CONGADA DO DIVINO ESPÍRITO SANTO DE PIRACICABA - BREVE ESTUDO

Em tese, a Congada de Piracicaba existe informalmente há mais de um século, surgindo a priori, como um grupo de pessoas que se reuniam nos meses que antecediam a festa em louvor ao Divino Espírito Santo, na cidade de Piracicaba, no interior do estado de São Paulo, onde fiéis, foliões, religiosos e marinheiros, compunham uma Folia do Divino e visitavam as casas das zonas rural e urbana, onde eram recebidos pelos devotos para os rituais religiosos que antecediam os festejos em louvor ao Divino Espírito Santo; herança da colonização portuguesa. Levavam a bandeira, terços e estandartes que eram marcantes ícones da fé católica, fortalecendo assim a fé dos devotos com orações, dança e cantorias. Eram recebidos com grandes festejos e mesa farta, e após os ritos religiosos tocavam e dançavam com todos os presentes. Muitos dos antigos cururueirose violeiros que eram devotos, compunham o grupo; onde ao término da visita sempre levavam doações em espécies ou gêneros alimentícios diversos, para a realização da Festa do Divino que era realizada anualmente e neste período inicialmente no entorno da igreja matriz, Catedral de Santo Antônio.

Na década de quarenta, o então professor e folclorista João Chiarini alia-se às ações de salvaguarda da cultura folclórica de tradição piracicabana e torna-se defensor e coordenador do grupo de dançantes e tocadores, iniciando assim uma nova fase dos antigos foliões que se reuniam para efetivamente reafirmarem-se como componentes da Congada do Divino de Piracicaba, então reconhecida nacionalmente graças à difusão e apresentações de sua arte e fé, e parceria com o então Centro do Folclore de Piracicaba.

A Congada do Divino de Piracicaba em seu movimento evolutivo tem em sua tessitura histórias diversas que compõem e enriquecem seu universo. Sempre ativa, atravessou por muitos desafios superando-os a medida que surgiam. Hoje ela e todos que dela fizeram e fazem parte são símbolo de resistência, fé, devoção e principalmente irmandade com seus pares. Em sua existência surgem gradualmente músicas e coreografias com temáticas elaboradas e alusivas à religiosidade e ao folclores, unindo heranças lusitana e africana que foram se desenvolvendo por antigos componentes, em um belo processo sincrético, culminando no que hoje chamamos Congada do Divino de Piracicaba e que tece em suas peculiaridades a aculturação do legado, se re estruturando de forma a manter e preservar a devoção do grupo ao Divino Espírito Santo, e que desde seu início tem como padroeira, Nossa Senhora de Aparecida.

Com o decorrer do tempo torna-se reconhecidamente único grupo manifesto de tradição folclórica, popular e religiosamente de Piracicaba ativo e interrupto e que alia a prática da fé aos diversos ritmos que incorporaram suas apresentações, entre elas: Baixão do Divino, Congada, Caninha-Verde, Samba Lenço, Dança da Fita, Tangarás, Rio de Lágrimas, gerando um universo sincrético acolhedor entre rituais, ritos,ritmos, e toda herança cultural e devocional africana e portuguesa.

Resistindo às muitas intempéries nesse longo espaço de tempo de existência, participa de vários eventos, levando o nome de Piracicaba à diversos segmentos religiosos, sócio e artístico culturais, entre eles, festas alusivas ao Divino Espírito Santo, à São Benedito, à Nossa Senhora de Aparecida, pousos, encontros, congressos, festivais, missas, fóruns, feiras e festejos de forma geral. É também intensa fonte de pesquisa do universo acadêmico, sendo tema de publicações, documentários, filmagens e gravações.

A Congada de Piracicaba representa nos festejos folclóricos, a resistência, inovação e manutenção da tradição do município, sendo de valor significativo para a interpretação da cultura local, onde se identificam elementos semiológicos tais como, dança, religião, economia, música, representação, credo, entre tanto outros que integram o contexto social de um coletivo cultural manifesto; gerando uma rede de relações sócio culturais multi dimensionadas. Isso posto, sua presença é tênue e de sistemático referencial teórico nas áreas de antropologia social, folclore, educação física teologia e sociologia, numa miscigenação completa do corpo, mente e espírito, através de resgate de técnicas corporais, orais, rítmicas à luz da interpretação cultural, desenhando o que chamamos de transfiguração.

Cada componente da Congada de Piracicaba é agente responsável pela sua salvaguarda, resistência, sobrevivência e vitoriosa superação, seja como cidadãos, organizadores, “dançadores”, “tocadores”, e ou “cantadores”; que se harmonizam com a comunidade, nos festejos da cidade e de outras localidades; demonstrando também o modo como transitam física, mental e espiritualmente nas comunidades que atua. Com base em um novo olhar, há de se entender que a Congada do Divino de Piracicaba constitui um significativo elo para a interação de diversos elementos presentes na sociedade, assim, o corpo que se manifesta, ora em casa, ora na rua, traz impregnada sua cultura: a cultura da Congada, Congada de Piracicaba. Roberta Lessa

Folclorista, Pesquisadora,“Congadeante” e Coordenadora da Congada do Divino de Piracicaba

Roberta Lessa
Enviado por Roberta Lessa em 21/11/2014
Reeditado em 21/11/2014
Código do texto: T5043518
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