O Lixo na Natureza e a Guerra Homem X Terra
O Lixo na Natureza e a Guerra Homem X Terra
Luiz Eduardo Corrêa Lima
(FATEA/Lorena/SP)
Todos os organismos vivos sem exceção, de uma forma ou de outra, se utilizam de recursos naturais para sobreviver e todos eles também produzem resíduos. Neste artigo vamos chamar generalizadamente os recursos naturais de “matéria prima” e os resíduos de “lixo”. Em geral, o lixo produzido por qualquer organismo vivo é de alguma maneira degradável e por conta dos mecanismos naturais acaba voltando ao sistema como fonte de matéria prima para novamente ser utilizado nos ciclos biogeoquímicos naturais e servir outra vez para os organismos vivos do ecossistema onde está sendo descartado. Assim, em condições naturais, como todo lixo é reaproveitado, não há acumulo do lixo produzido por praticamente nenhum organismo vivo, exceto o lixo produzido pelos organismos humanos.
Lamentavelmente, o caso humano é muito diferente. Somos uma espécie extremamente curiosa, inteligente, obreira e criadora, que tem a capacidade de modificar certos padrões naturais e mesmo de inventar novos padrões para satisfazer os nossos interesses imediatos. Por conta dessa nossa capacidade criadora cada vez maior, do nosso desenvolvimento científico e tecnológico progressivamente apurado, quimicamente nós somos capazes de criar artificialmente inúmeras substâncias novas e, o que é pior, o poder de resiliência do planeta Terra ainda não conseguiu recuperar e reaproveitar muitos dos ingredientes químicos encontrados nessas substâncias que nós temos fabricado.
Infelizmente, nós inventamos certos lixos que a natureza ainda não conhece e que, por isso mesmo, ela não sabe lidar com os mesmos e assim, geralmente não tem como degradá-los para serem reutilizados como matéria prima. Mesmo quando a natureza consegue produzir algum tipo de degradação, esta costuma ser muito demorada e não é possível o reaproveitamento daquele lixo como matéria prima ainda por bastante tempo. Desta maneira, nós humanos, minimizamos os recursos da natureza, tanto para nós, quanto para os demais organismos vivos, pois diminuímos potencialmente a ação naturalmente recicladora do planeta. Em suma, nós utilizamos (consumimos) os recursos naturais (matéria prima) e nem sempre devolvemos um resíduo (lixo) em condições de ser reaproveitado pelos ecossistemas naturais.
Parece incrível, mas o excesso de lixo é certamente o segundo maior problema que encontramos para a nossa continuidade como espécie viva no planeta Terra. O primeiro, obviamente, é o crescimento demográfico de nossa população, do qual decorrem todos os outros problemas, particularmente o aumento acentuado do lixo. Enquanto não controlarmos o nosso crescimento populacional, tudo sempre será muito mais difícil, em alguns casos será realmente impossível. Isso quer dizer que: o nosso segundo problema é a principal consequência do primeiro e se não resolvermos o primeiro, não teremos como resolver o segundo e também todos os outros que se sucedem.
Mas, a boa notícia é que hoje temos tecnologia para quase todos os males que cometemos. Seguramente 80 a 90% de todos os males causados pelo impacto humano sobre o planeta já têm possibilidade de serem solucionados. Isto quer dizer que a mesma tecnologia que nos trouxe os males, também já desenvolveu mecanismos capazes de minimizar ou mesmo extinguir esses males na grande maioria dos casos. Mas, então por que nós simplesmente não acabamos com os problemas e voltamos a viver em paz com o planeta e com as demais criaturas vivas?
Penso que a resposta para esta questão está relacionada com quatro aspectos: primeiro porque nós já ocupamos espaços demais da Terra com nossa grande população e com tudo que com ela se relaciona; segundo porque precisamos diminuir bastante as diferenças sociais criadas entre os homens ao longo do tempo; terceiro porque precisamos realmente assumir a importância vital dessa questão e querer resolver os problemas de fato e quarto porque necessitamos desenvolver ações de governança que invistam e promovam políticas públicas compatíveis com as reais necessidades das populações humanas, independentemente de custos econômicos. Temos que esquecer, coletivamente, algumas coisas que valorizamos muito, mas que não têm grande importância para a nossa vida e, por outro lado, temos que começar a nos envolver em novos valores que sejam de significado vital para nossa espécie. Esse ideário necessariamente passa por uma mudança de filosofia, que deverá produzir uma mudança de atitude e que finalmente promoverá a uma mudança de comportamento.
Embora isso, em tese, pareça ser relativamente simples, na prática essa questão é bastante complicada, até porque muitos dos governos não estão fazendo e nem têm a pretensão de fazer o dever de casa. Além disso, porque infelizmente a maioria das pessoas não está disposta a modificar os seus hábitos de pensar e consequentemente de agir. De um modo geral, ninguém está muito disposto a fazer coisas diferentes, principalmente no que diz respeito a perder determinados “confortos” que foram adquiridos ao longo da história. Em particular, o grupo dos grandes empresários que detém a maior parte dos recursos econômicos necessários para efetivar as ações, aparentemente, são os menos interessados em resolver os problemas, até porque a maioria dos representantes desse grupo acredita ser os que mais “perderão” com as mudanças.
Infelizmente nossa sociedade não está preparada para o que precisa ser feito e muitos ainda acham que as questões relacionadas com o meio ambiente são balela que não têm nenhum significado e que dinheiro, poder e conforto são efetivamente as únicas coisas que importam à humanidade na busca constante da felicidade. Nossas crenças erradas e nossos maus hábitos não serão facilmente apagados do pensamento coletivo de nossa espécie de uma hora para outra, porém, precisamos começar a pensar diferente. Toda essa mudança é um processo e todo processo é sempre gradativo. Mas, o tempo é insensível, implacável, severo e não pára.
De qualquer maneira, nós necessitamos começar o mais rápido possível a fazer algumas coisas que possam minimizar os problemas, porque temos pouquíssimo tempo para tentar solucionar esses problemas, até porque grande parte da situação já está fora de controle. Já superamos em cerca de 30% a capacidade de utilização do planeta e por isso mesmo, já faz algum tempo que estamos efetivamente em guerra contra o planeta. A Terra, por sua vez, também já começou a se defender e em certo sentido está nos contra atacando. Ultimamente as batalhas têm sido muito ruins para nós humanos. As catástrofes são cada vez maiores em tamanho e piores em efeito.
Apesar de todo estrago que fizemos ao longo do tempo, nós não conseguimos e certamente não conseguiremos destruir o planeta, mas aos poucos ele está dando o troco, porque ao tentar se defender de nós, ele agora já está nos destruindo. Quer dizer, como já era esperado pelos mais sensatos, nós estamos começando a perder a guerra. O tempo para o planeta é quase eterno, mas para nós é extremamente curto e passageiro. Assim, ou mudamos de atitude e de comportamento ou simplesmente perecemos.
Essa guerra não terá fim, enquanto nós não começarmos a trabalhar e auxiliar na recuperação do planeta. Portanto comecemos logo a fazer o dever de casa, pois a metade ainda cheia da ampulheta para a manutenção da vida humana no planeta está rapidamente se esvaziando. Vamos jogar a tolha e nos associarmos a Terra, enquanto ainda temos oportunidade de termos uma derrota honrosa, com vida. Do contrário, estaremos fadados a uma extinção precoce e extremamente próxima de nossa espécie.
Há urgência na resolução dos problemas e por isso mesmo precisamos partir para resolver aqueles que podem ser resolvidos mais rapidamente. O lixo humano, na minha maneira de entender, é a coisa mais fácil de ser controlada pelos governos e precisamos investir arduamente na tecnologia existente e no desenvolvimento de novas tecnologias para não aumentar a sua produção. A diminuição progressiva do tamanho das populações humanas, obviamente é algo mais complicado, porque é dependente de outros fatores, inclusive aspectos de cunho religioso, mas depende principalmente da vontade humana e precisa ser objeto de pauta e de trabalho dos governos. Com certeza, esse problema levará mais tempo para ser controlado, mas obviamente também deverão ser empregados esforços imediatos na tentativa de resolução dessa questão.
Não tenho dúvidas de que será muito difícil, mas também não tenho dúvidas de que a humanidade viveu dias muito ruins em outros momentos da sua história e até aqui, tem conseguido sobreviver. Estamos precisando apenas de um pouco mais de interesse de todos, de seriedade dos governos, de envolvimento real dos empresários e de empenho e participação das sociedades, para que possamos garantir a sobrevivência de nossa espécie e a qualidade de vida que as populações futuras são merecedoras.
Diz o ditado que: “o futuro a Deus pertence.” Entretanto, eu prefiro acreditar que o futuro se faz e se garante com as ações corretas do presente. Tenho certeza que Deus não vai se importar se começarmos a programar bem o nosso futuro. Aliás, creio mesmo que, ao contrário, se trabalharmos corretamente, Deus nos auxiliará e nos garantirá um futuro com qualidade de vida e com o planeta que desejamos. Se fizermos as ações certas hoje, certamente estaremos muito bem amanhã.
Luiz Eduardo Corrêa Lima (53) é Biólogo (Zoólogo), Professor, Escritor e Ambientalista;
Membro da Academia de Letras de Caçapava, ocupando a Cadeira 25;
Membro associado do Instituto de Estudos Valeparaibanos – IEV;
Ex-Vereador e Presidente da Câmara Municipal de Caçapava.