Alceu e Archidy: dois artistas quando jovens
Ninguém estava desparecido. Portanto, nenhum fenômeno jornalístico de reaparecimento.
“Estou montado no futuro indicativo / já não corro mais perigo / nada tenho a declarar / Terno de vidro / costurado a parafuso / papagaio do futuro num para-raio ao luar...”
A poética da mídia em diálogo e confronto com as emboladas de treme-treme, Beija-Flor-Oliveira.
Alceu Valença sabe tanto dos paradoxos da poesia como das contradições da política. E agora, por onde se perderam as antenas da raça? Até quando a cultura pernambucana continuará em câmara ardente?
Com a queda do muro de Apipucos, os herdeiros da Casa Forte brincam de socialismo sertanejo: cabras e queijos para todos, brasões repartidos entre ofendidos e humilhados. Idas e vindas, todas as rimas pretéritas e mitologia das raízes sem racionalidade. De campanha em campanha, de leilão em leilão, e camiseta e fardão, da alegria da amizade (sic) às claritas das caminhadas, dos slogas desgastados às cartas para a redação, artistas, intelectuais, educadores e outros devotos da frente prá-pular tentam sair do “gueto” de suas mansões super-estruturais.
Sempre em ritmo tão frenético, as maiorias bacharelescas e os pintores preferenciais do imaginário Roberto Marinho se tornam pródigos e prestigiosos em programas, projetos, planejamentos, a partir das comunidades de base, dos interesses coletivos da cidadania, dos eternos compromissos com a miséria da população oprimida. É preciso reler José Arlindo Soares sobre a Frente de Recife (1955/1964) e jogar todo saudosismo pelas janelas do mundo.
“Quem sabe, sabe; quem não sabe, sobra / cobra caminha sem ter direção...” Porque Joaquim Francisco é o Papagaio do Futuro, ou vice-versa e outros versos.
É bem mais fácil traduzir todas as sociologias e todos os efeitos psi dos ressentidos numa fórmula sabiamente prosaica. É preciso ter vergonha na cara. E ninguém tem a cara do povo. E ninguém sofre no lugar do povo. E ninguém tem a alegria da amizade popular. Chega de saudades messiânicas.
Sem medo da rima feliz ou infeliz, não foi pós-fácil (?) ler uma trajetória tão surpreendente de informações transformativas. Entre fotos, desenhos, letras, pinturas, páginas saturadas e outras em branco cio ou silêncio, quem lê tantas notícias, surtos, intrigas, surpresas e ressentimentos? Pressentimentos? Jogo de cumplicidade?
ARTE É INTRIGA: no registro humorístico e deseducador de Millôr. ARTE TEM QUE TER AMBIÇÃO: segundo, terceiro, último berro de Glauber.
Não é, nunca foi fácil carregar para o futuro, enquanto menino eternamente prometido e prometeico, o peso do nome e de um sobrenome sem precisar cometer o imaginário assassinato do pai de família, ou da repartição, ou da univer-cidade.
Salve-se quem souber na província de todos os equívocos. Não é fácil continuar sendo um menino experimental de olhos arregalados para o multiverso desde os três aninhos de promessas cúmplices. Olhos arregalados e transfigurados, em estilo dividido entre o surrealismo e o experimentalismo através dos palhaços Feliz e Chorão. Também cúmplices.
Na trajetória de Archidy Picado Filho, muito mais do que a intriga de Millôr ou a ambição glauberiana, reencontramos no paraíso perdido do gênio romântico, pós-Goethe, pós- Mário de Andrade, pós-Dali, pois-Cocteau: “pois sim”.
Nele, tudo implode e explode em sons, letras, traços, figurações, narrativas, aforismos, pensamentos, magia e paixão.
Todas as músicas da Música?
Mas onde restaria o mínimo espaço para o rigor científico ou filosófico?
Archidy Picado Filho, caso entrevistado, nos responderia com o desafio permanente da pro-ble-ma-ti-za-ção.
Na travessia intrigante de todas as multiplicidades, eis o Novo Homem (sic): príncipe-polivalente de roteiros imagéticos; atento aprendiz da Arte Cavalheiresca do Arqueiro Zen; MENINO EXPEIMENTAL entre ocidente e oriente; cultivador de paradoxos entre Arte e Educação; criador intersemiótico pelo quiasma de todas as linguagens: ingênuas e críticas, mágicas e racionalizadoras, eruditas e populares, retóricas e cúmplices.
Até quando?
*Comentário crítico do projeto “Feitura de um livro artesanal”, proposto como “dever de casa” pelo Prof. Jomard Muniz de Britto quando de minha participação no Curso de Educação Artística da UFPB (1990), constando em meu livro de comentários “A Máquina da Felicidade e o cromossomo Zen”, vencedor do prêmio à publicação pelo PROCULT (lei estadual 6.894/2000).