A Cimeira EUA-África, entre o fosso das expectativas e o dilema da credibilidade

A capital dos EUA, Washington, sediou a Cúpula de Líderes EUA-África de 13 a 15 de dezembro de 2022, com a participação do presidente Joe Biden e cerca de 50 líderes africanos.

A cúpula afro-americana é a segunda desse tipo, após a primeira cúpula realizada em 2014, organizada pelo ex-presidente dos EUA, Barack Obama.

Motivos da cimeira EUA-África:

Os motivos americanos para acolher esta segunda cimeira Usa-africana, após um intervalo de oito anos, foram múltiplos e diversos, apontando os mais importantes a seguir:

1- A busca de Washington para resgatar o seu papel de liderança global: o presidente Biden quer parecer diferente de seu antecessor, Donald Trump, no que diz respeito ao papel de liderança americana no mundo. Foram quatro anos em que o ex-presidente Trump tem levantado o slogan “America First”, o sr Biden veio com a política de resgatar o papel americano no mundo e fortalecer a credibilidade dos Estados Unidos entre seus amigos e aliados. Depois que o Sr Biden foi a Europa, a Ásia e as outras regiões do mundo, com base nessa abordagem, chegando a hora de passar à África, a exemplo desta cúpula, cujo objetivo é resgatar a parceria com o continente africano.

2- A prontidão de Badin para as próximas eleições presidenciais: tendo outro motivo de dimensão interna americana, o qual é relacionado com a disposição de Biden de anunciar sua candidatura a um segundo mandato nas eleições presidenciais dos Estados Unidos, dirigindo múltiplas mensagens eleitorais, e outras questões de preocupações ambientais sobretudo aos participantes na recente cúpula do clima “COP 27”, realizada na cidade egípcia de Sharm el-Sheikh, mês do novembro passado. O abrigo desta cimeira americana-africana tem também por objetivo enviar uma mensagem ao bloco eleitoral dos afro-americanos, base eleitoral dos candidatos do Partido Democrata, os quais contribuíram muito para sua eleição e chegar à Casa Branca, como Presidente dos Estados Unidos.

3- Ter uma visão americana sobre o continente africano: Depois de anos, olhando para África, como desprovida de importância estratégica, representando uma série de problemas que pesam sobre qualquer relação americana com este continente, uma vez que os Estados Unidos, sob a administração Biden, passou a ver a África como “uma oportunidade, não como um problema. Começando a perceber o enorme potencial econômico do continente marrom, além de seu estoque de minerais raros e importantes em indústrias estratégicas, além de suas vastas florestas e meios ambientais sobre as quais se pode enfrentar os desafios ambientais globais, em termos de absorção de emissões poluentes. Com base na declaração do secretário de Estado dos EUA, Blinken, até 2050, uma pessoa em cada quatro neste planeta será africana, quer dizer que “elas vão determinar o destino não só deste continente, mas do mundo”.

4- Competição das potências internacionais na África: Este motivo é baseado na adoção das sucessivas administrações dos EUA, começando pela administração Obama, por uma estratégia definida sobre a ideia do “retorno da competição das grandes potências sobre Africa”. Trata-se da competição entre os Estados Unidos, China e Rússia. Consequentemente, os Estados Unidos começaram a ver com grande preocupação a crescente influência dessas duas potências na África. Ficando claro para o governo Biden considerou que a China se tornou o maior parceiro comercial de muitos países africanos, uma vez que o volume do comércio chinês com o continente africano em 2021, representou cerca de US$ 261 bilhões, contra US$ 64 bilhões, em termos do volume de Comércio americano com este continente africano, além da ampliação dos investimentos chineses em áreas como energia e infraestrutura.

Assim, Pequim tem transformado esses investimentos econômicos em influência diplomática, resultado de uma cimeira sino-africana que se realiza a cada três anos, constituindo um apoio eleitoral africano em favor das posições chinesas em muitos fóruns internacionais.

Apesar das críticas de Washington aos países africanos contra as verdadeiras intenções da China no continente e os riscos de firmar parcerias econômicas, podendo resultar em pesadas dívidas ou controle chinês sobre a infraestrutura africana; mas a maioria desses países africanos não deu ouvidos.

Dada a necessidade africana aos investimentos chineses, sem qualquer alternativa americana concorrencial para financiar projetos alternativos ou firmar parcerias de desenvolvimento com África, sobretudo no período, antes da segunda cimeira EUA-África.

Os Estados Unidos descobriram que a Rússia também tem sido capaz de apoiar a sua influência em vários países africanos por meio da cooperação militar e venda de armas. A Rússia organizou uma cúpula com países africanos realizada em Sochi, outubro de 2019, tendo em vista a realização de uma próxima cimeira russo-africana 2023. Lembra-se que muitos países africanos recusam a condenar a Rússia, mantendo uma posição neutra em relação à guerra ucraniana.

Também ficou claro para Washington que a influência de seus aliados ocidentais na África, como a França e a Grã-Bretanha, diminuiu muito, incapaz de preencher o vazio dos Estados Unidos ou competir com a ascensão da influência chinesa ou russa no continente africano. Tais fatos levam os Estados Unidos a retornar ao continente africano e sediar esta segunda cimeira americano-africana.

Quanto aos países africanos, os motivos da participação nesta cimeira divergem entre a prova da sinceridade das intenções americanas e o grau de credibilidade na cooperação com África, num clima de competição entre as grandes potências, e defesa dos próprios interesses. No quadro de uma cooperação com a economia dos Estados Unidos, sem abandono da cooperação com a China e a Rússia. Uma vez que os países africanos veem da segunda cimeira Estados Unidos – África, como uma oportunidade para tratar das suas questões da segurança, dos conflitos, da alimentação, do clima, entre outras.

Resultados da cimeira:

Em 8 de agosto de 2022, durante a visita do Sr Anthony Blinken, Secretário de Estado, à África do Sul, os Estados Unidos anunciaram uma nova estratégia para a África, intitulada “Estratégia dos Estados Unidos para África Subsaariana”, envolvendo quatro objetivos ao longo de cinco anos, apoiar as sociedades abertas, proporcionar ganhos da Democracia e segurança, trabalhar para alcançar o desenvolvimento econômico e social, após a pandemia de Corona 19, e lutar contra os problemas de ordem climática e transição energética equitativa.

Ao longo desta estratégia, a Casa Branca considerou que a segunda cimeira EUA-África centra-se no reforço das parcerias com os países do continente nos mais diversos sectores, indo desde os negócios à saúde, a paz e segurança, além da procura de um terreno comum entre os dois lados.

No encerramento dos trabalhos desta cimeira, a Casa Branca anunciou, 15 de dezembro de 2022, um conjunto de iniciativas de cooperação com África, das quais a mais importante prevê investir pelo menos 55 mil milhões de dólares no continente africano, ao longo dos próximos três anos, criando um cargo de representante especial que possa coordenar os esforços relativos à implementação das iniciativas da dita cimeira; o Presidente Biden revelou neste sentido a sua intenção de nomear o Embaixador Johnny Carson, ex-Secretário de Estado Adjunto para Assuntos Africanos, neste referido cargo.

Outras iniciativas foram também anunciadas, das quais a disponibilização de mais de US$ 100 milhões de dólares, a título de Iniciativa para os Jovens Líderes Africanos objeto da inovação e da excelência, além do apoio dos EUA à União Africana a ingressar no G20 como membro permanente, mantendo o Programa de Desenvolvimento Internacional dos EUA, em termos da Corporação Financeira (DFC), com novos investimentos no valor de US$ 369 milhões de dólares para toda a África nas áreas de segurança alimentar, de infraestrutura de energia renovável e projetos de saúde, além de apoiar a iniciativa de Transformação Digital da África (DTA), aumentando o acesso digital e alfabetização no resto do continente por meio de um investimento de mais de US$ 350 milhões de dólares.

A administração dos EUA confirmou ainda a sua intenção de investir US $1,33 bilhão de dólares entre 2022 a 2024, visando a reforçar o trabalho dos profissionais da saúde na África.

Os Estados Unidos e a União Africana anunciaram uma parceria estratégica para a transição aos sistemas alimentares e mercados diversificados da cadeia de abastecimento. A este título, o presidente Biden apresentou uma ajuda de US $2 bilhões destinada à assistência humanitária de emergência para a África, além de projetar mais de US $150 milhões em novos fundos para lidar com a adaptação climática e estimular o investimento em infraestrutura de energia limpa no continente.

Limites de expectativas:

Não há dúvida de que o acolhimento da segunda cimeira americano-africana por Washington e as iniciativas anunciadas pela administração do Presidente Biden no encerramento desta cimeira representam um ponto de viragem na política dos Estados Unidos em relação ao continente castanho, embora as contribuições financeiras associadas com as iniciativas americanas são consideradas modestas e não atenderão às crescentes necessidades de desenvolvimento de mais de 50 países africanos.

Além disso, a maioria dessas contribuições está vinculada à aprovação do Congresso dos EUA, sendo não há garantia de que essas iniciativas vão continuar ou ser financiadas se houver mudança do governo na Casa Branca ou no caso da maioria partidária do Congresso. Resultado, o resgate da credibilidade dos Estados Unidos no continente africano depende do vinculado e da implementação dessas iniciativas no terreno e grau de sua continuidade no futuro.

Lahcen EL MOUTAQI

Professor universitário-Marrocos