deveria ser visto como uma virtude é definida como desqualificação para o ato de aprender. Queremos alunos dóceis, que aceitem nossos ensinamentos sem nenhum questionamento ou resistência.

Percebendo que não pode vencer o professor através do confronto direto o aluno assume a postura de indiferença. Aquieta-se, cria um mundo só seu, onde o professor não pode entrar. O professor é a autoridade do nada, a encarnação do Nowhere man cantado pelos Beatles. Assim a sala de aula é o espaço onde dois universos coexistem sem nenhuma comunicação.

O mais triste é que muitas vezes o professor não percebe, ou melhor, interpreta a indiferença como vitória sobre o comportamento do aluno. O silêncio que deveria surgir vez por outra na sala de aula como sinal de reflexão acaba sendo eterno, denunciando a alienação.

Permitir que o aluno assuma o aprendizado é mais tarefa do professor do que do aluno.

Lembro aqui de uma alegoria de Nietzsche. Quando falando das águias ele diz que elas fazem seus ninhos nos penhascos e não hesitam em atirar seus filhotes nos abismos quando percebe que estes já estão aptos a voar.

O Professor deve ser como a águia. A escola é o penhasco de onde se pode ter a visão ampla do mundo, o ninho é a sala de aula, e seus conhecimentos são o alimento que possibilitaram o vôo e finalmente o abismo é o mundo onde em determinado momento devemos atirar nossos alunos. Se voarem serão capazes de voar para onde quiseram se caírem é porque fomos falhos.

O professor pode ser visto também como um caruana, um ser encantado capaz de mostrar a beleza que existe até nas verdades mais monstruosas e instigar seus alunos a irem além do que ele foi.

Nossa resistência diante do permitir que o outro seja protagonista do seu destino vem de nossa formação adocicada, tão afetada, tão cheia de fitinhas e babados.

No fundo nós professores somos muito semelhantes a personagem Dora do filme central do Brasil. O medo de ser esquecida a tornou uma mulher amarga, mas no final do filme permitiu que Josué trilhasse seu próprio caminho.

Quem sabe nós também não mudamos nossa estória fazendo uma história diferente.

DEHOLAMBRA
Enviado por DEHOLAMBRA em 02/07/2011
Reeditado em 20/10/2015
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