Gilvan Samico
Samico foi desenhista, gravador, pintor e professor, atuando com desenvoltura e excelência em todas as atividades que exercia. Embora também tivesse incursão na pintura, ficou mais conhecido por suas gravuras, sua meticulosas xilogravuras inspiradas na temática e estilos da gravura popular do Nordeste do Brasil. No dizer de Ariano Suassuna, “(...) deve-se recordar que a pintura de Samico não foi algo que aparecesse de repente e depois de sua gravura. Ele começou como pintor e nunca deixou a pintura de lado.(...)” A sua pintura, como a sua gravura, reconhecida amplamente, ocupou lugar indispensável à expressão de seu universo artístico.
Influenciado por Oswaldo Goeldi e Lívio Abramo, o artista iniciou carreira como autodidata. Em 1948 começa a freqüentar a Sociedade de Arte Moderna do Recife e em 1952 funda o Ateliê Coletivo da Sociedade, idealizado por Abelardo da Hora. Cinco anos depois estuda xilogravura com Livio Abramo na Escola de Artesanato do Museu de Arte Moderna de São Paulo e no ano posterior, gravura com Goeldi na Escola Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro. Em 1968 recebe o prêmio viagem ao exterior pelo MAM – RJ e permanece na Europa por dois anos. De volta ao Brasil, mora em Olinda e leciona xilogravura na Universidade Federal da Paraíba. Em 1971 integrou o Movimento Armorial juntamente com Ariano Suassuna, voltado à cultura popular.
Dono de um estilo inconfundível, suas obras guardam uma unidade profunda e uma origem comum e anterior mesmo à própria realização final da gravura ou da pintura, pois nos inúmeros esboços - a lápis, em tinta sobre o papel ou a óleo sobre tela e madeira – já se delineavam os caminhos pelos quais iria trilhar.
Do mundo estranho e belo, ao mesmo tempo, do romanceiro e das capas dos folhetos de literatura de cordel nordestinos, surge a obra de Samico. Buscando um reencontro com as suas próprias raízes – tendo nascido em Recife – seus pássaros de fogo, bichos monstruosos, anjos, caçadores, santos, serpentes, cachorros e profetas perambulam por suas peças de arte como personagens do destino e artífices desse mesmo destino. Temas recorrentes nos folhetos de cordel, repetem-se em suas xilogravuras, como, por exemplo, O pecado de 1964, onde vemos uma figura central demoníaca, agachada e segurando dois estandartes – do homem e da mulher – e elevando com a língua grotescamente grande, entre os dois, a maçã. Ou em Traição, xilogravura a cores, também de 1964, onde se vê um enorme pássaro pousado nos galhos de uma planta com dimensões semelhantes à do pássaro e uma cobra enrolada na base dessa árvore e já se aproximando da retaguarda do pássaro; enquanto em segundo plano vemos um homem mergulhado em águas.
O artista possui obras no MoMA de Nova Iorque e participou duas vezes da Bienal de Veneza tendo sido premiado em uma delas. Reconhecido nacional e internacionalmente sua linguagem, como diz Ferreira Gullar, “(...)é clara, límpida mas plena de ecos” “jovem e arcaica(...)”, ao mesmo tempo. Sem dúvida sua grande contribuição à arte brasileira e mundial figura como modelo e bastião -- pela cultura de qualidade -- de incomensurável envergadura.