A prata da casa
Vez por outra algum aluno me pergunta: “professor, o que faz um aluno ser ‘melhor’ do que o outro e ter mais oportunidade no mercado de trabalho?” Antes de responder a este questionamento, devo esclarecer o porquê dessa pergunta.
Sabemos que muitos estudantes se despencam de Camaçari para Salvador, em busca das “melhores” formações e instituições de ensino. Seja qualificação, técnica ou superior, a maioria acredita que lá está a verdadeira excelência na formação profissional. Assim, o que poderia ser utilizado como artilharia para forçar a vinda de novas instituições de ensino para o município, torna-se justamente um dos principais entraves ao, por exemplo, projeto da gestão municipal de instalação de um pólo educacional em Camaçari. Bom, mas este é assunto para outro artigo...
E qual a diferença mesmo? Qual o melhor curso? Qual o nome de maior peso no mercado? Eu simplesmente contraponho: “a resposta está em você”.
Não precisa ser especialista para saber que a educação em Camaçari está descendo a mesma ladeira que o restante do país, apesar de termos a possibilidade de maiores investimentos na área; e de nos tornarmos referência para outros municípios brasileiros, por conta da altíssima arrecadação a qual dispõe a árvore que chora (que sonho!).
O ingresso de alunos em cursos técnicos e superiores dispõem de cada vez mais mecanismos facilitadores (linhas de financiamento específico, provões, cursos gratuitos, bolsas, novas instituições públicas e privadas etc.). Todavia, a base escolar está totalmente ruída. Basta tão somente verificar a situação da rede municipal. Até que existem boas estruturas físicas, não se pode negar. Todavia, são verdadeiros, como diz a Bíblia, “sepulcros caiados”. Por fora (e na mídia), está tudo “bonitinho”, mas por dentro, em sua essência, seu estado é putrefaço. O básico, para quem sai do ensino médio, por exemplo: português e matemática, não atende em absoluto ao que é exigido para complementação dos seus estudos em nível técnico e de graduação superior. Alunos que lêem e escrevem de forma correta (o básico do básico), tornaram-se exceções e não, lamentavelmente, regra. Tudo isso fruto de uma nova “pedagogia” de atendimento apenas aos indicadores politiqueiros de aprovação, sem compromisso com a qualidade na formação desses alunos. Assim eles chegam à formação técnica e superior: sem base! Resta-nos, enquanto educadores, retroceder às salas de aula do fundamental e do ensino médio para revisar e tentar, de alguma forma, construir, em pouquíssimo tempo, o basal necessário. Vale lembrar que professor é professor e não mágico!
Qual a melhor entidade de ensino? Essa é outra pergunta frequente. Creio que todas as instituições se esforçam para fazer o melhor. Todavia, é notório que já “viciamos” os nossos alunos, pois desde cedo, injetamos em suas veias a principal lição: não existe prazer em estudar! Outro dia ouvir uma profissional da área pedagógica afirmar que quem trabalha com educação é um “sonhador que acha que mudará o mundo, mas logo cairá na realidade, e passará a trabalhar tão somente por seu próprio sustento”. O sonho acabou! Este é o adágio de milhares de alunos e professores em todo Brasil. O primeiro não sente mais “excitação” em viver a plenitude do júbilo que é descobrir o conhecimento, o outro, por sua vez, já não acredita na educação como principal viés de transformação da nação e ambos colocam a culpa tão somente no governo (cuja parcela de responsabilidade é, sem dúvida, a maior; mas não total).
É obvio que existem as exceções dentro desse processo. Estes são profissionais de educação totalmente comprometidos com a arte de desenvolvimento de um novo Brasil, através do ensino, assim como existem alunos que sabem que a diferença e o sucesso são construídos também por eles próprios, mesmo que as dificuldades impostas, absurdamente, pelo governo, sejam muitas. As informações, que podem ser compreendidas e transformadas em conhecimento, são muito mais propagadas atualmente do que há 30 anos; com o auxílio de diversos meios de comunicação (TV´s, rádios, jornais, revistas, livros, escolas, internet etc.). Somos nós que escolhemos vencer em meio ao caos educacional em que se encontra a nossa rede de ensino, ou sucumbir juntamente como ela. A leitura, por exemplo, pode ser estimulada em sala, mas se estes alunos se deixarem vencer pela informação banal e visual, não serão bons escritores no futuro. Consequentemente, estes irão reduzir sobremaneira suas chances de ascensão profissional.
Eu tive a honra de me graduar Bacharel em Administração de Empresas por uma instituição de Camaçari, muito criticada por alunos que preferem rodar 120 km por dia para estudar em faculdades de Salvador. O hilário é que muitos dos professores destes estudantes foram os mesmos que tínhamos aqui. Eis um excelente exemplo: graduei-me no ano de 2007, a turma iniciou com 100 pessoas (subdivididas em duas turmas A e B). Destas, apenas 33 pessoas conseguiram graduarem-se no tempo estabelecido, outras poucas concluíram o curso em turmas posteriores e ainda outros cerca de 60% ficaram pelo caminho, por motivos diversos. Se analisarmos os 33 formados, podemos concluir que talvez 10, ou 12, exercem, evidentemente, a profissão de administrador. O que faz questionarmo-nos: como isso ocorre, se a intuição formadora foi a mesma, se os professores foram os mesmos, se as informações e conhecimentos apresentados foram uniformes? A resposta, meus leitores, está naquilo que nós, alunos, decidimos ser mais importante, o diploma/papel, ou o conhecimento/competência?
Será que é válido perpetuar a “leitura” daqueles que sempre reclamam da falência das escolas públicas – com razão! Daqueles que sempre afirmam que estão cansados porque trabalhou o dia todo e ainda têm que estudar a noite – com razão! Quem sabe ainda tenham razão os que continuamente se queixam de que o governo quer o povo menos esclarecido, de fácil domínio – mais uma vez com razão. Digo-vos que são válidas tais lamúrias, mas, sem um mínimo de razão, são os pautaram as suas derrotas nessas e em outras muitas desculpas. É preciso voz ativa e ação.
Estudei em escolas públicas quando estas já estavam em pleno processo de decadência. Estudei na Faculdade Metropolitana de Camaçari – FAMEC, tão criticada pela suposta “falta de qualidade”. Tive toda sorte de dificuldade das quais se possam imaginar, mas aqui estou eu, escrevendo este artigo para vocês... E onde estão todos os outros que apenas se lamentam e atribuem a outrem o seu insucesso pessoal?
Conheço profissionais competentíssimos, verdadeiras pratas da casa, oriundas dessa mesma instituição, que me enchem de orgulho por terem sido meus colegas de classe e por terem aceitado o desafio de provar que em Camaçari forma-se excelência; e aqui faço uma homenagem aos Administradores: Sílvio Brandão, Aline Reis, Jusinaldo Oliveira, Ana Cláudia, Cássia Vilela, Dilma Cerqueira, Adenilson Silva, Ana Carla, Danilo Cerqueira, Antônio Carlos, Erica Araujo, Fernanda de Oliveira, Ildênia Reis, Francisco Martins, Raul Gordilho, Osvaldo Azevedo, Thais Almeida, Daniele Nunes, Robson Rufino (in memoriam), dentre outros.
Quero aproveitar a oportunidade, para destacar a atuação brilhante de uma recém graduada administradora que vem fazendo uma verdadeira revolução no terceiro setor local e baiano, inclusive com incursões em outros estados, a Edileusa Sena. Mais uma prova de que existem muito mais metais preciosos oriundos desse garimpo.
A prata da casa existe e está construindo novos horizontes, novos modelos, seguindo a passos firmes e crentes de quão importante será a sua contribuição para Camaçari e para o país.
Lembre-se de que a transformação depende de cada um de nós e que é preciso, primeiro, que a mudança comece em nós mesmos, se desejarmos vê-la passear pelas ruas da nossa cidade.
Salve,
Caio Marcel Simões Souza (admcaio@gmail.com) é Administrador de Empresas e formado em Capoeira Regional, pelo Grupo de Capoeira Regional Porto da Barra. Também é responsável e mantenedor do Projeto Social Crianças Cabeludas, no bairro do Parque das Mangabas, Camaçari.
PS: Texto publicado no Portal Eletrônico Camaçari Agora. Link: http://www.camacariagora.com.br/colunista.php?cod_colunista=17