TAMANDARÉ... EM BELÉM ?!

TAMANDARÉ... EM BELÉM ?!

Eis que me cai nas mãos um livrão caríssimo, capa-dura de 32 x 23 cm, edição de luxo com papel envernizado de alta gramatura, editado em tempos petistas (2010 ?) com o objetivo nada sutil de homenagear a MB - Marinha do Brasil. A vida e os feitos de Joaquim Marques Lisboa -- futuro Almirante TAMANDARÉ -- são apenas "pano de fundo" para a glorificação do poderio naval de nossa Marinha "de guerra". O livro pegou chuva e perdeu várias das páginas iniciais... meu vira-lata não gostou do assunto e destruíu 4 ou 5 das páginas finais.

Este "xará" de Tiradentes nasceu com estrela e estava sempre "no lugar certo na hora certa"... ainda capitão de mar-e-guerra foi a Londres trazer o novo vapor "Dom Afonso", comprado pelo Brasil. Mal saiu do porto, deu de cara com navio de passageiros pegando fogo. Empenhou-se com seus marujos e conseguiu salvar 156 ingleses, embora muitos outros tivessem morrido, para desgosto do capitão. Foi a Recife com o navio enfrentar a "Rebelião praieira" em 1848 e, logo que chegou ao Rio de Janeiro, encontrou o navio "Vasco da Gama" encalhado na baía, sem o mastro principal, perdido na tempestade. O capitão providenciou cordames e correntes e rebocou a belonave até o porto salvador.

Em 1852 passeava na orla da praia quando ouviu gritos de socorro vindos do mar... 2 escravos saíram para pescar e sua canoa emborara. Joaquim mergulhou nas águas para salvá-los. Seu dono, supreso, lhe doou as "peças" ! Recusou, era contra a escravidão. O "barão" insistiu... Lisboa cedeu ao capricho do escravocrata, aceitou os "presentes" e lhes deu a alforria em seguida. O então vice-almirante (em 1859) passou a barão (3/1860), visconde (2/1865), depois conde (12/1887) e marquês -- em 16 de maio de 1888, pelas mãos da Princesa Isabel -- "por grandes serviços prestados à pátria".

Enquanto marinheiro Tamandaré esteve em quase toas as rebeliões e guerras havidas no Brasil... desde a Setembrada em Recife e Maranhão, em 1831; passou POR BELÉM suponho que em 1835, na revolta da Cabanagem. Lutou em Salvador, contra a Sabinada, entre nov./1837 e março/1838, indo depois ao Maranhão apoiar Caxias contra a "Balaiada". Desceu ao Rio Grande do Sul para enfrentar farroupilhas na "Guerra dos Farrapos", onde já estava desde 1836 um certo John Grenfell, nome conhecido n oPará.

Tamandaré, comandando frota de 12 navios, enfrentou e venceu as batalhas de Paissandu, no Uruguai, a de Humaitá na Argentina e a famosa RIACHUELO, no Paraguai, entre os anos 1864/67. Tendo nascido em 13/dez. de 1807 no vilarejo Tamandaré (PE), faleceu no Rio em 20 de março de 1897.

Mas, e a "passagem" por Belém ?! Porque nunca vi tal citação em texto algum sobre a Cabanagem ? (*1) Diz o livrão "TAMANDARÉ - O Príncipe dos Mares", de Juca Fernandes, editado pela INFRAERO, na pag. 38 que... "O almirante Tamandaré foi para Belém combater os cabanos e MOROU num dos casarões localizados em frente à praça das Mercês (...) Os casarões do entorno tiveram outros moradores ilustres. A praça testemunhou muitos fatos históricos do movimento cabano, com destaque para a tentativa dos cabanos de tomar o trem de guerra do Exército, que ficava abrigado na Alfândega, ao lado da igreja. O trem guardava canhões, munições, facas e espingardas. A tentativa fracassou e 800 cabanos foram mortos". Segundo a obra, o líder cabano Antônio Vinagre foi morto naquela área, alvejado por soldados que se postaram nos telhados das mansões.

A pergunta que não quer calar: porque "se eliminou" da história da Cabanagem a presença de Tamandaré EM BELÉM, enquanto o afamado John Grenfell estaria na mesma época nos confins do Rio Grande do Sul ?! Continuo com sérias dúvidas sobre o tal BRIGUE "Palhaço", afundado às margens do Guajará com 240 ou 252 revoltosos em seu porão. Imagens (pinturas) de antigos brigues nos mostram um navio de uns 30 metros de comprimento por uns 15 ou 18 de largura. Considerando que estocavam barris de água, de pólvora e de alimentos, não sobraria espaço para "entocar" METADE desses homens.

Onde está a VERDADE nessa estória ou História ?! Alguém precisa DESENTERRAR o navio do lodaçal em que está há 2 séculos, dar sepultura digna a esses HERÓIS da resistência popular e DESVENDAR de uma vez por todas a REAL HISTÓRIA desse decantado massacre. Resta saber quem terá coragem para levantar "a cortina do Passado"... e "revolucionar" esse momento histórico !

"NATO" AZEVEDO (em 3/abril de 2022, 18hs)

OBS: (*1) - sugiro a leitura de "O brigue Palhaço", de minha autoria, no RECANTO DAS LETRAS, postado em 17/fev. de 2022

***************

***************

NOTAS RECENTES (acréscimos)

Em meus primeiros dias no Pará (1984/85), quando pesquisei sobre o Passado de Belém a minha intenção era somente identificar a presença de "capoeiras" de antanho nas tropas do Exército e das Guardas imperiais daquela época. Assim, li "por alto" sobre as revoltas e nem percebi o trecho no qual Domingos Antônio Raiol cita mais uma rebelião, bem próxima da que teve o brigue "Palhaço" como referência e túmulo.

Nesta, de 14 a 17 de abril de 1823, foram presos... "em consequência os 271 cidadãos, condenados à morte por acórdão da junta de justiça (...) recolhidos ao porão da charrua Gentil Americana e da fragata Leopoldina no dia 7 de junho e, passados depois para a galera Andorinha do Tejo, seguiram presos para Lisboa", (pag. 37, in "MOTINS POLÍTICOS") Segundo o futuro Barão de Guajará, muitos morreram durante a viagem e, na pesquisa de Jorge Hurley, outros mais durante os quase 80 dias na prisão da Torre. Domingos Raiol declara que lá ficaram apenas 6 dias, sendo soltos graças ao empenho do "conde de Vila Flor... o maior defensor dos paraenses em Portugal". (idem, pag 37) É aí que "a porca torce o rabo"... o "advogado" dos revoltosos é, sem dúvida, o cônego Romualdo Antônio de Seixas, porém esse "conde de Vila Flor" seria outra pessoa, um nobre que governou Belém e que daqui saiu bem antes dos incidentes retratados.

A estranhar na obra de Jorge Hurley o fato de que a tragédia dos 255 assassinados no brigue "Palhaço" (1 sobreviveu) não ter sido citada. O que houve ? Um absurdo "lapso de memória" ?!

"NATO" AZEVEDO (em 19 de junho de 2022)