Competencias e Habilidades Interativas no Ensino de Língua Portuguesa no Ensino Médio
Competencias e Habilidades Interativas no Ensino de Língua Portuguesa no Ensino Médio
Autora: Solange Gomes da Fonseca
No que diz respeito à competência interativa, é preciso cultivar a idéia (tanto em professores quanto em alunos) de que a língua materna é um dos principais operadores da comunicação, nas diversas trocas sociais de que participamos cotidianamente. Seus usuários devem saber dispor dela adequadamente nas diversas situações comunicativas, cabendo à escola um importante papel de mediação na aquisição dessa competência.
Pela língua, somos capazes de agir e fazer reagir: quando nos apropriamos dela (instaurando um ‘’eu’’que dialoga com um outro) buscamos atingir certas intencionalidades, determinadas em grande medida pelo lugar de que falamos, e construir sentidos que se completam na própria situação de interlocução.
A transposição desse esquema descritivo para situações reais de comunicação em sala de aula nos faz refletir sobre a variedade de condições de interação instauradas entre professores e alunos. Hoje, diante dos novos paradigmas educacionais, não se espera que o professor seja o único a falar e o aluno, o único a escutar. É desejável que haja, ao longo das situações de ensino e aprendizagem, um salutar diálogo entre as duas partes, que pode contribuir definitivamente para a qualidade da construção do conhecimento.
Para que se encarem adequadamente as diversas situações comunicativas que se apresentam na escola, professores e alunos devem ter consciência do lugar de onde falam e dos interlocutores a quem se dirigem.
O professor deve estar consciente de que dele se espera que saiba dispor dos conhecimentos próprios de sua especialidade. No caso do professor de Língua Portuguesa, a expectativa é que saiba adequar seu próprio discurso a um bate-papo menos formal na resolução de um impasse cotidiano ou a uma aula mais expositiva, em que compartilhe seus conhecimentos sobre um tema recorrente na literatura ou um tópico gramatical.
Cabe ao professor do Ensino Médio adquirir paulatinamente a consciência do público a quem dirige seu discurso, levando em conta o fato de serem adolescentes, trazerem uma bagagem de conhecimentos adquiridos ao longo de seu processo anterior de escolarização, serem parte de um grupo social dotado de características próprias, que eventualmente os diferencia de outras comunidades.
Dos alunos, espera-se que reconheçam e respeitem a função social do professor, certamente marcada por uma formação diversa em relação a deles, tendo em vista seus anos a mais de escolarização especializada e o fato de ter optado por exercer o magistério e ocupar-se dos conhecimentos proporcionados pelo estudo de nossa língua.
Sabe-se, porém, que as condições para a instalação do desejável diálogo entre tais interlocutores muitas vezes estão comprometidos por fatores externos à aprendizagem, determinados por questões de ordem social, econômica, ética, entre outras. Há escolas em que os professores se vêem tolhidos no seu ofício de formar e ensinar porque não conseguem instalar minimamente situações de interação com os alunos. Como eles mesmos encontram grande dificuldade de serem falantes e ouvintes, depara-se com entraves ainda maiores para trabalhar essas competências junto a seus alunos.
O crescente processo de democratização do acesso à escola, que vem sendo implantado no Brasil por sucessivos governos, tem possibilitado a convivência, no espaço escolar, de pessoas de diferentes regiões, classes sociais e idades. Essa diversidade de origens propicia que, no espaço institucional da construção do conhecimento, conviva um grande número de variedades lingüísticas, materializadas em uma pluralidade de discursos.
Diante desse quadro, o ensino de língua materna deve levar em conta alguns fatores para o ‘’ desenvolvimento da competência e habilidade interativa’’:
- os sujeitos que participam do processo de ensino e aprendizagem devem ter consciência de que qualquer língua, entre elas a Portuguesa, comporta um grande número de variedades lingüísticas, que devem ser respeitadas.
- tais variedades são mais ou menos adequadas a determinadas situações comunicativas, nas quais se levam em consideração os interlocutores, suas intenções, o espaço e o tempo.
- cabe à escola propiciar que o aluno participe de diversas situações de discurso, na fala ou na escrita, para que tenha oportunidade de avaliar a adequação das variedades lingüísticas às circunstâncias comunicativas.
Para o desenvolvimento progressivo da competência e habilidade interativa, é importante que o professor de Língua Portuguesa crie condições capazes de inserir o aluno em situações reais de aprendizagem. Nesse sentido, alguns procedimentos são bem-vindos:
- alunos e professores precisam ter clareza sobre as várias situações comunicativas de que participam.
- no transcurso das aulas, os alunos devem ter oportunidades de individualmente, (em duplas ou em grupos) participar de situações dialogadas que implicam graus de formalidades variáveis.
- é muito importante que, nas situações comunicativas os alunos apropriem-se dos papéis de falantes e ouvintes exigidos na interlocução com o outro.
Ainda que, no que diz respeito ao desenvolvimento da competência interativa, tenha dado maior ênfase aos discursos produzidos em situações orais, deve-se deixar claro que essa competência não é exclusiva da expressão oral. No entanto, entende-se que o trabalho com a competência interativa pode ser extremamente benéfico para a criação de condições propicias ao vínculo necessário entre professor e estudantes nos processos de aprendizagem.
A abertura para o diálogo, o respeito à fala do outro, o saber ouvir parecem ser requisitos fundamentais para que a circulação das idéias e dos saberes se dê efetivamente na sala de aula.
Comunicação aqui entendida como um processo de construção de significados em que o sujeito interage socialmente, usando a língua como instrumento que o define como pessoa entre pessoas.
A língua compreendida como linguagem que constrói e desconstroi “significados sociais”.
O caráter sócio-interacionista da linguagem verbal aponta para uma opção metodológica do saber lingüístico do aluno, como ponto de partida para a decisão daquilo que será desenvolvido, tendo como referência o valor da linguagem nas diferentes esferas sociais.
O processo de aprendizagem de Língua Portuguesa deve basear-se em propostas interativas língua/linguagem, consideradas do pensamento simbólico, constitutivo de cada aluno em particular e da sociedade em geral.
A interação é o que faz com que a linguagem seja comunicativa. Esse princípio anula qualquer pressuposto que tenta referendar o estudo de uma língua isolada do ato interlocutivo. Semelhante distorção é responsável, pelas dificuldades dos alunos em compreender estaticamente a gramática da língua que falam no cotidiano.
Enquanto o desrespeito do aluno, normalmente, é explícito; o desrespeito do professor é camuflado, e sutil. E esse desrespeito tem varias facetas. Uma delas é o preconceito de classes. Na Escola Pública, às vezes, no fundo, o professor não acredita naquele aluno simplesmente por sua condição social. Paulo Freire diz que uma das coisas mais cruéis que o sistema nos ensina é detestar o cheiro do pobre. Aprende-se a desconfiar do pobre, a detestar o pobre. Isso é muito complicado. Na escola particular, este preconceito pode ocorrer de forma diferente, porque os alunos pertencem a uma camada de maior poder aquisitivo, sendo comum, inclusive, a tendência a tratar os professores como mais um empregado de casa: Eu estou pagando. É necessário tentar superar, não deixar que o preconceito vicie a relação.
Ao contrário, temos de ganhar esses alunos, seja o menino da camada popular, seja o menino da escola particular, já que estamos engajados num projeto de transformação.
Outra falta de respeito: as faltas constantes do professor ou a falta de tolerância para com os erros dos alunos. Sabemos que tudo isto é muito complicado porque é preciso considerar a situação concreta do professor. É necessário criar um clima de respeito também em relação a ele. Se o professor vem de uma seqüência de desrespeitos, fica difícil manter um relacionamento de respeito para com os alunos.
Lembrando aquele velho chavão ‘’o professor deve vestir a camisa da escola’’’, poderíamos completar insistindo que as escolas devem ‘’’vestir a pele do professor’’.Deve-se, portanto, criar um clima de respeito em toda escola.
Os conflitos entre alunos e professores devem ser enfrentados, antes de qualquer coisa, por eles próprios.
Para isto, o professor deve ter condições de, por exemplo, entabular uma conversa mais particular com algum aluno, se as providências tomadas em sala de aula não forem suficientes para resolver o problema. Se a escola não tiver outra possibilidade, no limite, consideramos ser preferível, então, um membro da equipe ir para a sala de aula e o professor sair com o aluno para ter o diálogo.
Muitos professores, para ‘’não perder tempo’’, acabam perdendo todo o tempo durante o ano, pois o tempo que o professor utiliza com estratégias de sobrevivência, quando não consegue equacionar o problema da disciplina, chega a ser mais de 50% do tempo útil da aula.
A questão não é ter uma equipe de especialistas de plantão para encaminhar alunos (fonoaudiólogos, psicólogos, neurologistas, médicos, assistentes sociais, orientadores educacionais, pedagogos, psicopedagogos, etc.), mas o professor ser formado, ser capacitado para poder fazer melhor o seu trabalho:
A cultura é invariavelmente definida como o tesouro pacientemente amealhado com tudo o que de melhor o espírito humano produziu, sejam as obras dos grandes mestres, seja o conjunto dos saberes disciplinares (conceitos, métodos, representações) que asseguram o atual domínio do homem sobre o mundo, seja, ainda, o conjunto das maneiras de ser individuais e coletivas. (FOUCAMBERT, 1994, p. 98)
A crítica que Foucambert faz aqui é relativa à omissão urbana. Para ele, os subúrbios operários padecem mais o preço do progresso do que a apoteose do pensamento técnico.
Vê-se, portanto, uma necessidade do professor em reduzir as inseguranças e incertezas de seus alunos na comunicação de sala de aula, fazendo-se compreender na Língua Portuguesa e encorajando-os à tomada de riscos em um ambiente confortável e não ameaçador, dando, assim, oportunidades para usarem a língua materna. Essa é uma visão aberta essencialmente para o outro. A comunicação implica uma ecologia cognitiva/afetiva, reconhecendo o direito das outras pessoas, fugindo do conceito de uma única maneira de melhor expressão. Dessa forma a comunicação na sala de aula de Língua Portuguesa, em um processo interativo de troca de significados, precisa ser gerenciada por todos os presentes, não apenas pelo professor, pois, conforme se sabe, a interação é uma co-produção, produtora-ação de todos os participantes, e através do gerenciamento conjunto da interação em sala de aula (o que requer comunicação, e, segundo nossa proposta, via língua materna) que se determinará o desenvolvimento lingüístico dos aprendizes.
Mesmo sendo a aprendizagem o uso de uma língua, atividades basicamente interativas, que dependem de variados tipos de relacionamentos com os outros e com a cultura como um todo, o processo de aprendizagem de Língua Portuguesa é também fortemente influenciado por fatores de ordem afetiva que residem no aluno, como: baixa auto-estima, desinteresse, entre outros podem impedir a aquisição de Língua Portuguesa no Ensino Médio, visto que representam barreiras para que o insumo possa ser compreendido e internalizado.
Acredita-se que os alunos começam o estudo de Língua Portuguesa e motiva-se para tal por uma miríade de razões (complexidade da motivação), mas é importante ter em mente que seus desejos de progredir ou alcançar uma certa proficiência na língua materna vai depender de uma experiência positiva com esse estudo. Para uma experiência positiva em sala de aula, o aluno sofrerá influências de várias direções, quer sejam pela atitude do professor, seu relacionamento com os colegas, como também pelos princípios metodológicos e conteúdos trabalhados na classe, que devem ser intrinsecamente analisados e trabalhados, ainda que o professor possa tornar um assunto chato em um assunto interessante ou vice-versa.