NA ROTA DO ATLÂNTICO

A Profª.Drª. Maria do Carmo Ferraz Tedesco e Estevam C. Thompson abordam o interesse dos comerciantes portugueses nos escravos em Luanda, enfrentando grandes dificuldades, mas se animando pela importante descoberta de ouro em Minas Gerais, pois esperavam que com aumento do tráfico de escravos, favorecesse o retorno de metais preciosos que ajudaria inflacionar os preços fora do Brasil. Porém, ocorrem outras problemáticas, pois os planos portugueses confrontaram com o governo militar que tinha por base cultural a plantação de cana-de-açúcar.

As disputas animaram as frações da península portuguesa e os colonos dos três maiores portos do Brasil; ocorrendo uma múltipla divisão interna do império português na África Central, Ocidental e no Brasil. Em meio aos conflitos e disputas econômicas, surge a preocupação com as estratégias que aumentaram as tensões na relativa autonomia colonial.

O tráfico dos africanos opunha a ideia aparentemente isola da, foi marcada por um intercambio comercial entre Brasil e África, que se envolvia diretamente com a economia do atlântico no século XVIII.

“O tráfico e a escravidão, são processos de longa duração que transformaram tanto a vida das regiões de origem do escravo, como os locais de chegada daqueles contingentes humanos, foram os fatores fundadores do grande intercâmbio cultural. Entretanto, após a abolição do tráfico e da escravidão estes eventos passam a ser abordados com certo constrangimento. Tornam-se, com o advento do liberalismo e das campanhas antiescravistas, fenômenos históricos que devem ser evitados e, se possível, jogados nos subterrâneos do esquecimento, suprimidos da memória coletiva” (TEDESCO p. 01).

No pensamento ocidental o escravo caracteriza-se por ser uma propriedade cujo trabalho possui valor econômico e uma mercadoria que tem valor comercial (FAGE, 1969, p. 394). Assim, no pensamento ocidental a escravidão é a antítese da liberdade. Um homem “livre” não pode ser comprado ou vendido e tem controle sobre sua vida e sua prole (MIERS; KOPYTOFF, 1977, p. 04-05).

Segundo Thompson, os indivíduos escravizados no comércio atlântico eram levados para longe de sua terra natal não apenas fisicamente, mas também culturalmente. Eles eram forçados a renunciar suas línguas, suas cosmologias e suas práticas sociais. Afirma Tedesco, “que o trânsito de pessoas e culturas, além de espécies vegetais, animais e produtos por um longo período reconfigurou as regiões dando origem a uma nova paisagem humana e natural”.

Historicamente o tráfico de escravos é uma velha prática das sociedades humanas incitando diferentes campos do conhecimento, a buscar compreender esse fenômeno no contexto das relações sociais. Thompson destaca que no caso da escravidão atlântica, além dos estigmas e da violência física típicas da instituição da escravidão havia mais uma violência simbólica marcada pelo preconceito racial.

Segundo Selma Pantoja, o tráfico dos africanos se vincula com o cultivo de cana-de-açúcar e mão-de-obra, ficando claro que o tráfico tornava-se possível graça a violência e o mercado de trocas entre os portugueses e os militares. No entanto, a descoberta do ouro em Minas Gerais, trouxe ameaça aos comerciantes asiáticos em Portugal, não sendo mais apoiado pelos fornecedores britânicos, que visavam à busca de escravos para trocar por ouro no Brasil.

Neste momento surgiram novos mercados estrangeiros, que eram mais bem capitalizados por meio das companhias comerciais, menos ligados aos antigos impérios asiático e mais ligados aos processos produtivos da Europa. Assim fica claro a fraqueza de Portugal, que enfrentava o tráfico ilegal, não tendo o apoio dos fornecedores britânicos e tornando-se cada vez mais isolado no campo comercial.

O comércio atlântico não se desenvolveu para sanar com as carências da África. Pelo contrário, ele foi motivado pelo luxo e prestígio, sendo que muitos dos produtos 9 eram negociados com os soberanos africanos podiam encontrar similares de ótima qualidade produzidos no próprio continente africano. Os africanos tiveram um papel ativo no comércio atlântico de escravos e em muitos casos essas relações comerciais com os estrangeiros contaram com a iniciativa de diversas comunidades africanas que ocupavam a costa atlântica e seu interior (THORNTON, 2004, p. 88-91).

As transformações das sociedades africanas, em decorrência do tráfico de escravos para a América, têm sido objeto de muita discussão entre os estudiosos. Visando compreender a transição e transmissão da história e da memória africana que sobreviveu através da oralidade.

Notamos com clareza que mesmo o comércio africano sendo ilegal; os africanos até 1850 eram as estruturas do comércio do atlântico, e grandes contribuidores de crédito para o interior das suas própria instituições políticas, econômicas e sociais. Como afirma Thompson, “afinal de contas, a história da escravidão não pertence aos africanos e seus descendentes, mas ao mundo inteiro”.

Ricamente Tedesco, nos propõe a compreensão da nossa sociedade, analisando o nosso passado colonial, o tráfico e o fluxo da escravidão, visando destacar os sujeitos do processo histórico no tempo e no espaço, interpretando os fatos e suas influências sobre os fatos atuais.

Em suma, podemos notar que o comércio metropolitano instalado diretamente com a África e propriamente dito com Angola, construindo um espelho que após a fraqueza da monarquia constitucional de Portugal em meio ao comércio da rotas do atlântico sul, que impulsionou os africanos que já estavam prontos para iniciar um comércio entre as décadas de 40 e 50; promovendo um comércio de exportação de cera, marfim e outros produtos que contribuíram para o desenvolvimento de um sistema de financiamento próprio dos africanos e luso-africanos que no final da década substituíram o comércio de escravos.

Referências

FAGE, John D. Slavery and the slave trade in the context of west African History, The

Journal of African History, Cambridge, v. 10, n. 3, p. 393-404, 1969.

FAGE, John D. Slaves and society in western Africa, c.1445-c.1700, The Journal of

African History, Cambridge, v. 21, n. 3, p. 289-310, 1980.

MIERS, Suzanne; KOPYTOFF, Igor. African Slavery as an institution of marginality.

In: ______. Slavery in Africa: historical and anthropological perspectives.

Madison: University of Wisconsin-Madison, 1977.

PANTOJA, Selma A. Três leituras e duas cidades: Luanda e Rio de Janeiro nos

setecentos. In: PANTOJA, Selma A.; SARAIVA, José Flávio Sombra (Org.). Angola e

Brasil nas rotas do Atlântico Sul. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999. p. 99-126.

TEDESCO, Maria do Carmo Ferraz. A Escravidão Nas Áfricas e o Comércio de Escravos pelo Oceano Atlântico. Díscíplina 6: Comércio de escravos e escravidão.

THOMPSON, Estevam C. Negreiros nos mares do sul: famílias traficantes nas rotas

entre Angola e Brasil em fins do século XVIII. Dissertação (Mestrado)–Programa de

Pós-Graduação em História, Universidade de Brasília, Brasília, 2006.

THORNTON, John. A África e os africanos na formação do Mundo Atlântico 1400-

1800. São Paulo: Campus, 2004.

Dhiogo J Caetano
Enviado por Dhiogo J Caetano em 15/10/2018
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