Sustentabilidade deveria ser uma coisa séria.

Sustentabilidade deveria ser uma coisa séria.

Luiz Eduardo Corrêa Lima

"Todo mundo 'pensando' em deixar um planeta melhor para nossos filhos... Quando é que 'pensarão' em deixar filhos melhores para o nosso planeta?"

A frase acima (na verdade uma pergunta, um questionamento) tem circulado bastante na INTERNET ultimamente, sempre acompanhada de uma charge que compara a educação da década de 60 do século passado com os tempos atuais. Eu mesmo já recebi o E-mail contendo essa informação de umas seis ou sete pessoas diferentes. Achei a frase realmente interessante, mas, apesar de todo o alarde que ela tem produzido, eu não concordo muito com idéia de “sustentabilidade” nela contida e gostaria de discutir aqui os porquês da minha discordância.

Primeiramente, devo dizer que, na atual conjuntura, para o planeta seria melhor que não deixássemos filhos nenhum, porque assim talvez houvesse mais tempo dele se recuperar. Aliás, para o planeta, talvez fosse melhor que nem nós existíssemos, porque assim, talvez ele não tivesse chegado ao estado de degradação em que chegou por conta exclusiva de nossos atos sucessiva e historicamente errados.

Em segundo lugar, quero dizer que o fato de deixarmos filhos melhores para o nosso planeta, necessariamente envolve em sermos humanos melhores e talvez seja exatamente isso que está faltando, porque nós não fomos e continuamos não sendo, pelo menos até aqui, nada bons com os demais humanos, com os outros organismos vivos e muito menos com o planeta. Teríamos que aprender e passar a ser humanos melhores, antes de gerarmos filhos e ocuparmos desordenadamente o planeta.

Todos nós sabemos que para aprender é mais fácil quando se é criança, porque a cabeça de uma criança ainda está “pura”, sem vícios, sem defeitos e pode ser trabalhada (construída e desenvolvida) de melhor maneira. Nesse sentido, apesar de temos feito muitas coisas erradas com o planeta, muitos de nós e não “todo mundo” como diz a frase. Aliás, na verdade, para o contingente de pessoas que precisamos, infelizmente ainda somos muito poucos. Muitos de nós, já temos alguma consciência do problema e talvez esses estejam, de fato, tentando deixar um planeta melhor para os filhos.

Até porque esses já sabem que se não agirem assim, efetivamente não haverá porque ter filhos, haja vista que o homem como espécie não sobreviverá no planeta, graças aos seus próprios erros. Isto é, erros dos homens que já viveram e que ainda vivem e não dos que viverão, porque esses últimos, se existirem, deverão estar cientes e preocupados com a questão e não cometerão os mesmos erros que foram cometidos pelas gerações anteriores. Bem, isso é o que se espera dos homens do futuro, mas não se sabe se efetivamente acontecerá!

Fico extremamente preocupado quando é dito na informação que essa pergunta foi ganhadora de um prêmio de sustentabilidade, quando ela não é e nem tem nada, absolutamente nada a ver com sustentabilidade. Ao contrário, ela é apenas um jogo de palavras interessante que aborda a questão socioambiental, mas que traz em seu bojo um conceito ambientalmente incorreto, não sei se intencionalmente ou não e que demonstra um total desconhecimento do que seja sustentabilidade, tanto por quem a escreveu, como por quem lamentavelmente a premiou. Aliás, esse é o grande problema do Brasil, muitas vezes se popularizam e se repetem determinados termos e coisas sem o devido entendimento dos mesmos e aqui, a meu ver, está acontecendo (aconteceu) exatamente isso.

Mas, há alguma coisa de positivo nos E-mails que tem trazido essa frase dúbia. Há um pequeno comentário escrito abaixo da frase, no final dos E-mails, que representa esse lado positivo. O comentário sim é ambientalmente correto e socialmente justo. Porque realmente “uma criança que aprende o respeito e a honra dentro de casa e recebe o exemplo vindo de seus pais, torna-se um adulto comprometido em todos os aspectos, inclusive em respeitar o planeta onde vive...”

Ora, então partamos para isso, ensinemos (eduquemos) aos nossos filhos, já que resolvemos tê-los, orientando aos mesmos como devem ser tratados o planeta e a vida e assim eles poderão efetivamente ser “filhos melhores para o planeta”. Se formos pais melhores, certamente teremos filhos melhores, mas ainda assim teremos que salvar o planeta para que eles possam continuar vivendo. Mas, se não fizermos dessa maneira, jamais teremos condições de produzir filhos melhores e consequentemente jamais teremos um planeta melhor.

Nem sempre palavras bonitas e bem escritas dizem coisas bonitas e que devem ser repetidas. É desta maneira que temos sido ludibriados pela mídia ao longo do tempo. A propaganda tem feito isso conosco todos os dias e nós simplesmente repetimos aquilo que eles querem que digamos e assumimos subconscientemente aqueles conceitos errados como se fossem verdadeiras maravilhas. E, o que é pior, divulgamos essas idéias como se fossem coisas fabulosas para todos os nossos amigos. Por fim, alguns de nós, lamentavelmente, até distribuímos prêmios para essas coisas. É por essa e outras que, por exemplo, até hoje ainda tem gente falando, escrevendo e repetindo que “a Amazônia é o pulmão do mundo”.

A Propaganda e o Marketing não são necessariamente ruins, desde que usadas no interesse da sociedade, mas certamente há muitas pessoas que se utilizam dessas ferramentas com outros objetivos e como mecanismos para induzir os demais a fazerem coisas erradas. Precisamos estar bastante atentos se quisermos realmente um planeta melhor e obviamente filhos melhores. É preciso que sejamos pessoas melhores e para tanto temos, primeiramente, que utilizarmos bem as nossas mentes, pensarmos mais nas coisas que recebemos, principalmente pela INTERNET e até mesmo filtrarmos algumas dessas informações que nos chegam.

A frase (pergunta) em questão, como já foi dito, vem seguida de uma charge que contém uma mensagem interessante e realmente verdadeira, que compara o comportamento dos pais de alunos nas escolas há 40 anos e hoje, os quais são totalmente distintos e eu imagino que essa imagem foi utilizada como chamariz para nos ludibriar com a informação que vem logo depois. Mas, por outro lado, se observarmos mais detalhadamente a charge concluiremos que a informação está ali mesmo, pois se o comportamento mudou a culpa é somente nossa e não de nossos filhos, dos professores ou do planeta. Fomos nós, como maus cidadãos, que deixamos a Escola e a Educação chegar ao nível que chegou. Somos nós que hoje estamos cobrando dos professores aquilo que não ensinamos aos nossos filhos e aí cobramos dos professores a nossa incapacidade como pais.

Nós, apenas nós e nossos ancestrais é que cometemos os erros que levaram ao atual estado de coisas, no que diz respeito ao planeta e à educação. Portanto, apenas nós poderemos produzir humanos melhores e capazes de mudar isso, mas é preciso que tenhamos isso como meta, porque nenhum humano do futuro (se existirem humanos no futuro) será melhor se nós não nos preocuparmos com o planeta e com a educação hoje. Em suma, precisamos sim, cuidar da Escola e da Educação para tentar produzir e deixar um planeta melhor para os nossos filhos, porque só assim eles terão oportunidade e condições reais de garantir a continuidade de nossa espécie e obviamente, no futuro, eles talvez possam ter filhos melhores.

Quero ter certeza que meus netos serão melhores que meus filhos, meus bisnetos melhores que meus netos e assim sucessivamente, mas para que isso ocorra é preciso cuidar do planeta e da educação hoje. Temos que recuperar o passivo que deixamos acumular ao longo dos anos e sem pais comprometidos e verdadeiramente responsáveis e também sem a educação ambiental ficará muito difícil. Aliás, provavelmente, será impossível.

A propósito, por tudo isso, eu continuo acreditando que ainda é preferível pensar “em deixar um planeta melhor para nossos filhos”, por que só assim poderemos ter filhos e só assim eles poderão ser melhores.

uiz Eduardo Corrêa Lima (53) é Bíólogo, Escritor, Ambientalista, Professor de Ensino Superior e Médio;

Membro da Academia Caçapavense de Letras e Ex-Presidente da Câmara de Caçapava.