O IMPERADOR "MULTIMÍDIA"
O IMPERADOR "MULTIMÍDIA"
Quase ninguém conhece Lúcio Domício Enobarbo, que virou Imperador aos 16, 17 anos, não por algum mérito próprio mas porque sua mãe, Agripina, tratara de "livrar-se" do marido, envenenando-o. Antes, providenciou às pressas o casamento do filho baixinho e míope com a filha de Cláudio, seu marido. Csamentos entre primos e até irmãos eram comuns, já que mulher NÃO GOVERNAVA mas o título de imperador era "vitalício" -- pelo curot tempo que duravam suas vidas -- e hereditário, de pai pra filho. Se só tinha filha, casavam a desditosa com o primeiro candidato a imperador que pretendesse o futuro trono. Depois, era só "encerrar" de algum modo a carreira do sogro ! É bom lembrar que o título deles todos era "CAESAR" -- César, donde se originou Kaiser e Czar -- e que Augusto foi apenas sobrenome de alguns deles.
Ricos e nobres moravam distantes da Roma de poder e intrigas, mas ainda assim eram atingidos por elas. Os Júlios, os Augustos e os Cláudios -- estes, sim, sobrenomes -- herdaram imenso império no qual a Roma de 150 MIL pobres via os nobres a esbanjar a riqueza da pátria em banquetes e palácios.
É nesse "caldeirão" que nascerá o famoso NERO -- suponho que apelido do futuro imperador -- sobrinho de Calígula, outra "praga", filho de um certo cônsul Cneu, nobre de péssimo conceito e todos os vícios. Por parte da mãe, Agripina, "a Jovem", Lúcio Domício tinha nobreza. Sua avó, de igual nome, casara-se com o general Germânico, muito famoso e venerado... com a "morte" dele, o cunhado Tibério exilou a "bruxa", junto com sua filha Agripina, não sem antes torturá-la. De vergonha, ela fez greve de fome até morrer ! Era pouco... os irmãos dela, tios do então bebê Nero, foram condenados á morte. Um suicidou-se antes da sentença ser cumprida, tendo o outro sido obrigado a comer o enchimento de palha de um colchão, antes de ser executado a mando do imperador recém-empossado. .
Povo adepto de horóscopos e predições, as sobre o recém-nascido NERO não foram das melhores e até seu pai declarava que, quem nascesse dele, "estava fadado a ter uma natureza detestável e tornar-se um perigo público". (pag. 19) O menino nasceu em 39dC e deveria herdar uma grande fortuna, mas seu tio Calígula -- o único que "sobrou" da matança promovida pelo imperador Tibério na família de Germânico -- confiscou a herança da Agripina-filha e a exilou em 39dC (pag. 20). Para subir ao trono, tramou a morte do cruel Tibério, que destruíra sua família. Dizem que Calígula era louco e tantas fez que senadores se uniram aos pretorianos para assassiná-lo.
Assumiu o trono Cláudio, irmão do general Germânico e, portanto, tio de Agripina, que a trouxe de volta para Roma em 41dC e, claro, casou com a sobrinha... a maior besteira que faria ! A pedido de Agripina "adotou" adiante o jovem Nero "como filho" e a mãe não perdeu tempo: casou-o aos 16 anos com a filha de Cláudio, Otávia, em 53dC... pronto, o caminho estava aberto para o filho virar imperador, bastava "afastar" os demais pretendentes ao trono, uns 3 ou 4. E foi o que fez Agripina, antes de envenenar o marido... veneno - a temida CICUTA -- era a "arma" mais usada nessas ocasiões, em geral no banquetes diários. Nero usou do recurso várias vezes... numa delas a dose foi tanta que o sujeito "caiu duro no salão", ao invés de morrer em casa, como sempre. Nero passou à História como LOUCO, mas seus primeiros anos à frente do Império foram bem sensatos. Planejou largas avenidas para Roma, preocupou-se com a distribuição de "panem" -- na verdade, farinha de trigo -- para o povo pobre e de escravos "favelados" que circundavam Roma e esmerou-se em divertí-los ("et circensis") em coliseus, nos mais diversos locais. Nos tais JOGOS, como animador privilegiado em contato com a massa, estava êle no seu local preferido, amante fanático das corridas de biga, esporte da ralé que os nobres desprezavam.
Embora detestasse sangue e mortes -- tentou eliminá-las dos combates, sem sucesso -- reconhecia o amor da plebe por êle e a manipulava, para desgosto dos senadores e nobres, obrigados pelo Imperador a se fazerem presentes nos vários dias das lutas, durante as "Juvenais", depois "Jogos Neronianos".
Nero nem estava em Roma quando esta pegou fogo mas, como tinha DONS ARTÍSTICOS -- muito ruins, segundo a maioria -- voltou correndo para "cantar" o pavoroso evento, tocando cítara sobre aquela desgraça, que durou 4 ou 5 dias. O incêndio só não atingiu a área nobre, das mansões e permitiu a Nero não só REMODELAR a cidade inteira como ainda iniciar a construção de seu palácio de quilômetro e meio de extensão e de luxo total -- o povo passando fome ao redor dele -- a "Domus Áurea", Casa Dourada.
O que arruinou Nero, além do assassinato da esposa nobre Otávia para ficar com uma plebéia, Popéia (também assassinada por êle, além da própria mãe, Agripina) foi sua viagem de MEIO ANO à Grécia, em 66dC, para participar das "Olimpíadas" CANTANDO... é isso mesmo ! Os gregos, para bajulá-lo, adaptaram aos Jogos essa modalidade "de disputa" e lhes deram TODOS os troféus... quase DUAS MIL coroas de louro ! Chegaria á Roma com elas, para júbilo da plebe que o adorava. Poucos sabem que êle "inventou a CLAQUE" -- espécie de Sílvio Santos da época -- criando os "AUGUSTIANI", jovens pagos divididos em 3 "grupos", para bater palmas, assobiar ou gritar durante as suas peças teatrais, baseadas no teatro grego. Esse amor desmedido pelas "frescuras helênicas", na visão machista dos legionários, foi sua perdição, além da nova amante Cálvia Crispinila, na sua ausência, ter se metido com as questões do Estado, um crime sem precendentes "palpite de mulher".
Foi a gota d'água... assim que soube, Nero "encerrou a carreira" de mais essa, num assomo de ira. Um amigo foi buscá-lo em Atenas e o obrigou a voltar, Roma estava em crise... desfilou pela cidade em biga com roupa colorida feita especialmente para a ocasião, desenhada por êle e quebrando o costume do uso do branco tradicional. Ali soube de um processo contra si -- no qual virara "inimigo do Estado", a ser chicoteado até a morte -- e fugiu de Roma, para um sítio de escravo seu... ao ouvir a cavalaria chegando encerrou com um punhal na garganta 14 ANOS de sandices.
-- "Que grande artista morre em mim" !, teria exclamado na ocasião.
"NATO" AZEVEDO (em 18/abril de 2022, 6hs)
OBS: baseado no livro "NERO", de Elizabeth Powers, edit. Nova Cultural, 1988, SP