A cortina de fumaça da Exxon

(Sobre uma mentira precisa e convenientemente lucrativa)

Nos anos 60 a Exxon iniciou pesquisas sobre a possibilidade de aquecimento global, causado pelo acúmulo de CO2 na atmosfera, decorrente da queima de combustíveis fósseis.

Em um documento interno de setembro de 1982, cientistas da Exxon resumiram o consenso dos especialistas sobre o aquecimento global causado pelo homem e a consistência de suas próprias pesquisas com esse consenso:

“O consenso é de que uma duplicação do valor pré-revolução industrial de CO2 atmosférico resultaria em um aumento da temperatura média global de 3,0 ± 1,5 ° C... Há unanimidade na comunidade científica de que um aumento de temperatura desta magnitude traria mudanças significativas no clima da terra, incluindo a distribuição de chuvas e alterações na biosfera... os resultados de nossa pesquisa estão em consonância com o consenso científico sobre o efeito do aumento CO2 atmosférico sobre o clima.”

Em 89, considerando o fato de que a percepção do aquecimento global poderia conduzir a uma redução no consumo de petróleo, e, consequentemente, de seus lucros, a Exxon alterou sua diretriz pública. Passou então a defender e financiar a posição contrária, argumentando haver um desconhecimento sobre o tema. Durante os 20 anos seguintes, então, a Exxon defendeu e financiou a posição: “não sabemos se o aumento do CO2 na atmosfera causa o aquecimento do planeta”.

Até hoje ouvimos ecos dessa frase, repetida aqui e ali.

Essa mentira pautou inúmeros debates sobre as mudanças climáticas, embora, sob meu ponto de vista, fosse apenas uma cortina de fumaça. Explicarei.

Ninguém tem dúvida de que a queima de combustíveis fósseis gera a fumaça que se acumula na atmosfera, boa parte dela sob a forma de CO2. Também não há dúvidas de que a concentração de CO2 atmosférico tem aumentado em decorrência dessas emissões, nem há dúvida de que continuará aumentando se as emissões continuarem. Não há nenhuma dúvida, também, de que, se as emissões continuarem os problemas se agravarão.

Nem há dúvida de que o CO2 acidifica os mares, de que os corais estão morrendo, de que os peixes estão ficando escassos, assim como toda a vida no mar. Também não há dúvidas de que as geleiras e as calotas polares estão derretendo, indicando já estar em curso o aquecimento do planeta. Não há dúvida também de que o CO2 contribui para o efeito estufa.

A raiz de todos esses problemas está no fato de não haver retorno, de não haver um ciclo na queima de combustíveis fósseis. A água que usamos, por exemplo, desce pelos rios, chega ao mar, evapora, e retorna aos reservatórios sob a forma de chuva, fechando o ciclo. O petróleo queimado, ao contrário, vira poluição, e nunca retorna à forma original. Em decorrência da inexistência de um ciclo natural propiciando o retorno do carbono à forma de petróleo, a poluição se acumula, causando problemas variados. Não há dúvida, portanto, de que, a continuação da queima de combustíveis aumentará os problemas já existentes, gerando, talvez, outros ainda não percebidos.

Temos absoluta certeza de que a continuação da queima de combustíveis fósseis nos níveis atuais acabará causando problemas gravíssimos, inviabilizando, provavelmente, nossa existência.

Temos, assim, inúmeras certezas sobre o tema.

Mas existe essa dúvida financiada pela Exxon: “não temos certeza se o planeta está sendo aquecido”. Tudo leva a crer que sim, que está sendo aquecido, mas é possível que erupções vulcânicas, alterações inusitadas na atividade solar, ou algo assim acabe por reverter esse quadro, daí certa dúvida.

E então, uma única dúvida, financiada pela Exxon, passou a eclipsar um mar de certezas. Devido ao financiamento, provavelmente, a dúvida ganhou um destaque desmedido, eclipsando todas as certezas, e constituindo uma cortina de fumaça tão eficiente quanto sarcástica.