Críticas à Cartilha Anti-Bullying Do CNJ - Um Risco ao senso crítico do leitor.
Lançada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) no dia 20OUT2010, a Cartilha 2010 – Projeto Justiça nas Escolas, que orienta os pais e educadores a prevenir o problema do bullying nas suas comunidades e escolas, poderá obter um grande sucesso(!) Tanto pela iniciativa de combater um tipo de violência que prejudica a vida social de milhares de crianças e adolescentes no mundo, quanto pelo amplo debate e conscientização realizados para promovê-la através de seminários e palestras, bem como pela sua distribuição gratuita, alcançando alunos, professores, estudiosos, autoridades, enfim, toda a sociedade civil.
De autoria da Dra. Ana Beatriz Barbosa Silva, essa cartilha apresenta alguns problemas graves, que podem suscitar interpretações distorcidas, até mesmo perigosas, mas que passaram despercebidos pelo senso crítico da autora e das autoridades que respondem solidariamente pela autoria deste projeto.
Baseada num esquema de perguntas e respostas, a malfada cartilha, apresenta na questão 04 a seguinte pergunta: QUAL O CRITÉRIO ADOTADO PELOS AGRESSORES PARA A ESCOLHA DA VÍTIMA? Transcrevo e destaco a seguir a resposta da autora, que a elaborou de maneira descuidada, talvez com a melhor das intenções, mas apresenta um conceito proferido sem a devida reflexão, ou seria uma discriminação, ou senão uma Injúria por Preconceito?
“Os bullies (agressores) escolhem os alunos que estão em franca desigualdade de poder, seja por situação socioeconômica, situação de idade, de porte físico ou até porque numericamente estão desfavoráveis. Além disso, as vítimas, de forma geral, já apresentam algo que destoa do grupo (são tímidas, introspectivas, nerds, muito magras; são de credo, raça ou orientação sexual diferente etc.). ESTE FATO POR SI SÓ JÁ AS TORNA PESSOAS COM BAIXA AUTOESTIMA E, PORTANTO, SÃO MAIS VULNERÁVEIS AOS OFENSORES. Não há justificativas plausíveis para a escolha, mas certamente os alvos são aqueles que não conseguem fazer frente às agressões sofridas.”
Eis a polêmica, o ensejo para interpretações distorcidas. E que perigo! Estaria a autora afirmando que pessoas introspectivas, nerds, muito magras, de credo, raça ou orientação sexual diferente etc, têm autoestima baixa, por isso são, de certa forma, culpadas também pelo bullying que sofrem? Ou ela quis dizer que estas pessoas são diferentes do grupo social a que pertencem e que este fato por si só já as torna pessoas com baixa autoestima? É como encontrar um enigma na porta de saída de um labirinto e do outro lado o senso crítico do leitor está entre a corda e o cadafalso!
Antes de mais nada, é preciso que fique bem claro que além de se contradizer na última frase da resposta, a autora, no trecho em destaque, cometeu uma conclusão irrelevante, uma falácia, um tremendo erro de argumentação, pois as razões ali expostas não lhe servem de suporte para aquela conclusão, ou seja, o fato das pessoas dentro de um determinado grupo serem tímidas, introspectivas, nerds, muito magras, de credo, raça ou orientação sexual diferente, não justifica se afirmar que elas sejam, por isso, de baixa autoestima. E quem não explica nem justifica se complica!
A autora não explicou o porquê desta “baixa autoestima”, e corre o risco de um leitor menos atento acusá-la de injúria por preconceito ou, pior ainda, por racismo! Neste contexto, alguém de um grupo qualquer, cujo contracheque seja diferente da minoria da população, poderia, por exemplo, após ser analisado pela lógica dela, pensar assim: "PUTZ, EU SOU UM MINISTRO, VOTEI CONTRA A LEI DA FICHA LIMPA E NÃO TENHO BAIXA AUTOESTIMA!" OU "EU SOU O ÚNICO DEPUTADO HONESTO E NÃO TENHO BAIXA AUTOESTIMA!".
Já na questão 13, que pergunta: “COMO É O BULLYING NAS ESCOLAS BRASILEIRAS, EM COMPARAÇÃO A OUTRAS, DOS ESTADOS UNIDOS OU DA EUROPA? ALGUMA CARACTERÍSTICA ESPECÍFICA?”, as vítimas das falácias da doutora são os nordestinos, os pobres e moradores dos ambientes sociais dominados pelo narcotráfico. Observem as conclusões irrelevantes dos trechos selecionados da resposta, logo abaixo.
“No Brasil, observam-se manifestações semelhantes às dos demais países, mas com peculiaridades locais: O USO DE VIOLÊNCIA COM ARMAS BRANCAS AINDA É MAIOR QUE A EXERCIDA COM ARMAS DE FOGO, UMA VEZ QUE O ACESSO A ELAS AINDA É RESTRITO A AMBIENTES SOCIAIS DOMINADOS PELO NARCOTRÁFICO. A violência na forma de descriminação e segregação aparece mais em escolas particulares de alto poder aquisitivo, onde OS DESCENDENTES NORDESTINOS, AINDA QUE ECONOMICAMENTE FAVORECIDOS, costumam sofrer discriminação em função de seus hábitos, sotaques ou expressões idiomáticas típicas. Por esses aspectos é necessário sempre analisar, de maneira individualizada, todos os comportamentos de bullying, pois as suas formas diversas podem sinalizar com mais precisão as possíveis ações para a redução dessas variadas expressões da violência entre estudantes.
Infelizmente, ocorrências com armas de fogo nas escolas não estão restritas às comunidades dominadas pelo narcotráfico e todos sabem que a violência na forma de descriminação e segregação não se limita às escolas particulares de alto poder aquisitivo, nem se caracteriza especificamente pelo bullying direcionado apenas aos DESCENDENTES NORDESTINOS, conforme defende a autora, que para piorar insiste pejorativamente em enfatizar "AINDA QUE ECONOMICAMENTE FAVORECIDOS".
Além disso, a doutora novamente se contradiz no último período desta resposta, pois antes ela analisa os locais dominados pelo narcotráfico e as escolas particulares com problemas de segregação contra os descendentes de nordestinos, e termina a resposta equivocando-se e enfatizando que “Por esses aspectos é necessário sempre analisar, de maneira individualizada, todos os comportamentos de bullying...” Ela começa tratando de casos específicos, depois tenta concluir o assunto generalizando.
Conclusões irrelevantes, falácias e equívocos, com a melhor das intenções. Corrijam urgentemente esta Cartilha! Ela é quase um bullying contra o senso crítico do leitor. É uma violência contra a educação das nossas crianças, pois ela peca contra a coerência, a clareza e a concisão da construção textual, pode suscitar polêmicas e interpretações distorcidas e, com certeza, nos custou milhares de reais, comprometendo recursos dos cofres públicos para realizar projetos mal sucedidos.
Tomara que mais ninguém perceba os muitos defeitos desta cartilha. Depois de lê-la, favor desconsiderar as questões 04 e 13, ou leia e a delete depois, rapidamente, sem contar pra ninguém. Melhor ainda, leia e envie as suas sugestões de correção para o Conselho Nacional de Justiça do Supremo Tribunal Federal.
______________
Confira a Cartilha no seguinte endereço:
http://www.cnj.jus.br/images/Justica_nas_escolas/cartilha_web.pdf