Motivação e Amorosidade: por uma docência afetiva e efetiva.[1]
Prof. João Beauclair
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Motivar o talento humano é nossa tarefa, como formadores de pessoas num mundo complexo e repleto de antagonismos. Somos convocados a seguir acreditando na educação e no seu poder cotidianamente, pois vivemos tempos de novas barbáries, banalizadas e naturalizadas, o que nos desafia a criar estratégias psicossocioeducativas que cheguem ao coração das pessoas, assim resgatando o humano no Humano.
Em cada um de nossos gestos, olhares, existem as possibilidades para acolher o outro e percebê-lo como legitimo outro. Para tanto, devemos perseguir a motivação permanente, processo interno que, em muitos momentos, nos vemos impossibilitados de prosseguir, mediante cotidianos que caem nas rotinas e nos afastam do viver a beleza da Vida, partilhando e compartilhando a magia que reside na aprendizagem humana.
Hoje, somos inundados por um mundo de informações, temos algum conhecimento e falta-nos um pouco mais de sabedoria. Com isso, fica claro o necessário resgate de valores humanos imprescindíveis a vida e, em cada sala de aula, em cada escola, seja ela do nível que for, cabe-nos a tarefa de rever percursos, fomentar autorias, exercitar a paciência e a tolerância, aceitar as diferenças e as diversidades.
Exige-se muito de nós, ensinantes do tempo presente, como se tais exigências pudessem dar conta da totalidade dos inúmeros dilemas que surgem na rotina presentes nos espaços e tempos oficias do aprender e do ensinar. São avaliações internas e externas do nosso trabalho, em alguns momentos equivocadas questões se fazem presente na própria gestão escolar, enfim, há muito que sentipensar e fazer. Entretanto, cabe-nos tomar posturas, fazer escolhas, exercitar o livre arbítrio e caminhar, se nossa opção residir no desejo de continuar com a ação da docência, com o ser e estar atuando em nossas professoralidades.
Motivar-se hoje com o trabalho docente é uma possibilidade de rever nossos próprios percursos, nossas histórias de vida como educadores, vivificando nossos anteriores tempos, onde o entusiasmo melhor se presentificava.
                O entusiasmo, em sua origem etimológica significa Deus age em Mim. Independente de nossos sistemas de crenças pessoais, quase todos nós acreditamos em alguma forma de nos aproximarmos do transcendente, do divino em nossas vidas. Tenho, no momento atual de minha existência como ensinante itinerante, feito observações a muitos que lêem meus artigos e textos e me ouvem em conferencia, mini-cursos, workshops e palestras, tratado de temas que acabam por aproximar nossas docências com nossas próprias vidas pessoais, tratando de fazer conjuntas reflexões sobre nossos humanos talentos, nossas próprias utopias, nossos desejos de mais e melhor vida, para si mesmo e para todos.
Neste movimento, sempre destaco a importância primordial de levarmos para cada sala de aula, para cada escola, nossa pessoalidade, nossas capacidades de compreensão, nossos talentos, gostos, projetos pessoais, vivencias éticas e estéticas que favoreçam a aproximação entre as pessoas, a criação de vínculos positivos entre aprendentes e ensinantes, não se esquecendo da poesia, que sensibiliza nossos corações e acalanta nossos devaneios.
Guimarães Rosa, com propriedade nos ensinou que mestre não é só quem ensina, mas quem também aprende. Adélia Prado nos ensinou que o desejo é imenso oceano, rico em suas propriedades. Drummond nos revela que o amor pode ser nossa maior tarefa, sensibilizando nossas almas e espíritos para, assim , viver cada etapa de nossas efêmeras vidas deixando nossas marcas, nossas obras inacabadas, mas fazendo parte da vida dos que conosco vivenciam etapas, aprendem e ensinam.
                Urge sabermos quem nos somos, qual é a nossa identidade, onde está nossa subjetividade. Jung contribui, com toda a sua obra, quando trouxe a importância dos processos de individuação dos sujeitos para a compreensão de nossas múltiplas dimensões. Hoje, com todos os avanços das Neurociências ainda ficamos, muitas vezes, perplexos com nossas ações, nosso acertos e, óbvio, com nossos erros. Acredito que errar é um direito nosso e aprender com ele um dever incomensurável. Se ficamos perplexos com algumas de nossas atitudes, cabe-nos encontrar um tempo para refletir sobre elas, para que assim , nos seja possível vislumbrar alguma evolução em nossas práticas socais, principalmente as da docência.
Venho apostando em estudar a amorosidade, as dinâmicas grupais, a psicopedagogia, a psicologia transpessoal, o holismo, a transpessoalidade como modo de melhor intervirmos na realidade. Também venho acreditando, com mais força e clareza, na importância da educação por projetos, onde haja a necessária dialogicidade entre nós. Estudar as questões da afetividade e suas influencias nos processos da cognição humana é outro modo de ampliar nossos recursos para melhor intervir.
Mesmo que já saibamos disso, é vital no momento histórico atual, que se faça lembrar que somos, quer queiramos ou não, modelos que são observados e de modo nem sempre consciente, absorvidos, assimilados por nosso aprendentes. Resta-nos saber como exercemos nossa presença frente a importante tarefa que é fazer a gestão de cada sala de aula.
Rever nossas condutas, estabelecer normas para o nosso próprio comportamento, evidenciar para nos mesmos nossas limitações pode nos nutrir com algo novo, positivo e que seja operante em nossas continuadas formações.
Mais do que nunca, necessitamos seguir com nossas formações, num continuum permanente, pois se tudo muda o tempo todo no mundo, como nos alerta o poeta Lulu Santos, também precisamos ser a própria mudança que desejamos no mundo, como Gandhi um dia explicitou. O resgate do humanismo na Educação é emergente como intensas e sucessivas buscas, pois o que podemos de melhor fazer, além de ensinar os conteúdos de cada uma de nossas disciplinas, é interdisciplinar informações, promovendo o desenvolvimento humano e concebendo novos maneiras de formar pessoas para uma era que se mostra, cada vez mais, repleta de incertezas, de lacunas, de dilemas que a todos nós afeta.
Motivar-se para exercer uma docência efetiva e afetiva é colocar-se em abertura para com os outros, para com o mundo, para a beleza do encontro, para o diálogo fomentado pela alegria de viver nossas dinâmicas existenciais com mais plenitude. Paulo Freire, em toda a sua obra, marcada pela presença do existencialismo, destacava que somos seres da incompletude e, a meu ver, é essa incompletude que pode saciar nossos desejos com provisoriedade de fazer algo mais, de ir além do que está posto, de avançar por veredas outras que se abrem como portas e janelas para o novo em nossas vidas.
Motivar-se para exercer uma docência efetiva e afetiva é situarmos nossas existências na propositura da Amorosidade, qualidade tão esquecida por nos na correria que sabe lá Deus, para onde seremos levados com ela. No exercício de nossas docências, acabamos por esquecer, hoje, de que a pressa não é a melhor amiga do viver mesmo de cada um. Corremos em demasia e, com isso, acabamos por ficar alheios ao que de fato pode ser mais interessante: o encontro com os outros que, em suas singularidades, podem acrescentar mais brilho ao nosso viver.
Abraçar nossas potencialidades, resgatar nossas preciosas histórias, tirar do limbo o que antes fazíamos com mais alegria e afeto pode ser um bom começo. Ressignificar o percurso do vivido, acolhendo a si mesmo como sujeito dotado de importância para a vida de outras tantas pessoas.  



[1] Publicado originalmente em: BIS Revista ANO I - Nº 7, Belo horizonte, Minas Gerais, 2010. http://www.sinepe-mg.org.br/
[2] Prof. João Beauclair: Conferencista e Palestrante Internacional sobre Temas Motivacionais, Educacionais e Psicopedagógicos em diversos eventos. Doutorando em Intervenção Psicossocioeducativa pela Universidade de Vigo, Galícia, Espanha. www.profjoaobeauclair.net
joaobeauclair@yahoo.com.br