De volta à infância (publicado originalmente em 26/3/2016)
Uma de minhas melhores lembranças da infância é a voz do dublador Marcelo Gastaldi anunciando o desenho do cachorro Snoopy, com aquele timbre e o ‘s’ e os ‘o’ arrastados na locução: Sssssnoooopy! E então se deitavam as aventuras inocentes e paixões platônicas do garoto Charlie Brown pela moça ruiva colega de escola. Eis então que alguns meses atrás estava em cartaz o primeiro longa-metragem totalmente dedicado a estes personagens: ‘Snoopy & Charlie Brown: Peanuts – O Filme’.
Falar sobre a trama infantil é passar em branco sobre todos os nossos sonhos em períodos petizes. Charlie Brown era o menino que eu queria ser e fui até certo ponto quando no colégio: tímido, desajeitado, sempre deixado de lado nas brincadeiras, e tendo de lidar com as menininhas bonitas da classe. O tormento maior de Charlie é ter de enfrentar qualquer tipo de situação, seja de que grau ou periculosidade for.
Eu já sabia que ao entrar na sala do cinema para ver o filme não teria mais a voz de Gastaldi no corpo de Charlie. O dublador morreu em 1995, aos 50 anos (também dublava o Chaves e o Chapolin). Clara era minha intenção de assistir ao desenho para averiguar se retornava aquele sentimento de quando contava 8, 9 ou 10 anos no máximo. E voltou. Pobre de mim, pensei. Necessitar disso pra lembrar?
O problema vai além disto. Pobre das crianças de hoje, repensei. Elas têm de lidar com animações bem sem sentido algum, desconexas, descoladas da poesia ideal pra mim, pelo menos. Puxe sua memória: nas histórias do Pernalonga, Pica-Pau, Tom & Jerry, só pra ficar nessas três, a trilha sonora era com músicas clássicas! Vi outro dia o maestro Júlio Medaglia falar sobre importância dessa característica nas produções de antigamente. Era isso mesmo. Hoje em dia sigo vendo-os com muita paixão, gosto.
Em ‘Snoopy & Charlie Brown: Peanuts – O Filme’, a dupla de protagonistas estão juntos com aqueles amigos de toda hora – Márcia, Patty Pimentinha, Lino, Schroeder e inesquecível Woodstock, grande companheiro de Snoopy. A realização, claro, nada deixa a desejar nos quesitos atuais: bem acabada, eficaz no propósito e de imagem estética limpa. Mas ainda prefiro os do SBT, com a voz de Gastaldi.