Para os que defendem o filme Deus não está morto

Muitos são os que defendem o filme norte-americano Deus não está morto, protagonizado por Kevin Sorbo, que faz um professor universitário, dizendo que ele é uma mensagem de fé e não um filme tendencioso que somente vilaniza os ateus. Segundo os que falam a favor do filme, ele foi inspirado em casos reais de professores ateus que perseguem estudantes cristãos no mundo acadêmico.

Certo, como existe de tudo nesta vida, não podemos negar que isto seja verdade. Mas se é verdade que há ateus perseguindo cristãos nas universidades, também é verdade que ateus sofrem preconceitos por parte dos cristãos nos Estados Unidos . Uma boa maneira de provar isso é assistindo a um canal ateu norte-americano em que os que o apresentam (todos ex-cristãos) costumam receber telefonemas de pessoas que os acusam de ter pacto com o diabo e dizem que eles irão queimar no fogo do inferno. O filme, muito convenientemente, "esquece" de mostrar este outro lado da moeda: que a intolerância e o preconceito não são atributos exclusivos dos ateus e que muitos, aliás, por serem oriundos de famílias muito cristãs, não têm coragem de assumir sua posição. Não é preciso ir muito longe para verificar que os ateus são alvo de preconceito. Pessoas ateias são vistas com reserva e muitos brasileiros admitem que não votariam em candidatos ateus.

O filme, além de botar o professor universitário como um arrogante que quer impor sua descrença, tenta explicar seu ateísmo colocando que ele se revoltou por que Deus se recusou a salvar sua mãe, que morreu de câncer quando ele tinha doze anos. Ou seja, fica subentendido que todo ateu, no fundo, é apenas um revoltado a quem Deus não atendeu. O filme não colocou que ele se tornou ateu por estudar mais a fundo a Bíblia e observar suas contradições e a crueldade do Deus do Antigo Testamento ou fazer questionamentos, perguntando-se por que, por exemplo, a gente não vê hoje os milagres que existem aos milhares na Bíblia. Mas não interessa a um filme cristão que alguém veja essas coisas, não é? E, enquanto o professor é um radical que quer impor o ateísmo à força, todos os cristãos são pessoas sensatas e moderadas. Ninguém vê um cristão que quer impor à força sua crença, como vemos na vida real.

Aliás, outros ateus que aparecem no filme são mostrados todos como pessoas arrogantes, insensíveis e de mau-caráter, como o empresário interpretado por Dean Cain(de Superman), que abandona a mãe com Alzheimer e a namorada que tem câncer. A namorada desse empresário, por sinal, começa o filme como uma ateia arrogante e, após o câncer, torna-se cristã. Que fica parecendo? Que o câncer foi um castigo por seu ateísmo.

Uma outra inverossimilhança do filme é que o professor de filosofia propõe que o aluno cristão que se recusa a escrever que Deus está morto prove a existência de Deus. Como alguém provará que Deus existe ou não após alguns debates? Há séculos, crentes e descrentes têm debatido esta questão e nunca foi provado nada. E por que o professor quer tanto que as pessoas acreditem que Deus não existe? Está numa guerra pessoal com Deus porque a mãe dele morreu de câncer? Se ele tem esse objetivo, com certeza, ele precisa é de tratamento psicológico já que, se após tanto tempo, não aceitou que as pessoas morrem, é porque não amadureceu psicologicamente para entender que a morte virá para todos nós um dia.

E como um professor, com anos de ensino nas costas, que, com certeza, tem bases teóricas (ele ensina Filosofia), não é capaz de vencer um calouro? Ele deveria observar Sam Harris (filósofo norte-americano) que, com argumentos moderados e inteligentes, consegue mostrar toda a fragilidade da apologética cristã de William Lane Craig. É incrível que um professor universitário não consiga vencer um calouro com argumentos.

Como se vê, o filme é um festival de absurdos. Colocar todos os ateus como vilões arrogantes e radicais e os cristãos como bonzinhos e moderados é um grande pecado de inverossimilhança, que apresenta uma visão distorcida do que realmente existe na sociedade. Muitos que são pelo filme dizem que só os ateus para não gostar dele. Façamos uma pergunta: os índios não têm bons motivos para detestar os filmes de faroeste que sempre botavam os índios como os vilões e os brancos como mocinhos? Uma vítima de estupro não tem motivos para odiar um filme ou seriado com estupro romantizado? E, por sinal, muitos cristãos que assistiram ao filme disseram que o filme não mostra a realidade, argumentando que ninguém é mau só porque é ateu. Qualquer um sabe que crença ou descrença em Deus não define caráter.

Assim como os filmes de faroeste apresentaram uma visão irreal de um aspecto da história norte-americana, esse filme apresenta uma visão irrealista e distorcida do caráter do ser humano. Ser cristão não é sinônimo de ser bom.

O pior é ver tantas pessoas dizerem que filmes assim são um exemplo de como a fé move montanhas. Isto mostra como grande parte das pessoas precisa desenvolver seu senso crítico.