Você é um professor mosca ou um professor abelha?
Você é um professor mosca ou um professor abelha?
Laura Leal
Aprendi muito com a vida. Para além dos conteúdos acadêmicos e conceituais, tive oportunidade de aprender no meu exercício de existir, pessoal e profissional, que algumas pessoas parecem ser “abelhas”, pois qualquer que seja a situação enxergam o “néctar”. Outras, ao contrário, optam por ser “moscas”: em tudo vêem excremento. Essa idéia me ajuda, diariamente, na empreitada que travo comigo mesma, na busca de um aperfeiçoamento de ser uma pessoa melhor. Não são poucos os momentos em que me questiono se minha postura é de “mosca” ou de “abelha” diante desta ou daquela situação.
Estou convencida que essa analogia com o “jeito mosca ou abelha de ser” pode ajudar a nos entender melhor, entender os outros e mais, entender as relações que são estabelecidas com a vida pelas pessoas. Como? Simples assim...
Vamos ilustrar essa afirmativa, pensando em um lindo jardim. Todos os movimentos de uma mosca nesse jardim são para encontrar os dejetos ali presentes, enquanto os da abelha são para buscar néctares. Nossos movimentos de busca, muitas vezes, definem aquilo que vamos encontrar. Se estivermos imbuídos da “postura de abelha”, teremos inúmeras possibilidades de produzir o “deleite” e com ele construir coisas boas. Mas, se optarmos por uma “postura de mosca” – além do potencial de veicular mais de uma centena de organismos patogênicos – encontraremos, sem dúvida, as mazelas existentes em todas as escolhas que fazemos, em todas as produções que concebemos, em todas as relações humanas que participamos. Sempre haverá possibilidade de encontrarmos os dois elementos, pois na vida, dificilmente, uma situação é de toda boa ou de toda ruim.
Ampliando ainda mais esta reflexão, sabemos que as abelhas produzem o mel que serve de alimento durante o período do inverno; no entanto, ao produzirem o seu próprio alimento, elas geram vida em abundância, pois da polinização depende a perpetuação de muitas espécies de plantas e de outras formas de vida. Percebe-se, então, que não é apenas um fazer que limita-se à extensão, mas também a intensidade do acontecimento.
As “moscas” também geram vida, mas o fazem depositando bactérias em comidas ou suas larvas em frutos que em seguida apodrecem. O curioso é que esses dois insetos habitam no mesmo espaço e, no entanto, olham para as possibilidades de formas muito diferentes.
Estendendo essa analogia à docência, podemos nos perguntar se somos, enquanto educadores, “abelhas” ou “moscas”?. É evidente que ao fazer essa analogia com animais devemos ponderar o fato de que eles são programados geneticamente e, nós humanos, somos dependentes da aprendizagem. Os animais nascem preparados, como se a obra já viesse pronta. Eles são o que são, desde o nascer. O ser humano, ao contrário, além da carga genética, é dependente da mediação, pois ao nascer já encontra um mundo preexistente, o que acaba por ser uma vantagem, uma vez que pode usar esses conhecimentos construídos por gerações, para evoluir como espécie, sem ter que começar do nada.
Mesmo tendo consciência dessas diferenças, vale a pena investir um pouco mais na metáfora da vida de inseto. Ela pode nos ajudar a problematizar uma perspectiva de aprendizagem condizente com o tempo em que vivemos, no qual nossos alunos estão cada vez mais desafiados a interagir em ambientes sempre mais complexos, marcados pela diversidade e em constante e vertiginoso ritmo de mudança.
Sendo assim, possivelmente, terá mais chance de favorecer uma verdadeira aprendizagem aquele educador-abelha, o que fecunda; do que aquele educador-mosca, que só deposita. As abelhas e as moscas não têm opção ... Mas nós a temos!
As escolas precisam gerar possibilidades de vida por meio dos olhares, dos gestos, das palavras e dos nossos saberes de seus educadores... Precisam encerrar em seu cotidiano uma prática pedagógica que cria, que inventa, que duvida, que pergunta... Portanto, precisa ter vida! A nossa inteligência não deve nos deixar escolher o outro tipo de vida: a copiada, a treinada, a reproduzida. Simplesmente uma vida que já nasce morta ou talvez, mais triste do que isso, uma vida que nunca conhecerá suas potencialidades de criar o novo, de olhar para velhos problemas e ver neles novas soluções. A “postura da abelha” traz consigo, portanto, a possibilidade intrínseca da docência, que é de fecundar as pessoas para que elas possam, por meio de uma gestação única e intransferível, deixar nascer todo o seu potencial.
Sob essa ótica é que deveremos fundamentar o papel da expectativa do professor em relação ao desenvolvimento das potencialidades dos seus alunos. Ouso dizer que existe uma relação direta entre a expectativa do professor e o desempenho do aluno. Quando o aluno estabelece um vínculo positivo, fruto de uma certeza de que determinado professor acredita que ele é capaz, esse aprendente se mobiliza e se põe em movimento para não decepcionar o mestre. Aquele professor que é capaz de aquecer os corações de seus alunos, certamente, é capaz mobilizá-los, rumo à superação das suas dificuldades, com vistas a ampliar os seus saberes. São os professores com “postura de abelha” que fazem a diferença, pois ajudam a encontrar o melhor de seus alunos e acreditam, fielmente, que eles podem se superar a cada dia.