Parece que nós ainda não entendemos que a Questão Ambiental é Planetária
Parece que nós ainda não entendemos que a Questão Ambiental é Planetária
Luiz Eduardo Corrêa Lima
Professor Titular de Biologia da FATEA/Lorena/SP,
Monitor de Educação Profissional do SENAC/Guaratinguetá/SP.
Nos últimos tempos, principalmente agora, depois da ocorrência da Rio + 20, muita gente aparentemente tem de fato demonstrado estar começando a entender que os problemas ambientais constituem uma questão planetária e que essa problemática interessa a todos porque é real e efetivamente existe. Melhor ainda, também está parecendo que muitas dessas pessoas já descobriram que a problemática ambiental precisa ser tratada porque ela é fundamental para o planeta e para a sobrevivência das espécies, principalmente para nós, os membros da espécie humana.
Como exemplo, é possível citar o fato de que ultimamente temos até ouvido relatos de cientistas que eram anteriormente descrentes de que o Aquecimento Global acontecia em grande parte causado pelas atividades humanas, as quais aumentaram progressiva e significativamente a taxa de gases de efeito estufa na atmosfera, mormente o C02 (Dióxido de Carbono). Esses cientistas que mudaram de posição estão agora estão ampliando as fileiras daqueles que sempre defenderam a posição de que as atividades humanas são as principais causadoras do Aquecimento Global. Enfim, o que eu quero dizer é que, embora tarde, felizmente, estamos evoluindo em nosso pensamento sobre o impacto humano no meio ambiente e atingindo, além dos homens de ciência, também as camadas mais populares da sociedade.
Entretanto, em consequência dessa nossa evolução de pensamento, também estamos sendo forçados a ter que mudar nossa postura metodológica em relação a problemática ambiental e isso ainda é muito confuso na cabeça da maioria das pessoas que não entendem, que não basta apenas pensar é preciso agir em coerência com esse pensamento e algumas dessas pessoas talvez não queiram mesmo entender, enquanto outras são infelizmente reforçadas pela mídia a continuar não querendo e assim não entendendo. Digo isso porque surge agora um novo problema que, em certo sentido, acaba até sendo mais complicado do que simplesmente admitir que o homem tem causado sérios danos ao meio ambiente, por isso mesmo parece ser mais difícil de ser tratado e consequentemente resolvido, porque se origina diretamente de nossa postura ideológica e comportamental em relação à abrangência planetária da problemática ambiental existente.
O que acontece é que muitos de nós quando nos referirmos aos problemas ambientais fazemos citações que demonstram claramente que estamos, na verdade, querendo manter certos padrões errôneos, pois não conseguimos nos libertar de velhos vícios e continuamos com a noção errada de desenvolvimento. De certa maneira, parece que estamos preocupados apenas com a Isonomia, ou seja, com o direito de fazer igual ao outro, mesmo que o outro faça errado. Isto é, se um determinado país pode ter realizado tal coisa no passado, outro país acha que tem todo o direito e realizar a mesma coisa agora. Embora essa condição possa até ser uma verdade sociológica, certamente muitas vezes isso também poderá ser uma grande irresponsabilidade ambiental e assim não deve ser projetado e muito menos reforçado pela mídia, como costuma acontecer. É preciso que saibamos separar o joio do trigo para poder seguir na direção correta.
Na verdade, a grande maioria dos países pobres e em desenvolvimento tem lutado apenas para conseguir direitos iguais aos países ricos e assim assumirem o “sagrado direito” de degradar, de poluir e de destruir o planeta, pelo menos naquela parte do planeta que cabe ao próprio espaço físico daquele país, isto é, o seu território geográfico. Assim como os países desenvolvidos ou mesmo alguns países em desenvolvimento já fizeram ou fazem coisas ambientalmente erradas, os outros países entendem que também podem e, o que é pior, que devem fazer. Porém, esse é um pensamento retrógrado e ambientalmente indesejável. Existe uma necessidade preponderante de que se esclareça que pensar assim é um contrassenso e agir assim é dar um tiro no pé. Ninguém mais pode pensar em desenvolvimento partindo exclusivamente da exaustão dos recursos naturais e da consequente degradação ambiental. Embora esse seja um procedimento totalmente errado é exatamente aí que mora o perigo, porque lamentavelmente é isso que a maioria dos países pobres está querendo fazer.
Em suma, querem o direito de degradar, enquanto o planeta necessita que se pare com toda e qualquer forma de degradação desnecessária. Não se trata aqui de discutir questões nacionais ou mesmo de discutir direitos de nações, mas sim de discutir o destino do planeta e da vida humana que nele habita, independentemente da nacionalidade. Temos que pensar no todo e não nas partes isoladamente. Mais que nunca a visão holística se faz necessária no pensamento humano.
Na verdade, num primeiro momento, o que precisamos fazer, além de não degradar, é recuperar todo o passivo ambiental existente que foi construído ao longo da história humana vivida na Terra e para isso temos que pensar no planeta e na humanidade como um todo e não nos países e suas populações específicas, porque quanto mais fragmentarmos, maior será a possibilidade de ações contrárias aos interesses gerais da Terra, da Vida e do Homem.
Num segundo momento, nossa preocupação maior não deve estar em continuarmos fazendo algumas coisas erradas aqui ou ali, haja vista que outros fizeram. Nossa preocupação deve estar centrada em não errar mais em lugar nenhum. Temos que para e fazer somente as coisas certas e efetivamente necessárias à vida humana em todos os lugares do planeta. Temos a obrigação de ser proativos e pragmáticos em relação ao planeta hoje, pois precisamos garantir nossa sobrevivência e, além disso, temos que investir em propiciar melhores condições de vida às gerações futuras.
Para começar, devemos ter em mente que o supérfluo deve ser esquecido e apenas o necessário deve ser feito, porque temos que parar com a degradação em todos os níveis e locais do planeta. Temos que usar apenas o necessário a nossa sobrevivência. Não estou querendo retroagir ou voltar à vida nas cavernas, como costumam insinuar alguns picaretas de plantão, mas estou apenas sugerindo ponderação nas ações e salientando que o nosso modo de vida, que é altamente exploratório e degradante da qualidade ambiental planetária precisa deixar de existir em nosso próprio benefício.
Somos uma espécie inteligente e temos totais condições de mudarmos o nosso comportamento, se quisermos, sem perder a nossa identidade e muito menos a maioria das vantagens que conseguimos ao longo de nossa curta história evolutiva. Nossa mente brilhante, nossa curiosidade extrema, nossa capacidade criadora incontestável, nossa possibilidade de gerar conhecimento e tecnologia certamente nos permitirão adaptações surpreendentes. Nós só precisamos acreditar e tentar, pois certamente conseguiremos mudar essa expectativa ruim e passar a viver dias melhores do que aquilo que hoje se projeta no futuro para nós e para o planeta.
O que nós não podemos é continuar explorando recursos naturais não renováveis como sempre fizemos e temos que criar mecanismos que nos obriguem a realizar a recuperação dos recursos naturais renováveis que for possível. Além disso, temos que controlar urgentemente o crescimento populacional humano. Independentemente da posição ideológica individual e de qualquer credo religioso, a população humana tem que parar de crescer para que as nossas necessidades progressivamente comecem a diminuir. As religiões têm que evoluir de forma a se adaptarem a essa nova necessidade e trabalhar demonstrando as suas respectivas responsabilidades com a humanidade e não podem mais estar acima dos interesses planetários. Acredito que a liberdade das religiões não possa ser condizente com atitudes que ponham em risco a manutenção da vida humana no planeta.
Vejam bem, não se trata de continuar a explorar, mas sim de parar totalmente a exploração de certos recursos e de desenvolver mecanismos que permitam que isso aconteça, sem prejuízo da qualidade de vida da humanidade atual e futura. Para tanto é necessário que esses novos mecanismos sejam efetivos e que permitam a sobrevivência humana sem a degradação ambiental planetária. Por outro lado, é preciso que fique bem claro que se a população humana continuar crescendo absurdamente como aconteceu até aqui, certamente NUNCA chegaremos num nível satisfatório de equilíbrio entre as necessidades e a utilização dos recursos naturais. O Planeta tem grande capacidade natural de resiliência, mas é preciso que nós permitamos que essa resiliência possa se manifestar e isso só será conseguido quando começarmos a atenuar a nossa extrema agressividade (ganância) pelo uso desses recursos naturais.
Temos que frear e parar rapidamente essa onda crescente, absurda, ilógica e doentia de consumo que se estabeleceu no comportamento humano recente com esse capitalismo selvagem que só visa o lucro de alguns em prol da massificação e da desgraça de outros. É preciso dar um basta nesse interesse contínuo do consumo pelo consumo e do lucro pelo lucro que escraviza as pessoas e só aumenta a degradação da natureza e extermina os recursos naturais. Temos que parar com esse “marketing” violento que indiretamente diz às pessoas que “o bom é ter”. É preciso lembrar que para ter, primeiramente temos que ser, porque se não existirmos não poderemos ter nada. Então, vamos investir no ser, pois o ter é e deverá continuar sendo secundário para o bem da humanidade.
Daqui para frente: “consumo tem que ter norma e lucro tem que ter controle”, pois do contrário não haverá mais solução para a continuidade de nossa espécie, que estará fadada a uma extinção prematura, por culpa exclusiva de sua incapacidade gerencial, de sua ambição, de sua índole destruidora e principalmente do individualismo e egoísmo da maioria dos indivíduos que a compõe. Está na hora de pensarmos efetivamente como espécie biológica viva, que quer continuar vivendo e não pensarmos apenas como grupos de indivíduos de uma espécie que querem se estabelecer de uma maneira melhor que os outros grupos de indivíduos dessa mesma espécie, a fim de suplantá-los e se for possível exterminá-los, como temos feito historicamente.
Em outras palavras, até aqui a humanidade tem agindo assim: temos guerreado conosco mesmos ao longo do tempo. Isto é, estamos conscientemente cometendo um “Canibalismo Social” ao longo de nossa História evolutiva, que etica e moralmente não é possível de ser admitido e precisa ser estancado urgentemente. Foi esse raciocínio incoerente e esse procedimento drástico que nos levou ao atual “estado da arte” e hoje temos plena convicção que essa foi uma maneira errada e que não podemos mais continuar vivendo assim, porque muitos dos grupos de humanos, alguns já totalmente fragilizados, não aguentarão essa carga exploratória e de maneira óbvia rapidamente sucumbirão.
Entretanto essa não é uma condição apenas dos mais fragilizados. É claro que num primeiro momento serão os mais pobres, os mais miseráveis, os doentes, os intelectualmente inferiores, mas depois serão todos os que restarem, porque não haverá como escapar de nossa dependência planetária dos recursos naturais. O tempo é compulsório, tarda mais não falha e chega para todos. Ou agimos em acordo, tentando ganhar tempo ou perdemos rapidamente por conta de nossa própria incapacidade de viver bem como espécie planetária. Precisamos entender que quando não houver mais recursos naturais, não adiantará nada ganhar guerras de outros grupos, não adiantarão de nada as riquezas acumuladas, não adiantará nada possuir muito dinheiro, porque não haverá nada de quem comprar ou de quem tomar.
É bom lembrar que agora estamos travando uma guerra com o Planeta e com tudo que ele pode nos oferecer. Não se trata mais de brigar com outro grupo de “humano inferior”, agora estamos brigando diretamente com a natureza e certamente essa é uma luta inglória que nós não temos como ganhar. Aliás, as últimas batalhas (as catástrofes violentas e cada vez mais comuns) têm nos mostrado o quanto somos frágeis e pequenos perante a grandeza das forças naturais. Só nos resta atuar em favor do planeta e torcer para que a Terra nos permita ficar por aqui um pouco mais.
Nós somos totalmente dependentes dos recursos naturais e no exato instante em que esses recursos escassearem de maneira significativa, nossa existência estará totalmente comprometida. Hoje nossa população total já está utilizando cerca de 20% a mais da capacidade mínima de suporte natural do Planeta. Isto é, já estamos caminhando no vermelho e vivendo num planeta proporcionalmente menor do que ele já foi. Estamos gastando mais do que o planeta é capaz de produzir, somos muito mais rápidos do que a resiliência planetária e já temos mais de 1 bilhão e meio de seres humanos vivendo na mais total miserabilidade e quase sem nenhuma condição de sobrevivência.
A pergunta que fica é a seguinte: Se continuarmos assim, até quando nossa espécie vai resistir e adiar a extinção que certamente é compulsória, mas que ainda pode ser tardia?
Se tratarmos o Planeta como patrimônio de todas as criaturas vivas e se lembrarmos de que nós seres humanos temos a pretensão de sermos as mais importantes criaturas da Terra e que, por isso mesmo, temos a maior responsabilidade pela manutenção do planeta e de todas as espécies nele viventes, inclusive e principalmente a espécie humana. Se agirmos assim, talvez seja bem possível minimizar os danos e controlar os efeitos maléficos e até, quem sabe, progressivamente inverter os valores das coisas e das tendências e consequentemente ampliar nossa existência temporal sobre a superfície do planeta.
O problema é que precisamos começar a desenvolver essa tarefa logo, pois já estamos bastante atrasados. Já temos produzido muita desgraça para outras espécies e principalmente para outros seres humanos, porque sempre temos procurado apenas o dinheiro e o lucro. Está na hora de priorizarmos a vida e o planeta, pois assim, com certeza, todos sairão ganhando, principalmente nós que acreditamos ser a espécie mais importante do planeta e que algumas crenças até admitem ter sido criada segundo a imagem e semelhança de Deus.
Pois então, sejamos como deuses, de fato, para que lá na frente alguns humanos, que ainda não nasceram, venham poder nascer em condições melhores que as nossas e assim possam ser orgulhosos de nós, seus antecessores, e ainda ficarem muito gratos com nosso trabalho atual, que garantirá suas vidas futuras. Além disso, certamente estaremos servindo de bons exemplos para que eles continuem tratando o planeta de forma sustentável, visando garantir a vida futura dos outros seres humanos que continuarão vindo e habitando esse planeta maravilhoso e único.
Senhores Chefes de Estados e Líderes Políticos das Nações em geral, por favor, pensem nisso enquanto ainda existe tempo disponível.
Luiz Eduardo Corrêa Lima (56) Biólogo, Professor, Ambientalista e Escritor.
Vice-Presidente da Academia Caçapavense de Letras (ACL);
Ex-Vereador e Ex-Presidente da Câmara Municipal de Caçapava.