Ajudas indesejadas

Quem gosta de desenhos antigos ou tem mais de trinta anos certamente assistiu a Os smurfs e lembra do smurf Gênio, que se destacava dos demais por usar óculos e se achar intelectualmente superior ao passo que os outros o achavam simplesmente insuportável por ser pedante, falar demais e querer mandar nos outros quando o Papai Smurf não estava por perto. Um episódio que mostra bem o quanto ele é intolerável é O bom vizinho (tradução direta do inglês) em que fica o tempo todo se intrometendo nas tarefas dos Smurfs, dando palpites e atrapalhando. Como resultado, ninguém quer sua ajuda. Todos o escorraçam.

O Gênio diz ao Smurf Fazendeiro para regar as hortaliças em ordem alfabética, tenta dizer a outro como tem que lavar as janelas e até se intromete na maneira como cada um arruma sua casa. E como ele reage ao fato de não quererem sua ajuda? Ele se sente injustiçado, pensa que ninguém reconhece seu intelecto superior, ficando magoado quando o Papai Smurf diz a dura verdade: “É você que é insuportável.”

Por que se falou no Smurf Gênio? Porque se pretende falar em pessoas cuja ajuda pessoa nenhuma deseja. Preferimos trabalhar sozinhos, mesmo que isso nos canse, a ter a ajuda de certas pessoas que apenas nos aborrecem e – verdade seja dita – mais atrapalham do que ajudam. E mesmo que ajudem, nós não queremos.

Geralmente, uma ajuda é bem-vinda porque, em princípio, entendemos como um gesto de boa vontade e de solidariedade. Entretanto, há pessoas que não ajudam de boa vontade. Muitas são as que jogam na nossa cara até mesmo os mais insignificantes favores que nos fazem. Um jovem contou que já não diz aos pais o que precisa porque cansou de ouvi-los jogar na cara dele até as coisas mais tolas que lhe davam ou faziam. Se o pai comprava para ele uma cerveja, passava cerca de meia hora dizendo: “Vê como sou bom para você? Comprei isso para você?” A irmã dele não gosta que o pai entre na cozinha ou faça coisas como lavar a louça porque o pai nunca deixa de dizer que perde os programas dele para ajudar e fica a dizer o quanto é bom.

Quem quer a ajuda de quem faz questão de fazer isso? A gente quer que as pessoas ajudem de coração, boa vontade, não que façam questão de dizer que se sacrificam por nós, como se nos ajudar fosse um grande peso para eles porque isso significa então que nós somos um peso. Uma autora que se refere a essas pessoas é a americana Regina Barreca, autora do livro, Doce Vingança. Ela as chama de falsos benfeitores malignos e este é um termo muito apropriado, pois essas pessoas não são realmente boas. Elas são manipuladoras, chantagistas e cruéis. Podem mesmo depois, para nos obrigar a fazer algo, usar os favores que nos fizeram ou fazem, como moeda de troca ou até para nos diminuir, falando que, se não fosse por elas, não seríamos ninguém.

Outro tipo de ajuda que ninguém quer é a das pessoas que fazem questão de “ensinar o padre a rezar missa”. Elas querem saber mais que todo mundo e não entendem que cada um tem sua maneira de fazer as coisas, como o smurf Gênio. Acham que apenas elas fazem tudo direito e são inteligentes. E, quando os outros rejeitam sua ajuda, sentem-se ofendidas e dizem que os outros não entendem sua generosidade e não admitem que elas fazem tudo melhor.

Imagine você que tem sua maneira de lavar os pratos e preparar as refeições, tendo que aturar uma pessoa que chega, fica andando de um lado para o outro, pega os pratos e panelas para lavar na área de serviço e inventa de sacolejar, pendurando panelas no varal e dizendo que é a melhor forma de fazer para não molhar a pia e o escorredor. Para piorar, essa pessoa amontoa tudo na parte superior do escorredor porque diz que é difícil tirar os copos da parte de baixo, colocando os pratos deitados. Conheço um caso assim e quando essa pessoa está na cozinha, ninguém entra, porque ela toma muito espaço e tempo. Todos esperam que ela saia.

Com certeza, acham que essa pessoa é maluca. Mas ela tem certeza que sua maneira de lavar os pratos é a mais lógica que existe e quando a contestam, afirmando que isso contraria a forma de lavar a louça, ela diz que os outros não entendem de lógica.

Portanto, podemos ver que realmente há pessoas que não queremos que nos ajudem. Elas mais atrapalham e infernizam do que auxiliam e o melhor é manter distância delas e aprender a nos virar sozinhos porque elas adoram poder dizer que ninguém consegue nada sem elas.