O MITO
O MITO PRODUZIDO PELO HOMEM REVELANDO O HOMEM QUE O PRODUZIU
Para definir o mito não há um só conceito e nem unanimidade sobre algum. Atropologicamente constitui-se uma realidade fundamental para explicar os fenômenos, a origem destes, do próprio homem e do mundo. Historicamente segue uma narrativa de cunho religioso, sagrado, portanto, para explicar os principais acontecimentos da vida por meio do sobrenatural. Através da narrativa e de um ritual em torno da mesma, procura-se manter vivo o mito. Surge da necessidade de o homem resolver seus conflitos internos. Da veemência de entender o seu cosmos e mantê-lo em equilíbrio com a sua realidade existencial.
O ser humano, por mais primitivo, evoluído, socializado ou alienado que seja, perturba-se com sua própria desordem. O ser humano não suporta viver o caos. Desde a origem da raça humana, o homem busca explicações, orientações e entendimento sobre tudo que está ao seu redor, no seu mundo, na sua imaginação. Por si só, nem sempre encontra respostas. Os fenômenos, naturais ou sociais, quando inquietam, confundem, destroem ou criam uma desordem no seu ser, no seu interior, no seu cosmos, o ser busca respostas. Precisa-as. Anseia por elas. Angustia-se.
Toda realidade social pressupõe uma liderança social. Ou, no mínimo, um conjunto de normas que a regem. Nesta conjuntura, no líder ou no que o representa nasce, quase sempre, a resposta às perturbações humanas. Ao longo do tempo teve o líder, através de sua credibilidade e aceitação junto à coletividade, a função principal de apaziguar e retornar o homem ao seu equilíbrio. Miticamente, apoia-se sempre numa narrativa metafísica para fundamentar uma aceitação coletiva que acomoda. Mas, reorganiza a desordem. O caos. Nasce o mito.
Na função do mito encontramos o homem buscando uma relação de reconstrução e acomodação das suas angústias, perturbações e dúvidas. Ao reconstruir, cria uma realidade abstrata, uma espécie de ficção inconsciente. Nesta, as formas simbólicas confundem-se com a realidade. Mais: as imagens e as próprias formas, convencionais ou abstratas, associam-se às próprias coisas reais. Identificam-se. Substituem a própria realidade. Reifica-se. Quando se processa a conformação espiritual e as angústias, perturbações e dúvidas são aquietadas e resolvidas, a sua alma acomoda-se. O seu mundo interior reorganiza-se. O cosmos entra em harmonia.
Pode-se atribuir à religião duas dimensões: sobrenatural e real. Na sobrenatural precisa do mito para manter sua realidade real e metafísica. Na real, o mito, que tem apenas uma dimensão, que é a literal, surge de uma narrativa, que não leva em conta a realidade, pois não a sabe interpretar, não se prende a um valor absoluto de verdade alguma, mas tem o papel e a função de “explicar” o inexplicável. Dar sentido a algo, fenômeno, para o qual a razão e a ciência não encontram resposta.
Socialmente, percebe-se a função do mito como uma alternativa ideológica de nortear as pessoas que compõe o cosmos social. Este norte é orquestrado pela elite dominadora que rege, planeja e cria pequenos mitos em forma de sistemas de consumo, status, culturas, necessidades, sem as quais, pressupõe-se, não se pode viver, ou não há felicidade. Tudo para satisfazer o grande deus contemporâneo: O CAPITAL.
Parece-me que, remotamente, o mito era mais necessário. As pessoas tinham menos condições de entender os fenômenos, que em sua maioria eram naturais do que sociais. Ponderando, no entanto, percebo que ele está mais presente hoje, no dia a dia. Acreditamos, vivemos, desejamos tudo que nos é jogado pelo grande tentáculo que liga nossa pobre, fantasiosa, iludida e acomodada realidade social ao sistema dominador: a mídia.