Série Netflix Round Six: Entretenimento Fácil ou Crítica Social?

As produções sul-coreanas de entretenimento têm alcançado enorme sucesso nos últimos anos, destacando-se em diferentes áreas como o K-pop, os doramas e o cinema, culminando na conquista do Oscar com o excelente Parasita. Na Netflix, o estrondoso sucesso de Round Six (Squid Game) consolidou ainda mais essa presença, especialmente com sua segunda temporada e o reality show inspirado na série, ambos muito populares.

 

A série, embora seja um produto de entretenimento acessível, apresenta uma narrativa original. Nela, pessoas em dificuldades financeiras são abordadas por um recrutador que as convida a participar de um jogo aparentemente simples. Durante a abordagem no metrô, se perdem, levam um tapa na cara; se ganham, recebem dinheiro. Ao final, recebem um cartão misterioso com um convite para participar de uma sequência de jogos em uma ilha secreta, ao longo de seis dias. Esses jogos são baseados em brincadeiras infantis da cultura sul-coreana, mas com uma diferença fatal: quem perde não apenas é eliminado do jogo, mas também perde a vida.

 

A série trabalha muito bem o suspense, explorando a iminência da morte dos participantes, todos em extrema vulnerabilidade e dispostos a arriscar tudo por dinheiro. Ao mesmo tempo, vai revelando suas histórias pessoais, permitindo que nos identifiquemos com alguns, como se fosse de fato um reality show. Evitarei spoilers para quem ainda não assistiu. 

Eu gosto muito da fotografia da série, que apresenta uma estética que remete a brincadeiras lúdicas e ao universo infantil, com cores vibrantes e alegres. É uma abordagem que lembra o estilo de Wes Anderson, muito bem trabalhada, conferindo à produção um tom fabulesco e cartunesco. Apesar de ser violenta, a violência é estilizada, o que a torna menos impactante como uma crueldade realista.

 

Na segunda temporada, o vencedor da primeira, tomado pelo remorso, decide usar o dinheiro conquistado para localizar o homem que o abordou no metrô. Ele gasta bilhões da moeda local até finalmente encontrá-lo. A consequência é que, após alguns dias, ele se vê de volta aos jogos. Antes de ser capturado, ele tenta instalar um chip em seu dente para ser rastreado, mas a estratégia é rapidamente descoberta pelos organizadores.

 

No início, ele tenta alertar os novos participantes sobre como sobreviver, mas os jogos mudam e ele também é pego de surpresa, precisando lutar por sua vida novamente. Paralelamente, a equipe que ele contratou com o dinheiro do prêmio tenta localizar a ilha dos jogos. Será que conseguirão antes que as seis rodadas aconteçam?

 

Essa nova temporada parece menos séria do que a anterior, incorporando mais toques de humor. Embora a surpresa e a originalidade da primeira temporada tenham se perdido, o nível de entretenimento permanece alto para quem busca apenas algumas horas diante da televisão. 

Os personagens, no entanto, são um pouco mais caricatos e seguem uma linha de estereótipos preconceituosos esperados pela sociedade em relação a pessoas desesperadas (mulher trans, idosa, mãe solteira, astro musical viciado, influenciador digital, etc.), e a abordagem sobre o poder de uma elite rica que paga para assistir pessoas em condições de extrema vulnerabilidade se sacrificarem é tratada de forma superficial.

 

Os participantes, considerados “não-pessoas”, lixo e escória pelos organizadores, entram no jogo por razões variadas: alguns por vício em jogos ou bebidas, outros devido a infortúnios como doenças ou crises financeiras. No início da série, o recrutador explora essa vulnerabilidade, sugerindo que o resultado da vida de cada um é fruto de suas escolhas. Ele oferece pão ou uma raspadinha a mendigos famintos, e muitos escolhem a raspadinha, demonstrando, segundo ele, a “ganância” mesmo diante da fome. Após isso, ele destrói os pães restantes e afirma que não foi ele quem os jogou fora, mas sim os próprios mendigos por suas escolhas.

 

Na nova temporada, somos introduzidos ao ponto de vista de uma mulher que trabalha dentro da organização como uma das mascaradas encarregadas de eliminar os perdedores. Sua motivação, ao que parece, é acabar com o sofrimento das pessoas, o que a faz não hesitar em cumprir seu papel.

 

Seu modo de agir, sem qualquer misericórdia, parece causar algum desconforto no líder da organização. Pelo que entendi, os jogadores que não sofrem ferimentos fatais são levados a uma mesa cirúrgica para terem seus órgãos preservados e posteriormente doados. Até onde assisti, não fica claro para quem esses órgãos são destinados: se para pessoas ricas que os compram ou para necessitados que realmente precisam deles. Isso levanta a questão de que talvez os organizadores não sejam totalmente malfeitores, embora estejam usando órgãos de alguém que poderia sobreviver, sem o consentimento da pessoa, sob a justificativa de que ela não merece aquele órgão por ser considerada “escória” da sociedade pela organização.

 

A série também explora o dilema interno dos jogadores: continuar jogando e arriscar a vida ou voltar ao mundo real, onde enfrentariam a falta de esperança e o risco iminente de morte por causa das dívidas. Para muitos, permanecer nos jogos é a única solução. Mesmo com a possibilidade de votação após cada rodada para decidir a continuidade dos jogos, a maioria escolhe seguir até o final.

 

Ainda não concluí a segunda temporada, faltam dois episódios. Apesar de considerá-la inferior à primeira pela perda do fator surpresa, ainda acho que entretém. É, sem dúvida, um entretenimento fácil, com reflexões sociais colocadas apenas em segundo plano. Mas diverte. Estou assistindo a série em paralelo a Cem Anos de Solidão, também uma produção original da Netflix, baseada no grande clássico de Gabriel García Márquez, um dos meus livros preferidos. Pretendo escrever sobre ele em breve, mas já adianto que é um grande risco tentar adaptar um livro tão aclamado para o formato audiovisual. Será que a série fez jus à obra literária? Aguardem a resenha!

 

Dave Le Dave II
Enviado por Dave Le Dave II em 03/01/2025
Reeditado em 04/01/2025
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