A Verdadeira função da Orientação Educacional
A VERDADEIRA FUNÇÃO DA ORIENTAÇÃO EDUCACIONAL
NA ESCOLA
Autora: Marilene Meira de Camargo
UNICENTRO – Universidade Estadual do Centro–Oeste
Curso: Pedagogia: Docência e Gestão Educacional
Orientadora: Profa. Dra. Cláudia Cabral Rezende
Resumo: Este artigo tem como objetivo averiguar sobre a função exercida pelo Orientador Educacional nas escolas brasileiras desde a sua origem. Esta pesquisa qualitativa realizou-se a partir de uma fundamentação teórico-bibliográfica de publicações de livros, artigos e documentos sobre o tema, além do embasamento empírico que partiu das discussões entre professores e alunos, ocorridas durante a graduação, no curso de Pedagogia da UNICENTRO, entre os anos de 2004 a 2008. Buscou-se investigar os principais movimentos realizados por essa categoria, suas lutas para definir e redefinir seu papel no contexto da educação, bem como as modificações do curso de Pedagogia que também procurava sua identificação, reconhecendo que a formação de um pedagogo é muito mais que a aquisição de saberes padronizados, de hábitos e habilidades profissionais. Através dessa investigação buscamos demonstrar a relevância da função do Orientador Educacional, defendendo assim, a necessidade do regresso dessa função nas instituições, observando a fundamental necessidade deste profissional e a qualidade dos objetivos de sua ação na elaboração de novos projetos, usando da interação de alunos, pais, professores e comunidades para trabalhar as questões sociais existentes. Pretendeu-se, com este estudo, mostrar que tais projetos devem ser contínuos, dinâmicos e permanentes, representando dentro da escola uma força de resgate da humanização.
Palavras-Chave: educação escolar; orientação educacional; orientador educacional; política educacional; pedagogia.
Abstract: This article aims to find out about the work performed by the school in Brazilian schools since its inception. This qualitative research was carried out from a theoretical justification of literature-publications of books, articles and papers on the subject, beyond the empirical rock that broke the discussions between teachers and students, during the graduation, in UNICENTRO the course of Pedagogy, between the years 2004 to 2008. The aim was to investigate the major moves made by this category, their struggles to define and redefine its role in the context of education, and changes the course of pedagogy that also sought to identify them, recognizing that the formation of a pedagogue is much more than the acquisition of knowledge standard of professional skills and habits. Through this investigation we sought to demonstrate the relevance of the function of the school, defending well, the need for the return of this function in the institutions, noting the fundamental need for this work and quality of the goals of its action in the development of new projects, using the interaction of students, parents, teachers and communities to work existing social issues. We were asked, with this study, show that such projects should be continuous, permanent and dynamic, representing the school within a rescue force of humanization.
Key words: school education, educational guidance, school counselor, educational policy, pedagogy.
Em 1924 foi criada a Associação Brasileira de Educação (ABE); uma organização que, conforme Romanelli (1986), tomou forma de movimento para comprovar os propósitos de tomada de consciência e compromisso de educadores, assumida por uma luta que durariam alguns decênios. Essa associação era liderada por um grupo de aproximadamente vinte e sete educadores brasileiros com idéias renovadoras e ideológicas; os mesmos que criaram o Manifesto dos Pioneiros da Educação. Entre eles destacam-se Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira, Afrânio Peixoto, Roquette Pinto, Cecília Meirelles. Este grupo realizou várias conferências e encontros onde foram debatidas questões sobre a gratuidade, obrigatoriedade e laicismo na educação. Este manifesto enfatizava a educação como um problema social e traçava novas diretrizes para a educação, buscando conscientizar os educadores sobre tal problema. Mais tarde, esse movimento renovador iria atingir o projeto de Lei e Diretrizes e Bases da Educação Nacional. A ABE realizou várias conferências que representavam conflitos entre os reformadores que lutavam a favor da democratização da escola, e os católicos, que até então monopolizavam a educação, tendo-a como privilégio de classe.
Segundo Marques (1994), essa mobilização dos pioneiros não conseguiu sobreviver à supremacia da igreja. A luta pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional concentrou-se em manobras parlamentares e debates dispersos, permanecendo a ABE inerte e silenciada. Porém, na história da pedagogia brasileira, o Manifesto dos Pioneiros da Educação foi um marco importante, pois conscientizava a defasagem da educação e o desenvolvimento da época.
De acordo com Romanelli (1986), a reforma denominada Francisco Campos foi o início de uma ação mais objetiva do Estado em relação à educação que refletia as contradições políticas e sociais da época. Essa reforma contou com uma série de decretos. O decreto nº. 19.850 de 11/04/1931 que criava o Conselho Nacional de Educação (CNE), que tinha a finalidade de firmar às diretrizes gerais do ensino primário, secundário, técnico e superior. Os decretos nº. 19.851, 19.852, de 11/04/1931 que instituíram o Estatuto das Universidades Brasileiras, que propunham a incorporação de pelo menos três institutos de ensino superior e o decreto 19.852 que reorganizou a Universidade do Rio de Janeiro, implantando a Faculdade de Educação, Ciências e Letras, devido à necessidade de formação do magistério secundário. O decreto 19.890 de 18/04/1931 dispôs sobre a organização do ensino secundário, tendo como finalidade exclusiva a formação do homem para todos os grandes setores da atividade nacional e o decreto nº. 20.158 de 30/06/1931 que organizou o ensino comercial nos níveis médio e superior, regulamentando assim a profissão de contador.
Contudo, essa reforma tratou de organizar somente o sistema educacional das elites, ficando, as demais, subordinadas ao jogo de forças que essas camadas manipulavam na estrutura do poder.
De acordo com a autora supracitada, em 1934 é criada a Universidade de São Paulo (USP) pelas normas do decreto 19.851 de 11 de abril de 1931. A USP era constituída pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, que tinha como objetivo a formação de professores para o magistério secundário. Assim, em 1937 diplomam-se no Brasil os primeiros professores licenciados.
Para Romanelli (1986), através da Constituição de 1937, durante a ditadura do governo Vargas, se instituiu oficialmente a discriminação social através da escola. No seu artigo 129 promulgou que: “O ensino pré-vocacional e profissional é destinado às classes menos favorecidas”. Com isso, estaria orientando a escolha da demanda social da educação fazendo com que o movimento renovador se calasse, pois modificava fundamentalmente o dever do Estado e limitava-lhe a ação quanto à educação.
As Leis Orgânicas do Ensino, em 1942, através do então Ministro Gustavo Capanema, abrangia os ramos do ensino primário e médio com os seguintes decretos: Decreto-lei nº. 4.073 de 30/01/1942, a Lei Orgânica do Ensino Industrial, o decreto-lei 6.141 de 28/12/1943, e o decreto-lei 9.613 de 20/08/1946, que promulgavam os ensinos de ofícios, ou seja, os ensinos técnicos profissionalizantes, exigindo uma formação profissional, constituindo uma obrigação dos empregadores para com os aprendizes. O Decreto-lei 4.048 de 22/01/1942 cria o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) destinado a organizar e administrar escolas de aprendizagem industrial em todo o país. O Decreto-lei 4.244 de 09/04/1942 do Ensino Secundário teria por finalidade formar no adolescente uma cultura geral, elevando uma consciência patriótica e humanística, acentuando assim, a velha tradição do ensino. O Decreto-lei 8.529 de 02/01/1946 da Lei Orgânica do Ensino Primário, instituindo a obrigatoriedade e gratuidade, contribuindo assim para uma diminuição da taxa de analfabetismo. O Decreto-lei 8.530 de 10/01/1946, sobre a Lei Orgânica do Ensino Normal, tendo como finalidade uma formação de pessoal docente, necessária às escolas primárias e que também habilitaria administradores educacionais.
Segundo Santos (1986), é nessa época que a Orientação Educacional, mais como uma Orientação Vocacional e Profissional, teria um papel importante a desempenhar. A ABE ofereceu curso de extensão sobre Orientação Educacional aberto a professores interessados em prestar serviços de Orientação Educacional em suas escolas, pois no contexto político, era necessário para o ajustamento do indivíduo às necessidades de ordem social.
Grinspun (2006) enfatiza que foi através das Leis Orgânicas do Ensino, que se fez necessário o orientador pedagógico, pois, esse profissional assumira funções de caráter terapêutico, preventivo, psicometrísta, identificando dons, aptidões e inclinações dos indivíduos.
Conforme Santos (1986), em 1946, quando é votada nova constituição, o nacionalismo e o populismo caracterizavam a vida política e a Orientação Educacional já se movimentava em torno de uma nova identidade. É organizado o I Simpósio em nível nacional com a colaboração do MEC (Ministério da Educação e Cultura) e do CADES (Campanha de Difusão e Aperfeiçoamento do Ensino Secundário). Os dirigentes eram, em sua maioria, religiosos e foram escolhidos pelo MEC. Essa função surgiu como mais uma das propostas de inovação educacional, que serviria para analisar as aptidões e adaptação do aluno à escola. Sendo assim, a Orientação Educacional seria mais uma Orientação Profissional com bases científicas e técnicas para ajustar o aluno a uma plena realização vocacional, com métodos de aconselhamento, atendimento individualizado e coletivo, psicologizante, tentando fazer uma articulação entre a escola e a família.
Para a autora, neste simpósio, o tema em discussão foi a Prática e a Implantação da Orientação Educacional nos ensinos de 1º e 2º grau. Este evento foi considerado o mais representativo, por ser o primeiro, e foi também o que ocasionou a organização da categoria. Este simpósio tenta definir o conteúdo da Orientação Educacional, bem como delimitar o seu campo de ação. Gildasio Amado, diretor do ensino secundário da época, afirmava que: “A base da diversificação da escola está justamente na Orientação Educacional”, expondo assim qual era a expectativa do governo sobre a Orientação Educacional.
No período de 1957 a 1967, foram realizados mais dois simpósios e dois seminários que discutiram os fins e os principais problemas da Orientação Educacional. Não alterando em nada o que foi proposto no primeiro simpósio. A Orientação teria um papel importante para desempenhar; esse profissional selecionaria, testaria e encaminharia os alunos para os cursos profissionalizantes, com base nos interesses e aptidões dos alunos, mas, mesmo assim, o sistema educacional continuava elitista.
A formação da Orientação Educacional se desenvolvia em escolas de nível secundário e em estabelecimentos particulares. Um dos resultados desses eventos foi a instalação, em 1959, em dezenove faculdades de Filosofia, de um curso de preparação em nível de pós-graduação de Orientadores Educacionais, financiados pelo MEC (Ministério da Educação e Cultura).
Conforme Santos (1986) é nesse contexto que a educação vai se tornando interesse econômico e de segurança e que ocorre a discussão da questão educacional nacional entre defensores do ensino particular e os defensores da escola pública, promulgando assim, a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) 4.024/61 da reforma universitária e da reforma do ensino de 1º. e 2º. graus, que atingiram diretamente as escolas técnicas, industriais e normais, extinguindo-se os cursos clássicos e científicos, assumindo assim, uma tendência tecnicista, em um aspecto qualitativo, com técnicas educacionais e formação profissional. Regulamentava também a concessão de bolsas, a aplicação de recursos para o sistema público e para a iniciativa privada e previa a cooperação entre União, Estados e Municípios.
Para Grinspun (2006), foi através dessa Lei de Diretrizes e Bases que o Orientador ganhou status de Orientador Educativo e Vocacional, identificando aptidões individuais, estendendo à todos os alunos, utilizando-se de todos os elementos da escola para desenvolverem esse trabalho. Ao Orientador Educacional caberia a orientação escolar, psicológica, profissional da saúde, recreativa, familiar.
Conforme Santos (1986), através da Lei 5.540/68, em seu artigo 30, parágrafos 1º e 2º, é definido que a formação dos especialistas em educação, inclusive a de Orientador Educacional, se daria no nível da graduação.
O I e o II Encontro Nacional de Orientação Educacional, teve como finalidade a fundação do corporativismo, para se mobilizarem contra a Lei 5.540/68, que eliminou o status de desse profissional; que antes era formado no nível de pós-graduação e que, com a referida lei, pelos cursos de Pedagogia, passou a formar os chamados Especialistas em Educação no nível de graduação. Foi quando a categoria se fortaleceu para o II Encontro, que tinha como finalidade a criação da FENOE (Federação Nacional de Orientadores Educacionais) para representar os direitos de seus associados em todas as estâncias, colaborar com o Estado e terceiros no campo educacional e também esforçar-se pela legitimidade da sua categoria.
Com a revolução conhecida como Golpe de 64, as iniciativas então tomadas foram desativadas, agravando-se a crise na educação. Surgiram os acordos MEC/USAID (Ministério da Educação e Cultura e Agency for International Developemed), para se adequar o sistema educacional ao modelo do desenvolvimento econômico; o tecnicismo. O Banco Mundial começou a prestar cooperação técnica à educação brasileira. Essa ruptura se deu somente no plano político e não no nível sócio econômico e continuou também na educação, visando ideologizar mais do que ensinar. As reformas dos ensinos de 1º e 2º graus reforçaram o modelo elitista e tecnicista da educação, ensejando a universalização do ensino profissional no nível médio, dificultando assim, o acesso das camadas populares ao ensino superior. A reforma universitária tirou o padrão de excelência de graduações e pós-graduação das escolas públicas, oferecendo assim a absorção desses padrões pelas escolas particulares. As instituições privadas passaram a ter uma qualidade superior as instituições públicas, o que garantia a ascensão das elites ao ensino superior, continuando a manter a seletividade e exclusão das classes populares no país. (Rayel, 2004).
Ocorre uma crise do setor educacional que, de acordo com Romanelli (1986), é reforçada pelas pressões internas e externas que levam o governo a optar pela modernização do sistema educacional, o que resulta na perda da autonomia da universidade, servindo à manutenção de uma estrutura de dominação.
Santos (1986) afirma que através dos fundamentos ideológicos do binômio desenvolvimento e segurança a escola subjulgava-se de modo essencial ao projeto de desenvolvimento econômico e social, com o importante papel de formar o capital humano. Ela moldaria pela disciplina, submissão e conteúdo transmitido, o profissional que melhor se ajustasse as necessidades dos capitalistas. A idéia era que através da profissionalização, que era compulsória e universal, os estudantes procurariam logo um emprego, já que este não era considerado difícil, devido ao milagre econômico que anunciava empregos e salários crescentes. Porém, a realidade era outra, o sistema educacional não tinha capacidade para essa transformação, nem que fosse implantada gradativamente. E as escolas particulares forjavam a profissionalização porque o que sua clientela queria, na verdade, era a seleção pelo vestibular, o que vinha reforçar um componente fundamental da realidade escolar capitalista.
Segundo Marques (1992), o curso de Pedagogia foi criado em 1939 com um esquema de três anos para licenciatura e destinava-se ao magistério nas escolas normais, e mais um ano de didática para bacharelado. Exercia as funções de Técnico da Educação, as quais eram indefinidas. Destinava-se ao magistério nas escolas normais e possuía pouca habilitação legal.
Com a primeira LDB 4.024/64, o curso de Pedagogia foi reduzido à licenciatura de professores que atuassem nas matérias pedagógicas do Curso Normal e os Especialistas de Educação que iriam desenvolver tarefas não docentes da atividade educacional (bacharelado). Porém, este curso era criticado por faltar conteúdo próprio.
Através da Lei 5.540/68, de acordo com o parecer 252/69, foram determinadas as licenciaturas em habilitações e a formação dos especialistas de educação, (supervisor e orientador educacional, administrador e inspetor escolar), acrescentando assim, as responsabilidades desses profissionais, impondo com urgência a reformulação do curso de Pedagogia e das licenciaturas.
Conforme Santos (1986), em 1970, o 1º Congresso Brasileiro de Orientação Educacional (CBOE) revelou preocupação com um trabalho científico, tendo como referencial teórico a Psicologia nos currículos de formação deste profissional, vinculando a Orientação Educacional à política administrativa. Apresentava projetos mais específicos para serem trabalhados pelo Orientador Educacional como: operação recuperação, operação rendimento, escola-família, mas não refletia, na dimensão necessária, a realidade concreta vivida nas escolas, ou seja, apresentavam auxílios aos Orientadores Educacionais para um desenvolvimento de sua função mais eficiente e produtiva, do primário ao ensino superior. Nesse Congresso demonstra-se também a contínua luta pela definição de seu papel e de uma legislação que garanta o seu espaço profissional, através de reivindicações de benefícios para a categoria. Para o governo, organizar a categoria de orientadores educacionais tinha como propósito que lhe servisse de base para diversificação da escola, enquanto que ele (governo) garantia privilegias como o profissional da seletividade.
Segundo Grinspun (2001), a Orientação Educacional legitimou-se pela obrigatoriedade com a LDB 5.692/71, que complementa a lei 5.540/68, surgindo com a finalidade de qualificar para o trabalho, através da profissionalização, com sondagens no 1º grau e habilitações profissionais no 2º grau.
Santos (1986) afirma que o fato da LDB 5.692/71 garantir a obrigatoriedade da Orientação Educacional, não garantia a sua implantação nas escolas, o que fez com que esse movimento da categoria não perdesse tempo quanto a conquista deste lugar no sistema educacional.
Ao participar do III Encontro Nacional de Orientação Educacional (1971) e do 2º Congresso Brasileiro de Orientação Educacional (1972), Garcia (1991), defendeu o compromisso de se construir uma escola de qualidade para todos que visava informar aos alunos as oportunidades educacionais e ocupacionais oferecidas pelas escolas de 1º e 2º graus e pelo mercado de trabalho, buscando técnicas mais adequadas para sondar aptidões e interesses para desenvolver o auto-conhecimento e o conhecimento do mundo.
Segundo Santos (1986), o 2º Congresso tinha como primeiro objetivo a definição de técnicas, processos e métodos. Havia uma distância entre os fundamentos, intenções e o preparo do orientador. A idéia era formar um Orientador Educacional humanista, porém, o sistema cobrava um profissional detector de técnicas que garantissem a produtividade das escolas. Essa polêmica se dava entre os educadores tradicionais e os progressistas. O segundo objetivo era o papel da igreja na formação dos Orientadores Educacionais, pois a presença de padres e freiras liderava a categoria.
As reivindicações apresentadas neste evento se delineavam à um maior desempenho e uma maior compreensão do seu lugar no sistema, e também, maiores recursos do governo para realização dos programas de formação, preparação e treinamento do profissional, centros de pesquisa regionais, bibliotecas das escolas com materiais de diversas profissões, criação de órgãos de supervisão em Orientação Educacional nas secretarias de educação. Esperava-se com isso, uma verdadeira revolução pedagógica, mas na verdade, ela serviria para um ousado propósito ideológico: mascarar as contradições sociais da educação. Essas eram as duas dúvidas: a indefinição de sua formação humanista, e o preparo para a sondagem e orientação de aptidões para o trabalho, o qual estava se tornando cada vez mais desqualificado e alienado.
Conforme Rayel (2004), com a transição da ditadura militar para a nova república o Congresso Constituinte e entidades da sociedade civil se articularam para a elaboração de uma nova Constituição e também uma nova LDB.
Conforme Garcia (1991) o IV (1973) e V (1975) Encontro Nacional de Orientação Educacional, e o 3º(1974) e 4º (1976) Congresso Brasileiro de Orientação Educacional serviram para regulamentar a profissão conforme o artigo 10º da LDB 5691/71, passando a exigir desse profissional uma constante atualização e comprometimento. Exigia-se que os temas dos encontros e congressos fossem desenvolvidos por Orientadores Educacionais, com a participação de professores e estudantes. Fizeram também um estudo de suas várias funções e uma possível abertura no mercado de trabalho. O currículo já era percebido como instrumento de trabalho, ficando evidente a unidade de diversidade. Neste momento que se concretiza a contradição dessa profissão: ser um profissional desenvolvido e direcionado pelo sistema ou um profissional comprometido com a prática pedagógica.
Conforme Santos (1986) no IV Encontro Nacional de Orientadores Educacionais cujo tema era A filosofia do Orientador Educacional, a categoria era chamada a mobilizar-se para se fazer cumprir o artigo 10 da lei 5.692/71, que promulgava: Será instituída obrigatoriamente a Orientação Educacional, incluindo aconselhamento vocacional, em cooperação com os professores, a família e a comunidade, visando adequar a orientação, se reduz os objetivos dessa categoria. Com isso há uma preocupação considerável de temas a serem trabalhados, numa tentativa de revisão de tarefas do orientador educacional, pois a categoria se sentia perdida diante da solicitação da referida lei, sendo que a categoria tinha experiência de leis não sendo cumpridas, e o pior disso tudo era que a maioria dos orientadores se encontrava em escolas particulares, onde desempenhavam papel de psicólogo. Ao Orientador Educacional era fundamental ter uma atitude teórica, uma capacitação técnica, para com isso, desenvolver uma prática eficiente.
No V Encontro Nacional foi realizado numa perspectiva de mudança desse profissional, tendo como prática o processo de acompanhamento psico-pedagógico, e a atuação desse profissional nos três grupos sociais básicos: família, escola e comunidade.
Segundo a autora, o 4º Congresso, tinha como objetivo a ampliação do mercado de trabalho através da abertura de novas áreas de atuação, onde a fundamentação teórica seria exposta dentro de uma abordagem integrada, na qual se realizaria um plano global da escola, onde haveria um currículo e um documento comum de trabalho para todos os profissionais do processo ensino/aprendizagem.
O VI (1977) e o VII (1979) Encontro Nacional de Orientação Educacional, (últimos encontros realizados), tem um marco importante para a categoria. Tentam se articular com o contexto social, sendo estimulados a sair do trabalho individualizado e direto com o aluno para um trabalho integrado da escola sobre o aluno, enfatizando o comprometimento com a realidade brasileira, visando tornar este profissional um agente de mudança. È quando os Orientadores Educacionais começaram a assumir, como categoria, uma posição mais progressista: A Lei não determina a necessidade do orientador nas escolas, mas da orientação Educacional.
Os orientadores já começavam a sair da visão psicologizante e idealizada com que foram formados para tentar compreender e interferir no processo pedagógico. “[...] é onde, pela primeira vez, há referências às classes sociais, dominação, opressão e liberdade, conceitos que daí em diante povoa as discussões, os temários de encontros e congressos.” (Garcia, 1990, p. 15-16).
Segundo Santos (1986), o VI Encontro Nacional foi o marco das tentativas da categoria de inserir o profissional na realidade concreta onde atua, imprimindo uma prática comprometida política e socialmente com as questões pedagógicas, quando ele deveria concentrar sua prática sobre a escola, sendo que o Orientador Educacional teria como obrigação os valores globalizantes e humanizadores da educação e o que deve e pode perceber como problemas da escola. O orientador estava saindo de um trabalho abstrato para um trabalho mais concreto, deixando, o aluno, de ser um caso, para transformar-se em um agente de uma sociedade e de uma cultura. Estendendo, assim, a tarefa de orientação a outros agentes pedagógicos, porém, mantendo para si a coordenação dos trabalhos.
O VII e último Encontro Nacional ocorre em um momento de abertura democrática; o Brasil tinha um índice de pobreza rural e urbana que teria que ser vencido. Era essa realidade que os orientadores teriam como elementos básicos para a reflexão e aprofundamento de suas teorias e metodologias, cumprindo assim sua função de agente de mudança. Esse debate foi um dos mais significativos para a categoria, sendo que a afirmação e a negação das suas conjecturas, a posição dos órgãos dirigentes e as linhas divergentes da prática da Orientação Educacional fizeram com que a categoria perdesse em coesão, mas ganhasse em autonomia para enfrentar suas questões internas. Reivindicou que a classe se unisse à outras categorias profissionais para lutar por condições melhores de vida e trabalho para o povo brasileiro.
No 5º, 6º, 7º e 8º Congresso Brasileiro de Orientação Educacional realizados nos anos 1979, 1980 1982 e 1984, conforme Garcia (1990), as discussões eram sobre a elaboração de um código de ética e de um Conselho Orientação Educacional através da FENOE e também sobre a reafirmação da categoria, retomando a psicologia como eixo teórico. Postulavam que fossem tomados, com mais clareza, os avanços que a categoria havia conseguido, e visassem a superação dos conflitos dentro da categoria entre conservadores e progressistas.
No 5º Congresso, o tema gerador foi Novas perspectivas da Orientação Educacional. Um dos maiores problemas da classe residia na falta de mercado de trabalho, do desconhecimento e da valorização da profissão. Essa busca de um novo campo de trabalho seria mais um movimento da categoria pela conquista de espaços privilegiados pelo poder público. Já no 6º. Congresso, um dos objetivos era dar suporte teórico ao trabalho desenvolvimentista da Orientação Educacional que seria o modelo de relação de ajuda, crença na capacidade humana de uma busca na auto-realização. Seu trabalho seria integrar a escola à informações, esforços, experiências, pessoas, facilitando assim o amadurecimento dos alunos e de todos os agentes educativos, para uma transformação. A figura central seria o professor, ele, como facilitador da aprendizagem, atingiria de maneira efetiva todos os alunos, apoiando individualmente os mesmos para que encontrassem suas próprias respostas e a responsabilidades escolhidas.
Conforme Santos (1986), o 7º Congresso teve como objetivo uma retrospectiva do seu movimento, para que se pudesse ter uma tomada de posições mais clara dos avanços que até então a categoria havia conseguido. Discutiram-se questões de ordem social, econômica e política, onde o orientador teve o destaque, valorizando sua renovação em detrimento da renovação social. Em vista disso, foram elaboradas propostas de alterações de formação acadêmica, reformulando seu posicionamento político, considerando a realidade em que estão inseridas e seu comprometimento com as transformações sociais, adequando o currículo, livros, textos à realidade social e cultural de cada região. Formou-se uma comissão por estado para estabelecer critérios à seleção de candidatos, duração mínima dos cursos, desempenho, duração e supervisão dos estágios, reformulação dos currículos e tempo de experiência anterior ao magistério.
O 8º Congresso, cujo tema era: Orientação Educacional: Realidade Brasileira teve como objetivo redefinir a Orientação Educacional, focalizando concretamente a escola, local onde sua prática se dá, explicitando seu papel social e as possibilidades de sua transformação. O que se constata, nesse evento, em nível oficial, é que a categoria se assume como educadores e se une aos demais em defesa de seus próprios interesses e da democratização da escola
Segundo Ribas (1995), nesse período, os Orientadores Educacionais faziam uma análise crítica de seu papel, tentando assinalar a orientação no processo educativo, numa dimensão político-pedagógica.
Para Santos (1986), pelo fato da Orientação Educacional ter surgido como área de conhecimento da Psicologia, tornava-se impossível fazer a distinção. Esse respaldo da psicologia que explicaria e justificaria as diferenças individuais através das etapas evolutivas do homem, dos padrões de aprendizagem e da aplicação de testes, e que servia à proposta pedagógica. O orientador formado nessa ótica psicologizante serviria de repassador do ideário liberal, se propondo a realização do aluno como ser social e como indivíduo, camuflando sua relação com a sociedade real. Ficou assim evidente a distância entre a formação dos orientadores e o trabalho concreto que deveriam realizar. Essas reorientações ficariam de responsabilidades das Instituições de Ensino Superior.
Além de mais verbas para a educação e integração curricular nas diferentes habilitações do curso de Pedagogia, solicitou-se que a FENOE elaborasse um documento sobre a competência do orientador educacional, enfatizando que a sua função não era reduzida ao aconselhamento vocacional. Com isso, criava-se uma nova perspectiva para a Orientação Educacional. A categoria sairia da alienação e entraria no processo da teoria e prática no contexto social e educacional, imprimindo-lhe uma prática comprometida política e socialmente com as questões pedagógicas enfrentadas pela escola no atendimento à maioria da população brasileira, pois lá estaria o seu aluno, datado, situado, social, política e historicamente.
Nos anos de 1990, o Brasil vivia o movimento das Diretas Já. Várias entidades civis e o Congresso Constituinte, iniciaram uma articulação para a elaboração de uma nova Constituição e de uma nova LDB, agora da Educação Nacional. Foi um longo processo com muitos conflitos e teve a participação ampla da sociedade civil, através das camadas trabalhadoras e seus partidos. Porém, surgiu uma série de medidas que concorreram para a privatização do sistema público de ensino, o que acentuou mais ainda a eletizada e excludente educação nacional. Uma nova fase do capitalismo se acentua no Brasil. O FMI (Fundo Monetário Internacional) e o Banco Mundial pressionam os estados Brasileiros pelo seu descomprometimento com as demandas sociais. A crescente onda de privatizações caminha ao encontro do crescente desemprego e deteriorização do padrão de vida, ao aumento da miséria e do analfabetismo no Brasil. (Rayel, 2004).
Durante o 9º e 10º Congresso Brasileiro de Orientação Educacional, nos anos 1986 e 1988, conforme Garcia (1990), o lado progressista foi eleito, inovando assim em forma e conteúdo, apresentando duas linhas de luta: a dimensão político-pedagógica, assumindo a direção da FENOE, e se articulando com todas as associações e institutos de educação para a participação de um Fórum Nacional da Escola Pública e a dimensão político-sindical em que se articulou com os demais trabalhadores, sendo afiliados, alguns, da categoria à CUT (Central Única dos Trabalhadores).
Afirma Grinspun (2001) que toda a prática da orientação está debruçada nesta concepção de educação, como um ato político, como instituição que está intrinsecamente relacionada com as mudanças ocorridas no núcleo da sociedade.
Com a abertura política do país, torna-se presidente Fernando Henrique Cardoso, um professor que surge com propostas de globalização. Neste período, segundo Rayel (2004), a educação passa a ser discutida sobre seu aspecto econômico e desenvolvida sob novos padrões de qualificação e de competências para o mundo do trabalho, provocadas pela globalização econômica, às novas tecnologias e técnicas de gerenciamento da produção. O governo e o MEC (Ministério da Educação e Cultura) impõem à descentralização e a municipalização do ensino
Conforme a ANFOPE (2004), para o curso de Pedagogia, o esforço se fixava na defesa da docência como formação. Surgiram oposições contra as habilitações e a ANFOPE (Associação Nacional de Profissionais da Educação) assumiu esse processo como um todo, extinguindo-se, assim, as associações de Orientação Educacional.
De acordo com a LDB 9.394/96 extinguiram-se dos cursos de Pedagogia as habilitações de Orientação e Supervisão Educacional por concluírem que o curso de Pedagogia estava fragmentado dentro do atual contexto educacional.
A Orientação Educacional viu-se cerceada em seu trabalho quando mais se intensificou a procura dos culpados pelo fracasso da educação. Começava a se solidificar, recusando um papel cujo desempenho a comprometia e mostrava suas reais possibilidades de colaborar para a melhoria da educação brasileira. (Grinspun, 2001)
Através deste breve histórico pudemos perceber que a educação sempre serviu mais à política do que à sociedade, pois todas as decisões tomadas foram devido a crises na economia. As exigências da época fizeram com que a escola se tornasse necessária, e como ela, a profissão do Orientador Educacional, desempenhando um papel ideológico e alienante.
Os Orientadores Educacionais, através de suas lutas, (em congressos, encontros e seminários) buscavam uma fundamentação teórica para uma ação mais competente, buscando demonstrar a amplitude de sua atuação, cujos objetivos demonstravam ser distintos aos que foram criados. Buscou cumprir os papéis que à ela foram designados, geralmente, a favor do sistema excludente e poucas vezes, para a emancipação das camadas populares, pelo fato de estarem sempre ligada as políticas educacionais.
Conforme Grinspun (2001), a Orientação Educacional, na atualidade, caminha na busca da totalidade do aluno, preocupando-se com a ampliação do conhecimento do educando como pessoa, construindo sua personalidade e participando consciente e ativamente de sua própria história de vida, valorizando a realidade de cada aluno.
A Orientação Educacional tinha como foco o atendimento ao aluno-problema, a sua família e os seus desajustes escolares. Voltou-se a prestação de serviços, mantendo o ajustamento e prevenção. Quando finalmente percebem a alienação em que se encontravam e começam a discutir currículos, objetivos, procedimentos, avaliação, metodologia, demonstrando que através das suas lutas conseguiriam, gradativamente, encontrar a sua verdadeira função, identificando que os fatores socioeconômicos, são os que determinam a sua prática, se extinguiu este profissional das escolas. Porém, as escolas particulares continuaram tendo este profissional em seu quadro educativo por entenderem que o Orientador Educacional se faz necessário no contexto da educação.
Concluímos o estudo postulando a necessidade do retorno da função do Orientador Educacional, consciente de que sua prática esteja engajada com as novas tendências da educação, para que possa elaborar novos projetos que promovam a participação do aluno no planejamento das atividades escolares, considerando-o agente participante do processo educacional e social. As novas tendências da educação propõem que se busque formar cidadãos críticos e atuantes. O aluno que é a razão de existir a escola, necessita do trabalho deste profissional, pois é o Orientador Educacional quem se preocupa com a formação pessoal, escolar e para a vida. A Orientação Educacional se faz necessária por ser um mediador entre o aluno e o meio social. Com o regresso da Orientação Educacional torna-se viável este objetivo, pois, sua atuação contribuirá para elaboração de novos projetos com alunos nos quais, por meio de problematizações e através da observações curiosas e da investigação da realidade da sua escola, trabalhando juntamente com demais profissionais, poderão discutir questões como: valores, atitudes democráticas, entre outros temas que visem à inserção da escola no contexto social, político e econômico. A Orientação Educacional poderá contribuir para a transformação da escola em um local de busca constante de soluções de problemas, planejando momentos culturais em que a família, juntamente com seus filhos, possa participar ativamente. Servindo de ligação entre o aluno e a família, compreendendo a realidade, os interesses e as necessidades dos mesmos, e servindo-se disso para elevar o nível cultural da comunidade, através de debates envolvendo questões do dia a dia, este profissional não tem currículo a seguir, podendo assim, usar de fatos marcantes que a mídia transmite como a corrupção, terrorismo, violência urbana, ética, cidadania, entre outros temas, fazendo com isso, que a curiosidade dos alunos possa ser aguçada através de pesquisas, tornando-os assim, conscientes de que podem transformar a sociedade, descobrindo-se como seres que sentem, fazem e pensam.
Conforme Grinspun (2001), quando a escola trabalha as questões sociais, ela está exercendo o seu real papel pedagógico. Todo projeto político da escola deve estar em consonância com o avanço da própria sociedade. O trabalho do Orientador Educacional nessa dimensão é contínuo, dinâmico e permanente. Sua atuação na escola contribuirá para a aquisição do conhecimento a ser construído, oferecendo-lhe os meios necessários para tal atividade.
Referências bibliográficas
ANFOPE/ANPED, 10/09/2004, apresenta Documentos enviados ao Conselho Nacional de Educação visando elaboração das Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia. Disponível em: http://aprender.unb.br/mod/discss.php?d=1558, acesso em 08/08/2008.
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GRINSPUN, Mirian P. S. Zippun (org) et al.,: A prática dos Orientadores Educacionais, 4. ed. São Paulo: Cortez , 2001, 158 p.
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