A VERDADE É RIDÍCULA

 

A China é hoje é o país mais poluidor do planeta. Estranho paradoxo para uma civilização que se desenvolveu na crença do Taoísmo, maravilhosa filosofia que emula a virtude do meio e exalta a sabedoria da natureza. Nos inspirados versos do Tao Te Ching, escritos há mais de 2.000 anos, Lao Tsé já nos adverte do perigo que corremos em consequência do abandono do “caminho natural”, ou seja, o desprezo que a nossa “científica civilização” vota à ordem natural das coisas. “Céu e Terra perduram eternamente. Perduram porque não vivem para si mesmos. Por isso o Sábio vive em silêncio e é sempre o primeiro. Esquece de si e conserva-se. Não aspira a fins egoístas e realiza com perfeição o que empreende”, escreveu ele. Quer dizer: existe uma ordem natural nas coisas. Mas o homem, com seus desejos, suas ambições e sua pretensa sabedoria a desequilibra. Quando sofre as consequências desse desequilíbrio, tenta corrigir e remediar os males que causou. Então inventa conceitos como justiça, direitos humanos, bondade, piedade e tudo o mais que se convencionou chamar de virtudes humanas ou elementos de civilização. Que no fundo, nada mais são do que uma tentativa de remediar o mal que fez a si próprio destruindo a ordem natural das coisas.

Lao Tsé tinha razão. A natureza não faz nada errado nem deixa existir o que não tem utilidade. Tudo que rema contra ela provoca desequilíbrio e desordem. E ela age para restaurar esse equilíbrio. Se a chuva cai nos lugares errados é porque alguma razão existe. Nós provocamos o caos com nossas imensas aglomerações urbanas, ruas e praças impermeabilizadas, lotadas de detritos e resíduos; com estradas que cortam montanhas e destroem florestas, reservatórios e plantações que modificam ambientes e destroem os biomas. A queima de combustíveis fósseis produz a fumaça que contamina o ar e provoca o efeito-estufa. Quando chove, as cidades ficam inundadas de água suja. As terras das encostas, sem anteparos e proteção, rolam sobre casas e estradas. Nas cidades as pessoas morrem em consequência das doenças provocadas pela poluição.

Talvez fosse útil, para todos nós, uma releitura do Tao Te Ching. Ali se diz que a verdade, frequentemente, soa paradoxal. Como a natureza não tem afetos, nem preferências (a natureza não é humana), quem mais sofre com suas respostas, geralmente são as pessoas que estão mais desprotegidas. E nem sempre são aquelas que mais a agride. Como diz Lao Tse, isso também se explica pois quando o sábio ouve falar no Tao (a ordem natural), abraça-o com zelo; quando se trata de um interessado, pensa nele de vez em quando, mas quando é ignorante, ri às gargalhadas. Para o ignorante, que só olha para o próprio umbigo, a verdade que não atende aos seus interesses é sempre ridícula. E o homem, que foi posto no mundo para botar ordem no caos da Criação, é justamente quem promove as maiores desordens.