Reflexão Sobre Tempo e Amor
Faz certo tempo que "prometi" um texto sobre o tempo para a pessoa que amo. Apesar de não ter certeza de que ela lerá este texto aqui, quero cumprir essa promessa.
Começo o texto relembrando a reflexão sobre o tempo que Thomas Mann faz em "A Montanha Mágica". Para ele, o tempo é ambivalente, pois costumamos dizer que quando estamos nos divertindo, temos a impressão de que o tempo passou rápido demais. Por outro lado, se estamos em uma situação de tédio, dizemos internamente que o tempo está demorando para passar. Essa relação com a duração do tempo é considerada em períodos curtos.
No entanto, em longos períodos de tempo, ocorre o oposto: as situações de diversão parecem dar amplitude à vida, deixando marcas profundas em nossa memória e expandindo a nossa noção de tempo. Por outro lado, os momentos de monotonia, que anteriormente pareciam demorar para passar, transformam-se em uma sucessão de situações que passam rapidamente, devido à sua repetição constante e uniformidade. Em nosso cronômetro pessoal, esses momentos fazem o tempo avançar rapidamente. Quer dizer, os momentos que passam rápido se transformam em lentos, dando profundidade à vida. No entanto, os momentos que passam lentamente, a longo prazo, acabam passando muito rapidamente, resultando em um sentimento de desperdício da vida
A abordagem de Thomas Mann sobre o tempo se relaciona diretamente com os conceitos de Henri Bergson, especificamente a Intuição, Duração e Memória.
Bergson argumentava que o tempo não era uma entidade objetiva e quantificável, mas sim algo profundamente subjetivo e vivido (Duração). Ele fazia uma distinção entre duas concepções do tempo: o tempo cronológico, medido de maneira objetiva e linear, e o tempo subjetivo, que é a nossa experiência pessoal do tempo.
A ideia de Thomas Mann, que se refere a como os momentos de diversão parecem expandir o tempo (Intuição), está alinhada com a concepção de Bergson de que experiências significativas e intensas nos fazem sentir que o tempo está se estendo, uma vez que estamos mais plenamente presentes e conscientes desses momentos. Por outro lado, quando se menciona que os momentos monótonos parecem passar rapidamente a longo prazo, isso também se relaciona com Bergson, pois a monotonia pode nos fazer sentir que o tempo está escorrendo de nossas mãos sem uma experiência significativa (Memória).
Outro pensador que explorou a complexidade do tempo foi Santo Agostinho. Em suas 'Confissões', ele se indaga o seguinte: 'O que é, pois, o tempo? Se ninguém me pergunta, eu sei; se quero explicar a quem me pede, já não sei.'
Neste livro, ele argumentou que o tempo é uma criação de Deus e que existe apenas porque Deus o ordena. Ele acreditava que o tempo é uma medida da mudança e que, sem mudança, não haveria tempo. Portanto, o tempo está ligado à nossa percepção de eventos que ocorrem no mundo físico. Sendo assim, Deus está fora do tempo e, portanto, não está sujeito às limitações do mundo físico, pois ele não possui matéria.
Para Agostinho, existem 'três tempos do tempo', ou 'três tempos presentes'. Ele os chama de 'tempos presentes' porque sempre que refletimos sobre o tempo, o fazemos no tempo presente. Desta forma, existiria o "Presente do Futuro", "Presente do Pretérito" e "Presente do presente".
O "Presente do Futuro" é o momento em que algo ainda não aconteceu, mas é esperado que ocorra no futuro.
O "Presente do ) Pretérito" é quando algo já aconteceu no passado. Agostinho via o presente do pretérito como a nossa memória do passado. Quando lembramos de algo que aconteceu, esse evento passado se torna presente em nossa mente no momento da recordação.
Já o "Presente do Presente" refere-se ao momento atual, o agora, onde experimentamos o presente de forma imediata. É o tempo em que vivemos e experimentamos a realidade ao nosso redor.
A ideia central de Agostinho é que todos esses "três tempos" estão interconectados e, de certa forma, coexistem na mente de Deus. Para Deus, que é eterno e onisciente, passado, presente e futuro estão todos igualmente presentes. No entanto, para os seres humanos, que vivem dentro do tempo e têm uma percepção limitada, a experiência do tempo é linear e sucessiva.
Por fim, gostaria de abordar a percepção de Nietzsche sobre o tempo. Ele é o autor que concebeu o conceito do "Eterno Retorno". Nietzsche sugere a possibilidade de que tudo o que aconteceu, está acontecendo e acontecerá no universo se repita infinitamente, de forma eterna. Isso ocorreria devido à finitude da quantidade de matéria no mundo, enquanto o tempo, por sua vez, é infinito.
Nesse contexto, a questão do tempo assume uma dimensão peculiar. Em vez de encarar o tempo como uma linha reta e irreversível, Nietzsche nos convida a considerar a possibilidade de que o tempo seja cíclico. Sob essa perspectiva, o futuro é, de certa forma, predestinado a repetir-se exatamente como aconteceu no passado. Cada momento de nossa existência está destinado a se repetir em uma sequência infinita.
O "Eterno Retorno" traz consigo uma perspectiva crítica em relação às nossas ações e vidas. Se o eterno retorno fosse verdadeiro, então cada ação que tomamos, cada pensamento que temos, seria eternamente repetido, sem fim. Isso implica uma responsabilidade intensificada sobre nossas vidas, pois nossas escolhas teriam um impacto infinito e duradouro. A noção de arrependimento ou nostalgia também se torna complexa, já que tudo o que foi perdido ou vivenciado intensamente em um momento específico retornaria inúmeras vezes.
Mas qual o sentido disso tudo com amor?
Os autores mencionados enfatizam a importância de nossa subjetividade na concepção do tempo. Os bons momentos vividos ao lado da pessoa que tem o nosso afeto podem tanto ampliar como encurtar a percepção do tempo. Agora, considere a possibilidade de que o tempo vivido com a pessoa que amamos está destinado a retornar eternamente. Certamente, escolheríamos com sabedoria a pessoa com quem compartilharemos nossa vida. Seguindo a linha de raciocínio de Agostinho e com a intuição bergsoniana de que essa é, de fato, uma experiência divina.