Sobre trânsito e infratores
Quando estava entre os que procuravam fazer a TV Cidade João Pessoa, produtora/emissora integrada aos órgãos da Prefeitura da capital da Paraíba, eu tive a idéia de realizar um documentário que abordaria a história da bicicleta.
O assunto certamente deve ter sido tratado já em outras televisões a contar como foi inventado tal meio de transporte e dizer que é considerado, sob muitos aspectos, o mais saudável entre todos, porque também apontado como politicamente correto pelos naturalistas ecologistas humanistas de todo mundo.
Mas o assunto não surgiu apenas porque quero também desenvolver tal consciência em telespectadores, ou porque me causa tristeza ver o abandono absoluto a que foram submetidas bicicletas. Em qualquer depósito de condomínios ou em garagens, você poderá observar a quantidade enorme delas enferrujando, de pneus vazios, mesmo quando novas, enquanto seus donos e donas, crianças e adultos, preferem curtir horas e horas diante de uma tela de computador, de uma TV ou o conforto sedentário dos automóveis a fazer diminuírem seus níveis de preguiça, obesidade, colesterol e possibilidades de sofrer enfartos.
Além disso, graças a problemas de colunas (que, desconsiderando problemas congênitos, também existem em muitos graças a não praticarem o ciclismo, ou qualquer outra atividade física), alguns não querem ser vistos pedalando uma bicicleta porque é “coisa de pobre”, como já ouvi dizer um imbecil; menos ainda se não forem aquelas bicicletas sofisticadas que, entre outras mais simples, dizem dos diferenciados níveis sociais de seus donos.
A despeito de não serem desportistas no dia a dia, além de montados em bicicletas ultra modernas, muitos fazem questão de aparecer pedalando munidos com todos aqueles exagerados acessórios de segurança a fazer-nos pensar serem mais cuidadosos do que realmente são – uma vez que, usando caras bicicletas e caros acessórios, estimulam ladrões a persegui-los.
Minha intenção de realizar o documentário foi também abordar a questão talvez mais importante no que diz respeito à não utilização das bicicletas pela população de minha cidade e, provavelmente, da sua: a quantidade de ciclovias existentes nas ruas e avenidas – embora nossa Prefeitura já ande ensaiando seus primeiros projetos de aberturas de espaços para ciclistas que, em sua maioria, atualmente andam entre os ônibus, caminhões, carros, outros ciclistas (na contramão), eventuais patinadores e pedestres em calçadas e, infelizmente, no meio das ruas e avenidas.
Atualmente, meu principal meio de transporte tem sido a bicicleta. Não apenas porque, graças a Internet, aos poucos não preciso mais tanto estar em locais muito distantes de meu apartamento para realizar meus trabalhos – o que já deveria fazer grande parte dos trabalhadores a evitar encher as ruas de quantidades desnecessárias de veículos – mas também porque, desde criança, sempre gostei de andar de bicicletas.
Mesmo que, como observei, nossa Prefeitura ande realizando os primeiros projetos de ciclovias, são ainda muito restritos os locais onde se pode utilizar bicicletas com segurança. O problema maior em nosso trânsito, todavia – como de resto nos outros Estados brasileiros – são as relações desrespeitosas existentes (também) entre transeuntes, sendo fundamentalmente a seguinte a hierarquia do desrespeito entre uns e outros: os motoristas de ônibus e caminhões não respeitam o espaço dos motoristas dos carros, que não respeitam os dos motociclistas e ciclistas, que não respeitam os dos pedestres que, por sua vez, não respeitam o espaço dos ciclistas, que não respeitam o espaço dos pedestres, sendo todos forçados a respeitar o espaço dos caminhões e ônibus apenas para, malgrado a ousadia dos motoqueiros e de certos ciclistas, fazer jus à lei do império dos maiores e mais fortes num exemplo claro de que, apesar dos esforços a manifestações do bom senso, a maioria de nós parece ser ainda um bando de irracionais.
Fui motorista de velocípedes e carrinhos desde os cinco anos, motorista de bicicleta desde os nove, de carro desde os dezesseis e nunca bati em nada nem ninguém. Sempre disse que, antes de poderes políticos e financeiros, se você quer conhecer os níveis de razoabilidade de alguém, dê um carro pra ele ou para ela dirigirem.
Em relação a observações sobre nossas performances no trânsito, apesar do considerável número de infrações e acidentes ainda existentes, de alguns anos pra cá houve significativa melhoria nas performances de motoristas de veículos mecânicos de modo geral – embora os pedestres continuem a dar fartos exemplos de que, além de uma carteira de identidade, deveriam possuir um documento que lhes atestasse estarem habilitados a dirigirem o próprio corpo, sendo então passíveis de multas por eventuais infrações.
Radicalizo para dizer que não entendo o que atrai o transeunte a andar no meio da rua, por exemplo, quando há uma calçada a ele destinada, embora muitas calçadas não estejam ainda em condições de atender as necessidades dos pedestres e, a despeito de certos perigos, possa entender as razões que levam ciclistas como eu a procurar dividir com segurança o espaço que prioritariamente está destinado ao pedestre – uma vez que, como observei antes, além de existirem defensores do desenvolvimento das relações entre pedestres e ciclistas nas calçadas, os que dirigem ônibus, caminhões, carros e motos (que, de maneira alguma, deveriam ultrapassar veículos pela direita ou andar próximo do meio fio das rodovias como se fossem bicicletas) tem demonstrado não ter nenhuma consideração pela vida de ciclistas.
Quanto a estes, embora demonstrem não ter o mesmo cuidado que eu quando (ainda) de bicicleta em trânsito pelas calçadas, será preciso que, como motoristas de outros veículos, ciclistas deem a atenção que dou a manutenção e cuidadosa condução de seus meios de transportes com a consciência de que, sem que importe o tamanho ou a natureza de seu veículo, será sempre a baixa velocidade, bem como as eficiências de nossos freios de ansiedades e animosidades, tanto quanto de rodas, que melhor nos ajudarão a manter a harmonia no trânsito, em todas as relações e direções.