Os Paradigmas Antropocêntrico e Ecocêntrico de Proteção da Natureza.


"Anthropocentrism and Ecocentrism: The Nature Protection Paradigms"



Hoje em dia, admite-se a existência de duas posturas humanas frente o ambiente: o antropocentrismo e o ecocentrismo. Para o primeiro, somente se justifica a proteção do ambiente se isto satisfizer as necessidades humanas. Para o segundo, a proteção ambiental deve ser apoiada independentemente dos benefícios diretos que tal medida trouxer ao homem. O antropocentrismo consideraria um erro a derrubada da floresta tropical por considerá-la um potencial estoque de plantas medicinais, por exemplo, O ecocentrismo, por seu turno, se posicionaria contrariamente ao desmatamento justificando que a floresta é o hábitat de milhares de espécies de animais e plantas.
 
A real origem do antropocentrismo, como corrente filosófica, é objeto de discussão. No entanto, sabe-se que, já nos relatos bíblicos, existem passagens cujas interpretações literais sugerem a existência de um homem dominador e que tem a natureza à sua inteira disposição, Aliás, a natureza, segundo essa concepção, fora criada justamente para servir o ser humano. A origem do termo “antropocentrismo” também é algo obscuro. Trata-se de um híbrido, proveniente do latim “athropos”, Homem, e do grego “kentrum”, Centro. Teria surgido em meio às controvérsias da Teoria de Darwin, a qual retirou o homem do pedestal em que se colocava diante da natureza e reduziu-o a um mero primata da família hominídea, assim como outras criaturas, já extintas, como o Homo erectus e cia. A maior parte dos ambientalistas responsabiliza este paradigma pelos atuais quadros de destruição ambiental. No entanto, sabe-se que nesta forma de pensar o mundo também há o apoio à proteção da biodiversidade, em diversas ocasiões (lembram? Não desmatar a floresta porque esta representa oferta de plantas medicinais ao homem, dentre outros recursos diretos!).

Exemplos de idéias antropocêntricas:

Ser a favor da proteção do cupuaçuzeiro (Theobroma grandiflorum) porque este fornece um fruto "gostoso de se comer".

Ser a favor da destruição de carrapichos (Bidens cynapifolia)
e urtigas (Urtica sp.)por representarem incômodo ao homem (o primeiro por possuir frutos providos de ganchos que se aderem facilmente às roupas, e o segundo por causar irritações à epiderme humana)
 
Curiosamente, os argumentos antropocêntricos foram a origem do movimento ecocêntrico, na década de 1960. Observando que os recursos que lhes eram tão valiosos começaram a correr risco frente à sobrexploração, o homem passou a defender seu uso racional, plataforma do que se chama atualmente de “Desenvolvimento Sustentável”. Ecocentrismo provem do latim, “oikos”, casa, ecossistema, “kentrum”, centro. Portanto, no paradigma ecocêntrico, quem assume a posição central são os ecossistemas, dos quais o homem se torna um componente a mais. Muito antes disso porém, movimentos defensores dos direitos de animais domésticos, na Europa, ao longo do século XVI, já advogavam a idéia de que os seres não-humanos também são elegíveis de direitos, tendo valor de existência tal como o homem, haja vista que são componentes igualmente dos ecossistemas, cujo equilíbrio pode ser perturbado se a extinção de alguma dessas espécies é observada.

Exemplos de idéias ecocêntricas

Todos os animais têm direito à vida, independente de sua utilidade ao homem.

O homem faz parte da natureza como os demais animais, inclusive embuás (Diplopoda), aranhas (Aracnida), serpentes (Serpentes), etc.
 
Diversos estudos têm focalizado atitudes antropocêntricas e ecocêntricas rumo ao ambiente. Na Noruega, Bjerke e Kaltenborn (1999) mensuraram estas atitudes diante de lobos (Canis lupus) em três grupos de interesse: criadores de ovelhas, biólogos e gestores ambientais. Neste trabalho, verificaram a predominância de atitudes antropocêntricas nos criadores de ovelha, o que desencadeava comportamentos negativos diante dos lobos. Por outro lado, houve predominância do paradigma ecocêntrico em biólogos e gestores ambientais, o que condicionava comportamentos positivos diante dos lobos.
 
No Brasil, e mais especificamente no Amapá, tenho realizado este tipo de estudo, no entanto, com mais ênfase ao contexto escolar. Realizando tal mensuração em professores de uma escola de ensino fundamental de Macapá, cheguei aos seguintes índices: 2.77 de antropocentrismo; 4.41 de ecocentrismo; 1.23 de apatia ambiental (indiferença). Felizmente, após a aplicação de teste de fiabilidade (Alpha de Cronbach), atingimos excelentes resultados, em especial para o ecocentrismo e apatia ambiental Estes são resultados que sugerem a reavaliação das atitudes ambientais entre os professores, os quais são considerados importantes propagadores de paradigmas, gerando apoio à proteção da biodiversidade ou não.
 
Estudos como estes são raros, porém, muito bem vindos, Afinal, as ações humanas frente à natureza estão diretamente ligadas à forma como esta é percebida pelo homem, por meio de conhecimentos, valores, crenças, atitudes e comportamentos. Daí a importância de se conhecer tal percepção, seja dentro ou fora do contexto escolar.

SUGESTÕES DE LEITURA


BJERKE, T.; KALTENBORN, B. P. The relationship of ecocentric and anthropocentric motives to attitudes toward large carnivores. Journal of Environmental Psychology, 19: 415-421, 1999.
 
KORTENKAMP, K. V.; MOORE, C. F. Ecocentrism and anthropocentrism: moral reasoning about ecological Commons dilemmas. Journal of Environmental Psychology, 21: 261-272, 2001.
 
KELLERT, S.R. The Value of Life. New York: Island Press, 1996.
 
LARRÈRE, R.; LARRÈRE, C. Should nature be respected?. Social Science Information. 46 (1): 9-34, 2008.
 
MILARÉ, E.; COIMBRA, J. A. A.. Antropocentrismo X ecocentrismo na ciência jurídica. Revista de direito ambiental, 9 (36), 2004.
 
THOMPSON, S. C. G.; BARTON, M. A. Ecocentric and anthropocentric attitudes toward the environmental. Journal of Environmental Psichology, 14: 149-157, 1994
 
 

David Figueiredo
Enviado por David Figueiredo em 18/07/2009
Reeditado em 10/09/2010
Código do texto: T1706643
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