As variações da Fala no Contexto Social

INTRODUÇÃO

Este artigo abordará as características individuais da fala e será desenvolvido com base em uma pesquisa científica, apoiada em ideias argumentadas por renomados autores sobre a fala e suas variações. Considerando que a importância da língua falada para o estudo científico, está principalmente no fato de ser na nossa língua falada que ocorrem as mudanças e as variações, que incessantemente vão transformando a língua.

Cada indivíduo ao nascer começa a aprender a língua em casa com os familiares. Ao ouvir as pessoas falando, apropria-se aos poucos do vocabulário e das leis combinatórias da língua. Sendo assim, não existe um jeito mais correto de falar, haja vista que todas as variantes linguísticas são eficazes na comunicação verbal, portanto, possuem valor dentro das comunidades nas quais são faladas. Apesar disso, uma das variantes, a norma padrão ou norma culta, tem grande prestígio na sociedade, por ser o tipo de língua utilizada na maior parte dos textos jornalísticos, científicos, didáticos, e outros que são de grande relevância.

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

A fala deve ocupar lugar de destaque no ensino da língua, haja vista que ao chegar à escola, o aluno trás consigo uma bagagem linguística que já domina. Neste sentido, a variedade linguística do aluno deve ser valorizada e respeitada; jamais excluída e considerada inferior. Pois, de acordo com os PCN (1998, p. 26):

[...] a escola precisa livrar-se de alguns mitos: o de que existe uma única forma “certa” de falar — a que se parece com a escrita — e o de que a escrita é o espelho da fala — e, sendo assim, seria preciso “consertar” a fala do aluno para evitar que ele escreva errado. Essas duas crenças produziram uma prática de mutilação cultural que, além de desvalorizar a forma de falar do aluno, tratando sua comunidade como se fosse formada por incapazes, denota desconhecimento de que a escrita de uma língua não corresponde inteiramente a nenhum de seus dialetos, por mais prestígio que um deles tenha em um dado momento histórico.

Na verdade, vem-se criando a consciência de que a oralidade tem um papel no ensino da língua e, assim sendo, os Parâmetros Curriculares Nacionais afirmam que “a questão não é falar certo ou errado e sim saber que forma de fala utilizar”, considerando as características do contexto da comunicação, ou seja, saber adequar a fala às diferentes situações comunicativas.

Ao encontrar pessoas de regiões diferentes do Brasil, percebe-se as diversas expressões linguísticas existentes. Segundo Camacho (1988) existem múltiplos fatores originando as variações, as quais recebem diferentes denominações. É inegável as diferenças que existem dentro de uma mesma comunidade de fala.

Ao ter contato com textos do século XVII e XVIII nota-se que os registros linguísticos diferem-se dos de hoje. Alguns termos se tornaram obsoletos outros permaneceram, mas com algumas alterações. Conforme Martinet (1964) “uma língua é um instrumento de comunicação segundo o qual, de modo variável de comunidade para comunidade, se analisa a experiência humana em unidades providas de conteúdo semântico e de expressão fônica...” Neste contexto, todas as variações, sob o prisma da estrutura linguistica, são perfeitas e completas em si.

Por conseguinte, a língua como um fenômeno social é caracterizada pela variedade. E sob o ponto de vista de Cagliari (1991), os modos diferentes de falar acontecem porque a língua portuguesa, como qualquer outra língua, é um fenômeno dinâmico, que está sempre em evolução.

2 AS VARIAÇÕES DA FALA

Todas as línguas variam, ou seja, não existe nenhuma sociedade ou comunidade na qual todos falem da mesma forma Tarallo, (1986). Em uma nação grande e extensa como a brasileira, a variação linguística se constitui em um fato natural e inevitável, se considerada a heterogeneidade social e os diferentes graus de contato intergrupal das diversas comunidades aqui existentes. Por variedades linguísticas deve-se entender segundo Soares (1983), as modalidades da língua, caracterizadas por peculiaridades fonológicas, sintáticas e semânticas, determinadas, de um modo geral, por três fatores: o geográfico, o sóciocultural e o nível da fala; responsável pela variedade linguística entre comunidades fisicamente distantes, resultando nos dialetos ou nos falares regionais. O responsável pela divergência linguística entre diferentes subgrupos de uma comunidade local seria o fator sóciocultural, estando entre os aspectos distintivos a idade, o sexo, a classe social, a profissão, o grau de escolaridade. Por fim, o nível da fala ou o registro de uso, que se refere ao nível de formalidade da situação em que ocorre a comunicação.

Vale ressaltar que há variação de fala em qualquer contexto social, numa gradação que vai de variedades cotidianas, informais a outras mais ou menos formais. Para Bakhtin (1986), o sujeito se constitui ouvindo e assimilando as palavras e os discursos do outro (sua mãe, seu pai, seus colegas, sua comunidade etc. O sujeito é visto como sendo imbricado em seu meio social, sendo permeado e constituído pelos discursos que o circundam.

Cabe aqui, lembrar a denominação dada por Bakhtin (1986, p. 36), de que a língua é um “fenômeno social”. E conforme Freitas (1998, p. 87) “a linguagem é fruto de uma construção coletiva de um determinado grupo cultural, pois isso não é algo vazio, abstrato, mas que possui sentido”, considerando que esse sentido é desenvolvido dentro dos contextos em que a comunicação ocorre. Consequentemente, por se tratar de um “fenômeno social”, a Língua é entendida como inseparável do processo de comunicação.

3 A LÍNGUA E A FALA

A língua e a fala fazem parte da contextualização lingüística do ser humano no âmbito social como enfatiza vários estudiosos.

Segundo Saussure:

[...] a língua é necessária para que a fala seja inteligível e produza todos os seus efeitos [...] é a fala que faz evoluir a língua: são as impressões recebidas ao ouvirmos os outros que modificam os nossos hábitos linguísticos. Há, portanto, interdependência da língua e da fala; aquela é ao mesmo tempo o instrumento e o produto desta. Mas tudo isto não as impede de serem duas coisas absolutamente diferentes.

(1995, p. 48-49).

Neste cenário, ao longo do tempo e nos mais diversos grupos sociais, as línguas passam a existir como um conjunto de falares diferentes ou dialetos, todos muito semelhantes entre si, porém, cada qual apresentando suas particularidades com relação a alguns aspectos linguísticos. A fala é um instrumento de comunicação, contudo, em determinadas situações não é utilizada com precisão, ou seja, o receptor não consegue decodificar a mensagem.

Para Saussure, a linguagem é composta de duas partes: a língua, essencialmente social, porque é convencionada por determinada comunidade lingüística; e a fala, que é secundária e individual, ou seja, é veículo de transmissão da língua, usada pelos falantes através da fonação e da articulação vocal.

Em relação à concepção de língua, Bakhtin afirma que ela é uma abstração quando concebida isolada da situação social que a determina. Para o autor, “a língua vive e evolui historicamente na comunicação verbal concreta, não no sistema lingüístico abstrato das formas da língua nem no psiquismo individual dos falantes” Bakhtin (1986: 124).

Se a escola tem por objetivo ensinar como a língua funciona, deve incentivar a fala e mostrar como ela funciona. Na verdade uma língua vive na fala das pessoas e só aí se realiza plenamente. A escrita preserva uma língua como um objetivo inanimado, fossilizado. A vida de uma língua está na fala. Cagliari ( 2005, p. 52).

3.1LINGUAGEM E INTERAÇÃO

Expressar-se oralmente, revela mais do que o pensamento; revela-se também o nível cultural, a posição social, a capacidade de adaptação a certas situações; enfim, mostra-se a forma de ser e de ver o mundo. A linguagem; portanto, é um instrumento humano bastante valioso, seu desenvolvimento passa por etapas e inclui aprendizagem. Aprendizagem neste contexto, entendida como humana. Assim sendo, a linguagem é vista como instrumento de interação social e formadora de conhecimento. Essa visão supera a concepção da linguagem como sistema preestabelecido, estático, centrado no código, uma vez que Bakhtin (1986) afirma que a verdadeira substância da língua (...) não é constituída por um sistema abstrato de formas linguísticas (...) mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação e das enunciações (1986, p.109). Nesta perspectiva, a linguagem verbal exerce uma função fundamental pelo fato de que ela é determinada, tanto pelo fato de que procede de alguém, como pelo fato de que se dirige para alguém. Desta forma, constitui-se “justamente o produto da interação do locutor e do ouvinte” (1986, p. 113).

Neste prisma, compreender a linguagem como forma de interação representa entendê-la como um trabalho coletivo, logo em sua natureza sócio-histórica e, então, "como uma ação orientada para uma finalidade específica (...) que se realiza nas práticas sociais existentes, nos diferentes grupos sociais, nos distintos momentos da história" Brasil( 1998, p. 20). Enfim, a linguagem como interação pressupõe construção entre sujeitos que agem, por meio da própria linguagem.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa corrobora e ao mesmo tempo afirma que a língua concebida como meio de integração social, requer a defesa de suas variações, sem ignorar a importância do domínio da norma linguística. Não se pode fechar os olhos à realidade linguística: a variedade. Toda variedade tem uma regularidade, não é um caos. A escola deve respeitar as variações linguísticas que o aluno usa para interagir, mas também deve ensinar a norma padrão, já que a maioria dos alunos não têm acesso a este tipo de linguagem.

No entanto, a norma padrão culta não deve ser ensinada como uma imposição da classe dominante, nem como uma possibilidade de ascensão social, mas, no sentido de ampliar a capacidade comunicativa do falante, isto é, para que este tenha competência de se expressar adequadamente nas diferentes situações comunicativas. As situações de comunicação diferenciam-se conforme o grau de formalidade que exigem. E isso é algo que depende do assunto tratado, da relação entre os interlocutores e da intenção comunicativa.

Portanto, a Linguagem é a atividade humana que nas representações de mundo que constrói, revela aspectos históricos, sociais e culturais. É através dela que o ser humano organiza e dá forma às suas experiências. Seu uso ocorre na interação social e pressupõe a existência de interlocutores no âmbito lingüístico..

REFERÊNCIAS

BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. 2. ed. São Paulo : Hucitec / Petrópolis : Vozes, 1987.

------------------------- Marxismo e Filosofia da Linguagem. 1981.

-------------------------------- (Marxismo e filosofia da linguagem. 3 ed. São Paulo: Hucitec, 1986.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Língua Portuguesa: 3º e 4º Ciclos do Ensino Fundamental. MEC/SEF, 1998.

CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e Linguística. São Paulo: Ed. Scipione, 1991.

--------------------------------------Alfabetização e Linguística. 10ª ed. 12ª impressão. São Paulo. Scipione, 2005.

CAMACHO, R. A variação linguística. In: Subsídios à proposta curricular de Língua Portuguesa para o 1º e 2º graus. Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, 1988.

FREITAS, Maria Teresa de Assunção (org.). Narrativas de professores: pesquisando leitura e escrita numa perspectiva sócio-histórica. Rio de

Janeiro: Ravil, 1998.

MARTINET, A. Elementos de linguística geral. Trad. de J. Morais-Barbosa. Lisboa, Liv. Sá da Costa, 1964. (ELG).

SAMPAIO, Ana Simone Moia. Linguagem Verbal e Aprendizagem. Disponível em http://www.profala.com/artpsico77.htm

SAUSSURE, Ferdinand de. Curso de lingüística geral. 20. ed. São Paulo: Cultrix, 1995.

Tarallo, Fernando. A pesquisa sócio-lingüística. São Paulo: Ática, 1986.

Dryca Guimarães
Enviado por Dryca Guimarães em 21/11/2010
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