OS PERIGOSOS HOMENS BONS
Avança: ouvimos
dizer que és um homem bom.
Não te deixas comprar, mas o raio que incendeia a casa, também não pode ser comprado.
Manténs a tua palavra.
Mas que palavra disseste?
És honesto, dás a tua opinião.
Mas que opinião?
És corajoso.
Mas contra quem?
És sábio.
Mas para quem?
Não tens em conta os teus interesses pessoais.
Que interesses consideras, então?
És um bom amigo.
Mas serás também um bom amigo da gente boa?
Agora, escuta: sabemos que és nosso inimigo. Por isso vamos encostar-te ao paredão. Mas tendo em conta os teus méritos e boas qualidades
vamos encostar-te a um bom paredão e matar-te com uma boa bala de uma boa espingarda e enterrar-te
com uma boa pá na boa terra. - Bertolt Brecht
No livro "Para Além do Bem e do Mal", Nietzsche faz a distinção do bom e do bem.
Segundo o filósofo, o primeiro valor moral que surgiu foi a ideia de bom, dos indivíduos mais aptos, que dominavam a técnica de caça, depois a capacidade de retórica, que lideravam, que eram verdadeiros talentos, portanto que eram bons. Em contraposição aos bons, surgiu o conceito de bem, que são aqueles indivíduos que não podiam externalizar seu pensamento por serem fracos, para se proteger dos bons, que os dominavam, tinham que internalizar seus sentimentos, e então surgiu o conceito de bem, do homem bom, no sentido de ser bonzinho, afável, amável, teoricamente é o indivíduo com altos padrões morais. Mas, segundo Nietzsche, isso é apenas uma estratégia, porque eles não podem ser bons, no sentido de versados para vida. Na gramática, é a diferença entre "mal" com "l" fazendo oposição ao bem e "mau" com "u" oposição ao bom.
Passando para análise do poema de Brecht, o poeta alemão denuncia a hipocrisia dos homens bons, que vendem a imagem de um alto padrão moral, mas que internamente praticam maldades e ilicitudes. Como mostrado por Hannah Arendt, no livro "A Banalidade do Mal" e no filme "Zona de Interesse", foram os homens que se achavam bons que perpetraram o holocausto.
Transpondo para nossa realidade do tupiniquim, o que dizer do procurador Deltan Dallagnol que possivelmente se acha um homem bom, patriótico, sob o pretexto de combater a corrupção, mas estava mais interessado em benefício próprio? Propondo uma fundação privada para armazenar o dinheiro da Lava-Jato e também ao defender o interesse dos EUA para que a Petrobras pagasse uma multa milionária para esse país, sem contar com o fato de condenar um homem inocente. Este é um homem bom? Bom para quem? Como perguntaria Brecht.
E o outro exemplo é o caso do meu antagonista aqui do RL que se diz um homem respeitável, que tem mulher, filhos e até netos, e vende seus rabiscos para ajudar o Médicos Sem Fronteiras, mas fica destilando ódio, misoginia, homofobia e preconceito de classe nas redes sociais. Certamente, ele se acha um sujeito bom. Bom como os nazifascistas e bom como o Dallagnol, bom como o homem da poesia de Brecht.