Frestas na cena psíquica dos cosplayers

Introdução

Fazer cosplay é uma prática de encontrar verdades,

não de fabricar mentiras.

Morgan

Tendo como foco as frestas na cena psíquica de cosplayers, este estudo se pauta basicamente no approach psicanalítico. De início, as definições de cultura geek e de cosplay são disponibilizadas. A seguir, o cosplay é pensado sob o viés da psicanálise, psicologia, filosofia, antropologia, dentre outros. Ademais, concepções da autora sobre o desejo, os traumas e o sistema das representações visam auxiliar na análise dessas frestas. Na próxima seção, o método clínico psicanalítico voltado para situações extraclínicas - entrevistas com cosplayers - permite acessar as frestas de seu eu. Na sequência, os aportes teóricos são articulados à análise desse material empírico para cartografar os modos de produção de subjetividade dos cosplayers e as interações entre eles. Com isso, contempla-se esse fenômeno de grande alcance na cultura contemporânea.

Cultura geek

Estilo da vida de pessoas com grande interesse em cosplays, livros, filmes, séries, histórias em quadrinhos, mangás, animes, jogos eletrônicos e de tabuleiro, computação, música eletrônica, coleções de objetos e brinquedos temáticos e cultura pop em geral. Envolve novas tecnologias relacionadas às diversas áreas do entretenimento. Parecem especialistas nas áreas de que gostam, pois se dedicam a pesquisar e aprender tudo sobre elas. Porém, eles não são solitários ou antissociais (Fernandes, 2022).

Portanto, a cena cosplay constitui um tópico de interesse na cultura geek.

A cena cosplay

As convenções de filmes de ficção científica nos EUA em 1930 constituem a origem do cosplay, pois os fãs se vestiam como personagens de filmes em concursos de fantasias/masquerades. Logo, a prática tornou-se bastante expressiva entre os jovens de Tóquio, trajando os costumes das personagens dos mangás, animês e filmes de ação (Luyten, 2005). No Brasil, o cosplay afirma-se ao final de 1990, juntamente com o início dos festivais de animês. As convenções contem produtos da cultura pop consumidos pelo público jovem, que atualizam as personagens e narrativas midiáticas. A estética do kawaii encontra beleza nas coisas frágeis, imaturas, inocentes e puras combinadas com a necessidade de proteção dos adultos (Nunes, 2013).

O processo histórico, que deu visibilidade aos jovens na última metade do século XX, fundamenta a emergência da cena cosplay nas culturas juvenis urbanas. Reguillo (2012) concebe a juventude como uma invenção do pós-guerra, na qual uma poderosa indústria cultural oferecia bens exclusivos para o consumo dos jovens. Estes jovens protagonizaram a revolução cultural no Ocidente a partir de 1960. Conforme Hobsbawm (2009), a cultura jovem tornou se a matriz da revolução cultural nos modos e costumes, nos meios de gozar o lazer. Nas sociedades urbanas, ser jovem é entendido como o ápice do desenvolvimento - visão dominante nas economias de mercado bem-sucedidas.

Quanto a sua inserção nos espaços urbanos, Straw (2004) expressa que a cena cosplay se refere à esfera de sociabilidade, criatividade e conexão em torno de certos objetos culturais da vida social, de modo que as práticas garantem um sentido ao espaço. A cena cosplay se vale de inúmeros sistemas sígnicos, sendo que os sistemas estão imersos em um continuum semiótico, ocupado por formações semióticas de diversos tipos, que se comunicam em diversos níveis de organização (Lotman, 1996). Muitos jovens enxergam nesta prática modos de resistência plural, diversa, polimorfa, vinculada a relativização de identidades e de recusas das formas ‘normais’ ou convencionais de comunicação e relacionamentos sociais (Freire Filho, 2007). Alguns cosplayers dão corpo à diferença entre as pessoas, ao se recusarem a se fundir com o idêntico (Silva, 2009).

Considerando a cena cosplay como trajetória de circulação de textos culturais, há narrativas, personagens, atores sociais e circulação de sentidos. Ela revela modos de exercitar a teatralidade pública adensada pelas emoções geradas pelas narrativas midiáticas em sua interface de comunicação e consumo. Nos nexos entre cosplayer e cosplay, as fontes de inspiração dos cosplays abrangem os signos da cultura pop japonesa, mediante personagens de mangás, animês, games e outras narrativas. A música e a moda urbana japonesa representadas pelas lolitas e fairies formam novas cenas em espaços produtores de sentidos. Celebridades como Lady Gaga, fenômenos editoriais como Harry Potter e personagens de Doctor Who e The Walking Dead somam-se às criações da Disney e da Marvel. Logo, uma rede de personagens vindos das mídias e da cibercultura, de vários gêneros e recortes temporais distintos inspiram os cosplayers (Nunes, 2013).

Mason-Bertrand (2019) acrescenta que a tolerância e a aceitação constituem facetas centrais do cosplay. O cosplay provê um espaço afirmativo seguro com valores e normas tolerantes. criando um senso de solidariedade e uma atitude de acolhida para com pessoas, que poderiam ser alienadas socialmente. Cultiva a aceitação da etnicidade, gênero, sexualidade, dificuldades sociais e saúde mental. A aceitação de sexualidades e gêneros não-normativos permite que cosplayers possam cruzar os limites do sexo sem estigmatização. Assegurando a inclusão, eles são condescendentes ainda para com pessoas com dificuldades sociais e com doença mental. Os cosplayers podem incorporar aspectos de sua identidade cotidiana nas performances, para instilá-las com autenticidade. Enfim, eles criam um espaço para escapar da intolerância na vida cotidiana.

Ramirez (2017) contrapõe que o cosplay promove valores como aceitação e tolerância, mas reproduz sistemas de opressão baseados em raça, gênero e classe, ao privilegiar a classe média/alta, os brancos, os fisicamente aptos e os homens cisgênero. Os cosplayers com mais recursos e maior capital cultural recebem maior reconhecimento e validação dos outros. Por outro lado, os cosplayers vivenciam uma compreensão mais profunda de sua identidade, fazem mais conexões sociais e desenvolvem maior coesão social. O cosplay desafia e desconstrói os mesmos sistemas de estratificação social, que ele reproduz. Ele resiste às estruturas de poder hegemônicas, pois seus atores criam estratégias contra hegemônicas e subversivas, para melhorar o acesso ao capital cultural.

Cantone e Laudanno (2013) defendem que a atitude adolescente de imitar um papel adulto, que emana independência, força e poder, é um fenômeno transgeracional e transcultural. Ele ilustra como os modelos adultos reais são eleitos por eles como referência, a qual eles podem se assemelhar ou se diferenciar. No cosplay, este processo não encontra ressonância no modelo real e a dimensão fantástica se torna a única via de descarga para a emoção. A relação do cosplayer com o personagem parece um modo de ele exprimir a si mesmo, numa tentativa de comunicar um mal estar pessoal-social, que não pode ser verbalizado e cuja única via de expressão é a imitação de um personagem. A dimensão pessoal orientada para o evitamento, a retirada e a fragilidade narcísica sugerem que a identificação - com um personagem fantástico - seja um modo de apaziguar a angústia dessa crise identitária. A identificação ajuda a enfrentar a angústia sentida como incontrolável e a precariedade do self. O corpo aparece hiperinvestido, como meio de comunicação da identidade. Dada a importância atribuída ao corpo e a modificação de si para realizar um bom cosplay, a semelhança física e a semelhança construída, através da imitação do personagem, colocam o cosplay na categoria das modificações corporais. O cosplay, suspensão temporária de um self frágil frente à angústia evolutiva, constitui um precursor da modificação corporal, sendo que o travestimento do corpo e sua representação são efeito da dificuldade de simbolização. O cosplay constitui uma modificação de natureza transitória e isenta de qualquer sofrimento, mas a dificuldade de simbolizar o corpo, seu hiperinvestimento narcísico e a falta de um modelo adulto de identificação leva o adolescente a se identificar com um personagem de sua infância. Dada a difusão do cosplay a nível mundial, cabe pensar a interação entre fatores sociais e individuais em sua gênese e desenvolvimento.

Letamedi (2021) avalia o cosplay como expressão visual externa de fandom acompanhada por uma transformação psicológica relativa à personalidade, poder, habilidades, gênero e sexualidade. Os cosplayers gostam das conexões sociais das comunidades cosplay, de sua criatividade e de seus aspectos psicológicos. A transformação psicológica de se vestir como um personagem é uma motivação gratificante. O prazer de se vestir como outra identidade é sua característica mais motivadora. Alguns adolescentes se sentem incapazes de explorar experiências e expressar emoções culturalmente não aceitáveis []. O cosplay lhes permite acessar traços de um personagem - ousadia, coragem, agressividade e hostilidade. No cosplay, não há a tendência a comportamentos inadequados ou riscos psiquiátricos. É mais provável que as experiências de validação, as conexões comunitárias e os elementos de mídia social criem amortecedores para a depressão, a ansiedade social e a solidão. Para as identidades marginalizadas, o cosplay pode fortalecer a experiência de [] estar no controle, ser livre, ser herói e se sentir forte, reverenciado e respeitado. Vestir-se como o personagem oposto ao seu gênero pode fortalecer a capacidade de incorporar características como poder, controle e visibilidade na mulher ou sensualidade, emotividade e vulnerabilidade no homem. No cosplay, o gênero é muito mais fluido, flexível e acessível. Quanto a isso, Adam e Galinsky (2012) cunharam o termo cognição indumentária para se referir à forma como roupas influenciam os processos psicológicos das pessoas (Muller, 2021).

Barboza (2013) vê o universo cosplay como um mundo paralelo de busca pela Terra do Nunca, onde os cosplayers se sentem seguros numa relação quase infantil. Eles se sentem livres para realizarem seus desejos e sua construção identitária se dá a partir das referências de mundo que são agregadas, em especial no plano da arte - maximizado no mundo globalizado. Ao utilizarem uma representação fictícia, eles expõem, pela vestimenta, performance e adornos, características que se assemelham e reproduzem o personagem preferido e demonstram sua identidade para o mundo mediante o cosplay. Nessa esteira, Freire Costa (2004) aborda os significados culturais das representações identitárias que os jovens constroem para si, em seus multipertencimentos, independentemente do que consomem mediante a compra, que os define no grupo social.

Conforme Slater (2002), o mundo do consumo hierarquiza, exclui, classifica. Sendo assim, Nunes (2013) expressa que os termos cospobre e cosplay são oposições binárias, que definem intenções. As pessoas que não participam dos desfiles e não se preocupam com a fidelidade absoluta ao personagem estão mais próximas à denominação cospobre, enquanto a competição mediante o cosplay concorre a premiações relevantes. De igual maneira, estas oposições indicam hierarquias e relações econômicas assimétricas, evidenciando os recursos financeiros necessários para fazer cosplay.

Fazer cosplay e ser cosplayer não impede que eles exerçam outros investimentos identitários/outras profissões.

O hibridismo nas preferências, nos pertencimentos e nas identificações atesta a heterogeneidade e os modos diversos de se estar junto ao outro. O consumo afetivo, material e midiático, descortinado na cena cosplay, funciona como código cultural e inaugura novas sensibilidades. Os cosplayers provocam rupturas e ressignificações das narrativas e de personagens hegemônicos (Nunes, 2014 a).

Alguns personagens usam cores pasteis normatizadas para roupas, brinquedos e acessórios de bebês e crianças, reforçando o estereótipo da feminilidade associada à ingenuidade infantil, erigindo um único jeito de ser menina: doce, ingênua, de rosa claro. O cosplayer reproduz o discurso dominante das narrativas midiáticas, mas, paradoxalmente, destrói essas ordenações sociais. A ressignificação destes discursos configura singularidades e indica a resistência aos códigos de comportamento adulto. Impõe-se a potência criativa do inconsciente maquínico-desejante, atravessando as cristalizações sociais e produzindo intensidades. Talvez fazer cosplay possibilite inventar outro mundo, criar novos territórios, onde seja viável se libertar mais e mais. O lugar de congregação dos cosplayers se torna o espaço atópico e utópico, com personagens amados, acionados pela memória de afetos e conectados a muitos tempos simultaneamente: à infância protegida e ao tempo dilatado da juventude (Nunes, 2013).

Dentre as motivações para a escolha do personagem, a identificação física e/ou psicológica entre o cosplayer, o personagem e a narrativa é a razão mais citada. O primeiro motivo para a escolha do cosplay é o afeto pela personagem. Quanto aos critérios para sua escolha, a personagem deve promover identificação; a história em si; a disponibilidade dos materiais; o porte físico do cosplayer e da personagem. A admiração pelo personagem pode incluir sua exclusividade, seu caráter único ou inusitado. Fazer cosplay desvela as alianças e as rupturas entre a produção das subjetividades em serie e das subjetividades singulares (Nunes, 2014 a). Nesse caso, os inconscientes desinvestem as linhas de montagem da subjetividade, investem outras linhas e inventam outros mundos (Guattari; Rolnik, 2005).

O inconsciente [do cosplayer] se espraia por toda parte, conectado pelo desejo e articulado ao espaço social. Entretanto, as fugas do desejo, das quais a infância e a adolescência são portadoras, são sistematicamente contidas [...] por regulamentações e leis, reputadas para reger o comportamento ‘normal’ do indivíduo (Guattari, 1988). Pois, o espaço do evento, semiotizado de modos diversos, promove acordos ambíguos entre o cosplay e o cosplayer, sob o broquel da liberdade, da paródia, do espírito lúdico e da juventude. Mecanismos disciplinares incidem sobre seu corpo e sobre o tempo-espaço da festa, vivenciada como espaço-tempo de rupturas e de estados alterados da consciência, mas isento de álcool e de confusão - sob o aval da polícia (Nunes, 2013).

As relações entre esse universo lúdico, expressivo e performático do cosplay e o mundo prescritivo do trabalho aparecem no surgimento dos cosplayers profissionais. O consumo desvela-se na circulação de capital, de artefatos e afetos, pois os cosplayers ajudam uns aos outros, trazem suas famílias, trazem amigos e fazem novos amigos. Os partícipes da cena cosplay clamam por inclusão, pertencimento e reconhecimento, graças ao lazer, ao lúdico e à estética dos personagens (Nunes, 2014 b).

Nessa linha de raciocínio, Crawford (2019) entende que a criatividade está se tornando cada vez mais um requisito de participação na cultura capitalista contemporânea. Num mundo caracterizado pelo consumo de massa, identidades líquidas, comunidades fluidas e velocidade urgente, o cosplay cria um espaço para a brincadeira e oferece algum descanso e a oportunidade para mover-se devagar e realizar coisas.

O universo cosplay em outros países

Rosenberg (2018) colabora pensando a psicologia do cosplay norte americano. As razões mais comuns para fazer cosplay incluem diversão, gostar do personagem e expressão criativa. A princípio, presume-se que os cosplayers têm como características de personalidade, o desejo de aventura, a busca de sensações e a sociabilidade. Porém, muitos cosplayers são tímidos e fazer cosplay lhes permite ser mais extrovertidos do que o normal. Sua transformação psicológica deriva das semelhanças e ressonâncias entre ele e seu personagem, com seus aspectos internos - personalidade, história - e externos - traje, aparência física. Além da transformação externa, sua experiência interna, psicológica e autoexpressiva envolve mudanças em seus estados psicológicos: empoderamento, orgulho, aceitação, bravura, singularidade, heroísmo e poder.

Poerwito-Setijadi (2012) adiciona que os cosplayers indonésios negociam sua identidade entre seu self e o self dos personagens. O cosplay é um meio importante de eles se engajarem em uma construção significativa do autoconceito e confiança. Conforme Ellard (2023), os cosplayers valorizam sua arte pela construção de confiança e conexão, levando-os a se juntar em prol de uma experiência segura para todos. O slogan Cosplay is not consent afirma que usar uma fantasia, não importa a roupa ou o personagem, não é consentimento para assédio sexual e outras ações indesejadas.

Pushkareva e Agaltsova (2021) informam que o cosplay é uma das direções da cultura suave, sendo realizado através da visualização sincrética de imagens da cultura de massa, autoconhecimento e socialização dos jovens. As formas culturais arcaicas dos feriados primitivos totêmicos, do carnaval medieval e das primeiras formas de teatro são reproduzidas no cosplay. Suas formas culturais tradicionais são dotadas de novos significados culturais: o jogo, a socialização dos jovens através da identificação e imitação de personagens, o desenvolvimento criativo de personagens. No cosplay, há uma revitalização parcial de formas culturais arcaicas, como o zoo-mistério, o carnaval, as primeiras formas de teatro. O cosplay na Rússia abarca um repertório temático mais amplo do que nos EUA e no Japão, pois inclui também imagens de animação soviética.

Nouhet (2005) afirma que o cosplay japonês está ligado ao carnaval e à flexibilização temporária de regras e status sociais, ao direito de brincar com os limites do aceitável ou do proibido, à liberdade de aparecer e de se sentir diferente da imagem apresentada para o outro. No Japão, o desvio dos códigos de vestimenta tem uma função subversiva e representa uma pequena perturbação nas convenções sociais. A criatividade é exercida para chegar a uma semelhança encarnada com o personagem. Os personagens se associam à metamorfose, reversibilidade e onipotência. O cosplay permite a passagem de um estado a outro através do despir-vestir, velar-revelar, fornecendo um suporte narcisista para a ligação corpo-fantasia-exibicionismo. Os shows revelam a problemática adolescente: a ligação entre brincadeira, prazer e fantasia; o corpo em transformação; o envoltório protetor ou escudo de excitação, o traje como recipiente narcísico e como suporte para identificações e para a diferenciação dos pais.

Depoimentos de cosplayers

Visando acessar o mundo mental de cosplayers, lança-se mão de trechos de entrevistas com eles. Divididas em duas partes, as entrevistas com cosplayers brasileiros e de outras nacionalidades dão a conhecer frestas em seu cenário mental. Essas frestas põem em questão que as entrevistas oferecem representações dispersas e limitadas de sua psique. Em comparação, as sessões de análise revelam a cadeia associativa das representações, sua relação com a história de vida do sujeito, sua repetição nas sessões e a mudança das representações ao longo do tempo.

As aspas põem em relevo as frestas no cenário mental dos cosplayers. O itálico destaca as frestas de seu eu/representações mentais e, ainda, palavras estrangeiras. Os colchetes suprimem trechos de seu discurso desnecessários para essa cartografia.

Cosplayers brasileiros

Fernanda, 13 anos: É liberdade de expressão, é para se libertar da sociedade. Aqui, você não tem medo de ser julgado, você está numa família’ (Nunes, 2013).

Kakao, 19 eterno: ‘Eu era totalmente zoada na escola e aí eu me achei... era o mundo que eu me encaixava. [] era um monte de gente igual eu. Eu pensei aqui eu não preciso fingir ser uma pessoa que eu não sou, posso ser quem eu sou [...]. Eu não tenho que seguir um padrão e aí eu comecei a me libertar cada vez mais’. Ela definiu sua idade como 19 eterno (Nunes, 2013).

Lucas, 15 anos: ‘Outra dimensão, eu costumava ir pra escola com esta touca [de orelhas compridas] e o pessoal olhava... oh! meu Deus!... eu não tô nem aí, é o meu estilo. aqui eu me sinto em casa mesmo, num outro mundo, é a minha dimensão’ (Nunes, 2013).

Bianca: ‘entrar na cena é se desligar, entrar noutro mundo (...) se você não tem um escape, como pode ser criativo? se não brincar, que vida triste vai ser’ (Nunes, 2013).

A relação entre negritude e personagens da rede de narrativas midiáticas é também mencionada pelos cosplayers.

José Luiz/Jedi Negro de Star Wars, 40 anos: ‘só faço cosplay desse personagem para demarcar um posicionamento político, as pessoas afrodescendentes não têm uma referência e quando têm, elas se alegram em ver’(Nunes, 2014b).

Mariana/ Tempestade do X- Men, 19 anos: ‘porque tem pouco cosplay que dá pra fazer, devido a minha cor’(Nunes, 2014b).

Paula/garota McDonald’s: ‘é mais parecido com a gente, deu pra fazer porque não existe, é um palhaço. Há um certo respeito por você, porque você tá vestido como personagem’ (Nunes, 2013).

Wellington/Pantera Negra: ‘O personagem tem uma importância muito grande para mim por conta da representatividade. Sofri racismo e bullying na adolescência, então eu cresci com a não aceitação de quem eu sou. Ler os quadrinhos e vivenciar essa história me ajudou a aceitar quem eu sou e quais são as minhas origens’ (Canhisares, 2020).

Cosplayers de outras nacionalidades

Moon, garota americana, 18 anos: ‘cosplay é um método de expressão e escapismo e uma forma de ser outra pessoa []. Com o cosplay, me sinto mais confiante e confortável comigo, me faz sentir que sou capaz de fazer coisas que normalmente não sou capaz. Também me ajuda a me expressar de maneiras que normalmente tenho dificuldade em expressar. O cosplay [] teve um impacto positivo na minha saúde mental. Eu luto com muitas coisas, incluindo ansiedade e transtorno depressivo e problemas de saúde física []. Fazer cosplay ajuda a aliviar temporariamente o estresse da minha saúde (Muller, 2021).

Morgan, garota americana: ‘A principal razão pela qual adoro cosplay é porque ele proporciona uma espécie de fuga da realidade. Como alguém que não foi a pessoa mais forte e muitas vezes se sentiu sozinha no mundo, fazer cosplay [] me trouxe para uma atmosfera totalmente nova de apoio e aceitação de pessoas, que eu não sabia que existiam. Comecei a não me importar com o que os outros pensavam de mim e dos meus interesses. Se isso te faz feliz, não importa o que as outras pessoas pensam de você’ (Ellard, 2023).

Ellard, garota americana: ‘Apesar de ser mulher, só tenho interesse em fazer cosplay de personagens masculinos. Acredito que o motivo tenha a ver com o tipo de personagens que admiro e com a liberdade de me apresentar como um gênero diferente [] em um espaço onde não serei julgada por meus interesses. Existem fatores comuns que me atraem nos personagens masculinos: suas jornadas para se tornarem mais confiantes em si mesmos, suas atitudes enérgicas e lúdicas e seu conforto em seus corpos e na forma como exalam feminilidade. Não apenas posso explorar as diferentes formas de masculinidade, mas eu ganho confiança quando consigo me parecer com o personagem’ (Ellard, 2023).

Ace se identifica como uma mulher queer e altera ela/elas para ele/eles no cosplay. Continuar fazendo cosplay serve para expressar sua própria sexualidade e gênero em oposição aos estereótipos sobre as mulheres e para trabalhar sua confiança corporal. Ace: ‘Eu considero o cosplay seguro - é como uma concha onde posso ser atraente, sexual, feminina. E o meu verdadeiro eu está lá dentro em algum lugar, mas estou segura. Porque quando você está olhando para uma foto de cosplay e depois olha para meu verdadeiro eu, muitas vezes você nem reconhece que sou eu. Eu pareço tão diferente em uma foto de cosplay. Eu nem me reconheço. Embora eu seja feminista, desafiando constantemente [estereótipos femininos] e expressando minha própria estranheza, o cosplay ainda traz essa ansiedade para mim: não me sinto confiante sobre como minha sexualidade e meu corpo serão comparados às personagens femininas de seios grandes. Isso definitivamente representa um desafio para mim. Quando quero fazer cosplay desses personagens, enfrento questionamentos e isso me impede de explorar todo o meu potencial no cosplay. Há transfobia na comunidade cosplay, mas isso é contra a ideia de cosplay porque cosplay deveria desconsiderar sua própria realidade - um mundo de fantasia onde você não fica limitado a como você é na realidade. Você tira uma folga do seu corpo por um dia e pode viver a vida de outra pessoa. Postar nas redes sociais faz parte do meu crescimento pessoal, parte da forma como me conecto com o resto do mundo. O cosplay é uma janela para o mundo ver uma parte de mim que está fora da minha aparência. Quero postar numa comunidade onde as pessoas apreciem meu trabalho e não julguem meu corpo. [] quero manter o cosplay em um nível que me faça feliz, em vez de me trazer mais ansiedade. Quero desafiar estereótipos. Quero trazer mais criatividade para [] fazer coisas diferentes com o cosplay. Quero que as pessoas fiquem impressionadas com a coragem de desafiar coisas [] (Ellard, 2023).

Cas, garota americana: ‘O cosplay tem sido muito importante para descobrir meu gênero, porque eu questionei muito isso enquanto crescia. [] fiz cosplay quase exclusivamente de personagens masculinos por anos e anos, porque estou fazendo cosplay de mulher o tempo todo na minha vida cotidiana. Em nossa sociedade, é muito desaprovado ter certas características corporais. A comunidade tem sido tão tranquila e aberta com isso, então tem sido um impulsionador da confiança corporal. Isso é o mais importante para mim [] como pessoa gordinha. Cosplay é para todos os tipos de corpo (Ellard, 2023).

Kaitlyn, garota americana: Enquanto crescia, muitas vezes me disseram para ter vergonha dos meus interesses, que eu devia ter medo de não agir como menina, que era uma fase que eu iria superar e que teria vergonha. Em vez disso, aprendi a abraçar o fandom como parte do que eu sou []. Isso me permite mostrar meus interesses [] e ter orgulho deles (McIsaac, 2012).

Mac Beauvais, garoto americano: ‘Existem muitos motivos excelentes para fazer cosplay [] mas a verdadeira força motriz para mim tem sido a autoconfiança. Passei muitos anos da minha juventude me sentindo estranho, feio e indesejado para meus colegas. Eu andava com meus colegas nerds na escola e, embora fosse aceito lá não era o suficiente, porque não estava feliz comigo mesmo. O cosplay me ajudou a ficar mais confortável com minha aparência, mas também mais confiante emocionalmente. É difícil não se sentir confiante desfilando nas folhas da Poison Ivy ou usando seu melhor par de botas Black Canary’ (McIsaac, 2012).

Molly, garota americana: a razão pela qual faço cosplay é porque não há nada mais estimulante do que retratar um personagem que cresci amando. Tive uma infância solitária e isolada e os quadrinhos e outros personagens de ficção foram meus melhores amigos por muitos anos. As super-heroínas me ensinaram a ser uma espécie de mulher forte e durona, incorporar os pilares da feminilidade arrasadora é uma grande emoção para mim. Não há nada mais gratificante do que me [] vestir como a Mulher Maravilha e me chamarem de Diana’ (McIsaac, 2012).

Katarina, garota americana: Cosplay me ajudou a fazer mais amigos do que jamais tive no ensino fundamental e médio juntos. Fui intimidada e fui um pária social. Isso me permitiu ser o melhor possível e aprender habilidades, nas quais posso crescer sempre e focar no que quero fazer da minha vida. Então é por isso que sou apaixonada, é uma grande parte da minha vida, eu não consigo imaginar viver uma vida sem fantasias, porque isso é chato! Posso ser eu mesma todos os dias da semana, mas nos dias de convenção posso incorporar alguns dos meus personagens favoritos e é muito divertido’ (McIsaac, 2012).

Lauren, garota americana: ‘Meu amor por cosplay é composto por partes iguais de processo e produto. Fico emocionada com o desafio de criar, de olhar para algo e pensar como eu faria isso? []. Quando alguém reconhece minha fantasia, é maravilhoso conhecer alguém que compartilha a mesma paixão que eu’ (McIsaac, 2012).

Margarita, garota russa, 21 anos: Tentar manter a personalidade do personagem escolhido permite ao cosplayer se comportar diferentemente da vida cotidiana. [] As histórias de personagens desempenham importante papel nessa identificação. Heróis e vilões ajudam a aprender as diferentes maneiras de resolver problemas. Ao experimentar sua imagem, temos a oportunidade de olhar para a vida através de seus olhos. [] Através do cosplay, cosplayers revelam que eles compartilham ideias e princípios do personagem. Não há cânones especiais para o cosplay original, mas a principal regra é ter uma ideia. []. É importante que a imagem seja detalhada, interessante e viva. [] cosplay demanda trabalho árduo e pessoas pacientes com boa imaginação (Pushkareva; Agaltsova, 2021).

Rachel, garota francesa,17 anos: ‘o cosplay não tem nada a ver com disfarces, disfarçado você não brinca, você se fantasia de qualquer pessoa ou de alguma coisa []. No cosplay, você personifica o personagem [] pra mostrar. Além da dimensão divertida e amigável, não somos qualquer um ou qualquer coisa, afirmamo-nos como personagem. No cosplay, fingimos de verdade’. Em seu site, ela aparece com o rosto descoberto, vestida de comerciante. ‘No meu site, eu não sou o personagem, sou eu no visual dele, mas sou eu’. Ela adora ‘a magia do show, no palco a gente interpreta um personagem. [] você não é mais você mesmo, você é outra pessoa []. Quando entramos na pele do personagem, somos vistos de forma diferente. Não passamos mais despercebidos como na rua. Todo mundo vem conversar com a gente []. A coisa mais interessante no cosplay é estar no grande palco, num verdadeiro anfiteatro, com som e luzes’ (Nouhet, 2005).

Erica, garota argentina, 20 anos: existem várias opções para fazer cosplay: ou o personagem te encanta, [] ou é um personagem pelo qual você está apaixonado ou você faz um favor a alguém. [] Tenho que gostar do personagem []. Você gosta da história, da personalidade, vai além do físico, se o personagem é fofo ou não (Diaz, 2018).

Discussão

Falando da realidade britânica, Mason-Bertrand (2019) frisa que a tolerância e a aceitação são centrais no cosplay, vivenciado como um espaço afirmativo seguro, que cria solidariedade e acolhida para com as pessoas diferentes. Em contrapartida, ao se referir à realidade americana, Ramirez (2017) diverge dela, visto que o mundo cosplay repete e suplanta os preconceitos e os estereótipos sociais.

Com relação aos depoimentos de cosplayers brasileiros, os frequentadores do Anime Dreams 2012 sentem que ali é um lugar à margem do mundo adulto, livre do outro que exclui a pessoa que está fora da norma (Nunes, 2013).

Fernanda, 13 anos: ela experimenta ser livre das imposições familiares e sociais, ser autêntica e ser natural. O cosplay proporciona um ambiente familiar, quiçá não encontrado na sua própria família.

Kakao, 19 eterno: o sofrimento mental de ser zoada e ser excluída na escola deu lugar a estar encaixada no mundo cosplay, ter parceiros, ser livre dos padrões sociais, podendo ser autêntica e ser natural. Contudo, ser eternamente jovem revela sua recusa diante do curso inexorável do tempo, que desborda nas raias de ser impossível.

Canevacci (2005) expressa que nas culturas juvenis, o jovem [] pode perceber sua condição de jovem como não terminada ou não terminável. O cosplayer vira do avesso as categorias que fixavam faixas etárias definidas e claras passagens geracionais. Além disso, o encontro com os outros iguais, porém diferentes da ordem dominante, proporciona-lhe o acolhimento da intimidade, oposta à escola onde a diferença foi simbolizada de forma negativa, por causa das marcas significantes que materializavam as singularidades (Nunes, 2013).

Lucas, 15 anos: ‘Outra dimensão, eu costumava ir pra escola com esta touca [de orelhas compridas] e o pessoal olhava... oh! meu Deus!... eu não tô nem aí, é o meu estilo, aqui eu me sinto em casa mesmo, num outro mundo, é a minha dimensão’.

Bianca: ‘entrar na cena é se desligar, entrar noutro mundo (...) se você não tem um escape, como pode ser criativo? se não brincar, que vida triste vai ser’.

A menção de estar em outro mundo, estar em outra dimensão mais familiar e mais acolhedora cria a vivência de ser aceito e de ser acolhido, que favorecem a saúde mental. Há espaço para ser criativo, ser brincalhão e ser alegre (Almeida, 2022).

A elaboração do sofrimento psíquico ligado a ser negro mediante personagens da rede de narrativas midiáticas é mencionada pelos próximos cosplayers.

José Luiz/Jedi Negro de Star Wars, 40 anos: ‘só faço cosplay desse personagem para demarcar um posicionamento político, as pessoas afrodescendentes não têm uma referência e quando têm, elas se alegram em ver’.

Mariana/ Tempestade do X- Men, 19 anos: ‘porque tem pouco cosplay que dá pra fazer, devido a minha cor’.

Paula/garota McDonald’s: ‘é mais parecido com a gente, deu pra fazer porque não existe, é um palhaço. Há um certo respeito por você, porque você tá vestido como personagem’.

No plano representacional, ela parece sentir ser inexistente, ser excluída, ser invisível, ser desrespeitada e, com o palhaço, pode ser respeitada, em alguma medida (Almeida, 2022). Para Nunes (2013), ela se sente respeitada por encarnar uma celebridade midiática, denotando sua necessidade de inclusão social, de ter voz e ter visibilidade - negadas aos jovens negros e pobres. Contudo, podem ser obtidos mediante o estatuto alcançado pelo viés da fantasia, dispondo da importância e do valor simbólico que eles gozam na cultura do entretenimento e do consumo.

Wellington/Pantera Negra: ‘O personagem tem uma importância muito grande para mim por conta da representatividade. Sofri racismo e bullying na adolescência, então eu cresci com a não aceitação de quem eu sou. Ler os quadrinhos e vivenciar essa história me ajudou a aceitar quem eu sou e quais são as minhas origens’.

A elaboração de seu sofrimento psíquico por ser desvalorizado, ser excluído e ser injustiçado - simplesmente por sua cor - é possível graças à sua identificação com o personagem, que enfrenta desafios, consegue vencê-los e assume um lugar valorizado na sociedade. Desse modo, ele pode ser aceito, ser corajoso, ser vencedor e ser valorizado, ao elaborar ser envergonhado para ser orgulhoso de suas origens (Almeida, 2022).

No que se refere aos depoimentos de cosplayers de outras nacionalidades, questões próximas as de brasileiros são elencadas por eles.

Moon sinaliza a mudança de ser escapista e ser alienada para ser confiante e estar confortável, ser competente, ser expressiva, ser autêntica e ser saudável.

Morgan indica a mudança de ser escapista, ser alienada, ser fraca e ser solitária para ser apoiada, ser aceita, ser independente e ser feliz, ao poder explorar variantes de gênero.

Ellard descreve ser confiante, estar confortável com seu corpo, ser livre para ser masculino, ser feminino e ser fluida em termos de sexualidade.

Ace se define como mulher queer. Ace significa ser um ás, ser campeã. O termo queer designa a pessoa que não se enquadra nos padrões normativos de identidade de gênero e sexualidade, não se identificando com os padrões cisgênero e heterossexual.

Inicialmente, surgem ser autêntica, ser confiante quanto à sexualidade e gênero e estar segura. O cosplay consiste em uma concha de proteção, na qual ela pode ser atraente, ser sexuada, ser feminina. Por outro lado, ser feminista, ser desafiadora de estereótipos femininos, ser estranha e ser ansiosa parecem se confrontar com as representações anteriores. Seu conflito quanto a ser/estar indiferenciada do outro fica ressaltado em: você está olhando para uma foto de cosplay e depois olha para meu verdadeiro eu, você nem reconhece que sou eu. Eu nem me reconheço. Talvez esse conflito inclua ser masculino e ser feminina (Almeida, 2022).

Além disso, Ellard (2023) propõe que ao incorporar personagens de diferentes gêneros, os cosplayers aprendem sobre suas identidades e aumentam a confiança em seu corpo. No cosplay, eles aprendem sobre sua própria fluidez de gênero. Alguns cosplayers começaram sua jornada reimaginando as restrições de género e desafiando os estereótipos mediante o cosplay, continuando a fazê-lo no cotidiano.

Rachel, garota francesa: a dubiedade entre ela ser real e ser fictícia surge em: ‘o cosplay não tem nada a ver com disfarces’ []. no cosplay, você personifica o personagem []. Vigora a confusão mental entre ela ser anônima e ser notável, ser verdadeira e ser fingidora/ser fake talvez: ‘não somos qualquer um ou qualquer coisa, afirmamo-nos como personagem. [] fingimos de verdade’. ‘[] eu não sou o personagem, sou eu no visual dele, mas sou eu’. [] você não é mais você mesmo, você é outra pessoa. []. Não passamos mais despercebidos’ []. Aparece, ainda, ser a estrela e ser obscura: ‘A coisa mais interessante no cosplay é estar no grande palco, num verdadeiro anfiteatro, com som e luzes’. A divisão de seu eu e seu sofrimento mental se revelam nessas oposições (Almeida, 2022).

A respeito de seu discurso, Nouhet (2005) pontua a função continente do traje, envoltório tranquilizador, a pele de si. Anzieu (2018) escreve sobre o vestuário: como segunda pele, ele diz respeito ao corpo, à sua imagem e à sua apropriação; uma segunda pele [...] um escudo de excitação ativa, que duplica o escudo de excitação passiva constituído pela camada externa da pele do ego. Conforme teorizado por Winnicott (2019), o brincar é uma terapia e o jogo está ancorado na realidade.

Passando-se do plano individual para o geral, mais reflexões são necessárias. Cantone e Laudanno (2013) apontam que a identificação - com um personagem fantástico - pode ser um modo de apaziguar a angústia dessa crise identitária. A identificação ajuda a enfrentar a angústia sentida como incontrolável e a precariedade do self. O corpo hiperinvestido constitui o meio de comunicação da identidade. Freire Filho (2007) considera que muitos jovens enxergam nesta prática modos de resistência plural, diversa, polimorfa, vinculada a relativização de identidades e de recusas das formas ‘normais’ ou convencionais de comunicação e relacionamentos sociais.

O material teórico em diálogo com essas fontes empíricas permitiu traçar um panorama desse universo real e simbólico rico e complexo, com seus diversos matizes.

Considerações finais

O fenômeno cosplay - desenvolvido localmente - consiste em uma parte da cultura global geek - amplamente difundida no mundo globalizado. Nesse caso, uma poderosa indústria cultural oferece bens exclusivos para o consumo dos cosplayers. Frente a isso, fez-se mister trilhar caminhos para entender suas subjetividades com suas faltas e suas ressignificações identitárias, propiciadas pela cena cosplay. Ao ofertar possibilidades de o cosplayer se reinventar, por meio de personagens diferentes de seu eu cotidiano, o cosplay dá vazão a transformações psicológicas importantes. Nesse sentido, vigora a percepção dos autores de que o mundo cosplay favorece a saúde mental dos cosplayers. Todavia, sua possível compreensão acerca do relativismo da validação de si a partir do outro pode esbarrar na dificuldade de eles superarem essa dependência afetiva.

As frestas em seu cenário mental contribuem, em parte, para se vislumbrar esse mundo nas fronteiras do real e do fantástico. A crueza da realidade humana precisa, muitas vezes, ser temperada pela leveza e a criatividade do imaginário e do suprarreal.

Referências

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Maria Emilia Sousa Almeida
Enviado por Maria Emilia Sousa Almeida em 25/11/2023
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