A PSICOLOGIA EXISTENCIAL COMO UM REMÉDIO PARA OS DIAS ATUAIS

 

     A filosofia existencialista comunicou as bases de seu pensamento à psicologia, o que acabou por criar uma nova abordagem da psique. Trazendo à tona o estado espiritual em que a humanidade se encontra após ser bombardeada por ideologias e filosofias perniciosas, cabe questionar o quão eficaz o tratamento com enfoque existencialista pode se mostrar. Ao lançar um olhar mais aproximativo sobre o que a modernidade causou na alma e no espírito humano, é possível perceber que a proposta existencialista se encaixa perfeitamente como uma resposta para o mal que atinge em cheio a humanidade atual: a perda do sentido da vida. A reabsorção das circunstâncias onde se dá a existência do ser é um dos princípios para o desenrolar da busca por sentido. A psicologia existencialista se propõe a reconciliar o homem com sua respectiva vida e a fazê-lo enxergar o sentido objetivo e o propósito intrínseco que sua existência carrega.

     A psicologia existencialista aborda questões relacionadas com a psique humana e sua articulação com os princípios e fundamentos da existência. Essa escola é muito conhecida por tratar de um ponto fulcral para a sanidade de qualquer espírito: o sentido da vida. A Idade Moderna é historicamente marcada pela tomada de Constantinopla pelos turco-otomanos em 1453 d. C., mas também é marcada pelas grandes navegações, pela descoberta do Novo Mundo, pela Reforma Protestante e pelo uso generalizado da pólvora. Mais ainda, é marcada pela pretenciosa passagem da Idade Média para a “Idade da Razão”, pela revolução científica e pelo Iluminismo.

     O clímax da Idade Moderna é a Revolução Francesa e, desde então, a humanidade nunca mais se viu livre de ideologias e filosofias que trazem em suas vísceras a promessa de um mundo moldado à imagem e semelhança do Paraíso perdido por Adão. Como um desfecho imediato dos fatos que marcaram a modernidade, a Idade Contemporânea também ofereceu à história os seus mortos, com duas grandes guerras e genocídios generalizados por toda a face da terra. Como um desenrolar imediato das ideias cultivadas, por sua vez, a humanidade teve suas bases espirituais terrivelmente abaladas com a disseminação do materialismo racionalista e cientificista.

     Ao se confrontando com uma realidade desoladora, a psicologia existencialista busca reconstruir a ponte que liga o homem aos mais elevados sensos de transcendência e significado. O que é proposto a partir de agora é descobrir se a filosofia existencialista apresenta eficazmente respostas para as perguntas que a humanidade vem se fazendo e se a abordagem existencialista da psicologia pode ser ratifica como um poderoso método para sarar as almas estilhaçadas e os espíritos cambaleantes que se perderam de si mesmos e não enxergam mais nenhum sentido em suas existências.

     Constatar o quão adequado é a psicologia existencialista para as neuroses que afligem a humanidade é algo de elevado preço, pois quando, por meio de uma análise existencial, são dissecadas as causas que estão levando determinada pessoa a uma neurose, é possível perceber cristalinamente que toda a estrutura noológica e psicológica dela está edificada sobre filosofias que funcionam como verdadeiros venenos para a alma. Essa constatação poderia passar despercebida se a abordagem terapêutica escolhida pelo psicólogo fosse outra: a hipótese de que a neurose possa ter uma causa noética não é nem sequer aventada por outras escolas da psicologia como o freudismo ou o behaviorismo, por exemplo.

     Em busca de uma maior intimidade com o existencialismo, será consultado o filósofo espanhol José Ortega y Gasset e, para uma aproximação da abordagem psicológica do existencialismo, serão trazidos à memória os escritos do psicólogo austríaco Viktor Emil Frankl, que sobreviveu aos campos de concentração nazistas enquanto desenvolvia seu método terapêutico conhecido hoje como logoterapia. Para corroborar o que a psicologia existencialista postula, a todo o momento Carl Gustav Jung será trazido à discussão, principalmente por suas manifestações acerca do problema do sentido da vida, mas também como uma forma trazer uma terceira voz à discussão, voz essa que é diversa da corrente estritamente existencialista, seja filosófica ou psicologicamente.

     A existência do ser humano é profundamente determinada e condicionada pelas circunstâncias. Este fato abrange não só os aspectos mais universais e abrangentes, mas também, e principalmente, aspectos da experiência mais direta e imediata de cada sujeito em particular. Quando se vê amarrado a uma série contínua e ininterrupta de compromissos financeiros que atendem a necessidades materiais básicas, por exemplo, pode surgir uma voz dissonante que se interroga pelo sentido de um cotidiano tão massivo e deprimente. Qual o sentido de despertar todos os dias para fazer as mesmas coisas, rodeado das mesmas pessoas, nos mesmos lugares, para atender às mesmas demandas, mês após mês, ano após ano, década após década? Essa é uma pergunta que pode acometer o indivíduo principalmente quando alcança a maturidade e se vê preso como a uma teia de aranha em um emaranhado de circunstâncias das quais fugir nem sempre é uma opção possível. Em verdade, enquanto há circunstâncias das quais se afastar acarretaria em um sofrimento devastador, outras há das quais não há nem mesmo a possibilidade de fuga. O calendário e o relógio são grilhões que até admitem certa margem de manobra, mas dificilmente alguém conseguirá escapar de compromissos econômicos e práticos. Afastar-se do lugar onde se vive ou da família que se tem pode significar uma ruptura terrível e acachapante, e é por isso que mesmo havendo margem para manobrar dentro dessas circunstâncias o que se busca é antes de tudo preservá-las e conservá-las.

 

     Eu não dei a vida a mim mesmo, mas, ao contrário, encontro-me nela sem querê-lo, sem que me tenham consultado previamente nem me pedido permissão. [...]

     A circunstância ou o mundo em que caímos ao viver e na qual estamos prisioneiros, na qual estamos perplexos, se compõe em cada caso de um certo repertório de possibilidades, de poder fazer isto ou aquilo. Perante este teclado de possíveis afazeres somos livres para preferir uma coisa ou outra, mas o teclado, tomado em sua totalidade, é fatal. As circunstâncias são a parte de fatalidade que compõe essa realidade que chamamos de vida. (ORTEGA Y GASSET, 2019, p. 69, 117).

 

     As circunstâncias que prendem o indivíduo na mecanicidade da vida cotidiana podem desembocar em uma crise depressiva, onde todo o mecanismo social para a sobrevivência em sociedade e mesmo para a manutenção da prole perde completamente o significado e se deforma em um símbolo psíquico que denuncia uma alarmante falta de sentido. Mais ainda, as correntes que prendem um indivíduo às suas circunstâncias são muito mais pesadas do que um ligeiro olhar pode revelar em um primeiro momento. Depois de transcorrido considerável tempo de uma vida, as possibilidades que antes pareciam infinitas para o fôlego juvenil começam a se estreitar consideravelmente.

 

     Precisamos viver só um pouco para já tocar os confins de nossa prisão. No mais tardar aos trinta anos reconhecemos os limites dentro dos quais se moverão nossas possibilidades. Tomamos posse do real, que é como ter medido em metros a corrente que prende nossos pés. Então dizemos: ‘é isso a vida? Nada além disso? Um ciclo fechado que se repete, sempre idêntico?’ Eis aí um momento perigoso para todo homem. (ORTEGA Y GASSET, 2019, p 125).

 

     Quanto mais fundo se mergulha na tarefa de mapear a extarquia que determina e condiciona o indivíduo, tanto mais suscetível ele se torna para o surgimento de conflitos existenciais e de personalidade. Se o dia-a-dia maçante e saturador já tem o potencial deprimente, mais acentuado esse potencial se torna quando o indivíduo se pergunta o porquê de ele ter vindo à existência e não encontra o menor resquício de uma razão para isso. O indivíduo toma consciência de que foi lançado na existência sem que seu consentimento fosse consultado. Foi-lhe dado, da maneira mais alheia e indiferente à sua vontade, um país para nascer, uma língua para falar, uma família onde nascer e uma época onde pudesse desenrolar o drama de sua seu própria, inalienável e fugaz existência, e tudo isso sem que pudesse opinar sobre o mínimo ajuste que fosse. As condições ambientais, geográficas, históricas, sociológicas, econômicas, psicológicas e até mesmo e genéticas nas quais o indivíduo nasce determinam muito do que virá a ser sua existência, e mesmo quando as circunstâncias não a determinarem, no mínimo a condicionarão. Neste ponto de consciência existencial, o sujeito pode vir a se questionar o porquê de ele não ter permanecido onde estava antes de seu nascimento, o porquê de ele ter vindo à vida, e qual o sentido de experimentar esta existência em um vale de lágrimas marcado pela fluidez e pelo constante devir. É um pensamento terrível considerar que a inexistência é preferível a ter que existir em determinadas circunstâncias, que há dores tão terríveis que levam o indivíduo a desejar nuca ter nascido e a amaldiçoar o dia de seu nascimento.

 

     A vida deixa, de fato, uma margem de possibilidades dentro do mundo, mas não somos livres para estar ou não neste mundo que é o de agora. Só cabe renunciar à vida, mas, se se vive, não cabe escolher o mundo em que se viver. Isso dá à nossa existência um cariz terrivelmente dramático. Viver não é entrar por vontade própria num lugar previamente escolhido a gosto, como se escolhe o teatro depois da ceia, mas é encontrar-se, de repente e sem saber como, caído, submerso, jogado num mundo impermutável: neste de agora. Nossa vida começa a ser a perpétua surpresa de existir, sem nossa anuência prévia, náufragos num orbe impremeditado. Não demos a vida a nós mesmos, e sim a encontramos, justamente, ao nos encontrarmos conosco mesmo. [...]. Em suas linhas mais radicais, a vida é sempre imprevista. Não nos foi anunciada antes de que entrássemos nela — em seu cenário, que é sempre um, concreto e determinado —, não nos prepararam. [...]

A vida nos é dada — melhor dizendo, nos é arremessada, ou nós somos arremessados nela —, mas isso que nós é dado, a vida, é um problema que nós temos que resolver. (ORTEGA Y GASSET, 2019, p. 48, 49).

 

     Um paralelo a essa experiência que desperta a perda de sentido e significado da existência é o mito de Sísifo, rei de Corinto, que depois de enganar os deuses e a morte, foi condenado por Hades a passar a eternidade no Tártaro rolando uma grande rocha montanha acima. Acontece que quando a rocha alcançava o topo, ela sempre voltava rolando para a base, e então Sísifo empregava um esforço hercúleo para, mais uma vez, levar a rocha até o cume, e então ela tornava a rolar montanha abaixo, e assim por toda a eternidade. O esforço contínuo e inútil de Sísifo faz sua existência parecer completamente desprovida de sentido, e era justamente neste ponto que residia o mais terrível aspecto do castigo imposto por Hades, não no esforço para erguer a rocha em si, mas na transmutação de Sísifo em um cadáver ambulante, em um espírito completamente despido de sentido e significado, condenado a assimilar o absurdo. O mesmo adoecimento ocorre no indivíduo que vê seu cotidiano como um castigo infernal, uma condenação que o força a fazer repetidos esforços que não são nunca concludentes nem tampouco definitivos.

 

     O vazio existencial manifesta-se principalmente num estado de tédio. Agora podemos entender por que Schopenhauer disse que, aparentemente, a humanidade estava fadada a oscilar eternamente entre os dois extremos de angústia e tédio. (FRANKL, 2020, p. 131).

 

     No entanto, o mesmo pensamento que denuncia ao indivíduo a falta de sentido no esforço interminável requerido dia após dia, evidencia um aspecto saudável do espírito: O indivíduo toma consciência de que sua existência não pode se reduzir ao atendimento de necessidades materiais; algo em seu espírito se rebela contra o absurdo e um clamor por sentido e significado se faz ouvir das profundezas da alma. Ainda que esse clamor seja reprimido, ele está de uma vez por todas inscrito no ser e nunca mais deixará de fazer parte dele.

 

     A sociedade do “quem pode mais chora menos”, com suas assim chamadas agências egotistas e a mudança e perda de valores ligadas a esses processos de mudança social, lançam muitos em um vácuo existencial, incluindo os que aparentemente têm tudo do que se vive, mas pouco do para quê vale a pena viver. (JUNG, 2015, p. 28).

 

     Longe de tal procura por sentido ser uma doença mental, como propunha Freud em uma carta escrita à princesa Bonaparte, ela é uma das marcas mais distintivas do ser humano, pois só o ser humano dentre todos os animais é capaz de empreender essa busca por sentido, como bem pontuou o psicólogo existencialista Viktor E. Frankl (2005). Aquele que clama por sentido não é um neurótico, é apenas um ser humano. A vontade de sentido, embora possa provocar neuroses quando não atendida, reflete ao mesmo tempo a salubridade do espírito que se rebela e se convulsiona diante a falta de sentido. Essa sede por significado continuará emergindo mesmo que todas as necessidades materiais, sociais e afetivas estejam plenamente atendidas, porque é dela, em última instância, que depende a sobrevivência do ser.

 

     Foi desprezado ou esquecido que se uma pessoa chegou a colocar as bases do sentido que procurava, então está pronta a sofrer, a oferecer sacrifícios, a dar até, se necessário, a própria vida por amor daquele sentido. Ao contrário, se não existir algum sentido para o seu viver, uma pessoa tende a tirar-se a vida e está pronta para fazê-lo mesmo que todas suas necessidades sob qualquer aspecto estejam satisfeitas. (FRANKL, 2005, p. 18).

 

     O psiquiatra e neurologista austríaco Viktor E. Frankl, desenvolvedor do tratamento conhecido como logoterapia, relatou em um livro suas experiências como prisioneiro e principalmente como médico nos campos de extermínio nazistas durante a ocupação alemã da Europa. Para Frankl, um indivíduo pleno de sentido e significado é capaz de suportar não só a carga tediosa do cotidiano, mas também, e principalmente, é capaz de suportar os mais terríveis sofrimentos e enfrentar os mais dolorosos dos destinos.

 

     A divisa que necessariamente orientou todos os esforços psicoterapêuticos ou psico-higiênicos junto aos prisioneiros talvez encontre sua melhor expressão nas palavras de Nietzsche: “Quem tem por que viver aguenta quase todo como”. Portanto era preciso conscientizar os prisioneiros, à medida que era dada a oportunidade, do “porquê” de sua vida, do seu alvo, para assim conseguir que eles estivessem também interiormente à altura do terrível “como” da existência presente, resistindo aos horrores do campo de concentração. E, inversamente, ai daquele que não via mais uma meta de vida diante de si, cuja vida não tinha mais conteúdo, mas perdia o sentido de sua existência e assim todo e qualquer sentido para suportar o sofrimento. Essas pessoas perdiam a estrutura e sucumbiam muito cedo. (FRANKL, 2020, p. 101).

 

     Assim, a psicologia existencialista se apresenta como um tratamento extremamente producente tanto para enfrentar a falta de sentido provocada pelo tédio do cotidiano quanto para situações de extremo sofrimento. No caso da logoterapia em específico, cada segundo, cada situação, cada acontecimento, desde o mais fútil e banal até o mais assombroso e terrível, suplica para que seja preenchido de sentido e significado. O destino é implacável e as circunstâncias da vida são fatais. Mas mesmo onde o destino se mostra em toda a sua soberania, é o indivíduo quem determina, em última instância, se aquele destino tem um sentido ou não, é o indivíduo que é senhor dentro de sua alma, é ele que escolhe como reagir diante de um destino inescapável, seja sucumbindo, seja o preenchendo plenamente de sentido.

 

     Porque assim é, efetivamente: o que importa é como se suporta o destino logo que nos escapa das mãos. Em outras palavras: quando não é mais possível moldar o destino, então se faz necessário ir ao encontro deste destino com a atitude certa. [...] o que interessa é a atitude adequada, o sofrimento sincero de um destino autêntico. (FRANKL, 2015, p. 74).

 

     Isso é possível porque o sentido é uma conquista do espírito humano e somente nele se plenifica, o sentido e o significado não são plenificados nos acontecimentos nem nos objetos. Isso significa que a realidade não pode ser tida como uma matéria a ser dissecada ou observada sob a lente de microscópios como uma substância que após demasiado exame desvenda seu sentido; o eixo de atenção na busca por sentido se encontra dentro do ser humano, é ele que subtrai ou mesmo amputa as coisas de seu sentido, é ele que vislumbra e preenche as coisas de sentido. Embora toda a realidade esteja repleta de sentido, ela não pode por si mesma dar-se significado, os fatos não tornam sobre si mesmos em busca de sentido, tampouco os objetos o fazem. É somente a alma que persegue o sentido, assim como uma corça clama pelas correntes das águas. A esse respeito, é profícuo trazer á superfície neste momento um caso empírico relatado por Viktor E. Frankl:

 

     Recorreu a mim um médico idoso, que, por muito tempo, exercera as funções de clínico geral. Um ano antes falecera sua esposa, a pessoa que amava mais do que tudo, e não conseguia, no entanto, afastar a dor da perda. Perguntei a esse meu paciente, fortemente deprimido, se já havia refletido sobre o que poderia ter acontecido se tivesse falecido antes da esposa. “Nem pensar”, respondeu, “minha mulher teria ficado totalmente desesperada”. Só precisei então chamar-lhe a atenção: “Veja o senhor, tudo isso acabou por poupar a sua esposa, ainda que ao preço, sem dúvida, de que seja o senhor quem deve agora suportar a saudade”. Seu sofrimento adquiriu um sentido naquele mesmo instante: o sentido de um sacrifício. Não podia nem um pouco mudar o destino, mas tinha mudado a atitude! O destino tinha lhe tirado a possibilidade de cumprir um sentido através do amor. Mas lhe reservara a possibilidade de adotar, diante desse destino, a atitude adequada. (FRANKL, 2015, p. 76-77).

 

     O legado de Viktor Frankl é paradigmático quanto à questão do sentido. O anseio por significado não deve ser reprimido ou sufocado, antes, deve ser tratado como um dos aspectos mais naturais e intrínsecos ao ser humano, deve ser um pensamento bem-vindo e ter uma resposta imediata e contundente. Evitar o conflito interno por sentido ou mesmo escorraçar tais pensamentos os rejeitando in limine não é algo que Jung recomendaria: Tudo o que é rechaçado e violentamente expulso da psique consciente vai desembocar no esgoto sombrio do inconsciente, um lugar habitado por arquétipos malignos que podem irromper súbita e espontaneamente à consciência. Jung ser referia a essa região do inconsciente para onde escorre todo o chorume da psique consciente e onde se escondem os mais terríveis demônios suscetíveis de erupção consciente como o “lado sombrio” do ser humano. A falta de sentido deve ser aceita, enfrentada e resolvida; nunca evitada ou mesmo desprezada. Os escritos de Jung têm uma capacidade peculiar de deixar o leitor terrivelmente perturbado, especialmente por seus registros acerca do inconsciente:

 

     O inconsciente pessoal contém lembranças perdidas, reprimidas (propositalmente esquecidas), evocações dolorosas, percepções que, por assim dizer, não ultrapassaram o limiar da consciência (subliminais), isto é, percepções dos sentidos que por falta de intensidade não atingiram a consciência e conteúdos que ainda não amadureceram para a consciência. Corresponde à figura da sombra, que frequentemente aparece nos sonhos. [...]

     Quando são reprimidas ou desprezadas, sua energia específica desaparece no inconsciente, com consequências imprevisíveis. A energia aparentemente perdida revive e intensifica o que sempre está por cima no inconsciente, isto é, tendências que até então não tiveram oportunidade de manifestar-se ou não puderam ter uma existência desinibida na consciência, construindo assim uma sombra sempre destrutiva. Mesmo as tendências que poderiam exercer uma influência altamente benéfica transformam-se em verdadeiros demônios quando são reprimidas. Por isso muitas pessoas bem-intencionadas têm razão em temer o inconsciente... [...]

     É isto o que acontece em relação a cada indivíduo: por trás de seu mundo racionalmente ordenado, uma natureza espera, ávida de vingança, pelo momento em que ruirá a parede de separação, para se expandir, destruidoramente, na existência consciente. [...]

     Nele [no inconsciente] existe certamente um recanto inferior, um quarto de despejo de segredos impublicáveis que não são propriamente inconscientes, mas dissimulados e apenas semiesquecidos. (JUNG, 2015, p. 40, 96, 172 e 251).

 

     Parece mesmo não ser uma boa ideia reprimir crises existenciais renegando-as ao limbo do inconsciente. Todavia, além do tédio e do sofrimento, há outro fator ainda mais decisivo para o adoecimento de alma que acomete o homem moderno. Esse fator é o ensopado venenoso de todas as filosofias e ideologias que contaminaram a alma humana a partir da Idade Moderna, como o racionalismo, o materialismo e o cientificismo. Todas as promessas feitas pelo Iluminismo seiscentista não se cumpriram; em contrapartida, jogaram a humanidade em um período de trevas marcado por guerras e revoluções. Mas o mais terrível aspecto da modernidade vai além da tragédia material, é o efeito colateral que as novas ideias causaram no espírito humano. O Iluminismo prometia ao homem moderno a libertação do jugo da autoridade, do misticismo e do irracionalismo. O racionalismo colocava na razão a única autoridade intelectual e a única base onde o conhecimento poderia ser erigido. Jung se referia com estas palavras ao racionalismo que premeia o pensamento materialista moderno:

 

     Nós, do Ocidente, acreditamos que uma verdade só é convincente quando pode ser constatada através de fatos externos. Acreditamos na observação e na pesquisa o mais extas possíveis da natureza. Nossa verdade deve concordar com o comportamento do mundo exterior, pois, do contrário, esta verdade será meramente subjetiva. (JUNG, 2015, p. 208).

 

     O cientificismo, por sua vez, avançou sobre o recorte que delimita o campo da ciência. Depois de a ciência ter delimitado o seu campo de atuação por meio de um método, tudo o que não era passível de ser examinado pelo crivo científico foi relegado não só a um conhecimento não-científico, mas a um conhecimento de segunda classe. Ora, delimitar as fronteiras da ciência não implica em si nenhuma anormalidade, mas quando o cientificismo dá um passo além e afirma que tudo o que a ciência não pode provar ou examinar simplesmente não existe é que as coisas adquirem um ar mefistofélico. Toda uma dimensão transcendente foi bloqueada para o homem moderno.

     Com o advento do positivismo, que sustentava a crença de que a ciência seria responsável por levar a humanidade a um mundo de paz e prosperidade, o homem se convenceu de uma vez por todas de que a natureza estava rendida a seus pés. “Conhecimento é poder” era a frase de efeito que impulsionava a ciência desde a modernidade. Mal sabiam que o ovo que estavam a aquecer sob suas asas era o ovo de uma serpente. Logo a ciência estaria a serviço dos Estados e todo e qualquer avanço no conhecimento científico significaria também o avanço do poder de alguns homens sobre muitos outros. O escritor britânico C. S. Lewis teve uma grande sensibilidade em perceber que os motivos para comemorar não passavam de mera retórica:

 

     O que chamamos de poder do homem é, na realidade, o poder que alguns homens possuem de permitir, ou não, que os outros obtenham lucro. [...]

... O que chamamos de poder do homem sobre a natureza, revela-se como o poder exercido por algumas pessoas sobre as outras, tendo a natureza por seu instrumento. [...]

     A conquista da Natureza pelo Homem, se os sonhos de alguns planejadores científicos se realizarem, significa o governo de algumas centenas de pessoas sobre bilhões e mais bilhões. Não há, nem pode haver qualquer aumento simples de poder do lado do homem. Cada novo poder conquistado pelo homem também é, ao mesmo tempo, poder sobre o homem. Cada avanço o deixa mais fraco, ao mesmo tempo em que o deixa mais forte. Em toda vitória, além de ser o general que triunfa, ele também será o prisioneiro que se arrasta atrás do carro da vitória. [...]

     Porque o poder do Homem de torna-lo aquilo que ele quiser na verdade significa, como vimos, o poder de alguns homens de fazer o que eles quiserem de outros homens. [...]. Mas os moldadores de homens da nova era estarão aramados com os poderes competentes do Estado e a tecnologia científica. Nós teremos, ao menos, uma raça de manipuladores realmente capazes de moldar toda a posteridade segundo o que lhes aprouver. (LEWIS, 2017, p. 56, 59, 60).

 

     O método científico levou o homem à lua e aos confins do mundo quântico. Mas a mesma ciência que serve à medicina é a mesma que serve aos exércitos nacionais. Em todas as nações, a plêiade dos melhores cientistas é sempre encontrada a serviço do Estado. Qualquer avanço científico e tecnológico é sempre, em primeiro lugar, examinado para que se averiguem as possíveis aplicações militares, e só quando se torna obsoleto ou mesmo porque não atende a fins belicosos é que outras aplicações são aventadas como hipótese, dentre elas a comercial e o bem-estar humano. Sobre a pretenciosa e petulante “vitória do homem sobre a natureza”, C. G. Jung assim escreveu:

 

     ‘Nós vencemos a natureza’ é apenas um slogan. A chamada ‘vitória sobre a natureza’ nos subjuga com o fato muito natural da superpopulação e faz com que nossas dificuldades se tornem mais ou menos insuperáveis devido à nossa incapacidade de chegar aos acordos políticos necessários. Faz parte da natureza humana brigar, lutar e tentar uma superioridade sobre os outros. Até que ponto, portanto, ‘vencemos a natureza’? [...]

     Como europeu, não posso desejar que o homem adquira ainda um maior ‘controle’ e poder sobre a natureza, tanto exterior quanto interiormente. [...]

     O poder tornou-se de tal modo perigoso que é cada vez mais premente a questão, não tanto de saber o que ainda se pode fazer, mas de que modo deveria ser constituído o homem ao qual se confia o controle desse ‘poder’, ou de que maneira se poderia mudar a mentalidade do homem ocidental para que renunciasse a seu terrível poder. Seria infinitamente mais importante tirar-lhe a ilusão desse poder do que reforça-lo na errônea convicção de que pode tudo quanto quer. O slogan ‘Querer é poder’ custou a vida de milhões de pessoas. [...]

     O homem ocidental não necessita da superioridade sobre a natureza, tanto dentro como fora, pois dispõe de ambas as coisas de maneira perfeita e quase diabólica. O que ele, porém, não tem é o reconhecimento consciente de sua própria inferioridade em relação à natureza, tanto à volta como dentro de si. O que deveria aprender é que não é como ele quer que ele pode. Se não estiver consciente disto, destruirá a própria natureza. Desconhece sua própria alma que se rebela contra ele de maneira suicida. (JUNG, 2015, p. 106, 225, 226, 227).

 

     Soma-se a todo esse construto o ateísmo — que não só nega a existência de Deus, mas, e principalmente, renega ao ridículo toda ideia transcendental ou espiritual —, e está formado o cenário no qual o homem foi jogado na modernidade, tal qual um órfão despojado de suas antigas crenças, tradições e valores. “Eu não preciso dessa hipótese específica”, respondeu Laplace a Napoleão, quando este lhe indagou sobre o porquê da ausência de Deus no seu trabalho sobre astronomia.

     Arranca-se o transcendente, fecha-se o céu, e o niilismo surge como o coveiro que se encarrega do sepultamento do cadáver. O cosmos passa a não ter mais sentido algum, a existência é reduzida a um efêmero fenômeno biológico. O abismo espiritual provocado e sustentado pelo niilismo, segundo escreveu Giovanni Reale, tem profundas raízes na filosofia niilista:

 

     Em suma, a afirmação “Deus está morto” é a formulação emblemática do niilismo e significa que o mundo metassensível (o mundo metafísico) dos ideais e dos valores supremos, concebido como o ser em si, como causa e como fim – ou seja, como aquilo que dá sentido a todas as coisas materiais, em geral, e à vida do homens em particular -, perdeu toda consistência e toda importância. (REALE, 2014, p. 26).

 

     O clamor da alma humana por sentido, a sede por transcendência e a dimensão espiritual do homem foram aviltadas e vilipendiadas. Somente o que era racional e pudesse ser explicado por meios materialistas era incentivado e louvado, ao passo que tudo o que era transcendente, religioso, metafísico e espiritual foi perseguido e combatido como se fosse um pensamento retrógado e indigno de qualquer crédito. O que se viu foi a germinação de um período de guerras sangrentas e revoluções violentas, a Idade Contemporânea deixou para trás a Idade Moderna e transformou o mundo em um grande cemitério a céu aberto, tendo como seu símbolo inaugural a Revolução Francesa. Apesar da promessa iluminista, o racionalismo e o cientificismo marcaram o mundo de uma forma terrivelmente sombria. Como consequência da Revolução Iluminista — ainda que um tanto quanto mais longínqua, mas ainda assim intimamente ligada —, o mundo foi precipitado em duas grandes guerras mundiais, testemunhou a bomba atômica e o acidente nuclear em Chernobyl, presenciou as revoluções comunistas na Rússia e na China e um genocídio generalizado em diversas partes do mundo. Os “bem pensantes” franceses do século XVII ratificavam visceralmente (com as tripas nas mãos!) a parola utópica de que a razão conduziria a humanidade a um mundo mais livre, mais fraterno e mais humano, ou, em suas próprias palavras: Liberté, Égalité, Fraternité. Quem dera os mitos do paraíso reconquistado se reservassem a meros sofismas que estouram no ar como bolha de sabão e não deixam atrás de si nenhum rastro além de gotículas de água inofensivas; o arquétipo do jardim de delícias levou os teóricos iluministas a abrir a caixa de pandora e a libertar todas as desgraças sobre a humanidade. Jung foi insistente em apontar a chaga e denunciar o que havia sido feito com o espírito do homem ocidental, contaminado por ideologias mortais:

 

     Nossa fatalidade são as ideologias, que correspondem ao Anticristo há tanto tempo esperado. O nacional-socialismo (nazismo) se assemelha tanto a um movimento religioso quanto qualquer outro movimento a partir de 622 d. C. O comunismo tem a pretensão de instaurar o paraíso na terra. Estamos, de fato, mais protegidos contra as más colheitas e epidemias do que contra nossa miserável inferioridade espiritual, que parece oferecer pouca resistência às epidemias psíquicas. (JUNG, 2015, p. 209).

 

     Apenas as guerras e revoluções do século XX mataram mais seres humanos do que todas as catástrofes naturais que haviam acontecido no mundo até então, considerando-se terremotos, furacões, erupções vulcânicas, enchentes e epidemias. Destaque importante é o fato de que o maior número de mortes não se deu em períodos de guerra declarada ou de invasão estrangeira, mas em tempos de paz: Nos regimes comunistas, os governantes matavam sua própria população desarmada, fazendo o número de óbitos superarem a Segunda Guerra Mundial. Giovanni Reale foi pontual e cirúrgico ao apontar as causas que levaram a humanidade a um de seus períodos mais sombrios:

 

     A meu ver, tais males e os vários disfarces niilistas dos valores perdidos a eles vinculados podem ser resumidos nos dez itens apresentados a seguir:

     1. o cientificismo e o redimensionamento da razão do homem em sentido tecnológico;

     2. o Ideologismo absolutizado e o esquecimento do ideal do verdadeiro;

     3. o praxismo, com sua exaltação da ação pela ação e o esquecimento do ideal da contemplação;

     4. a proclamação do bem-estar material como sucedâneo da felicidade;

     5. a difusão da violência;

     6. a perda do sentido da forma;

     7. a redução do Eros à dimensão do físico e o esquecimento da “escala do amor” platônica (e do verdadeiro amor);

     8. a redução do homem a uma única dimensão e o individualismo levado ao extremo;

     9. a perda do sentido do cosmos e da finalidade de todas as coisas;

     10. o materialismo em todas as suas formas e o esquecimento do ser, a ele vinculado. (REALE, 2014, p. 35).

 

     Como resultado desse envenenamento metafísico, os efeitos necróticos do pensamento moderno alcançaram proporções devastadoras: o cheiro de morte passou a ser percebido principalmente na dimensão espiritual da existência. A humanidade foi assaltada de seu sentido e arremessada sem piedade em um precipício niilista e materialista onde a dimensão terrestre aprisiona o espírito humano e o sufoca até a morte por inanição. Foi nesse cenário de devastação e morbidez que a psicologia existencialista se mostrou como um eficaz auxílio no tratamento das neuroses modernas. Um dos principais objetivos dos filósofos e psicólogos existencialistas é reacender a chama do sentido no interior da alma humana, reconectar o homem ao transcendente e auxiliá-lo a enxergar que cada segundo de sua vida, por mais insignificante que seja, clama por um sentido e roga a ele que lhe dê um significado.

     Carl Gustav Jung, conquanto não seja um psicólogo da escola existencialista, reconhecia explicitamente que o ser humano depende vitalmente de ideias que trazem sentido à existência, ponto em que seu pensamento se coaduna perfeitamente ao que dizia o pai da logoterapia, Viktor E. Frankl:

 

     Dependemos realmente de ideias e convicções gerais porque são capazes de dar sentido à nossa existência. A pessoa consegue suportar dificuldades inacreditáveis quando está convencido do significado delas, e se sente derrotada quando tem de admitir que, além de sua má sorte, aquilo que faz não tem sentido algum. [...]

     Nossa psique está profundamente conturbada pela perda dos valores morais e espirituais. (JUNG, 2015, p. 87, 97).

 

     Viktor Frankl dizia que o sentido pode ser encontrado até mesmo nas piores circunstâncias e situações que a existência humana está fadada a passar. Nem a dor, nem a morte, nem o sofrimento são capazes de arrancar do homem a capacidade de conferir sentido e significado à sua existência. Frankl não chegou a essa conclusão por meios analíticos ou dedutivos, ele falava de coisas que presenciou e tratou de uma forma intimamente pessoal, enquanto via seus companheiros sofrerem terríveis destinos nos barracões abarrotados de judeus esperando pela aniquilação.

 

     Finalizando, disse que a vida está repleta de oportunidades para dotá-la de sentido. Os meus companheiros mal se mexiam, estirados pelo chão. Vez por outra, ouvia-se um suspiro doloroso. Dei a entender que a vida humana tem sentido sempre e em todas as circunstâncias, e que esse infinito significado da existência também abrange sofrimento, morte e aflição. [...]

     Quando um homem descobre que seu destino lhe reservou um sofrimento, tem que ver nesse sofrimento também uma tarefa sua, única e original. Mesmo diante do sofrimento, a pessoa precisa conquistar a consciência de que ela é única e exclusiva em todo o cosmo dentro deste destino sofrido. Ninguém pode assumir dela o destino, e ninguém pode substituir a pessoa no sofrimento. Mas na maneira como ela própria suporta esse sofrimento está também a possibilidade de uma realização única e singular. (FRANKL, 2020, p. 08, 102).

 

     Assim, o existencialismo se assentou como um robusto e profícuo ramo da psicologia. Ponto fulcral dessa corrente de pensamento filosófico é levar o homem a perceber a extarquia da sua existência, o quanto o destino o condiciona e determina, tendo bem claro diante de si qual é a margem de manobra que a vida lhe oferece. Uma vez abraçado esse destino inevitável, o próximo passo é carregá-lo de sentido. A saúde da alma é então alcançada quando o homem se dá conta de que as circunstâncias em que ele fora jogado quando veio à existência são dele e a ele pertencem como uma propriedade. O processo de apropriação da vida que é dada ao ser é o que vai entregar as ferramentas que serão úteis àquele que, ao tomar posse de sua vida, olha para suas circunstâncias com o anelo profundo e deliberado de lhe preencher de sentido e significado:

 

     Temos de buscar nossa circunstância, tal qual ela é, precisamente no que tem de limitação, de peculiaridade: o exato lugar na imensa perspectiva do mundo; não nos determos perpetuamente em êxtase frente aos valores hieráticos, mas sim conquistar para a nossa vida individual o posto oportuno entre eles. Em suma: a reabsorção da circunstância é o destino concreto do homem. [...]

     Esse setor da realidade circunstante forma a outra metade da minha pessoa: só através dele posso me integrar e ser plenamente eu mesmo. [...]

     Eu sou eu e minha circunstância, e se não a salvo não me salvo eu. Benefac loco illi quo natus es, lemos na Bíblia. E na escola platônica o propósito de toda a cultura se dá como isto: “salvar as aparências”, os fenômenos. Quer dizer: buscar o sentimento do que nos rodeia. (ORTEGA Y GASSET, 2019, p. 31, 32).

 

     A psicologia existencialista é demasiado útil para a crise que o homem moderno atravessa, onde há a perda dos valores espirituais e as ideias transcendentes são ocultadas da vista. Justamente quando o homem se perde — e se sente perdido — é que as circunstâncias vêm em seu resgate, clamando para que sejam inteiramente absorvidas e preenchidas de significado. Quem acorda em um lugar do qual não se lembra e nem sabe como foi ali parar (ainda que isso dure poucos segundos logo após o despertar), olha em volta, percebe os objetos ao seu redor, e logo recaptura a lembrança fugidia; o mesmo acontece com quem se perde de si mesmo no imenso mar da existência: A realidade se impõe tornando o homem inescusável diante da evidência de propósito e significado da existência. As circunstâncias são as tábuas às quais os náufragos podem recorrer quando se sentem já despojados de sentido existencial.

 

     O que é pois a vida? Não busquem longe, não tratem de recordar sabedorias. As verdades fundamentais têm de estar sempre à mão, porque só assim são fundamentais. Aquelas que é preciso ir buscar é porque estão num lugar apenas; são verdades particulares, localizadas, particulares, provinciais, de canto, não básicas. Vida é o que é e o que fazemos: é, pois, de todas as coisas, a mais próxima de cada um. Ponhamos a mão sobe ela, e ela se deixará apertar como uma ave mansa. (ORTEGA Y GASET, 2019, p. 42).

 

     A psicologia existencialista é precisa e altamente eficaz para o enfrentamento das neuroses — principalmente das noogênicas — que acometem a humanidade atualmente. As respostas oferecidas pela psicologia existencialista se coadunam perfeitamente às questões que são levantadas por aqueles que sofrem com a falta de sentido. A reconquista das circunstâncias da vida, a reabertura para o transcendental e a plenitude do significado existencial são forças vitais que sustentam a salubridade psíquica. O senso de sentido da vida pode ser mortalmente determinante diante de situações extremas; ela pode sustentar a vida de uma pessoa ou fazê-la desabar não tendo reação alguma para continuar vivendo. Trata-se de uma filosofia extremamente pertinente para o estado de espírito em que vive a humanidade contemporânea.

 

BIBLIOGRAFIA:

 

FRANKL, Viktor Emil. Em busca de sentido: um psicólogo no campo de concentração. São Leopoldo: Sinodal; Petrópolis: Vozes, 2020.

 

­­________________. O sofrimento de uma vida sem sentido: caminhos para encontrar a razão de viver. São Paulo: É Realizações, 2015.

 

________________. Um sentido para a vida: psicoterapia e humanismo. Aparecida: Ideias & Letras, 2005.

 

JUNG, Carl Gustav. Espiritualidade e transcendência. Tradução de Nélio Schneider. Petrópolis: Vozes, 2015.

 

LEWIS, C. S. A abolição do homem. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2017.

 

ORTEGA Y GASSET, José. Meditações do Quixote. Campinas: Vide Editorial, 2019.

 

__________________. Lições de metafísica. Campinas: Vide Editorial, 2019.

 

REALE, Giovanni. O saber dos antigos: Terapia para os dias atuais. São Paulo: Edições Loyola, 2014.

 

Diogo Mateus Garmatz
Enviado por Diogo Mateus Garmatz em 18/07/2022
Reeditado em 18/07/2022
Código do texto: T7562477
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