A obra Liberalismo e Democracia de Norberto Bobbio.
A obra Liberalismo e Democracia de Norberto Bobbio
A obra "Liberalismo e Democracia", de Norberto Bobbio
Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy 14 de agosto de 2022, 8h00
"Um autor que faz pensar com sintonia fina". Com essa imagem, Roberto Janine Ribeiro lembrava o legado de Norberto Bobbio (1909-2004) ao ensejo da morte do jusfilósofo italiano, em matéria publicada na Folha de S.Paulo, em 10 de janeiro de 2004.
A frase é o ponto de partida para uma série de reflexões sobre a obra de Bobbio, que proponho tratar aqui na ConJur. Bobbio notabilizou-se como filósofo do Direito e da política.
Comecemos com um texto central para a compreensão do tema do liberalismo e sua relação com a democracia.
Em "Liberalismo e Democracia", Bobbio opôs a liberdade e a democracia dos antigos à liberdade e a democracia dos modernos.
Tratou também de direitos humanos, da tirania da maioria, dos limites do poder do Estado, da democracia e do tema da igualdade.
O liberalismo (enquanto limitação do poder do Estado) e a democracia (no sentido de distribuir esse poder) estão no núcleo desse pequeno grande livro do pensador italiano.
O liberalismo, como concebido e definido no livro, determina certa concepção de Estado, com exata limitação de poderes.
Para Bobbio, o estado liberal não seria necessariamente democrático. Pelo contrário: segundo o autor, o liberalismo realiza-se mais efetivamente em Estados cuja participação no governo é mais um monopólio das classes possuidoras.
A relação entre liberalismo e democracia é o problema que sustenta o argumento de Bobbio.
"Liberalismo e Democracia" é um livro marcado por um esforço de sistematização de oposições e tensões. Bobbio opõe Locke aos organicistas. Para esses últimos, a sociedade seria anterior ao indivíduo.
Para aquele primeiro, a sociedade sucede o indivíduo. Essa dialética se resolveria em um terceiro gênero, em forma de postulado político-econômico: sem individualismo não haveria liberalismo.
Bobbio também opõe anarquismo e liberalismo; para o anarquismo, o Estado é um mal; para o liberalismo, o Estado é um mal necessário.
A concepção de Estado como mal necessário está originalmente em texto fundador de Thomas Paine.
Em "Liberalismo e Democracia", lê-se sobre a oposição de Locke e Kant ao paternalismo do Estado. Bobbio também retoma Adam Smith no que se refere aos três deveres básicos (e únicos) do governante.
A defesa contra os inimigos externos, a proteção contra as ofensas dos demais cidadãos e autorização para intervenção em obras públicas apenas na hipótese de impossibilidade de execução por parte da iniciativa privada.
Bobbio também se refere a Humboldt e à metáfora que nos dá conta de que o furor de governar seria a mais funesta doença dos soberanos contemporâneos.
Bobbio também opõe os libertaristas aos igualitaristas. Estes últimos perseguem o totalizante, o harmonizante e o igualitário.
Aqueles primeiros são individualistas, conflitualistas e pluralistas. Nesse jogo de oposições, Bobbio também opõe o holismo dos organicistas (que radicam em Aristóteles) ao atomismo dos individualistas.
O livro também tem espaço para o confronto entre o liberalismo conservador de Tocqueville e o liberalismo radical de Mill, que Bobbio parece tanto admirar.
Bobbio empareda o leitor com uma concepção de democracia como uma resposta difícil para demandas fáceis, em oposição à autocracia, que encaminharia respostas fáceis para demandas difíceis.
Trata-se de um livro esclarecedor, sendo-o, no entanto, para problemas datados. O autor não suspeitava (e nem teria como fazê-lo) do modo como narrativas superlativamente antidemocráticas se apoderaram de uma compreensão de mundo liberal.
A confusão entre o liberalismo econômico, o liberalismo político, o liberalismo jurídico, o liberalismo e o conservadorismo nos costumes parece ser um dos maiores dilemas de identificação pelos quais hoje se passava.
Esse problema afeta o Brasil de modo intenso. Há uma barafunda de entendimentos (ou pretensos entendimentos) sobre o alcance, os limites e a extensão do liberalismo, em suas várias formas.
A leitura de pequeno grande livro de Bobbio esclarece muitas dúvidas do leitor customizado, apressado e tiktokiado.
Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy.
Livre-docente pela USP, doutor e mestre pela PUC-SP, advogado, consultor e parecerista em Brasília. Foi consultor-geral da União e procurador-geral adjunto da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional.
Publicação pelo site:
https://www.conjur.com.br/2022-ago-14/obra-liberalismo-democracia-norberto-bobbio/
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Edjar estudou latim, grego, aramaico, alemão, francês e espanhol, com formação também em Filologia, estudou direito canônico e pátrio, formulador como tese em Astrofísica, O Princípio da Incausalidade.
Autor de diversos artigos científicos publicados em sites.
Licenciado em Filosofia, Sociologia e História, formado em Psicologia, com registro pelo Mec, pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC-MG, outras Universidades, como as Federais e o Mackenzie, estudando sempre política e economia.
Experiência na orientação de estudos em temas diversos. Professor convidado do Instituto Parthenon - Instituto Brasileiro de Filosofia e Educação-www.institutoparthenon.com.br
Edjar Dias de Vasconcelos.