As Palavras - Bumerangue
As palavras deveriam constituir um patrimônio de inestimável valor representando a pessoa que as emitiu. Cuida-se muito pouco delas. Se o ser humano tivesse consciência do grande mal que inflige a si ao emitir impulsiva, apressada e irrefletidamente palavras que levam o selo da discórdia, da indiscrição, da intromissão e da maledicência, e que este agravo acaba por voltar-se contra ele - como a arma de arremesso dos indígenas australianos - cuidaria das próprias como sagradas. Elas representam os pensamentos da pessoa.
Em geral, o homem se move mentalmente em função de pensamentos alheios que absorve pelos meios que circula. Essa importação, que pode ser positiva ou negativa, cria um ambiente mental antagônico e indisciplinado sem que se tenha um controle sobre ele; diz o que não queria, prejudica-se por falar demais, ofende os que ama e assim por diante.
Não é conveniente querer falar bem antes de aprender a pensar. O conteúdo da palavra, o pensamento que a anima, deverá estar apoiado na conduta que possa atestar sua natureza.
Quais fatores dificultam a livre expressão do pensamento? Por que a maioria das pessoas tem dificuldade para falar em público?
O bom conhecimento da língua favoreceria aquela prática; quanto maior o vocabulário, maiores recursos de expressão. Há pessoas que têm um grande conhecimento da língua, um amplo vocabulário adquirido através da leitura, mas grande dificuldade em expor o pensamento.
Existem certas limitações psicológicas comuns à maior parte das pessoas que impedem a livre manifestação das idéias. É muito comum ocorrer o esquecimento ou que se fuja do assunto por causa de uma preocupação. Essa falta de domínio é generalizada. A maior parte das pessoas padece desse mal, e por um motivo bastante simples: o desconhecimento da estrutura mental para que se possa agilizar a observação, a reflexão, a recordação, o pensar, julgar e combinar. É necessário conhecer esse mecanismo e adestrá-lo para desenvolvê-lo, como fazemos com as capacidades físicas.
Certa vez alguém disse que Deus fez o ser humano com dois ouvidos e uma boca, para ouvir mais e falar menos. A admirável arte do silêncio permite a quietude mental do aprendiz que quer ouvir, possibilitando o desenvolvimento da comunicação através da palavra. Saber calar, para poder ouvir e falar.
Aquietar e silenciar os pensamentos, ouvir com atenção as idéias do interlocutor, expor com serenidade e segurança as idéias, pensamentos e convicções, respeitar as que não coincidam com as nossas, buscar o ponto de conciliação entre as diferenças. Tudo faz parte de uma conduta de exceção nestes tempos de desencontros e incompreensões.
Se não aprendemos a ouvir os pensamentos e idéias das outras pessoas, tendemos a cair na obstinação, a não aceitar nenhuma variante ou reparo aos nossos pontos de vista. O obstinado quer que os outros conciliem com suas idéias, mas ele nunca é capaz de conciliar com as alheias; é incapaz de ouvir qualquer coisa além daquilo que ele admite ou vê. O que discorda dele é considerado inimigo. Existe, na grande maioria dos seres humanos, certa dose de obstinação, essa surdez mental que nos impede extrair dos critérios alheios algo que nos ajude a superar a rigidez cadavérica de nosso juízo e teimosia -. No entanto, para compensar, existe também o gérmen da transigência, capacidade de avaliar os outros critérios e alterar os próprios quando uma razão maior ou uma nova situação exija, como muito bem ponderou González Pecotche em seu livro “Deficiências e Propensões do Ser Humano”.
O início de uma ação consciente caracteriza-se pela atenção e cuidado com as palavras que se pronuncia. Elas representam os pensamentos que estão na mente de quem as utiliza.
Cuidar mente e dos pensamentos significa zelar pela vida e o conceito pessoal.
Nagib Anderáos Neto
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