Colônia Paraguaia em Campo Grande
Entre os diferentes povos que contribuíram na construção da história de Campo Grande, Mato Grosso do Sul, estão os imigrantes paraguaios. Por ocasião do cinquentenário da Associação Colônia Paraguaia, cuja programação está anunciada para o próximo dia 19 de agosto, é oportuno rememorar alguns traços que justificam a importância do evento. Fundada em 1973, essa associação resultou do persistente trabalho de imigrantes que desde a primeira metade do século 20 se estabeleceram na cidade, com suas tradições culturais, seus ofícios e saberes. Um patrimônio de valor indescritível, nem sempre preservado com o devido destaque na imprensa escrita, mas que fortaleceram os alicerces da pujante Cidade Morena da atualidade.
Essa história pode ser tratada de diferentes pontos de vista, com seus vários capítulos, mas neste artigo, é priorizado o registro da presença de muitos artesões sapateiros, seleiros e coureiros paraguaios que contribuíram na composição social dos ofícios e das artes praticados em Campo Grande. Durante décadas, desde os meados do século passado, era muito comum encontrar esses profissionais estabelecidos na cidade, seja como proprietários de oficinas ou funcionários de sapatarias existentes no centro da cidade. Naquele tempo, era comum mandar confeccionar calçados sob medida para toda a família, cujos profissionais sapateiros dominavam desde as técnicas de fabricação das formas de madeiras até o curtimento de couro.
Desde 1984, quando eu vim morar em Campo Grande, em paralelo com minha carreira de professor, sempre cultivei a pratica do artesanato, confeccionando sandálias artesanais em couro, cintos e outros artefatos. Razão pela qual conheci vários sapateiros e seleiros paraguaios, conhecedores de excelentes técnicas e saberes oriundos dos povos hispânicos. Durante décadas o trabalho desses profissionais foi muito valorizado pelos pecuaristas que compravam botas, perneiras, selas, laços, tralhas de montaria, malas de couro para o exercício das rudes atividades pastoris. Para enfrentar a lida diária, essas peças deveriam ser resistentes ao sol e à chuva, muito bem costuradas com linha encerada e engraxadas. Foi por esse motivo que, em sintonia com a base econômica da pecuária, Campo Grande contou, por muitos anos, com a presença de vários sapateiros e seleiros vindos do Paraguai.
Entre os protagonistas fundadores da Associação Colônia Paraguaia, estava o exitoso empresário Juan Hernando Quevedo, que chegou em Campo Grande, em 1947. A princípio começou a trabalhar na Sapataria Portugueza, propriedade do imigrante italiano João Talamini. Como registra em suas memórias, inseridas no livro Centenário de Campo Grande, publicado em 1999, posteriormente, ele e seus dois irmãos foram a trabalhar na Fábrica de Calçados Zás-Trás. Os três irmãos artesãos trabalhavam no entorno da mesma banca, confeccionando diferentes modelos de calçados para crianças, jovens e adultos, femininos ou masculinos. O próximo passo dado pelo referido empresário foi montar sua própria oficina, a Sapataria Quevedo, que abriu as portas para o início de outras exitosas atividades comerciais.
Entre os primeiros imigrantes paraguaios que vieram para Campo Grande, estavam habilidosos profissionais na arte de charquearia, razão pela qual muitos foram trabalhar no Matadouro Municipal. Ficou na história as várias famílias paraguaias que residiam na Vila Carvalho, não muito distante do atual Horto Florestal, onde funcionou o primeiro matadouro de gado de Campo Grande. Por outro lado, era muito comum encontrar habilidosos peões empregados nas fazendas de gado da região, muitos deles conhecedores da arte de construir cercas e instalações de madeira para as fazendas. Por essas e várias outras razões, é oportuno prestar nossas reverências aos protagonistas do cinquentenário de criação da Associação Colônia Paraguaia, instituição que sempre fortaleceu as bases culturais e sociais da promissora capital do Mato Grosso do Sul.