O futuro dos super-heróis está nas heroínas doces

O FUTURO DOS SUPER-HERÓIS ESTÁ NAS HEROÍNAS DOCES

Miguel Carqueija

Miraculous Ladybug: amável, meiga e amorosa. Comparar com Wolverine.

 

Assisti em 18/7/2022 no youtube um episódio completo da Miraculous Ladybug e achei fascinante. Infelizmente está dublado em espanhol e sem legendas. Eu entendo espanhol, já li livros nesse idioma, porém não é tão fácil entender áudios. Mesmo assim compreendi a história em linhas gerais.

Entendi que Marinette ficou preocupada porque as pessoas de sua família — pai, mãe, avó — evitavam revelar a ela um segredo de família, e pelo que eu entendi ia ser comemorado mais um aniversário do pai. Marinette compreendeu que seu avô paterno, que ela nem conhecia, estava ausente por conta de algum problema do passado.

Resolvida a esclarecer o assunto Marinette descobre a residência de seu avô, padeiro como o pai, e a muito custo consegue entrar e falar com o velho, procurando seus pontos fracos e sem revelar de imediato que era a sua neta. Ela faz uso de um estratagema, convencendo um entregador de farinha a deixá-la entregar o saco. De boné e tudo ela afinal adentra a casa, quase não aguentando o peso que tem de carregar (não esquecendo que ela é uma menina adolescente), e desenvolve um diálogo difícil com o temperamental velhote, que afinal a desafia a preparar pão ao seu lado para ver quem faz melhor. Ele começa a desconfiar que se trata da sua neta quando Marinette começa a cantarolar uma canção que desperta recordações no velho padeiro.

Nesse ponto ocorre um dos constantes ataques do vilão que assola Paris e que quer se apossar dos “miraculous” (jóias de poder) que estão sob a guarda de Marinette e Adrien (o Cat Noir). Marinette é obrigada a se transformar em Ladybug para defender seu avô, atingido pela possessão que o vilão provoca para mudar a forma de suas vítimas e usá-las como fantoches. O Cat Noir aparece para ajudar Ladybug e após muita luta o bem sai vencedor de novo. Ladybug se despede supostamente por conta de algum compromisso, deixando o Cat Noir conduzir o padeiro para casa... onde este reencontra Marinette ainda trabalhando com o pão. Chamado a julgar, o Cat Noir observa que os dois pães – do velho e da jovem – são bons embora diferentes, portanto decidiu pelo empate. O desfecho é comovente, com Marinette orgulhosamente trazendo seu avô pela mão e surpreendendo a família, eliminando anos de separação e incompreensão.

Eu fico imaginando, em que filme de super-herói DC ou Marvel, ou da linha japonesa dos Cavaleiros do Zodíaco, se vê essa exaltação da família? Numa época em que se rejeita a instituição da família?

 

Kim Possible: a singeleza e comicidade da heroína são cativantes. Comparar com o Incrível Hulk.

 

 

 

Nas histórias de Sailor Moon tem muitas coisas assim. As cenas de amor entre Usagi Tsukino e Mamoru Chiba, a ternura de Sailor Moon por sua filha Chibiusa. A maneira intrépida como Sailor Moon salva Chibiusa, quando esta é jogada no vácuo pela vilã Neherenia.

“A promessa da rosa”, primeira animação longa da Princesa da Lua, mostra cenas envolventes de carinho, amor e amizade. Quando Chibiusa, no telhado da casa com os gatos falantes Luna e Artêmis, aguardando a volta das “sailors” do asteroide fatal, observa tranquila: “Sailor Moon é a mãe de todos, certamente protegerá a todos”.

 

Hikaru Shidou: embora ingênua e infantil, quando luta pelo bem nada a faz recuar. Comparar com Deadpool.

 

As “Guerreiras Mágicas de Rayearth”, sendo embora uma franquia que acabou, deixou como legado muita mensagem de amor das personagens Hikaru, Fuu e Umi. No mangá, por exemplo, Umi, a guerreira da água, observa sobre Hikaru, “você é bondosa como uma irmã”. A admiração e a estima que cada uma tem pelas outras duas, embora se conheçam a pouco tempo, é tocante, Hikaru por exemplo, para defender suas amigas não se importa nem com ferimentos e luta mesmo ensanguentada. É como a amizade entre as “sailors”.

Momomiya Ichigo, lider das Tóquio Mew Mews. Impossível imaginar heroína mais inocente. Comparar com a Mulher Gavião.

 

 

 

Nas “Toquio Mew Mews”, série de conteúdo mais infantil, assim mesmo há grandes manifestações de amor, amizade e senso de dever, e surgem frases de conteúdo filosófico como “Amar alguém é um ato de nobreza”. Se pensarmos na futilidade dos personagens da Liga da Justiça, Vingadores, X-Men, Watchmen etc além do culto à violência, veremos que hoje existe uma linha de heroínas (sempre heroínas, heróis aparecem mas são secundários) fora dessa linha e que apresentam conteúdo edificante.

 

Kurenai Ishida: bondosa e sensível, de coração mole. Comparar com o Monstro do Pântano.

 

Mesmo nas “Mussumets”, embora seja uma série produzida de forma mais tosca, deparamos com algumas pérolas nas jovens heroínas, e a Kurenai dá uma autêntica lição: “Justiça não é só dar golpes, nem mesmo ficar repetindo essa palavra! A Justiça nasce dentro dos nossos corações”.

Kim Possible é outra doçura, que ama a sua família e se comete algum erro com alguém, reconhece o erro e pede desculpas.

Uma grande parte do público de super-heróis já se bandeou para as heroínas doces, que contrastam radicalmente com a mesmice brutal dos super-heróis habituais, que hoje em dia aparecem em filmes de vandalismo, de destruição caótica.

Convém esclarecer que essa doçura e meiguice não se encontra nas super-heroínas tradicionais DC e Marvel, como Mulher Maravilha ou Mulher Gavião. Ou a tal Mulher Gato, vilã que virou uma super-heroína de ética ambígua.

Ou o que vocês ainda esperam do Homem de Ferro e outros personagens desse tipo?

 

 

Rio de Janeiro, 19 e 20 de julho de 2022.

 

Sailor Moon: vivencia com Mamoru Chiba o mais denso e terno romance de amor dos desenhos animados. Comparar com o Homem de Ferro.

 

Miraculous Ladybug criada por Thomas Astruc em 2015 (França)

Sailor Moon criada por Naoko Takeushi em 1991 (Japão)

Guerreiras Mágicas de Rayearth criadas pelo grupo CLAMP em 1993 (Japão)

Kim Possible criada por Bob Schoole e Mark Mc Corkle em 2002 (Estados Unidos)

Tóquio Mew Mew criadas por Reiko Yoshida e Mia Ikumi em 2000 (Japão)

Mussumets criadas por Juzo Matsuki em 2006 (Japão)