É FOGO! CORRE TAMANDUÁ!
(Sandra Fayad)
Tristeza é um assunto que tento não abordar, mas – perdoem-me os leitores – hoje é inevitável. As Redes de Rádio e Televisão, bem como os Jornais do Brasil e até do Exterior noticiaram, ao longo da última semana, a devastação provocada pelo incêndio, que já consumiu mais de doze mil hectares do Parque Nacional de Brasília.
Vejo as imagens, leio e ouço as notícias, passo de carro ao lado do Parque enegrecido pela fumaça, assistindo a tudo com enorme tristeza. Choram meus olhos e meu coração perante a dor da natureza que tanto amo.
Nesta época do ano, em que a ausência de chuvas ultrapassa quatro meses, levando a umidade relativa do ar a cair para a marca de 10%, no nosso Planalto Central, a vegetação naturalmente seca do cerrado transforma-se em verdadeiros gravetos. Um simples palito de fósforo é suficiente para causar um desastre de imensas proporções. E parece que foi o que aconteceu mais uma vez. As autoridades dizem que estão investigando, mas seja qual for o resultado apurado ou deduzido – se criminoso ou não – o fato é que justamente aqui, onde estão sendo mantidas, preservadas e estudadas a fauna e a flora em extinção, é que veio acontecer essa tragédia. Nos anos anteriores, não faltou trabalho aos bombeiros nesta área, mas desta vez o prejuízo tomou proporção alarmante e, mesmo com o envolvimento da Defesa Civil, Exército, Ibama, Ministério do Meio Ambiente, Novacap, Caesb, ainda há riscos de aumento do território devastado, pois seis dias depois de iniciado, ainda não se pode afirmar que estão totalmente controladas as chamas. O período das secas começou em maio irá se estender até outubro. Isto já é sabido desde antes da delimitação do Parque, mas só agora que “a porta foi arrombada e escancarada” é que as autoridades determinaram a vigilância da área pelo Exército, para que o fato não se repita.
É tarde. Segundo declarações do Diretor do Parque, serão necessários de cinco a sete anos para que ocorra a recuperação parcial do prejuízo ecológico, que foi objeto da atenção pessoal da Ministra do Meio Ambiente. Agora.
Há quatro ou cinco anos, no início do período das secas, assisti à realização de um trabalho de prevenção coordenado pelo Ibama. Fizeram um acero de dois metros ao longo da cerca paralela à estrada do Lago Oeste e depois pulverizaram o local com um óleo não inflamável. Naquele ano, não tivemos notícia de incêndios no interior do Parque. Se isto pode ser feito e deu certo, então por que não continuaram?
Provavelmente porque não resulta em votos ou novos cargos comissionados.
Especialistas em diversidade genética lamentam a perda de parte do seu trabalho em andamento em toda a extensão dos trinta mil hectares do parque. São dezenas de pesquisas sobre plantas como o pequi, insetos e mamíferos que terão que ser reiniciados. Funcionários do Corpo de Bombeiros relatam que viram até veados campeiros mortos. Sem chances para os jabutis, tartarugas, filhotes de todas as espécies, ovos, lobeiras e, por conseqüência, mais prejuízos para o lobo-guará, espécie já tão dizimada.
Outro animal em extinção que eu já vinha estudando, foi mais de cem por cento sacrificado, já que agora se encontrava no período de gestação.
Trata-se do Tamanduá Bandeira, que também é vagaroso ao locomover-se. Ele é o único mamífero das regiões de campos e cerrados da América Central e do Sul que não possui dentes, batizado cientificamente como Myrmecophaga tridactyla , conhecido, em inglês, por Giant anteater, é da ordem Xenarthra. Nesta ordem estão também os tatus e as preguiças que possuem articulação diferente, por não conter esmalte nos dentes.
Quanto aos demais aspectos físicos, o Tamanduá possui focinho longo e fino, patas com garras compridas e língua que mede de 30 a 40 cm. Nasce com 1,20 kg, com olhos abertos e passam aproximadamente 1 ano agarradinhos no dorso da mãe, onde encontram calor, proteção e alimentação. Os adultos podem pesar até 60 kg e medir 1,20 m de corpo mais a cauda em forma de bandeira, que é um tufo de pelos, de quase um metro. Apresentam uma coloração acinzentada, com faixas diagonais pretas e bordas brancas estendendo-se até o peito e sobre os ombros em direção às costas. Sua gestação dura 190 dias e gera apenas um filhote por ano, que nasce no início da primavera. Vive de 15 a 20 anos.
Possui hábitos de atuação crepusculares. Os casais encontram-se somente na época do período reprodutivo, como no caso da onça, ou então durante a amamentação, no caso das fêmeas. Ele é totalmente solitário e fica dormindo a maior parte do dia em lugares escondidos e cobertos com a própria cauda.
Sua marcha é lenta, dificultada pelas garras que são voltadas para dentro, evitando o desgaste das unhas no contato com o solo, pois é com elas que escava os formigueiros e rompe os duríssimos cupinzeiros.
Alimenta-se basicamente de formigas e cupins (ovos, lagartas e adultos). Funciona como um aspirador de insetos. Destrói os formigueiros e cupinzeiros com as garras dianteiras e come aproximadamente 35.000 unidades por dia. Para aprisionar os insetos, o tamanduá usa a língua fina, comprida e gosmenta.
Em cativeiro, recebe uma “papa” a base de leite de soja, ração de cachorros, carne moída, ovos cozidos, frutas e complementos vitamínicos e minerais. Cupins são oferecidos sempre que possível. Sua extinção deve-se à destruição de seu habitat, já que ocupa principalmente o cerrado, que é um dos ecossistemas mais vulneráveis. Sua extinção é ainda causada pela caça e pelas queimadas, fatais para os tamanduás, pois seu pêlo é altamente inflamável, pegando fogo rapidamente, enquanto tenta escapar no seu passo lento.
Pode-se imaginar o desespero desse e de outros animais, durante o incêndio do Parque Nacional de Brasília. O tamanho do prejuízo pode ser medido, nas palavras do próprio Diretor:
“O Parque Nacional é o habitat de animais em extinção. A morte de um desses espécimes é uma perda significativa”
Considero-me de luto com a destruição dessa grande Reserva, um dos maiores prejuízos para a flora e fauna, devido à falta de planejamento adequado e cuidados básicos por parte das autoridades competentes.
Obs.: Já não tenho lágrimas nem palavras de revolta.
Este texto é de ago/2007
Foto: Mary & Viny
(Sandra Fayad)
Tristeza é um assunto que tento não abordar, mas – perdoem-me os leitores – hoje é inevitável. As Redes de Rádio e Televisão, bem como os Jornais do Brasil e até do Exterior noticiaram, ao longo da última semana, a devastação provocada pelo incêndio, que já consumiu mais de doze mil hectares do Parque Nacional de Brasília.
Vejo as imagens, leio e ouço as notícias, passo de carro ao lado do Parque enegrecido pela fumaça, assistindo a tudo com enorme tristeza. Choram meus olhos e meu coração perante a dor da natureza que tanto amo.
Nesta época do ano, em que a ausência de chuvas ultrapassa quatro meses, levando a umidade relativa do ar a cair para a marca de 10%, no nosso Planalto Central, a vegetação naturalmente seca do cerrado transforma-se em verdadeiros gravetos. Um simples palito de fósforo é suficiente para causar um desastre de imensas proporções. E parece que foi o que aconteceu mais uma vez. As autoridades dizem que estão investigando, mas seja qual for o resultado apurado ou deduzido – se criminoso ou não – o fato é que justamente aqui, onde estão sendo mantidas, preservadas e estudadas a fauna e a flora em extinção, é que veio acontecer essa tragédia. Nos anos anteriores, não faltou trabalho aos bombeiros nesta área, mas desta vez o prejuízo tomou proporção alarmante e, mesmo com o envolvimento da Defesa Civil, Exército, Ibama, Ministério do Meio Ambiente, Novacap, Caesb, ainda há riscos de aumento do território devastado, pois seis dias depois de iniciado, ainda não se pode afirmar que estão totalmente controladas as chamas. O período das secas começou em maio irá se estender até outubro. Isto já é sabido desde antes da delimitação do Parque, mas só agora que “a porta foi arrombada e escancarada” é que as autoridades determinaram a vigilância da área pelo Exército, para que o fato não se repita.
É tarde. Segundo declarações do Diretor do Parque, serão necessários de cinco a sete anos para que ocorra a recuperação parcial do prejuízo ecológico, que foi objeto da atenção pessoal da Ministra do Meio Ambiente. Agora.
Há quatro ou cinco anos, no início do período das secas, assisti à realização de um trabalho de prevenção coordenado pelo Ibama. Fizeram um acero de dois metros ao longo da cerca paralela à estrada do Lago Oeste e depois pulverizaram o local com um óleo não inflamável. Naquele ano, não tivemos notícia de incêndios no interior do Parque. Se isto pode ser feito e deu certo, então por que não continuaram?
Provavelmente porque não resulta em votos ou novos cargos comissionados.
Especialistas em diversidade genética lamentam a perda de parte do seu trabalho em andamento em toda a extensão dos trinta mil hectares do parque. São dezenas de pesquisas sobre plantas como o pequi, insetos e mamíferos que terão que ser reiniciados. Funcionários do Corpo de Bombeiros relatam que viram até veados campeiros mortos. Sem chances para os jabutis, tartarugas, filhotes de todas as espécies, ovos, lobeiras e, por conseqüência, mais prejuízos para o lobo-guará, espécie já tão dizimada.
Outro animal em extinção que eu já vinha estudando, foi mais de cem por cento sacrificado, já que agora se encontrava no período de gestação.
Trata-se do Tamanduá Bandeira, que também é vagaroso ao locomover-se. Ele é o único mamífero das regiões de campos e cerrados da América Central e do Sul que não possui dentes, batizado cientificamente como Myrmecophaga tridactyla , conhecido, em inglês, por Giant anteater, é da ordem Xenarthra. Nesta ordem estão também os tatus e as preguiças que possuem articulação diferente, por não conter esmalte nos dentes.
Quanto aos demais aspectos físicos, o Tamanduá possui focinho longo e fino, patas com garras compridas e língua que mede de 30 a 40 cm. Nasce com 1,20 kg, com olhos abertos e passam aproximadamente 1 ano agarradinhos no dorso da mãe, onde encontram calor, proteção e alimentação. Os adultos podem pesar até 60 kg e medir 1,20 m de corpo mais a cauda em forma de bandeira, que é um tufo de pelos, de quase um metro. Apresentam uma coloração acinzentada, com faixas diagonais pretas e bordas brancas estendendo-se até o peito e sobre os ombros em direção às costas. Sua gestação dura 190 dias e gera apenas um filhote por ano, que nasce no início da primavera. Vive de 15 a 20 anos.
Possui hábitos de atuação crepusculares. Os casais encontram-se somente na época do período reprodutivo, como no caso da onça, ou então durante a amamentação, no caso das fêmeas. Ele é totalmente solitário e fica dormindo a maior parte do dia em lugares escondidos e cobertos com a própria cauda.
Sua marcha é lenta, dificultada pelas garras que são voltadas para dentro, evitando o desgaste das unhas no contato com o solo, pois é com elas que escava os formigueiros e rompe os duríssimos cupinzeiros.
Alimenta-se basicamente de formigas e cupins (ovos, lagartas e adultos). Funciona como um aspirador de insetos. Destrói os formigueiros e cupinzeiros com as garras dianteiras e come aproximadamente 35.000 unidades por dia. Para aprisionar os insetos, o tamanduá usa a língua fina, comprida e gosmenta.
Em cativeiro, recebe uma “papa” a base de leite de soja, ração de cachorros, carne moída, ovos cozidos, frutas e complementos vitamínicos e minerais. Cupins são oferecidos sempre que possível. Sua extinção deve-se à destruição de seu habitat, já que ocupa principalmente o cerrado, que é um dos ecossistemas mais vulneráveis. Sua extinção é ainda causada pela caça e pelas queimadas, fatais para os tamanduás, pois seu pêlo é altamente inflamável, pegando fogo rapidamente, enquanto tenta escapar no seu passo lento.
Pode-se imaginar o desespero desse e de outros animais, durante o incêndio do Parque Nacional de Brasília. O tamanho do prejuízo pode ser medido, nas palavras do próprio Diretor:
“O Parque Nacional é o habitat de animais em extinção. A morte de um desses espécimes é uma perda significativa”
Considero-me de luto com a destruição dessa grande Reserva, um dos maiores prejuízos para a flora e fauna, devido à falta de planejamento adequado e cuidados básicos por parte das autoridades competentes.
Obs.: Já não tenho lágrimas nem palavras de revolta.
Este texto é de ago/2007
Foto: Mary & Viny