A Educação de Adultos e suas Necessidades Especiais

A Educação de Adultos e suas Necessidades Especiais

Luiz Eduardo Corrêa Lima

Da mesma maneira que uma criança não é um adulto em miniatura, um adulto também não é uma criança grande e assim, ambos, a criança e o adulto, devem ter tratamentos específicos na orientação das informações que lhes são atribuídas. Os mecanismos que visam instruir e informar os indivíduos humanos devem obrigatoriamente ter essa dimensão de pensamento e devem objetivar cumprir técnicas que permitam fazer a distinção exata entre a criança e o adulto que se quer orientar para que o aprendizado possa ser satisfatório.

Embora as afirmativas acima sejam verdades bastante claras na mente da maioria das pessoas, a prática educacional no mundo até bem recentemente não se preocupava, ou pelo menos não se atinava muito para esse detalhe, que ao contrário do que se pensa não é tão pequeno assim. São muitas mudanças químicas, físicas e principalmente biológicas, as quais geram outras mudanças psíquicas, comportamentais e em última análise, sociais. Essas mudanças precisam ser consideradas no contexto da educação, sendo necessário que se estabeleçam critérios definidos em função da idade dos indivíduos em processo de aprendizagem.

Assim, é certo que a faixa etária e o desenvolvimento ontogenético do indivíduo existente em sua consequência, produzem diferenças significativas em todos os organismos vivos e principalmente no organismo humano. Normalmente essas diferenças se acentuam gradativamente ao longo dos anos vividos, mas, algumas vezes elas surgem de forma abrupta e violenta, desenvolvendo mudanças comportamentais da água para o vinho, as quais possuem causas biológicas distintas e aparentam graus de complexidade extremamente diversificados e bastante significativos.

Pois então, foi a partir dessas constatações que surgiram os postulados iniciais da ANDRAGOGIA (arte de ensinar aos adultos), em oposição a PEDAGOGIA (arte de ensinas crianças). A idéia não é tão moderna assim, pois já existem textos produzidos sobre o assunto desde o final dos anos 60, porém, mais recentemente, com a ênfase cada vez maior na educação de adultos, mormente nos países mais pobres e menos desenvolvidos, a idéia da Andragogia cresceu, ganhou novos adeptos e tem tentado progressivamente sair da teoria para a prática didática.

Um jovem recebe informação, teoricamente imune de qualquer infestação conceitual, ao menos na maioria das vezes é (ou deveria ser) assim e aceita essa informação, ou não, normalmente sem discuti-la do ponto de vista da logicidade, da coerência e mesmo da utilidade, quando muito faz referências ao entendimento. Entretanto, essa mesma informação, quando passada para um adulto, muitas vezes envolve em situações outras, conflitantes ou não, com o aspecto abordado e que o aluno, por força de sua idade e sua vivência, já pode ter vivido ou experimentado de alguma forma, direta ou indiretamente.

Esse fato traz um complicador significativamente maior ao processo de aprendizagem a ser desenvolvido, porque o indivíduo adulto não está pré-disposto, como uma criança, a receber qualquer informação e muitas vezes, quando a recebe, ele quer discuti-la, não só do ponto de vista do seu entendimento, mas também e principalmente da sua condição meritória e da sua relação contextual. O adulto, certo ou errado, tem opinião própria e muitas vezes ele quer e resolve discutir e opinar sobre aquele assunto, de acordo com o grau de informação que ele já possui ou mesmo com a crença que tem sobre aquilo.

Penso eu que isso está certíssimo e que deveria ser sempre assim mesmo, porque entendo ser esse aspecto (a discussão) quem gera o conhecimento efetivo da matéria. A gente só sabe mesmo aquilo que a gente é capaz de discutir. Lamentavelmente a nossa prática pedagógica costumeira não permite esse tipo de debate, por que ela é direcionada para as crianças e “criança não tem que discutir nada tem que aceitar tudo e ponto final”. Nossa Pedagogia é mentirosa, despótica, ditatorial e opressora. Ainda há muitas crianças que a aceitam essa coisa horrível, mas certamente a grande maioria dos adultos não pode se enquadrar nesse modelo arcaico.

Pois é, aqui ocorre o grande embate, porque a grande maioria dos nossos professores não está preparada para essa situação e isso gera um conflito tremendo entre o professor que trata o aluno sem considerar sua idade, sua experiência de vida, sua condição de ser pensante e seu conhecimento prévio e o aluno que, por sua vez, não aceita a imposição do “novo” conhecimento trazido pelo professor, porque ele contradiz muitas de suas convicções. Vou dar um exemplo para tentar ser mais claro na minha indagação.

Imagine que um Engenheiro Agrônomo com poucos anos de carreira, porém com um currículo brilhante e ganhador de prêmios por seu trabalho no desenvolvimento de uma determinada cultura vegetal seja convidado para falar para um conjunto de agricultores que tratam daquela mesma cultura, muitos desses agricultores semi-alfabetizados ou mesmo analfabetos, mas que têm grande conhecimento empírico na produção do vegetal em questão. Dependendo do que o Engenheiro Agrônomo diga, os agricultores vão confrontá-los veementemente e talvez até nem queiram mais ouvir o Engenheiro Agrônomo falar, em função do disparate entre o que é sabido e o que está tentando ser ensinado. É possível até mesmo que haja um conflito maior a partir das discussões.

Quer dizer, é preciso que aqueles professores que ensinam aos adultos tenham conhecimento das práticas que os seus alunos vivenciam e também que estejam predispostos a aceitar o conhecimento inicial que os alunos têm daquilo que vai ser ensinado, para que na troca (isso mesmo: troca) de opiniões haja um ganho para o aprendizado do aluno, que justifique aquela informação dentro do seu universo mental, intelectual e principalmente contextual. Ou seja, para ensinar um adulto, além de informar, é preciso muitas vezes ter que trabalhar a informação e argumentar bastante para conseguir convencer. A recusa do adulto ao “novo” é um direito que ele tem e só o convencimento pode superar esse direito pessoal.

Então, a Andragogia é exatamente isso, o desenvolvimento de técnicas de ensino especiais (próprias) para os adultos, isto é, técnicas de ensino que respeitem, antes de tudo e principalmente, o direito ao conhecimento prévio que o adulto já possui sobre aquela informação que estará de alguma maneira lhe sendo passada. Ministrar aulas para adultos é, por isso mesmo, muito mais difícil e complicado, exige muito mais conhecimento do professor do que dar aulas para crianças e por isso mesmo não pode ser atributo de qualquer indivíduo como se tem visto por aí.

Pois bem, a Andragogia é hoje uma verdade manifesta no mundo e em muitos países estão sendo desenvolvidas técnicas específicas e diferenciadas para o ensino de adultos, mas como anda a situação aqui no Brasil?

Nesse nosso país, nós estamos cheios de escolas para adultos, mas não temos nenhuma escola que prepare professores para ministrar aulas para esses mesmos adultos. Ora, isso é um verdadeiro contra-senso. Em suma, estamos ensinando de forma errada, com as pessoas erradas e mal preparadas, pois temos tratado, em nossas escolas, adultos como se fossem crianças grandes, porque estamos considerando aquela mesma velha e insipiente Pedagogia em todos os casos.

Aliás, cabe ressaltar que é aquela mesma Pedagogia que já está ultrapassada, mesmo para os nossos jovens da atualidade, que está sendo também destinada aos adultos desse país. Se essa prática educacional já não presta para quem ela se dedica, imaginem então para um grupo social diferente e complexo, como são os adultos desse país continental e extremamente diversificado, onde, infelizmente, o conhecimento empírico e a força do trabalho físico individual têm sido a marca do desenvolvimento.

Está na hora de reavaliarmos nossas técnicas educacionais e de pensarmos coletivamente num país melhor, onde todos tenham as mesmas chances e assim consigam minimizar as diferenças sociais com base na competência dos indivíduos. Aliás, está na hora de pararmos de brincar, tratando a escola apenas como maneira de alimentar e enganar alguns indivíduos. É preciso que pensemos mais seriamente na Educação desse país.

A Educação de adultos pode ser um caminho profícuo e pode gerar bons frutos no desenvolvimento do Brasil, porém é necessário um trabalho profundo na formação de professores para atuar nessa área. Infelizmente, quem sai das universidades hoje não tem condições mínimas para cumprir essa árdua e importante tarefa.

Luiz Eduardo Corrêa Lima (53) é Biólogo, Professor de Ensino Superior, Técnico e Médio.

leclima@hotmail.com