O ATOLEIRO E O PORVIR RISONHO

(aos professores do imenso e muito amado Brasil)

A Democracia futura deve ser adubada com muito cuidado e semeada com muita antecipação, primeiro no aconchego familiar, depois em sala de aula, pelas mãos hábeis dos mestres. Quem não tem esse conviver, jamais saberá o gosto das opiniões, jamais conseguirá saborear com senso analítico as posições divergentes. Um grande país se faz com o amadurecimento das ideias. Como chegar a isso sem aprender e apreender o mérito de cada concepção? A figura do professor, a do mestre instalado em sala de aula frente aos seus pupilos, é vital para a nação se olhar no espelho, aventando o passado e antecipando futuros. Tenho imenso respeito e admiração para com a classe obreira dos professores, especialmente os do ensino fundamental, no qual aprendemos a olhar o mundo com olhos de espanto. Estou com 71 anos. Muitos viventes estranhos à minha família fizeram e me propiciaram que pudesse chegar com senso crítico até esta quadra da existência. Ensinaram-me o caminho das pedras sem pisar nelas para não me machucar. É simples e límpido: sou o resultado da sabedoria engendrada em minha cuca pelos professores, uma vida quase que integralmente dedicada ao questionamento sócio-político, filosófico e estético, sempre na incessante busca de eventuais soluções para os problemas e tentar tonar o mundo mais palatável à vida com algumas nuanças e/ou captação de silhuetas de amor para tentar encontrar a tal felicidade momentânea. Eles – os agentes da mestria – foram o moto-contínuo que acendeu a energia da eventual sabedoria, aquela que carrega as baterias para a convivência e ilumina a estrada com faróis de bom facho. Como esperar ações lúcidas, centradas e sábias, se não lemos, se não copiamos o que nos é repassado através da história societária de nosso povo? Sem professores cultos, bem forjados, também não se chega a um patamar razoável. Os extremos que temos visto e estamos observando diariamente em exposições públicas, nas redes sociais, tracejam a cara do Brasil do século XXI: expositores de ideias se digladiam desarrazoadamente, chegando ao monólogo bruto e pejorativo, especialmente em política de massas. Será possível escolhermos dirigentes cultos e sérios, enfim, aqueles que possam nos tirar do atoleiro ditatorial ainda e sempre existente nas cabeças dos donos dos pensamentos extremados? E mais uma vez, com humildade, teremos de voltar aos ensinamentos dos mestres, a fim de dar boas-vindas à Senhora Democracia. Enfim, desejar uma longa vida aos que aprenderam a perseverar na busca dos caminhos, entre pedras e urzes, com muito pouca água...

– Do livro inédito A VERTENTE INSENSATA, 2017/18.

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