A FILOSOFIA NO BRASIL
A FILOSOFIA NO BRASIL
A expressão filosofia no Brasil se refere à tradição do pensamento filosófico realizada por brasileiros dentro ou fora do Brasil. As atividades de reflexão filosófica foram trazidas pelos padres jesuítas na segunda metade do século XVI com as atividades do descobrimento das Américas, e se estende até os dias atuais com o processo de profissionalização universitária. O desenvolvimento da filosofia no Império do Brasil poderia ser dividido em três momentos:
• Primeiro reinado;
• O período regencial e
• Segundo reinado.
Durante o primeiro reinado é notável pela hegemonia do liberalismo iluminista do século XVIII. Com a experiência da administração liberal do período regencial, ocasionará do surgimento de correntes antagônicas ao iluminista. Muitos irão aderir a corrente espiritualista e metafísica tradicional gerada pela influência do romantismo.
No início do século XIX o Brasil estava emergindo como país autônomo, sob o reinado de D. Pedro I muito se entrelaçaram as reflexões filósoficas aos sentimentos patrióticos. Muita influência francesa é possível observar até na Constituição de 1824 inspirada no pensamento do poder moderador do pensador franco-suiço Benjamin Constant. Muitas contribuições políticas serão por parte de conservadores como Visconde do Uruguai, Marquês de São Vicente, Zacarias de Góis e Vasconcelos, Visconde de Cairu e Bernardo Pereira de Vasconcelos; o liberalismo moderado José Bonifácio e Hipólito José da Costa; e o liberalismo radical de Frei Caneca e Diogo Antônio Feijó.
O maior polo formador da erudição filosófica ocorreu a partir das facudades de direito de São Paulo e de Olinda. Muitas contribuições para a filosofia ocorreram através de juristas, romancistas, poetas e políticos. Em 1838 o elemento de tranformação para as ciências sociais foi a criação do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, gerando o ínicio para o estudo da historiografia do Brasil. Com o objetivo de compreender os elementos da integridade nacional será o foco da reflexão de Francisco de Varnhagen.
Em reação ao iluminismo, o ecletismo surgiu como uma fusão do espiritualismo metafísico, fruto do racionalismo francês de René Descartes, e do empirismo inglês de John Locke sendo o maior expoente o educador francês Victor Cousin. O ecletismo vai ter grande adesão na primeira metade do século XIX, por diversos setores da sociedade brasileira, como o poeta Gonçalves de Magalhães, pintor Pedro Américo, o médico Eduardo Ferreira França e Antonio Pedro de Figueiredo. Será característica a influência do indianismo como forma de buscar os valores de identidade da nação brasileira.
Em 1845 surge um grupo secreto de escritores chamado de Sociedade Epicuréia, fundado por Alvares de Azevedo, Aureliano Lessa e Bernardo Guimarães. Será composto pela boêmia gerando discussões e saraus sobre a temática sombria da vida, refletindo elementos sobre morte e satanismo. Tiveram muita influência do romantismo de Lord Byron e Charles Baudelaire. Foram também participantes: Francisco Leite de Bittencourt Sampaio, Castro Alves, Fagundes Varela, João Cardoso de Meneses e Sousa (Barão de Paranapiacaba) e Múcio Teixeira, entre outros.
No Brasil terá mais repercusão no direito, com João Teodoro Xavier de Matos e Carlos Mariano Galvão Bueno. Na Faculdade de Direito de Recife, o tomismo surge com o pensamento do paraibano José Soriano de Souza e tem respaldo em outros pensadores como: João Mendes de Almeida Júnior, Leonel Franca, Frei Firmino de Centelhas, José Maria Benevides (Padre Júlio Maria).
Na segunda metade do século XIX, houve uma enorme mudança a partir do segundo reinado. Inicialmente com a introdução dos pensamentos de influência filosofia alemã. A partir desta corrente veio um período chamado por Sílvio Romero de "surto de novas ideias".
A Faculdade de Direito de Recife se tornou o polo florescedor do positivismo entre os intelectuais do Brasil, conhecido como Escola do Recife. Terão destaques desse grupo Tobias Barreto que vai tentar trazer influência da filosofia alemã herdeira do kantismo. Teorico do monismo evolucionista, Barreto sofreu profundas influências do naturalista Ernst Haeckel. Essa Escola do Recife será uma forma do positivismo heterodoxo advogado por Émile Littré e isso repercutirá em diversos pensadores como: Silvio Romero, Clóvis Beviláqua, o historiador Capistrano de Abreu, o médico Luís Pereira Barreto, Ivan Monteiro de Barros Lins e por Alberto Sales entre diversos outros bacharéis. Isso fará com que o positivismo repercuta nas diversas camadas da sociedade imperial.
As grandes contribuições dos estudiosos do positivismo da Escola do Recife foram as primeiras tentativas de organizar a “história da filosofia no Brasil”, sendo esse o título das primeiras obras de Silvio Romero em 1878. Na região sul e sudeste do Brasil, o positivismo terá uma influencia na sua forma ortodoxa com é defendido por Pierre Laffitte, com a criação da Igreja Positivista. Sendo os maiores expoentes no Brasil: Miguel Lemos, Raimundo Teixeira Mendes e Benjamin Constant Botelho de Magalhães que fundaram em 1876 a Sociedade Positivista do Brasil e a Igreja Positivista do Brasil em 1881. Todos advogaram o Estado laico, o ingresso das mulheres na política, e muito dessa filosofia irá servir de suporte ao movimento abolicionista liderado pelo liberal Joaquim Nabuco e Ruy Barbosa, e ao movimento republicano que culminou com a Proclamação da República.
A República do Brasil também conhecida depreciativamente como a República dos Bacharéis demonstra a forte produção de juristas brasileiros. A primeira década do século XX vai ser marcada pelo positivismo. No direito vai respaldado por Pontes de Mirandae por Pedro Lessa que compunha a Liga da Defesa Nacional que advogava a serviço militar obritatório. Os principios positivistas repercutiam em quase todas as camadas políticas do Brasil, principalmente durante esse período.
Em contraponto, surgiram autores que foram contra essa corrente positivista, que era uma herança do kantismo. Um dos mais importantes foi a metafísica de Raimundo de Farias Brito e Jackson de Figueiredo. Figueiredo que foi o responsável pela fundação do Centro Dom Vital que era uma organização católica, responsável pela exposição do pensamento filosófico conservador ultramontano antiliberal e antimaçom. Depois da morte de Fiqueredo, o Centro Dom Vital passou para ser administrado por Alceu Amoroso Lima.
Outros autores importantes surgiram como Leonel Franca, Heráclito Fontoura Sobral Pinto e Manuel Bonfim. Este último que travou um forte confronto contra Silvio Romero sobre a questão da importância da miscigenação para formação da identidade do povo brasileiro. Muitos positivistas, influênciados pela doutrina de Arthur de Gobineau, que tinha passado pelo Brasil, adotavam muitas posições racistas, e que o Brasil necessitaria passar por um processo de embranquecimento racial. Manuel Bonfim foi uma das principais vozes em antagonismo contra essas correntes advogando a miscigenação como um importante elemento positivo na formação da identidade nacional. Não há como imaginar a filosofia no Brasil, pelo menos no século XIX e início do XX sem mencionar o positivismo.
Assim, a partir da segunda metade do século XX a filosofia passa a ter sua primeira onda de intelectuais acadêmicos legitimamente ligados à filosofia. Cujos nomes e características veremos mais abaixo. Na sociologia surgiram Florestan Fernandes, Antônio Candido de Mello, Fernando Henrique Cardoso e Darcy Ribeiro.
Alguns filósofos brasileiros da atualidade
No Brasil, pelo desaquecimento histórico que recaiu sobre a filosofia no século XX (leia-se ditadura de 1964), não existem, praticamente, pessoas que exerçam profissional e exclusivamente essa disciplina. Isto ocorre por conta de não exisitir por aqui grandes escolas de filosofia. O que acontece é que a maioria dos nossos filósofos – dfiferente dos americanos e europeus – se divide entre o exercício de magistério em outras áreas correlatas como teologia, sociologia, direito e antropologia, e outras nem tão correlatas assim. A rigor, não temos pensadores que desenvolvam uma filosofia pura. Mesmo assim, vamos encontrar em nosso universo intelectual, pessoas, homens e mulheres, que a despeito das limitações acima aludidas, se esforçam em levar a filosofia adiante. No Brasil existem muitos filósofos. Selecionamos aqui apenas alguns, talvez os mais expostos à midia, conferências, entrevistas e literatura.
Marilena Chaui
Filósofa, nascida em 1941, Professora titular de Filosofia Política e História da Filosofia Moderna da USP, é Mestre (em Merleau-Ponty) e Doutora (Spin osa). É internacionalmente conhecida por seus livros, conferências, publicações e manifestações na mídia. Marilena foi Secretária Municipal de Cultura de São Paulo, de 1989 a 1992, durante a administração de Luiza Erundina. (1988-1992). Seus principais livros,
• Simulacro e poder
• Cidadania cultural
• Espinosa. Uma filosofia de liberdade
• Convite à filosofia
• Experiência no pensamento
• O que é ideologia?
Mario Sérgio Cortella
Esse filósofo e professor universitário, nascido em 1954 em Londrina, Paraná, é um dos intelectuais brasileiros mais requisitados nas escolas, mídia e programas de televisão. Professor titular do Departamento de Teologia e Ciências da Religião e de pós-graduação em Educação da PUC-SP, na qual esteve de 1977 a 2012. Suas principais obras:
• Não espere pelo epitáfio. Provocações filosóficas
• Não nascemos prontos
• Qual é a tua obra?
• Vivemos mais! Vivemos bem?
• Não se desespere
Miguel Reale
O jurista Miguel Reale († 2006) foi um filósofo, educador e poeta brasileiro. Tornou-se um dos líderes do integralismo no Brasil e ideólogo da Ação Integralista Brasileira. Posteriormente, defendeu o liberalismo social. Reale formou-se pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (1934), onde foi professor catedrático (1941) e reitor da universidade (1949 — 1950; 1969 — 1973). É autor, entre outros, de Filosofia do Direito e de Lições Preliminares do Direito, obras clássicas do pensamento filosófico-jurídico brasileiro. Ficou conhecido como formulador da teoria tridimensional do direito, na qual os elementos da tríade fato, valor e norma jurídica compõem o conceito de direito. Ocupou a cadeira 14 da Academia Brasileira de Letras, a partir de 16 de janeiro de 1975. Escreveu coluna quinzenal no jornal O Estado de S. Paulo, na qual tratou de questões filosóficas, jurídicas, políticas e sociais da atualidade.
Outros livros publicados:
• Fontes e modelos do direito
• Direito natural/direito positivo
• Filosofia do Direito
• O Estado moderno
Denis Lerrer Rosenfield
Rosenfield (nascido em 1950) é um filósofo brasileiro, escritor, professor universitário e articulista de vários jornais nacionais. Tem livros e artigos acadêmicos publicados em português, francês e espanhol. Sua tese de Doutorado, denominada “Política e Liberdade em Hegel”, transformou-se em livro e foi publicado em português e francês. Trata-se, ainda hoje, de uma obra de referência sobre a Filosofia Política de Hegel, constituindo-se no primeiro livro a abordar as relações entre a Ciência da Lógica e a Filosofia do Direito de Hegel. Seus principais livros:
• Política e liberdade em Hegel
• O que é democracia?
• Filosofia política e direitos humanos
• A ética na política
Antônio Mesquita Galvão
Nascido em 1942, em Porto Alegre, Galvão é aposentado de uma Estatal (Caixa). Paralelamente deu aulas de História da Filosofia, Filosofia da Ciência, Formação Social e Política no Brasil e História do Pensamento Humano em várias universidades. Além dessas, lecionou ética e bioética em EAD, aulas regulares e workshops. Dá aulas particulares de Grego Bíblico. Possui Doutorado em Teologia Moral. Por sua oposição à autoridade e hierarquia se auto intitula “um anarquista”. Tem 112 livros editados no Brasil e exterior. Abaixo suas obras que tratam de filosofia:
• Ética cristã e compromisso político. São Paulo, 1996;
• A crise da ética. O Neoliberalismo como causa da exclusão
social. 3ª edição. Petrópolis, 1999;
• A fome e o ensino social da Igreja. Aparecida, 2001;
• Bioética. A Ética a serviço da Vida. Aparecida, 2004.
A filosofia clínica
A “filosofia clínica” é uma terapia social realizada por filósofos. Por ser uma atividade multidisciplinar, faculta aos profissionais de outras áreas cursar esta pós-graduação como uma especialização e utilizar os ensinamentos, em caráter introdutório, em suas áreas.
Deste modo, Filosofia Clínica é a abordagem filosófica para aliviar as angústias humanas, a exemplo Filosofia do Aconselhamento, que surgiu na Alemanha, em fins do século passado. Enquanto a psicologia procura harmonizar conflitos a partir de uma abordagem através do inconsciente, a FC procura resolver problemas a partir do consciente. Ajuda a tomar decisões eficazes e rápidas. A filosofia, e nisso se invoca sempre a maiêutica de Sócrates, procura arrancar da pessoa aquilo que ela sabe e não sabe que sabe. Maiêutica, no grego, quer dizer parto.
As bases metodológicas partem da historicidade do paciente, percorrendo-se desde o logicismo formal até a epistemologia das questões focadas no diagnóstico dos problemas. Diz-se que a filosofia ensinada pelos mestres visa levar as pessoas a pensarem. Pois a filosofia, transformada em “clínica” através de entrevistas realizadas em consultórios, visa ensinar a pessoa a organizar suas idéias, formular raciocínios através da lógica dos silogismos, e assim pensar de forma mais determinada. Na FC não existe o conceito de normalidade ou de patologia; não existem concepções a priori como “o homem é um ser social” ou “alguém que busca a felicidade”.
Depois de muitos anos no ostracismo, a filosofia volta à primeira linha das ciências sociais, atuando como instrumento facilitador do pensamento humano. A ditadura militar eliminou o ensino da sociologia e da filosofia no segundo grau. Foi um dos maiores crimes de lesa-cultura que já se cometeu em nosso país. Até hoje muita gente não sabe – e outros não querem saber – o porquê dessa castração que atuou como um elemento predador de nossa cultura e educação. As ciências humanistas, e entre elas a filosofia, eram atividades multidisciplinares que ensinavam as pessoas a pensar, e tudo que os ditadores fantasiados de gorilas não queriam é que o povo pensasse. Eles preferiam que os estudantes, em todos os níveis de ensino, recebessem “pratos feitos”, ao invés de estabelecer aquela práxis que é a característica da ciência: especular. Você podia falar em pobres, mas era proibido perguntar por que existia pobreza, por exemplo.
Na “filosofia clínica” o indivíduo vai ao consultório do filósofo, não para desnudar seu inconsciente, na busca de solução para problemas de comportamento, traumas, culpas, atração pela mãe, etc., mas para que o especialista o ajude a colocar as idéias em ordem, a definir alternativas e a escolher caminhos. Enfim, alguém que – conforme o objetivo da filosofia – o ajude a pensar. Pensar por sua própria cabeça. Luxo que a vida moderna nem sempre nos permite. Enquanto a psicologia procura harmonizar conflitos a partir de uma abordagem através do inconsciente, a FC procura resolver problemas a partir do consciente. Ajuda a tomar decisões eficazes e rápidas. A filosofia, e nisso se invoca sempre a maiêutica de Sócrates, procura arrancar da pessoa aquilo que ela sabe e não sabe que sabe.
As bases metodológicas da FC partem da historicidade do paciente, percorrendo-se desde o logicismo formal até a epistemologia das questões focadas no diagnóstico dos problemas. Diz-se que a filosofia ensinada em sala de aula visa ensinar o aluno a pensar. Pois a filosofia, transformada em “clínica” visa ensinar a pessoa a organizar suas idéias, formular raciocínios através da lógica dos silogismos, e assim pensar de forma mais determinada.
A pessoa com dificuldade de estabelecer raciocínios lógicos (e isto se faz necessário em todos os quadrantes da vida) se angustia, se fecha e pode cair em depressão. A base dessa corrente é o trabalho dos chamados epicuristas da Grécia, seguidores de Epicuro. Para este último, filosofia era, por fim, “a terapia da alma”, daí sua utilização para aliviar as angústias humanas. A Filosofia Clínica trabalha em cima da lógica (aristotélica, cartesiana e hegeliana). Muitas pessoas sofrem porque não sabem organizar suas idéias, e por isso não conseguem expor seus argumentos de forma clara e, sobretudo convincente. A partir da década de 1980 o termo, que aponta para aconselhamento filosófico (do inglês: philosophical counseling), ganhou popularidade pela divulgação da obra do filósofo canadense Lou Marinoff, pelo filósofo francês Marc Sautet e - no Brasil - pelo psicanalista e filósofo Lúcio Packter.
O termo aconselhamento filosófico assemelha-se à Philosophische Praxis (português, literalmente: prática filosófica ou consultório filosófico, não confundir com a filosofia prática de Aristóteles) criada pelo filósofo alemão Gerd B. Achenbach, em 1981, a partir da concepção epicurista de filosofia como "terapia da alma". Neste contexto o aconselhamento filosófico é entendido como uma proposta para resolver questões típicas da psicoterapia (problemas pessoais de relacionamento, auto-imagem, etc.).
A prática filosófica no sentido mais amplo é definida principalmente pela preocupação de tornar acessível a metodologia e o conhecimento filosófico ao público em geral e usar o potencial prático da filosofia como recurso terapêutico para indivíduos, organizações ou empresas através de consultas individuais, discussões de grupo, seminários, palestras, viagens ou cafés filosóficos. Na FC são trabalhados diversas técnicas e autores da filosofia como Heráclito, Epicuro, Sócrates, Aristóteles, Locke, Hume, Morin, Nietzsche, Kant, Spinoza, Descartes, Husserl, Scheller e outros.