Nove décadas de nascimento de Jayme Caetano Braun
Autor: Paulo de Freitas Mendonça (Jornalista, poeta e pajador)
Em 30 de janeiro de 2014 se comemora os 90 anos de nascimento do pajador, poeta e compositor Jayme Caetano Braun, um dos mais consagrados artistas rio-grandenses de todos os tempos.
O calor de janeiro de 2014 talvez não seja igual a do mesmo mês no ano de 1924, assim como o mundo não tem o mesmo ritmo. No início do século XX as famílias com certo grau cultural se reúnem nas salas de suas casas para os saraus e recitais e os peões, que forjam suas erudições na lida do campo, no lombo do cavalo e na herança das guerras de fronteira, entoam suas realidades nas penhas com seus pares no interior dos galpões. Jayme Caetano Braun nasce nesta realidade, no dia 30 de janeiro de 1924, na estância Santa Catarina, de propriedade de seus avós maternos, Anibal Caetano e Florinda Ramos Caetano, na localidade de Timbaúva, então 3º distrito de São Luiz Gonzaga, atual município de Bossoroca. Seu pai, João Aluysio Thiesen Braun, é um respeitado professor descendente de alemães e sua mãe, Euclides Ramos Caetano Braun, de tradicional família pecuarista da região missioneira. O casal Braun reside em São Luiz Gonzaga e dirige-se a estância dos avós paternos durante as férias com o claro objetivo de que o nascimento do seu segundo filho ocorra naquela localidade, aos cuidados de uma parteira chamada Antônia. Depois do resguardo, o casal retorna para São Luiz Gonzaga e Jayme cresce com a realidade do campo e da cidade, numa região em que a mística das Reduções Jesuíticas move o imaginário popular, forjando assim o seu discurso poético.
Segundo Vinícius Ribeiro, artista plástico escultor das duas estátuas do pajador, pesquisador e primo em terceiro grau de Braun, o dom artístico provém da família que lhe viu nascer. “Sua avó materna Florinda Ramos Caetano, irmã do poeta e coronel revolucionário Laurindo Ramos, dominava o verso de improviso e recitava seus poemas no ambiente familiar criando forte estrutura poética que Jayme veio a conviver e herdar mais tarde” afirma Ribeiro.
Em virtude das transferências do professor João Aluysio, o adolescente Jayme mora em Cruz Alta, Passo Fundo e Santa Cruz. Após a morte do professor, a família muda-se para Porto Alegre, mas Jayme resolve retornar ao seu berço de nascimento, passando a residir na fazenda Santa Terezinha, de propriedade de seu tio Danton Vitório Ramos, também na Timbaúva. Casa-se com Nilda Aquino Jardim, com quem tem dois filhos. Mora por um ano na Estância Piraju, de propriedade de seu sogro. Depois se muda para Serrinha, distrito de São Luiz Gonzaga, onde administra um bolicho de campanha por cerca de dois anos, em seguida retorna a São Luiz Gonzaga e de lá, definitivamente para Porto Alegre, onde vive maior parte de sua vida e tem outro filho, num segundo casamento, com Aurora Ramos Braun.
Na capital gaúcha conquista o reconhecimento como homem da palavra, torna-se diretor da Biblioteca Pública (1959-1963), sócio-fundador da Estância da Poesia Crioula, presidente do Conselho Coordenador, que futuramente vem a ser o MTG e Conselheiro de Cultura do Estado. Como locutor de rádio sua atuação provém desde São Luiz Gonzaga, mas em Porto Alegre ganha notoriedade estadual, mantendo por 15 anos o programa Brasil Grande do Sul, na Rádio Guaíba AM.
Na Estância da Poesia Crioula realiza diversos estudos sobre a poesia, convive com a elite de poetas crioulos da época e conhece ao poeta uruguaio Sandálio Santos (Nicásio Garcia Beriso), quem lhe ensina a estrutura da Décima Espinela, a qual sustenta a maior parte de sua produção poética escrita e improvisada através da pajada. Participa do Grupo Os Teatinos, juntamente com Glênio Fagundes, Paulo Fagundes e Marco Aurélio Campos.
Sobrinho do poeta e político Ruy Ramos, também herda deste, além da poesia, o gosto pelas questões sócio-políticas, apesar do seu insucesso nas urnas numa única vez que se candidata a deputado estadual. Por influência deste, participa como pajador de campanhas importantes como as de Getúlio Vargas, Leonel Brizola, Jânio Quadros e outros.
Estas vivências do campo, da cidade, das missões, da política, da região de fronteira e dos meios culturais são formadoras da sua produção artística em seus diversos livros e discos de sucesso. A parceria com seu conterrâneo Noel Guarany lhe dá visibilidade de um resgate extremamente importante que é a valorização da cultura missioneira, na qual se agregam num futuro breve, Cenair Maicá e Pedro Ortaça, entre outros. O canto de rebeldia, sendo a voz calada do índio, o alerta para um patrimônio cultural abandonado e a defesa dos usos e costumes do campo e do bem maior do povo, a liberdade, são seus discursos poéticos preferidos que encontram eco nos anseios de grande parte da população rio-grandense. Estes e outros fatores, associados a sua qualidade poética e inspiração incomparável, lhe outorgam a respeitabilidade como um dos mais importantes poetas do Estado e o patrono do movimento pajadoril brasileiro, tendo sua data de nascimento reconhecida por lei estadual como Dia do Pajador Gaúcho.
O Professor Mosart Pereira Soares ao referir-se ao poeta pajador afirma: “Eu diria que a desenvoltura de Jayme Caetano Braun improvisando participa da natureza do milagre.” E, continua: “O Jayme Caetano Braun foi, até aqui, a maior expressão do improvisador, do pajador, que tivemos. Diante dele não há o que resista. O Jayme Caetano Braun tem uma cultura respeitável e sobretudo um imenso talento.” O poeta Balbino Marques da Rocha é profético: “Jayme nasceu em São Luiz Gonzaga, mas naquele momento tremeram os alicerces dos quatro pontos cardeais do Rio Grande, porque nascia o grande inimitável payador desta terra, que terá o calendário mudado para antes e depois de Braun.”
Ambos tem razão, Jayme Caetano Braun é reconhecido como um cultor da poesia que transcende o gauchismo e o seu tempo. É nome de CTG na capital federal, de viaduto em Porto Alegre, está imortalizado em estátuas em São Luiz Gonzaga e na capital gaúcha e em praça, em Passo Fundo. É considerado por artistas e públicos de diversas gerações como um prócer da cultura rio-grandense, que deixa discípulos e influencia até hoje a produção artística do Estado. É consagrado nos galpões dos rincões mais ermos do sul do Brasil e nos salões mais nobres da capital, prova disso é que, quando da sua morte, em 08 de julho de 1999, o Salão Negrinho do Pastoreio, do Palácio Piratini, sede do governo estadual, vela respeitosamente seu corpo, na despedida derradeira.
Seus poemas e letras de música permanecem atuais, recitados, lidos e ouvidos nos mais diversos ambientes, inclusive além fronteiras, respaldando seu sonho de pátria grande através do modus vivendi dos habitantes do sul da América. Suas pajadas continuam inspirando novos pajadores e encantando os admiradores da poesia oral improvisada.