A INSPIRADORA LYGIA FAGUNDES TELLES

Novamente o mundo da cultura sofre com uma perda irreparável. No dia 03 de abril faleceu Lygia Fagundes Telles. Provavelmente a maioria saiba que ela nasceu em São Paulo, no ano de 1923 e antes de completar 10 anos de idade, já escrevia suas primeiras histórias. Foi procuradora do estado, romancista e contista. O gosto pela cultura e pelo direito certamente foi influencia da mãe pianista e do pai promotor público. Fã confessa de Monteiro Lobato, inovou na literatura e conquistou o grande público escrevendo ficções de poucas páginas, mas de uma intensidade imensa. A temática feminina foi uma constante, também abordou a vida nos grandes centros, seus problemas sociais e aqueles assuntos mais polêmicos como adultério e drogas, nunca se esquecendo do amor. Sua biografia traz mais de 20 livros publicados e traduzidos para diversos idiomas, também participou de várias antologias e chegou a assinar um roteiro de cinema. Terceira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras, recebeu quatro Prêmios Jabuti, o Prêmio Camões - maior honraria da literatura em língua portuguesa - e várias honrarias. Foi a primeira mulher brasileira indicada ao prêmio Nobel de Literatura, em 2016, aos 92 anos de idade. Seu vasto currículo merece análises aprofundadas, artigos, teses e muito mais, especialmente seu posicionamento de denúncia e oposição ao regime de ditadura militar, pois seus livros são pontos de resistência, notadamente As meninas, de 1973, onde uma das personagens é envolvida com a luta armada e existe descrição da tortura. Foi uma das líderes do “Manifesto dos Mil”, que ganhou esse nome por reunir assinaturas de mil intelectuais contra o regime e a censura daquele tempo. Sua obra possui grande relação com a realidade do ponto de vista de uma mulher vivendo em um país subdesenvolvido que traz todos os elementos desta sociedade com grande crítica de caráter social. Também realiza interessantes inserções no imaginário, tudo objetivando mudar a realidade tornando-a mais agradável para todos os sujeitos. A escritora registrava, ainda, o medo, a loucura, o acaso e o imprevisto. Aliás, dizia que seu melhor livro foi “A Disciplina do Amor” onde lançava um olhar mais atento ao mundo, sendo que apesar do desencanto, tinha espaço para compreensão e ternura para controlar a loucura razoável dos tempos modernos. Apesar de perfeccionista, gostava de dizer que não precisava ser compreendida, mas sim lida e se possível, amada. Lygia conseguiu despertar o amor e o interesse por seus textos que eram escritos com emoção e compaixão. Acreditava que o escritor é testemunha do seu tempo e de sua sociedade. Sabedora das dificuldades humanas e que as palavras são a única forma de atingir ao próximo, construiu pontes de aproximação e auxilio para atenuar o medo e o sofrimento do próximo. Em 1996, durante entrevista no Programa Roda Vida, da TV Cultura, afirmou estar pronta para olhar nos olhos da morte, pois sentia que sua missão estava cumprida. Além de encantar através da escrita, Lygia também arrebatava plateias em encontros e entrevistas a programas televisivos. Para quem, ainda, não experimentou ler uma de suas obras, fica a dia, também vale a pena garimpar nas redes sociais e resgatar materiais com histórias interessantes recheadas de inteligência e bom humor. Deixando um legado rico e inspirador, Lygia era provocativa basta observar suas citações como: “Não há gente completamente boa nem gente completamente má, está tudo misturado e a separação é impossível. O mal está no próprio gênero humano, ninguém presta. Às vezes a gente melhora. Mas passa”. Não vamos discutir se ela estava totalmente correta, mas podemos afiançar que sua passagem por essa vida engrandeceu nossa cultura e certamente tornou inúmeras pessoas muito melhores.

ANDRÉ LUIZ DA SILVA
Enviado por ANDRÉ LUIZ DA SILVA em 08/04/2022
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