TEM QUER TER

Não quero tratar aqui de política, muito menos de coisas ou planos estruturais. Nadinha, mas nadinha mesmo de administrações públicas ou particulares; nem mesmo de ecologia, pois na natureza que Deus nos criou (e criou mesmo, não me importando com os ideológicos da teoria da evolução, que não passa de teoria), pois do que pretendo dissertar, é que, há, em todos os lugares, independentemente de nossas vontades, principalmente na cidade da gente, bem abaixo de nossas barbas, no campo social, coisas e pessoas indispensáveis, das quais sentimos falta, se as não tivermos por perto!

A gente vê pessoas de todos os tipos, jeitos, raças, formas, crenças, origens e gerações diversas. E todas elas podem se tornar inspiração de nossas lições. Das quais extraímos idéias e conclusões múltiplas. Por isso a gente chega a pensar que numa cidade, nos bairros ou nos centros, pode ter, ou melhor, “tem que ter” uns mais carentes, para despertar-nos o senso de solidariedade, levando-nos a realizar algo mais que a contemplação, sem interesses subjacentes ou obscuros.

“Tem que ter” uns enfermos, para exercitarmos a misericórdia, o socorro e a solidariedade (que alguns denominam de humanidade, que está rareando em nossos dias!), que, muitos estão deixando (empurrando para outros), ou seja, deixando para os profissionais, que se dedicam na área da saúde, esquecidos de que os seres humanos valem mais que os animais e as coisas em geral, por mais caras que esses últimos possam custar.

“Tem que ter” um “sapinho” da vida que passa horas e horas na rua e convive com a gente, de perto, usando gravata (literalmente), causando-nos riso por causa desse seu “teatrinho ambulante”, vestindo ainda alguns apetrechos próprios de um verdadeiro Executivo, dirigindo-nos palavras elogiosas “hei bacana!”, que muitos omitem nos contatos rápidos de rua ou nunca se exercitaram nessa arte de conquistar as pessoas pelo traquejo da empatia.

“Tem que ter” umas pessoas de entendimento menos exercitadas ou menos

atualizadas em determinadas áreas, para que as demais possam se inclinar, a fim de lhes prestar o devido auxílio, com carinho, paciência, dedicando tempo e ação, em favor dos menos esclarecidos, mesmo gratuitamente, não importando o tempo que os de casa ou de parentela nunca têm para desprender a esses “tipos” desavisados de nossos contextos sociais.

“Tem que ter” os que nascem com as dificuldades físicas ou mentais, para que os especialistas do bem e cultivadores do amor real, possam entrar em ação, sem exigir preço que os gratifiquem à altura (in casu, os educadores), sem louvores, sem mídia, realizando proezas voluntárias ou não, para que alguma coisa de concreto no presente século, não passe em branco e nossos amados maninhos supercarentes, não fiquem em falta e possam conseguir algo mais “debaixo do sol” – coisas primárias que é para todos eles desfrutarem.

“Tem que ter” um comércio para as pessoas mais simples, mais carentes, pois seus potenciais financeiros, sendo escasso, lhes é tolhido na própria vida que não lhes ofereceu jamais um patamar entre os mais abastados e também porque muitos se contentam com o pouco que possuem, para encetar a marcha de sua existência e de seus modestos labores.

“Tem que ter” muros com desenhos, “lay out” ou logomarcas das micro e médias empresas, pois o espaço do pobre ou dos pequenos que ganham a vida honestamente é exatamente ali onde ele faz a sua propaganda, divulga o seu trabalho com menos desprendimento financeiro, pois os grandes industriários ou os da elite poderosa ocupam outros espaços que os pequenos nem pisam.

Há ainda muitas outras coisas que precisam “ter” (ou haver) diante de nossos “narizes” para que possamos enxergar o que muitos enxergam e nós mesmos não enxergamos, para darmos nossa quota de participação.

Muniz Freire, 14 de abril de 2006

Fernando Lúcio Júnior