CUIDADO COM DITADOS E PROVÉRBIOS
 
Ditados populares e provérbios são, via de regra, pressupostos que embutem crenças, e estas, se não forem desafiadas, podem ancorar comportamentos limitadores. Isso porque muitos ditados populares são oriundos de experiências malogradas ou doloridas que alguém teve, e por conta disso, registrou-as em um ditado que passou a ser repetido inconscientemente sem que jamais alguém o tenha contestado. Quem já provou, por exemplo, que cruzar com gato preto na sexta-feira dá azar? Ou que manga com leite faz mal? Que de cavalo dado não se olham os dentes?
Muitos ditados populares carregam preconceitos embutidos. Outros denunciam traços de personalidade da pessoa que os usa. Quem diz que lugar de mulher é na cozinha, por exemplo, não quer compartilhar com ela todas as coisas da vida, só algumas; quem acredita que água mole em pedra dura tanto bate até que fura pode estar mostrando que é muito persistente ou então que é teimoso como uma mula. Aliás, quem disse que mulas são teimosas? Elas só empacam de vez em quando, por alguma razão. É maneira pela qual elas dizem não a alguma coisa que alguém quer obrigá-las a fazer. Nós, seres humanos, temos muitas formas de dizer não. Alguns animais, como as mulas, só tem essa.
É preciso tomar cuidado com as mensagens embutidas nos ditos populares. Muitos desses ditados ancoram comportamentos indesejáveis e hoje em dia, até politicamente incorretos. Acreditar que é de pequeno que se torce o pepino pode levar-nos a um processo frente ao Conselho Tutelar; acreditar que á noite todos os gatos são pardos pode fazer com que nós nos tornemos descuidados em nossas escolhas; acreditar que os opostos se atraem pode nos levar a escolher amigos e parceiros totalmente diferentes de nós, e isso, fatalmente nos levará a muitos conflitos. Crer que a morte é preferível a determinada sorte revela uma predisposição de caráter fraco, incapaz de enfrentar os desafios da vida. Achar que cachorro velho não aprende truque novo é criar limitações ao próprio desenvolvimento pessoal. E assim por diante.
Outro exemplo: Alguém disse um dia que errar é humano. Essa pessoa, quando disse isso, certamente queria justificar a si mesma por alguma coisa que tentou fazer e não obteve bom resultado. Como a desculpa era boa, todo mundo passou a repeti-la quando cometia alguma besteira ou falhava na execução de alguma tarefa. Mas qual é a prova que justifica esse pressuposto? Porque errar é humano? O que quer dizer esse ditado infeliz? Que a humanidade já tem, na sua estrutura neurológica, uma falha congênita que fatalmente leva todas as pessoas ao erro?
Mentira. Errar não é humano. Errar, na verdade, é desumano. Quando admitimos pressupostos desse tipo estamos programando para nós mesmos um comportamento de conformidade e limitação. Estamos procurando desculpas para mitigar a culpa que sentimos por não termos atingido um bom resultado na nossa ação.
Aliás, é isso que fazemos diariamente. Encaixotamos o universo infinito em nossas mentes e lhe damos um nome: sabedoria. Mas o que é a nossa sabedoria além da quantidade, e principalmente, da qualidade de informação que temos?
Falta de informação ou interpretação de má qualidade dela é que são a causa dos nossos erros. A nossa mente não erra. Ela é como um computador da mais alta e moderna tecnologia. Ela só nos dá respostas erradas quando os dados com os quais a alimentamos são falsos ou incompletos. Se ela tiver as informações corretas ela nos dará respostas corretas.
Dizer que errar é humano é a mesma coisa que admitir que o homem é originalmente mau. Os maniqueístas diziam isso: o homem é matéria, por isso todo homem é mau. Algumas correntes religiosas também admitiram esse pressuposto infeliz e criaram uma doutrina limitadora da atividade humana, que produziu, e ainda produz, mais sofrimento do que felicidade. Essa doutrina diz que quanto mais castigamos a nossa parte material, mais o nosso espírito se aproximará da perfeição. Com base nisso, os crentes nessa doutrina estigmatizaram o prazer, rotulando-o de pecado. Não existe o pecado. Existe o mau comportamento que se pratica justamente por que se foi mal informado. 
Pressupostos baseados em informações falsas baniram da vida ocidental até o mais salutar dos costumes, que é a higiene pessoal. Tomar banho, para os bons padres medievais, era um costume pagão, um prazer que os pecadores da licenciosa sociedade romana se davam. Por conta disso, a maioria dos europeus ficou 1500 anos sem tomar banhos regulares, sujeitando-se á pragas, doenças e outras enfermidades que a falta de higiene e a insalubridade provoca. Essa crença limitante durou até que o Renascimento trouxe de volta a idéia de que o prazer é bom e não é pecado. E depois que os europeus viram que nenhum índio ia para inferno por andar nu e viver tomando banho nos  saudáveis rios do Novo Mundo, que eram saudáveis e limpos justamente porque eles ainda não haviam trazido o pecado para estas terras.
Nós não temos uma porção má. A nossa chamada porção má é apenas dor física ou moral. A maldade é somente a reação de uma pessoa que está sofrendo. O diabo é apenas a dor que desorienta. E toda dor é informação. Quando sentimos alguma dor, física ou moral, o nosso organismo está nos informando que alguma coisa está errada com ele, ou que algo vai mal em nossa vida. Quando não sabemos interpretar as informações que o nosso corpo nos dá, ou as interpretamos equivocadamente, então ocorre o que chamamos de erro. É como consultar um ortopedista para tratar de uma úlcera péptica.
No dia em que aprendermos a tratar a dor do mundo como informação ele será, de fato, aquele paraíso que até hoje só existiu em nossas mentes. Porque então saberemos dar respostas mais adequadas aos motivos que a provocam.
E não precisaremos mais justificar a nossa incúria dizendo que errar é humano.