Terras para estrangeiros
Nacib Hetti
No momento em que o Brasil precisa, urgentemente, de novos investimentos para geração de empregos, o novo governo pede para se discutir a irracional proibição da compra de terras por empresas estrangeiras com vontade de investir no país. Nelson Rodrigues dizia que o brasileiro tinha complexo de vira lata para caracterizar sua então baixa auto-estima. De lá para cá, as coisas mudaram, com a crescente participação do país no cenário mundial, em praticamente todos os seguimentos culturais, esportivos e econômicos.
Tudo contribui para dar ao brasileiro uma postura mais altiva, com evidente reflexo nas manifestações de soberania. Hoje podemos dizer que somos respeitados como uma economia emergente, com a crescente participação no mercado internacional. De quando em vez, infelizmente, aflora o complexo de “vira lata” adormecido no fundo da alma do brasileiro, que ainda vê no estrangeiro uma ameaça, pronto para roubar nossas riquezas, esquecendo que as instituições estão funcionando a favor do país.
O lamentável parecer da AGU que limita a aquisição de áreas rurais por empresas estrangeiras foi uma recaída. As instituições brasileiras garantem soberania plena sobre o nosso território. O fato de uma empresa estrangeira comprar uma fazenda, para investir em pecuária, agricultura ou reflorestamento não lhe garante direito de soberania sobre a referida área, como se fosse uma extensão do território de seu país de origem. A posse não dá direito ao proprietário de fincar na terra uma bandeira soberana que não seja a brasileira.
Contraditoriamente, na medida em que se limita a compra de terras por investidores offshore, observa-se uma dezena de informações sobre a exploração das águas territoriais e do subsolo brasileiro pelas empresas não nacionais. Entre 2011 e 2015, empresas mineradoras estrangeiras investiram cerca de US$2,4 bilhões. As estrangeiras na mineração do ouro já trabalham a 700 metros de profundidade, com túneis que perfazem 60 km. Nada contra, mas fica a pergunta: por que o estrangeiro pode explorar o subsolo e as águas territoriais, e não pode trabalhar o solo para produzir alimentos?
O Estado brasileiro, por meio de suas instituições administrativas e legais, tem diversos instrumentos para fazer prevalecer sua soberania, pela aplicação de sanções penais até a medida extrema da desapropriação das terras, desde que fique constatado algum tipo de risco, nos aspectos ambiental e trabalhista e quanto a manifestações que desqualifiquem a soberania brasileira sobre o seu território.
A penalização da Chevron pelo vazamento no mar é um exemplo do poder coercitivo das autoridades sobre o investidor estrangeiro. Nós não somos uma colônia despersonalizada e sem mecanismos institucionais para defesa da nossa soberania. Levamos nossas posições em qualquer foro mundial, sugerindo políticas financeiras, econômicas e sociais, mostrando que temos, sim, condições de agir como uma economia de mercado em consonância com as regras que estabelecem as relações de independência das nações.