UNIVERSIDADE; TÚMULO DO SABER

Por muito tempo tive vontade de fazer parte da Quadrademia.

Inocente, pensava que haveria alguma coisa realmente boa lá.

Um mundo intelectual incandescente, gente fervilhando de ideias novas, originais...

Sonhava que seria um lugar no qual eu encontraria uma vocação e meus talentos seriam incentivados.

Doce sonho de criança!

Na Quadrademia, os professores, invariavelmente, mestres e doutores, vestiam-se com uniformes. Mais que isso, a indumentária dos seus pensamentos também era uniformizada.

Para tudo, na Quadrademia, havia regras. Observância de regras estritas deveriam necessariamente orientar um novel quadradêmico.

Uma fábrica do saber, ou uma linha de produção em série. Essa era e ainda é a Quadrademia.

Certa feita, foi-nos solicitado um trabalho, um pequeno trabalho.

Tal labor inspirou um sem-luz fazer o que de melhor podia. Então, para a feitura do trabalho, utilizou várias e variadas formas diferentes, cores esfuziantes, tonalidades inusitadas, o que dava um colorido especial à obra do sem-luz.

Foi entregar seu trabalho ao doutorando. Este leu o trabalho e disse, com o dedo em riste:

- Desprovido de iluminação, o negócio aqui é o seguinte; quando te pedimos um trabalho na Quadrademia, você sabe que ele deve ser sempre da mesma forma, respeitar as regras quanto às cores e as tonalidades devem ser aquelas especificadas nos nossos manuais.

Mas aquele que ainda sabia pouco olhou para o futuro doutor e disse:

- Doutor, a escolha pela forma, pela cor e pela tonalidade do trabalho foi feita de forma deliberada. De modo algum, eu, o desprovido de todo o conhecimento, fiz o que fiz inconscientemente.

- É que eu pensava que aqui na Quadrademia os lamparinas apagadas seriam incentivados à criatividade, à originalidade, à fuga do lugar-comum.

- Não, absolutamente, não. Respondeu o candidato a doutor.

- Assim é a Quadrademia, e assim eu quero que seja. Se você quer fazer de outra forma, procure outro lugar, aqui se faz assim e não haverá nenhum tipo de concessão.

Peguei meu trabalho e o enfiei dentro de minha bolsa pensando o que teria feito de errado. Fui matutando para casa, sobre o estudo, sobre os professores, sobre a Universidade...

Concluí que a Quadrademia é a verdadeira sepultura de toda e qualquer criatividade. Que o gesso é o material mais utilizado lá, pois tudo o que for possível é engessado na Quadrademia.

Descobri também que lá só há espaço para a forma quadrada, tudo tem que ter esse formato ou estará automaticamente descartado. As cores devem ser sempre as mesmas, e as tonalidades são sempre branco, preto e as múltiplas tonalidades do cinza.

Por fim, para aqueles que se adequavam à Quadrademia, depois de todo o corpo ter sido engessado, o ritual final consistia num completo sepultamento do quadradêmico sobre toneladas de um denso gesso.

Este processo se fazia necessário para que ele de forma nenhuma se mova. E mais especificamente, em nenhuma hipótese pense. É que esta última atividade, na Quadrademia, é permitida somente aos doutores.

A nós, os sem-luz, resta o ofício do papagaio; temos que repetir o que todo mundo já disse.

Frederico Guilherme
Enviado por Frederico Guilherme em 28/11/2010
Reeditado em 29/11/2010
Código do texto: T2642536
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